Parecer GEOT nº 1741 DE 09/11/2012
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 09 nov 2012
Aproveitamento de crédito de ICMS de ativo imobilizado.
......................................., com escritório profissional na ............................., CNPJ nº .................... e inscrição estadual nº ..................., com a atividade de geração de energia elétrica – CNAE 3511501, expõe, para depois consultar, o seguinte:
1 – instalou uma usina hidroelétrica no Rio Corrente, localizada nos municípios de Itarumã e Aporé, neste Estado, ocorrendo a construção de todo o parque gerador relacionado ao empreendimento nos anos de ... e ...;
2 – a maior parte da aquisição de bens ocorreu de forma fracionada, desde o Gerador, que representa o “coração” da usina, até as edificações, compondo, ao final, o parque gerador, classificado como “ativo imobilizado” ou “ativo permanente” pela Legislação Tributária e pelas Normas Contábeis;
3 – escriturou todas as aquisições destinadas ao ativo imobilizado no livro CIAP;
4 – encerrada a fase pré operacional, iniciará suas operações e utilizará os créditos acumulados, no valor de R$ ................., referentes às aquisições do ativo, pois, pelo Princípio da não-cumulatividade do ICMS, tais aquisições de bens integrantes do ativo permanente dão ao contribuinte o direito de apropriar os créditos, para abatimento das obrigações para com o ICMS.
Posto isso, questiona:
1 – é pertinente ao contribuinte creditar-se dos valores constantes no Livro CIAP e que são referentes às entradas de bens destinados ao ativo imobilizado, conforme determina a regra contábil, ainda que esses bens sejam incorporados a um ativo maior, na fase pré-operacional?
2 – em caso afirmativo, existe algum procedimento específico a ser utilizado no aproveitamento, haja vista o decurso de prazo verificado entre o momento da entrada do bem e a utilização dos créditos?
A questão sobre o direito da apropriação de crédito de ICMS pela geradora de energia elétrica, relativamente às suas aquisições de bens para o ativo imobilizado ou de insumos utilizados na produção da energia elétrica, foi analisada no Parecer nº 1.449/2010-GEPT, cujo teor transcreveremos a seguir:
“A presente consulta trata de questionamento quanto à tributação do ICMS nas operações de transferência de energia elétrica ocorridas entre geradoras de energia elétrica.
Regra geral, nas operações interestaduais o imposto é dividido entre a origem e o destino, ficando parte da receita do imposto para o Estado de origem da mercadoria e parte para o Estado de destino da mercadoria.
Em circunstâncias excepcionais, a Constituição Federal, ao tratar do imposto elege o princípio do destino como regra de incidência, deixando o produto da arrecadação do imposto de determinados produtos inteiramente para o Estado de destino destes, fazendo parte desta exceção a energia elétrica e o petróleo.
Sobre a matéria a Constituição Federal, assim estabelece:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
(....)
II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
§ 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
X - não incidirá:
(....)
b) sobre operações que destinem a outros Estados petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, e energia elétrica;
TÍTULO X
ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS
Art. 34. O sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda nº 1, de 1969, e pelas posteriores.
(....)
§ 9º - Até que lei complementar disponha sobre a matéria, as empresas distribuidoras de energia elétrica, na condição de contribuintes ou de substitutos tributários, serão as responsáveis, por ocasião da saída do produto de seus estabelecimentos, ainda que destinado a outra unidade da Federação, pelo pagamento do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias incidente sobre energia elétrica, desde a produção ou importação até a última operação, calculado o imposto sobre o preço então praticado na operação final e assegurado seu recolhimento ao Estado ou ao Distrito Federal, conforme o local onde deva ocorrer essa operação.
Ao estabelecer a não incidência do ICMS em operações interestaduais com petróleo e energia elétrica, o legislador constituinte elegeu o princípio do destino para cobrança de tal imposto, significa dizer que favoreceu a unidade federada para a qual o petróleo ou a energia são destinados, ou seja, o imposto só é devido por ocasião do consumo das mercadorias.
Regulamentando a matéria, a Lei Complementar nº 87/96, estabelece:
Art. 3º O imposto não incide sobre:
(....)
III - operações interestaduais relativas a energia elétrica e petróleo, inclusive lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos dele derivados, quando destinados à industrialização ou à comercialização;
(...)
Art. 6o Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que assumirá a condição de substituto tributário. (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)
(....)
Art. 9º A adoção do regime de substituição tributária em operações interestaduais dependerá de acordo específico celebrado pelos Estados interessados.
§ 1º A responsabilidade a que se refere o art. 6º poderá ser atribuída:
(....)
II - às empresas geradoras ou distribuidoras de energia elétrica, nas operações internas e interestaduais, na condição de contribuinte ou de substituto tributário, pelo pagamento do imposto, desde a produção ou importação até a última operação, sendo seu cálculo efetuado sobre o preço praticado na operação final, assegurado seu recolhimento ao Estado onde deva ocorrer essa operação.
Em linhas gerais, a Lei Complementar nº 87/96, atendendo ao comando constitucional, regulamenta a forma de efetivação do princípio do destino no que tange à tributação da energia elétrica, abrindo aos Estados a faculdade de eleger geradoras ou distribuidoras de energia elétrica como substitutas tributárias do imposto desde a produção ou importação até a última operação, sendo o cálculo do imposto efetuado sobre o preço praticado na operação final, leia-se sobre o preço praticado ao consumidor final, assegurando-se o montante do imposto ao Estado onde ocorrer o consumo da energia elétrica.
Importante ressaltar que não obstante a Constituição Federal e a Lei Complementar nº 87/96 façam menção ao termo substituto tributário, no que tange à tributação da energia elétrica no consumo final, o certo é que não existe consenso sobre a real natureza de tal forma de tributação, sendo que alguns Estados atribuem o nome de substituição tributária e outros de diferimento do imposto, e a doutrina ora diferencia tais institutos, ora trata-os como sinônimos, mas o importante, abstraindo-se de qualquer discussão doutrinária ou dogmática, é entender que tanto a CF/88, quanto a Lei Complementar nº 87/96 privilegiam a unidade federada em que a energia elétrica for consumida, homenageando o princípio do destino e desprezando qualquer tributação no que tange ao ICMS antes da operação de consumo final.
No caso do Estado de Goiás a nossa legislação regulamentou a disciplina constitucional e da Lei Complementar, da seguinte forma:
- Lei nº 11.651, de 26 de dezembro de 1991, que instituiu o Código Tributário Estadual – CTE:
Art. 37. O imposto não incide sobre:
I - operações:
.................................................................................................................
b) que destinem a outro Estado petróleo, inclusive lubrificantes, combustíveis líquidos e gasosos dele derivados e energia elétrica, quando destinados à comercialização ou à industrialização;
- Decreto nº 4.852, de 29 de dezembro de 1997 – Regulamento do Código Tributário Estadual – RCTE:
Anexo VIII
Art. 30. É substituta tributária, assumindo a responsabilidade pelo pagamento do imposto devido na operação anterior e subseqüente, desde a produção ou importação até o consumo, a empresa distribuidora de energia elétrica (Lei nº 11.651/91, art. 52).
§ 1º O imposto a que se refere o caput deste artigo deve ser pago na ocasião do fornecimento de energia elétrica e calculado sobre o preço então praticado na operação final.
§ 2º É assegurado o pagamento do imposto ao Estado de Goiás, quando nele ocorrer a operação de saída mencionada no parágrafo anterior
§ 3º A apuração e o pagamento do imposto, incidente sobre a operação descrita no caput deste artigo, devem ser feita conforme o previsto na legislação tributária.
Observa-se da legislação acima transcrita que o legislador goiano optou por utilizar o termo substituição tributária, assim como o fez o legislador na Constituição Federal e na Lei Complementar, elegendo a empresa distribuidora de energia elétrica substituta tributária em relação ao pagamento do imposto devido na operação anterior e posterior, desde a produção ou importação até o consumo, fixando como base de cálculo o preço praticado na operação final.
Entretanto, a legislação estadual prevê que o pagamento será devido para o Estado de Goiás se houver o consumo da energia (operação final) dentro do próprio Estado. Portanto, embora o legislador tenha utilizado a expressão substituição tributária, não se trata de substituição tributária na sua essência. Na verdade, aproxima-se mais do instituto do diferimento.
A legislação estadual não tratou expressamente da operação entre geradoras, entretanto, é possível concluir que, em decorrência da aplicação do princípio do destino, de matriz constitucional, só há tributação da operação de energia elétrica por ocasião do seu consumo, sendo devido o montante do imposto ao Estado onde é consumida e devendo ser aplicada como base de cálculo para cobrança do imposto o preço praticado na operação final.
Dessa forma, qualquer operação anterior à operação de consumo final, entre geradoras ou entre geradoras e distribuidoras estão amparadas pelo instituto constitucional que determina a cobrança do imposto somente na operação de consumo final, não importando para a nossa conclusão a natureza de tal instituto se substituição tributária ou diferimento.
Relacionando-se com a presente discussão, tem-se a questão do aproveitamento de crédito, relativo aos insumos utilizados na produção de energia pela geradora, quando a energia é vendida para uma distribuidora ou transferida para outra geradora, não importando em operação de consumo final.
Tendo em vista a correta exegese do princípio da não cumulatividade, no sentido de que a cada débito deve corresponder o crédito do imposto cobrado na operação anterior, com vistas a impedir a cobrança do imposto em casacata, garantindo-se a cobrança do imposto somente sobre o valor agregado em cada operação, verifica-se que não ocorrendo débito do imposto na operação de transferência da geradora de energia para outra geradora ou da geradora para distribuidora, não há que se falar em aproveitamento de crédito, relativo aos insumos utilizados na produção da referida energia elétrica, tampouco em relação à aquisição de bens para o ativo imobilizado, salvo se a geradora de energia efetuar operações internas diretas com consumidor final, caso em que ocorrerá saída com débito do imposto.
Destarte, apontamos fundamentação de sentença no mandado de segurança nº 2007.34.00.027349-7, proferido na 7ª Vara Federal do DF, nos seguintes termos:
“Entendo que a razão está com os Estados, ao não admitir o creditamento efetuado pela Eletronorte.
A sistemática do creditamento e subseqüente compensação do ICMS é uma exigência do caráter não-cumulativo e plurifásico do referido tributo, fazendo com que o contribuinte situado no meio da cadeia produtiva apenas contribua sobre o valor adicionado ao produto.
Observo, preliminarmente, que, de acordo com o art. 4º da Lei Complementar 87/1996, o contribuinte do ICMS “é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize, com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial, operações de circulação de mercadoria”.
Assim, o contribuinte do ICMS incidente sobre a venda de combustível é a Petrobrás, sendo o recolhimento efetuado por essa empresa, e não a Eletronorte. De igual modo, o contribuinte do ICMS incidente sobre a conta de energia paga pelo consumidor é a empresa de distribuição de energia e não a Eletronorte.
Resta, evidente, então, que a Eletronorte não recolhe ICMS sobre o valor por ela agregado ao produto posto em circulação e, por isso, não assume a condição de contribuinte do ICMS.
Não havendo incidência do tributo sobre o valor por ela agregado, não há porque escriturar tais créditos, pois o creditamento tem a única finalidade de evitar a cumulatividade. Estando descartada a cumulatividade, admitir-se o creditamento implicaria a concessão de favor fiscal, sem lei autorizadora.
“Portanto, à míngua de lei, não há razão jurídica para a Eletronorte manter os créditos de ICMS escriturados em razão da compra de combustível da Petrobrás.
Ressalto que a jurisprudência tanto do STF quanto do STJ é desfavorável à pretensão de aproveitamento desses créditos, conforme se colhe dos seguintes arestos:”
No mesmo sentido, cumpre destacar decisão proferida em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 325.623-8, relatora Ministra Ellen Grace, acórdão publicado em 07.12.06, na qual fixou entendimento de que o diferimento não ofende o princípio da não cumulatividade do ICMS, pelo fato de não permitir o aproveitamento de crédito em operação na qual não ocorre cobrança do ICMS, ficando o débito do imposto diferido para momento posterior.
Feitas essas considerações, conclui-se que, por força de mandamento constitucional e legal, toda a tributação do ICMS sobre operações com energia elétrica resume-se à incidência do imposto sobre a operação de consumo final, assegurado ao Estado em que for consumida a energia, o produto da arrecadação do imposto.
1. Ademais, cumpre observar que não existindo débito do imposto por ocasião da saída da energia elétrica da geradora de energia, por força de mandamento constitucional, não há que se falar em direito a aproveitamento de crédito relativo a insumos utilizados na produção da energia, tampouco em relação à aquisição de bens para o ativo imobilizado, salvo se a geradora de energia efetuar operações internas diretas com consumidor final, tendo em vista que neste caso ocorrerá saída com débito do imposto”.
Diante do exposto conclui-se que, em razão da sistemática de tributação do ICMS sobre as operações com energia elétrica, cuja incidência do imposto ocorre somente na operação para consumo final, a consulente (geradora de energia elétrica) não pode apropriar-se do crédito de ICMS, relativo às aquisições de bens adquiridos para o seu ativo imobilizado ou dos insumos utilizados na produção da energia elétrica, salvo se efetuar operações internas diretas com consumidor final, tendo em vista que neste caso ocorrerá saída com débito do imposto.
Salientamos, ainda, que a Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás, com respaldo em decisões do Poder Judiciário, e em perfeita consonância com o entendimento da administração tributária das demais unidades da Federação, e conforme entendimento manifestado no Parecer nº 2311/2000-AST, não admite o aproveitamento de crédito destacado em documento fiscal relativo à aquisição de material de construção civil para ser utilizado na edificação das instalações de qualquer empresa.
É o parecer.
Goiânia, 09 de novembro de 2012.
JULIO MARIA BARBOSA
Assessor Tributário
Aprovado:
LIDILONE POLIZELI BENTO
Gerente de Orientação Tributária