Parecer ECONOMIA/GEOT nº 189 DE 10/08/2023

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 10 ago 2023

Consulta se tripa bovina tem direito a alíquota de ICMS de 12% e crédito outorgado do ICMS previstos para carnes e miúdos comestíveis.

I – RELATÓRIO

(...), com atividade de Frigorífico – abate de bovinos, CNAE 10.11.2- 01, neste ato representada por seu Procurador (m.j.), expõe para ao final consultar o seguinte:

- A CONSULENTE dedica-se a atividade de abate e comercialização dos produtos resultantes do abate do gado bovino.

- Sendo assim, a CONSULENTE entende que, observando os detalhes aqui já prestados, a tripa bovina deverá beneficiar-se da mesma tratativa tributária dada a carne bovina fresca, resfriada, congelada, salgada, temperada ou salmourada e miúdo comestível resultantes do abate ou da industrialização realizada em seu próprio estabelecimento.

- Diante do exposto, a CONSULENTE requer, respeitosamente, a Vs. Sa., que seja confirmado seu entendimento e indaga:

a) Está correto o entendimento da CONSULENTE que poderá utilizar o Crédito Outorgado em suas saídas internas de tripa bovina, uma vez que são miúdos comestíveis resultantes do abate do gado bovino industrializados no Estado, de acordo com o art. 11, inciso V, Anexo IX do RCTE/GO?

b) Em virtude de a tripa bovina ser considerada pelo MAPA – Ministério da Agricultura e Pecuária como produto comestível e apto ao consumo humano, conforme Certificado Sanitário Nacional para Produtos de Origem Animal, deve aplicar a alíquota do ICMS de 12% em suas saídas internas, conforme prevê o art. 20, §1º, inciso II, “a”, item 6 do RCTE/GO?

c) Caso a interpretação da CONSULENTE esteja equivocada, qual o procedimento correto a ser aplicado e sua respectiva base legal?

II – FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente, para a adequada solução da consulta, transcrevemos a seguir os dispositivos legais da legislação tributária referidos pela consulente. Eis os mesmos:

Decreto nº 4.852/97 - RCTE

Art. 20. As alíquotas do imposto são (Lei nº 11.651/91, art. 27):

(...)

§ 1º Nas seguintes situações específicas, as alíquotas do imposto são:

(...)

II - 12% (doze por cento):

a) na operação interna com os seguintes produtos:

(...)

6. ave, peixe e gado vivos, bem como carne fresca, resfriada, congelada, salgada, temperada ou salmourada, e miúdo comestível resultantes do abate desses animais;

Anexo IX do RCTE

Art. 11. Constituem créditos outorgados para efeito de compensação com o ICMS devido:

(...)

V - para o estabelecimento frigorífico ou abatedor, na saída para comercialização ou industrialização, de carne fresca, resfriada, congelada, salgada, temperada ou salmourada e miúdo comestível resultantes do abate ou da industrialização, em seu próprio estabelecimento de asinino, bovino, bufalino, equino, muar, ovino, caprino, leporídeo e ranídeo adquiridos em operação interna com a isenção de que trata o inciso CXVI do art. 6° deste Anexo ou criados pelo beneficiário do crédito outorgado ou por produtor rural a ele integrado, o equivalente à aplicação de 5% (cinco por cento) sobre o valor da respectiva base de cálculo, para o estabelecimento beneficiário dos Programas FOMENTAR ou PRODUZIR, ou 9% (nove por cento), para o estabelecimento não beneficiário dos referidos Programas, observado o seguinte (Lei nº 13.453/99, art. 1º, I, “c”, 1.1 e 1.2):

Constata-se que tanto na situação específica de alíquota de 12% (doze por cento) quanto na previsão do crédito outorgado tratados na legislação tributária supratranscrita, exige-se, para o caso em apreço, que o produto se trate de MIÚDO BOVINO.
Buscando a exata definição do que seja miúdo, escoramos na definição trazida ao contexto do ordenamento jurídico pátrio, pelo Decreto Federal nº nº 9.013/17, que regulamenta a Lei nº 1.283, de 18 de dezembro de 1950, e a Lei nº 7.889, de 23 de novembro de 1989, que dispõem sobre a inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal, em especial, seus artigos 278 e 279 a seguir transcritos. Eis a seguir:

Art. 278. Para os fins deste Decreto, miúdos são os órgãos e as partes de animais de abate julgados aptos para o consumo humano pela inspeção veterinária oficial, conforme especificado abaixo:

I - nos ruminantes: encéfalo, língua, coração, fígado, rins, rúmen, retículo, omaso, rabo e mocotó;

II - nos suídeos: língua, fígado, coração, encéfalo, estômago, rins, pés, orelhas, máscara e rabo;

III - nas aves: fígado, coração e moela sem o revestimento interno;

IV - no pescado: língua, coração, moela, fígado, ovas e bexiga natatória, respeitadas as particularidades de cada espécie;

V - nos lagomorfos: fígado, coração e rins; e

VI - nos equídeos: coração, língua, fígado, rins e estômago.

Parágrafo único. Podem ser aproveitados para consumo direto, de acordo com os hábitos regionais, tradicionais ou de países importadores, pulmões, baço, medula espinhal, glândula mamária, testículos, lábios, bochechas, cartilagens e outros a serem definidos em normas complementares, desde que não se constituam em materiais especificados de risco.

Art. 279. Para os fins deste Decreto, produtos de triparia são as vísceras abdominais utilizadas como envoltórios naturais, tais como os intestinos e a bexiga, após receberem os tratamentos tecnológicos específicos.

§ 1º Podem ainda ser utilizados como envoltórios os estômagos, o peritônio parietal, a serosa do esôfago, o epíplon e a pele de suíno depilada.

§ 2º Os intestinos utilizados como envoltórios devem ser previamente raspados e lavados, e podem ser conservados por meio de dessecação, salga ou outro processo aprovado pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal.

Depreende-se da leitura do regulamento com artigos retrotranscritos, que o art. 278 discrimina especificadamente quais são os órgãos e as partes de animais de abate, julgados aptos para o consumo humano pela inspeção veterinária oficial, que são elegidos pela legislação referida como miúdos, sendo que, para os ruminantes, os miúdos são apenas os ali tratados no inciso I, quais sejam: encéfalo, língua, coração, fígado, rins, rúmen, retículo, omaso, rabo e mocotó.

Outrossim, já o artigo 279 do citado regulamento denomina claramente como produtos de triparia as vísceras abdominais utilizadas como envoltórios naturais, tais como os intestinos e a bexiga, após receberem os tratamentos tecnológicos específicos, ou, ainda, que podem ser utilizados como envoltórios os estômagos, o peritônio parietal, a serosa do esôfago, o epíplon e a pele de suíno depilada.

Já o § 2º desse artigo, diz qual o tratamento que os intestinos utilizados como envoltórios devem previamente submeterem-se para consumo humano, tais como serem raspados e lavados, podendo ser conservados por meio de dessecação, salga ou outro processo aprovado pelo Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal.

Daí que se infere nitidamente da legislação de classificação de produtos animais (regulamento com dispositivos já transcritos) que tripa bovina, apesar de ser produto comestível, é produto de triparia, e não miúdo, que, inclusive, diga-se de passagem, são tratados em artigos diferentes da legislação federal.

Dessarte, produtos de triparia não podem ter o mesmo tratamento tributário dispensado ao miúdo bovino, visto que a legislação tributária concessiva de tratamento tributário diferenciado de forma benéfica ao sujeito passivo, deve ser interpretada literalmente, tal como disciplina o art. 111 da Lei nº 5.172/66 - CTN, abaixo transcrito:

LEI Nº 5.172, DE 25 DE OUTUBRO DE 1966 - CTN.

Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:

I - suspensão ou exclusão do crédito tributário;

II - outorga de isenção;

Extrai-se de dicionário na internet, que o vocábulo “literal” traz os seguintes significados:

- que reproduz exatamente, palavra por palavra, determinado texto ou trecho de um texto.

- conforme ao próprio e genuíno significado das palavras, por oposição ao seu sentido figurado; exato, rigoroso.

III – CONCLUSÃO

Posto isso, podemos concluir respondendo objetivamente aos questionamentos formulados pela requerente na petição de consulta, na forma seguinte:

QUESTIONAMENTO a) Está correto o entendimento da CONSULENTE que poderá utilizar o Crédito Outorgado em suas saídas internas de tripa bovina, uma vez que são miúdos comestíveis resultantes do abate do gado bovino industrializados no Estado, de acordo com o art. 11, inciso V, Anexo IX do RCTE/GO?

RESPOSTA: Não, o entendimento da consulente não está correto, porque não poderá utilizar o crédito outorgado do ICMS referido, visto que pela legislação federal tripa bovina não é miúdo, mas produtos de triparia, que são coisas distintas, não se podendo dar o mesmo tratamento tributário para tais produtos;

QUESTIONAMENTO b) Em virtude de a tripa bovina ser considerada pelo MAPA – Ministério da Agricultura e Pecuária como produto comestível e apto ao consumo humano, conforme Certificado Sanitário Nacional para Produtos de Origem Animal, deve aplicar a alíquota do ICMS de 12% em suas saídas internas, conforme prevê o art. 20, §1º, inciso II, “a”, item 6 do RCTE/GO?

RESPOSTA: Não, a consulente não deve aplicar a alíquota de ICMS de 12% (doze por cento) nas suas saídas internas para tripa bovina, visto que tal produto não está contemplado na legislação tributária referida pela mesma, na medida em que a legislação federal classifica a tripa bovina como produto de triparia, e não de miúdo.

QUESTIONAMENTO c) Caso a interpretação da CONSULENTE esteja equivocada, qual o procedimento correto a ser aplicado e sua respectiva base legal?

RESPOSTA: a consulente deverá aplicar a alíquota de 17% (dezessete por cento) para as saídas internas de tripa bovina, conforme determina o inciso I do art. 20 do Decreto nº 4.852/97 – RCTE, e não utilizar o crédito outorgado referido pelas razões já expostas neste parecer.

É o parecer.

 GOIANIA, 10 de agosto de 2023.

DAVID FERNANDES DE CARVALHO

Auditor-Fiscal da Receita Estadual