Parecer Normativo CST nº 49 de 18/07/1977

Norma Federal - Publicado no DO em 22 jul 1977

A massa falida não se caracteriza como contribuinte pessoa jurídica, nem a ela se equipara, para efeitos da legislação do Imposto sobre a Renda.Se após o pagamento do passivo houver sobra restituível (art. 129 do Decreto-lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945), o valor que ultrapassar o da participação no capital social será classificado como rendimento da cédula "F" na declaração do titular da firma individual, do sócio ou do acionista, na forma prevista na alínea "h", do art. 34 do RIR, quando pessoas físicas, ou como acréscimo ao lucro real, segundo a alínea g do art. 222 do RIR, se pessoas jurídicas.

Imposto Sobre a Renda e Proventos
MNTPJ 2.16.15.00 - Apuração dos Resultados nos Casos de Liquidação, Extinção ou Sucessão

1. Pretende-se esclarecer se as massas falidas estão sujeitas ao tratamento previsto nos arts. 129 e 130 do Regulamento do Imposto sobre a Renda - RIR, aprovado pelo Decreto nº 76.186, de 02 de setembro de 1975.

2. Legislação Aplicável

2.1. Os dispositivos do RIR/75, a serem analisados, assim estão redigidos:

"Art. 129. As firmas e sociedades em liquidação serão tributadas, até findar-se esta, de acordo com as normas estabelecidas neste Livro (Decreto-lei nº 5.844, de 23 de setembro de 1943, art. 51).
Parágrafo único. Ultimada a liquidação, proceder-se-á em conformidade com o disposto no artigo seguinte (Decreto-lei nº 5.884/43, art. 51, parágrafo único).
Art. 130. No exercício em que se verificar a extinção, a firma ou sociedade, além da declaração correspondente aos resultados do ano-base, deverá apresentar a relativa aos resultados do período imediato até a data da extinção (Decreto-lei nº 5.844/43, art. 52, e Lei nº 154, de 25 de novembro de 1947, art. 1º)
Parágrafo único. A declaração de que trata a parte final deste artigo será apresentada dentro de 30 (trinta) dias contados da data em que se ultimar a liquidação."

2.1.1. Segundo o RIR, todas as pessoas jurídicas de direito privado, inclusive as em liquidação, são contribuintes do imposto, sejam quais forem seus fins e nacionalidade (art. 95), estando elas e as empresas individuais obrigadas à inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes (art. 105), e sujeitas, como regra, à tributação com base no lucro real comprovado este por meio de escrituração em idioma e moeda nacionais e pela forma estabelecida nas leis comerciais e fiscais (art. 135).

2.2. Dispõe o art. 335 do Código Comercial (Lei nº 556, de 25 de junho de 1850), que são reputadas dissolvidas as sociedades comerciais por quebra da mesma, ou de qualquer dos sócios, mas ressalva que, em todos os casos "deve continuar a sociedade, somente para se ultimarem as negociações pendentes; procedendo-se à liquidação das ultimadas":

2.2.1. a escrituração mercantil acha-se disciplinada por dispositivos do Código Comercial e pelo Decreto-lei nº 486, de 03 de março de 1969, este regulamentado pelo Decreto nº 64.567, de 22 de maio de 1969;

2.2.2. as formalidades de escrituração mercantil e fiscal, válidas para o Imposto sobre a Renda, estão esclarecidas, entre outros, pelos Pareceres Normativos CST nºs 347/70, 170/74 e 127/75, publicados no Diário Oficial da União, respectivamente, de 29 de outubro de 1970, 17 de outubro de 1974 e 24 de outubro de 1975;

2.2.3. mais especificamente, o Parecer Normativo CST nº 191/72, publicado no Diário Oficial da União, de 17 de julho de 1972, ao interpretar aspectos dos arts. 218 e 219 do RIR/66 (arts. 129 e 130 do RIR/75), e referindo-se a liquidações não falimentares, aponta a obrigatoriedade de o liquidante "manter a escrituração de suas operações, levantar balanços periódicos, apresentar declaração de rendimentos, pagar tributos exigidos e cumprir todas as demais obrigações previstas na legislação tributária".

2.3. A Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional) vincula o surgimento da obrigação tributária principal à ocorrência do fato gerador previsto em lei (art. 114), proibindo a exigência de tributo com base em interpretação analógica (art. 108, § Iº) e estende a capacidade tributária passiva à entidade que configure, pelo menos, uma unidade econômica ou profissional (art. 126, III):

2.3.1. o fato gerador, a base de cálculo e a identificação do contribuinte do Imposto sobre a Renda assim estão enunciados pelo CTN, verbis:

"Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza, tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho, ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
Art. 44. A base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis.
Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43, sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis."

2.4. A Lei de Falências (Decreto-lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945) regula inteiramente a matéria de direito falimentar, razão por que suas regras se sobrepõem a outras de caráter genérico, segundo o princípio do § 1º do art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942). Disciplina especificamente: a caracterização e declaração de falência; os efeitos jurídicos da sentença declaratória da falência; a administração da falência; a arrecadação e guarda dos bens, livros e documentos do falido; o pedido de restituição e embargos de terceiro; a verificação e classificação dos créditos; o inquérito judicial referente à apuração de crime falimentar; a liquidação; a extinção das obrigações do falido; as concordatas; os crimes falimentares; outras disposições especiais, gerais e transitórias:

2.4.1. com a instauração do processo, inicia-se a dissolução da sociedade mercantil, segundo previsto no art. 335, item 2, do Código Comercial, bem como a cessação das atividades do falido, em regra, a ela seguindo-se a fase de liquidação, composta pela realização do ativo e pagamento do passivo, ao final da qual ocorrerá a extinção da pessoa jurídica e da firma individual. Semelhante, pois, as fases de que tratam os arts. 129 e 130 do RIR, relativas à dissociação ordinária, concorde ou judicial, e as fases da falência;

2.4.2. encontra-se expresso nesse diploma que o síndico, sob a imediata direção e superintendência do Juiz, exercerá a administração da falência (art. 59), de que prestará contas quando terminar a liquidação, ou tiver o devedor obtido concordata (art. 69), sujeitas essas contas à aprovação judicial (art. 131);

2.4.3 - determina a lei, ainda, que, após o pagamento do principal e dos juros, a sobra que houver será restituída ao falido (art. 129), ou aos sócios ou acionistas da entidade extinta.

3. Considerações Gerais

3.1. Formalizado, por via de sentença, o reconhecimento do estado falencial, passará a surgir a figura da massa falida, que em sentido amplo é:

"... a instituição legal, que se compõe para a defesa de todos os interesses em jogo, sejam os dos credores, como os do próprio falido, sem atender os interesses individualísticos de cada um. Toma, assim, uma personalidade própria, que não se confunde com a do falido nem com a dos credores, vigiada e protegida pela lei e assistida pelo Juiz oficiante da falência, sendo representada por um Delegado, inicialmente nomeado pelo Juiz, o síndico, que é, depois, o liquidatário. Nesta razão, a rigor técnico, massa falida não se pode confundir com a massa ativa e massa passiva, contidos nela, indicando os valores ativos, que lhe pertencem ou os encargos, que pesam sobre ela." (De Plácido e Silva, "Vocabulário jurídico")

3.2. Muito embora se possa alegar, de um lado, que a personalidade jurídica da sociedade mercantil não se extingue no preciso momento da declaração do estado falencial, pois se prolonga até o final da liquidação, que a entidade mantém, até a realização do ativo, a propriedade nominal dos bens arrecadados; de outro lado, entretanto, cabe observar que a universalidade de direitos passa à integral administração e disponibilidade de um terceiro, por força da lei e não por vontade dos credores ou do falido.

3.3. Segundo ensinamento da doutrina jurídica, o síndico não é representante dos credores nem do falido, pois tem uma posição processual de órgão de execução forçada, a serviço do poder de prestar justiça. Vislumbra-se claramente, que não gerencia nem administra em nome ou conta da empresa falida, e sim administra a falência "sob direção e superintendência do Juiz", em favor dos interesses da massa:

3.3.1. incumbe-lhe a representação da massa, em juízo e fora dele, daí podendo opor-se aos interesses do falido, seus sócios ou acionistas, e aos individuais de cada credor, quando em contraposição aos interesses coletivos;

3.3.2. do ponto de vista da legislação do Imposto sobre a Renda, observa-se que, entre outras, são atribuídas ao síndico as seguintes obrigações:

a) comunicar ao Cadastro Geral de Contribuintes, dentro de 30 (trinta) dias de sua nomeação, a decretação da falência (Instrução Normativa SRF nº 28, de 17 de junho de 1974, subitem 7.1);

b) comunicar a baixa no prazo de 30 (trinta) dias após encerrada a falência (idem, subitem 7.2);

c) fornecer as informações e esclarecimentos solicitados pelas repartições da Secretaria da Receita Federal (art. 439 do RIR); e

d) cumprir outras obrigações decorrentes da representação legal da massa falida (art. 563 e seu parágrafo único, do RIR);

3.3.3. outrossim, é importante observar que o síndico, ao exercer a administração que lhe compete, nos limites da lei e da autorização judicial, não passa, com isso, a dar continuação à atividade social paralisada com o advento do processo, sendo de se constatar não lhe caber a obrigação de efetuar escrituração contábil regida pelas leis comerciais e sim apenas a escrituração capaz de amparar a prestação de contas de sua administração (art. 69, § 1º, da Lei de Falências).

3.4. Ainda convém salientar que, embora a massa falida se apresente no mundo jurídico destacadamente da entidade falida e dos seus credores, tendo capacidade ativa e passiva para estar em juízo nos casos especificados na lei, constitui entendimento predominante na doutrina e jurisprudência o de não ser ela uma pessoa jurídica. Por outro lado, se o legislador quisesse sua equiparação, tê-la-ia manifestado expressamente, obedecendo ao comando do art. 97 do CTN, cujo inciso III exige que a definição do fato gerador e do sujeito passivo constem do texto legal. A propósito, note-se que embora o RIR disponha expressamente no art. 7º sobre a aplicação do tratamento tributário da pessoa física ao espólio, não estendeu à massa falida o tratamento conferido à pessoa jurídica.

3.5. Como se vê do RIR, são contribuintes eleitos pelo legislador as pessoas jurídicas, caracterizadas estas sob firmas ou sociedades, registradas ou não, filiais, sucursais, agências ou representações no País das pessoas jurídicas com sede no exterior (art. 95 e seu parágrafo único) e as empresas individuais a elas equiparadas, para os efeitos do Imposto sobre a Renda (art. 100).

3.6. Mesmo a uma análise pouco minudente, verifica-se que há fundamentais modificações na situação de fato e de direito da empresa declarada falida, que a impedem, salvo temporariamente ou no caso de concordata suspensiva (arts. 40, § 1º, 74, e § 7º, e 183 da Lei de Falências), de estar no exercício de quaisquer atividades vinculadas ao seu objeto e de agir na condição de "unidade econômica" a que art. 126, III, do CTN atribui capacidade tributária passiva, visto perder não só o direito de administrar e dispor de seus bens, como até de praticar qualquer ato que se refira, direta ou indiretamente, aos bens, interesses, direitos e obrigações compreendidos na falência (art. 40 e § 1º, da Lei de Falências). Por conseguinte, fica impossibilitada de apurar a matéria tributável do Imposto sobre a Renda "segundo as leis comerciais e fiscais" e de obter a "disponibilidade econômica ou jurídica" da renda, esta última integrada à massa falida para pagamento do passivo.

3.7. Ao estabelecerem a ordem de pagamento do passivo - fase integrante da liquidação - a Lei de Falências (art. 124, inciso V) e o Código Tributário Nacional (art. 188) asseguram preferência aos encargos da massa representados por créditos tributários, vencidos e vincendos, exigíveis no decurso do processo de falência:

3.7.1. daí, deduz-se que o crédito tributário pode ter-se tornado exigível:

1. antes da decretação da falência, contra o falido, como dívida ativa legalmente inscrita, caso em que será cobrável imediatamente sob configuração de título executivo extrajudicial (inciso VI do art. 585 do vigente Código de Processo Civil e art. 422 do RIR); ou

2. durante o processo de falência, como encargo da massa e sob a responsabilidade solidária do síndico (art. 134, V, do CTN), devendo ser pago antes dos credores da falência.

4. Conclusões

4.1. A massa falida, por não ser pessoa jurídica e nem estar a ela legalmente equiparada, não é sujeito passivo da obrigação do Imposto sobre a Renda.

4.2. Conclui-se, daí, que as normas referentes à dissolução, liquidação e extinção da pessoa jurídica, de que tratam os arts. 129 e 130 do RIR, inclusive quanto à tributabilidade e à prestação de declaração de rendimentos, não são aplicáveis às empresas cuja existência venha efetivamente a se extinguir em virtude de falência.

4.3. O valor do capital da firma individual ou o da participação no capital social que, ao final da liquidação, eventualmente vier a ser devolvido, respectivamente, ao seu titular, ao sócio ou ao acionista, como previsto pelo art. 129 do Decreto-lei nº 7.661/45, será considerado restituição de capital. Em conseqüência, a quantia que ultrapassar o valor da respectiva aplicação, por representar acréscimo do ativo ou vantagem dele auferida, sujeitar-se-á à tributação nas declarações de rendimentos das beneficiárias:

a) como acréscimo ao lucro real, com base no art. 222, alínea g, do RIR, se o sócio ou acionista da falida for pessoa jurídica, ou

b) como rendimento classificável na cédula "F", ex vi do art. 34, alínea h, do mesmo Regulamento, se pessoa física.

À consideração superior.