Parecer GEOT nº 84 DE 13/01/2012

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 13 jan 2012

Exigência de escrita contábil.

A Delegacia Regional de Fiscalização de Goiânia em face de diversos processos de suspensão de ofício instaurados com o advento da IN nº 946/09-GSF, que dispõe sobre o CCE e da IN nº 966/09-GSF, que estabelece o rito processual a ser aplicado nos casos de suspensão e cassação da inscrição no CCE, a fim de dirimir dúvida quanto ao procedimento a ser adotado e a fim de evitar solução divergentes em casos semelhantes, vem formular a presente consulta em relação às seguintes situações:

1 - quando a notificação for para entrega de livros contábeis (Diário) e o contribuinte declarar na DPI que sua escrita é fiscal e não contábil e também declarar que sua forma de tributação para fins de apuração de Contribuição Social e Imposto de Renda é com base no lucro presumido, tributos de competência da União. Considerando, ainda, que a Receita Federal do Brasil regulamenta por meio de Instrução Normativa a dispensa do Livro Diário na apuração pelo Lucro Presumido, surgem as seguintes dúvidas:

- diante da obrigatoriedade da escrituração contábil imposta a todas as empresas, nos termos dos artigos 1.179 e 1.180 do Código Civil Brasileiro, o Fisco estadual pode exigir a apresentação dos livros contábeis (Diário) à empresa que declarar não possuir escrita contábil e que a tributação é com base no lucro presumido? O não cumprimento da notificação pode motivar a suspensão de ofício da inscrição (por reiterados atos de recusa ou embaraço à fiscalização, artigo 29, inciso IX da IN nº 946/09-GSF)?

- nos casos em que o contribuinte declarar ter escrita contábil e que a tributação é com base no lucro real e mesmo assim não atender a notificação, neste caso qual o procedimento a ser tomado? Devemos suspender de ofício a inscrição por embaraço à fiscalização e, em seguida, solicitar a busca e apreensão judicial dos livros e balancetes?  Ou somente solicitar a busca e apreensão judicial?

2 - quando a notificação for para apresentação de extratos bancários e/ou microfilmagem de cheques, surge a seguinte dúvida:

- pode o Fisco exigir que o contribuinte entregue tais documentos? O não cumprimento da notificação pode ser motivo para suspender de ofício sua inscrição? Ou ante à recusa de atendimento da notificação, com base na LC nº 105/01 e IN nº 966/09-GSF, deve-se solicitar tais informações à instituição financeira?

Em conformidade com o disposto no art. 103 do Decreto nº 4.852/97 – Regulamento do Código Tributário do Estado de Goiás (RCTE), a suspensão da inscrição estadual é “o evento que interrompe temporariamente a regularidade cadastral do contribuinte perante a administração tributária e o impede de exercer sua atividade enquanto perdurar a suspensão, ficando vedada a utilização da inscrição suspensa para todos os efeitos legais”.

Portanto, a suspensão da inscrição cadastral é uma medida extrema que somente deve ser adotada pela Administração Tributária quando, além de atender os requisitos legais, se mostrar necessária, vez que encontra oposição no direito ao exercício da liberdade de atividade econômica.  Tanto assim, que a legislação estadual cuidou de exigir processo administrativo para fundamentá-la, consoante o disposto no caput do artigo 104 do RCTE.

Acerca da diligência e comedimento que deve ter o agente público no manuseio dos instrumentos de coerção de que dispõe a Administração Pública (art. 2º, parágrafo único, VI da Lei nº 13800/01), o que nos parece ser a preocupação da consulente, quando da elaboração do Parecer nº 263/07-GOT, desenvolvemos o seguinte raciocínio: "Inicialmente, convém observar que o bloqueio da substituição tributária constitui-se num mecanismo de controle auxiliar da Administração Fazendária e como tal deve ser manejado levando-se em conta o poder discricionário que possui, segundo a competência funcional, a autoridade administrativa frente às situações excepcionais que concretamente se apresentam no dia a dia, vez que os instrumentos de controle representam meios desenvolvidos com objetivos específicos, logo, a finalidade é a razão última de sua existência e, por isso, essencial sua consideração na análise dos casos concretos, de modo a evitar que o meio (instrumento) seja tomado com um fim em si mesmo."

Isso para dizer que, em última análise, a suspensão cadastral deve se dar quando restar comprovado que a atividade comercial a ser suspensa está sendo danosa à sociedade.

Pois bem, a obrigatoriedade da escrituração contábil e, especialmente, do Livro Registro Diário, em caráter geral, emana dos artigos 1.179 e 1.180 do Código Civil Brasileiro, como seguem:

Art. 1.179. O empresário e a sociedade empresária são obrigados a seguir um sistema de contabilidade, mecanizado ou não, com base na escrituração uniforme de seus livros, em correspondência com a documentação respectiva, e a levantar anualmente o balanço patrimonial e o de resultado econômico.

Art. 1.180. Além dos demais livros exigidos por lei, é indispensável o Diário, que pode ser substituído por fichas no caso de escrituração mecanizada ou eletrônica.

[...]

Por ser uma obrigação de natureza civil, seu descumprimento tem repercussão na esfera civil, especialmente, no caso de falência, recuperação judicial e de sucessão.

Quanto ao viés tributário, a União legislando sobre o imposto de renda dispensa da escrituração contábil e comercial, os contribuintes enquadrados nas hipóteses de apuração do lucro presumido ou de opção pelo regime denominado "SIMPLES" (Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte).

O certo é que, quase a totalidade dos dispensados da escrituração contábil e comercial, pela legislação do imposto de renda, jamais procedeu à escrituração dos livros diário e razão.

Por sua vez, a legislação do ICMS, ajustada entre os estados mediante a celebração de Convênios e Ajustes SINIEF, estabelece os livros fiscais com vistas ao controle e fiscalização do tributo, matéria que se encontra disciplinada nos artigos 300 a 356 do RCTE do Estado de Goiás.

Tratando dos instrumentos auxiliares da escrita fiscal, o artigo 307 do RCTE, assim disciplina:

Art. 307. Constituem instrumentos auxiliares da escrita fiscal os documentos e os livros da escrita comercial, inclusive o livro Registro de Duplicatas, o Copiador de Faturas, as notas e outros documentos fiscais, guias e demais documentos relacionados com a atividade do contribuinte, ainda que pertencentes ao arquivo de terceiros, inclusive programas e arquivos relativo a usuário de equipamento eletrônico de processamento de dados

§ 1º Após o decurso do prazo de 120 (cento e vinte) dias, contados do encerramento do exercício social, o contribuinte que possuir escrita contábil regular pode ser notificado pelo fisco a apresentá-la no prazo de 2 (dois) até 20 (vinte) dias, sob pena de, não o fazendo, ter sua escrita contábil desconsiderada.

§ 2º Para os efeitos do parágrafo anterior, é imprescindível a apresentação dos livros Diário e Razão ou ficha utilizada para resumir e totalizar, por conta ou subconta as escriturações efetuadas no livro Diário.

§ 3º O contribuinte que utiliza sistema eletrônico de processamento de dados, para registrar documento de natureza contábil, deve fornecer, quando notificado, o respectivo arquivo digital e sistema, na forma exigida pela Secretaria da Receita Federal, observado, ainda, normas estabelecidas na legislação tributária.

A atividade de fiscalização, relativamente à exigência de livros, é amparada na lei estadual nos seguintes dispositivos:

LEI Nº 11.651, DE 26 DE DEZEMBRO DE 1991.

Art. 147. Sem prejuízo de outras atribuições e competências funcionais, o Fisco Estadual poderá:

II - exigir a apresentação de mercadorias, livros, documentos, programas, arquivos magnéticos e outros objetos de interesse da fiscalização, mediante notificação;

[...]

§ 1º Caracteriza recusa ou embaraço à fiscalização qualquer ação ou omissão que retarde ou dificulte a fiscalização, bem como o não atendimento de notificação expedida pelo agente do Fisco para exigência de apresentação de mercadorias, livros, documentos, programas, arquivos magnéticos e outros objetos de interesse da fiscalização.

§ 2º Repetir-se-á quantas vezes se fizerem necessárias, no caso de descumprimento, a notificação referida no parágrafo anterior, sujeitando-se o infrator, para cada uma delas, a nova exigência da multa.

§ 3º Na hipótese dos parágrafos anteriores, o agente do Fisco solicitará, de imediato, à autoridade administrativa a quem estiver subordinado, providências junto à Procuradoria Geral do Estado ou ao Ministério Público, para que se faça a busca e apreensão judicial.

[...]

Art. 148. O movimento real tributável, realizado pelo sujeito passivo em determinado período, pode ser apurado por meio de levantamento fiscal, conforme dispuser o regulamento.

[...]

§ 3º Para efeito de arbitramento, o Fisco poderá se utilizar de métodos ou processos que o leve à maior proximidade possível da avaliação real dos fatos, cujo valor ou preço obtido presume-se correspondente a operação ou prestação tributada, especialmente na ocorrência das seguintes circunstâncias:

IV - quando o contribuinte mantiver apenas a escrituração fiscal, ainda que dispensada ou inexigível a escrituração contábil, desde que efetivamente comprovadas irregularidades na sua escrituração;

V - na falta de livros obrigatórios ou a omissão de escrituração de tais livros dentro dos prazos legais;

VI - na falta de autenticação dos livros obrigatórios ou das fichas soltas ou avulsas que os substituírem;

[...]

Também é oportuna a transcrição dos seguintes artigos do Código Tributário Nacional:

LEI Nº 5.172, DE 25 DE OUTUBRO DE 1966.

Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação.

Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal.

Art. 195. Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los.

Parágrafo único. Os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados serão conservados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram.

[...]

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.

§ 1o Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes:

I – ...

II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa

[...]

Como se observa, a exigência de apresentação de extrato bancário ou de cópia de cheque, por se tratar de instrumento auxiliar da escrita fiscal, quando se revelar de interesse da fiscalização, encontra-se amparada pelo artigo 147 do CTE combinado com o artigo 307 do RCTE.

Posto isso e considerando que os livros fiscais elencados na legislação tributária estadual, são os primordiais para o controle do ICMS (art. 306 RCTE); considerando que somente o contribuinte que possuir escrita contábil regular pode ser notificado a apresentá-la (art. 194 CTN c/c art. 307, § 1º, RCTE); considerando que as medidas a serem adotadas no caso de recusa da apresentação da escrita contábil ou de documentos bancários de interesse da fiscalização já se encontram disciplinadas na legislação tributária estadual (art. 147, § 3º, CTE e IN 966/09-GSF), conclui-se que:

1 - Somente pode ser exigida a apresentação dos livros contábeis (Diário e Razão) à empresa que estiver obrigada à escrita contábil na forma exigida pela legislação do Imposto de Renda (Receita Federal do Brasil), ou não estando obrigada pela legislação tributária, passou a adotá-la por opção própria.  Por conseguinte, ante a falta de exigência na legislação tributária, o Fisco estadual não pode exigir que o contribuinte escriture livros contábeis.

A recusa não justificada daquele contribuinte que possua livros contábeis em atender a notificação efetuada nos termos do § 1º, art. 307 do RCTE, para exibição dos livros contábeis, caracteriza embaraço à fiscalização, sujeita o contribuinte à penalidade pecuniária própria e, sendo indispensável para a realização da fiscalização, abre oportunidade para adoção da medida prevista no art. 147, § 3º do CTE e constitui elemento para instauração de processo administrativo tendente a suspender a inscrição estadual do contribuinte, nos termos do artigo 104, VII do RCTE.

2 - Consoante disposição do inciso II do artigo 147 do CTE e do caput artigo 307 do RCTE, a autoridade fiscal pode notificar o contribuinte a apresentar documentos de interesse da fiscalização, como é o caso do extrato bancário e da cópia microfilmada de cheque.

Em caso de recusa injustificada de apresentação de tais documentos, após a aplicação das penalidades cabíveis pelo não atendimento de reiteradas notificações, caracteriza-se o embaraço à fiscalização, quando indispensáveis para a fiscalização da empresa, poderá ser solicitado pela autoridade fiscal, via processo administrativo, a suspensão da inscrição estadual do contribuinte, conforme autoriza o artigo 104, VII do RCTE, sem prejuízo das medidas estabelecidas na Instrução Normativa nº 966/09-GSF, de 3 de novembro de 2009 (art. 6º LC nº 105/01).

É o parecer.

Goiânia, 13 de janeiro de 2012.

GILSON APARECIDO DE SILLOS

Assessor Tributário

Aprovado:

LIDILONE POLIZELI BENTO

Gerente de Orientação Tributária