Declaração de Ineficácia de Consulta COTRI nº 1 DE 03/01/2023
Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 04 jan 2023
Processo SEI nº 00040-00034147/2022-78
ICMS. Diferencial de alíquota. EC nº 87/2015 . Operações interestaduais de venda de mercadorias a órgão da Administração Pública, consumidor final, não contribuinte do imposto, sediado no Distrito Federal. Entrega física do bem, por conta e ordem do adquirente, a outros departamentos do órgão localizados em unidade federada distinta. A conveniência da entrega não tem repercussão nos aspectos identificadores do fato gerador do tributo. O ICMS-DIFAL é devido ao Distrito Federal, a teor do § 3º do art. 20 da Lei distrital nº 1.254/1996.
I - Relatório
1. Pessoa jurídica de direito privado, estabelecida em São Paulo/SP, apresentou Consulta abrangendo o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviço de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação, regulamentado neste território pelo Decreto nº 18.955 , de 22 de dezembro de 1997 (RICMS/DF).
2. Relata o Consulente que foi o vencedor do pregão eletrônico realizado pela Diretoria Técnico-Científica da Polícia Federal, estabelecida no Distrito Federal, cujo objeto foi o fornecimento de equipamentos eletrônicos e as respectivas assistências técnicas de garantia.
3. Aduz que, a pedido do comprador, parte das mercadorias será remetida fisicamente para departamentos da Polícia Federal, no Maranhão e no Rio de Janeiro, conforme especificado no contrato, sendo tais operações acobertadas por notas fiscais de simples remessa.
4. Pondera que, no aspecto jurídico, as mercadorias serão transferidas do Consulente para a cliente e, posteriormente, remetidas da cliente para seus departamentos no Maranhão e Rio de Janeiro. Lado outro, no aspecto físico, as mercadorias serão transportadas diretamente do estabelecimento do Consulente para os departamentos do Maranhão e do Rio de Janeiro.
5. Como se trata de venda para consumidor final não contribuinte de ICMS, apresenta dúvida acerca da unidade federativa titular da diferença de alíquota do ICMS (ICMSDIFAL).
6. Diante do exposto, trouxe os questionamentos abaixo transcritos, ipsis litteris:
(1) A DIFAL incidente sobre essa operação interestadual (transferência jurídica de bens da Consulente para a Cliente, e fisicamente da Consulente para departamentos da Cliente) será devida para o Distrito Federal, ou para o estado de destinação física da mercadoria?
(2) O órgão de fiscalização do estado de destino físico da mercadoria, no caso Rio de Janeiro ou Maranhão, poderá exigir o pagamento dessa DIFAL?
II - Análise
7. De início, registra-se que a análise da matéria consultada está plenamente vinculada à legislação tributária.
8. Em análise de recebimento da Consulta, a Gerência de Programação Fiscal - GEPRO, subordinada ao Centro de Gestão de Malha e Programação Fiscal - CEMPRO, atestou que o Consulente não se encontrava sob ação fiscal (Documento SEI nº 96554825). Todavia, tendo-se em vista o início da fase de análise do mérito da matéria arguida, cabe à Gerência de Esclarecimento de Normas (GEESC) a análise da (in) admissibilidade da Consulta Tributária, mormente em atenção ao disposto no inciso IV do art. 56 da Lei ordinária distrital nº 4.567/2011, cuja análise não cabe àquele órgão.
9. A matéria envolve pedido de posicionamento fiscal da Gerência de Esclarecimento de Normas, desta subsecretaria, quanto ao ente federativo competente para a cobrança do DIFAL do ICMS nas operações interestaduais para consumidor final em que a mercadoria é recebida por terceiros localizados em unidade federada distinta.
10. As operações em comento têm como adquirente órgão da Administração Pública Direta, localizado no Distrito Federal, que, por sua vez, solicitou a entrega de mercadorias diretamente a outros órgãos, situados em outros Estados, conforme autorizado pelo CONFAZ no Ajuste SINIEF nº 13/2013 com as alterações promovidas pelo Ajuste SINIEF nº 8/2016 .
11. O DIFAL do ICMS foi previsto pela Emenda Constitucional (EC) nº 87, de 16 de abril de 2015, que reformulou o art. 155 da Constituição Federal , in verbis:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
(.....)
§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:
(.....)
VII - nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual; (grifo nosso)
12. No Distrito Federal, a cobrança do ICMS-DIFAL tem fundamento na Lei distrital nº 5.546, de 05 de outubro de 2005, que alterou o art. 20 da Lei 1.254/1996 , e no Decreto nº 37.122 , de 16 de fevereiro de 2016, que alterou o art. 48 do Decreto nº 18.955/1997 .
13. Note-se que a norma constitucional adota o critério espacial para definir a quem pertence o diferencial de alíquota do ICMS, fixando que é devido ao Estado de localização do destinatário.
14. A dúvida do Consulente surge quanto à definição do Estado de localização do destinatário, se seria aquele no qual está localizado o estabelecimento do contratante (Diretoria Técnico-Científica da Polícia Federal localizada no Distrito Federal) ou aquele para o qual as mercadorias serão enviadas fisicamente (departamentos da Polícia Federal no Maranhão e no Rio de Janeiro).
15. O critério material da regra matriz de incidência do ICMS é o ato de circular mercadoria, na inteligência do inciso II do art. 155 da Constituição Federal. A circulação, necessariamente, deve envolver operação de conteúdo jurídico-econômico, consoante o entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal de que a hipótese de incidência do imposto é a circulação jurídica dos bens postos no comércio, com alteração de sua titularidade (AR 2.104-AgR, ReI. Min. Rosa Weber - RE, ReI. para o acórdão Min. Carmen Lúcia).
16. Dado que só há fato gerador de ICMS quando há circulação jurídica do bem, para aferir o aspecto espacial do imposto, extrai-se que, quando a norma constitucional se refere ao destinatário do bem, trata-se do destinatário jurídico.
17. No presente caso, o destinatário jurídico afigura-se como o órgão público que firmou o contrato com a empresa que é quem é responsável jurídica e economicamente pela operação. O fato de ter sido estipulada, por conveniência de logística, a entrega das mercadorias diretamente a outras unidades federadas não afeta a relação jurídica existente entre o remetente vendedor e o adquirente, caracterizando-se como mera circulação física de mercadorias, sem relevância jurídica para fins de incidência do ICMS.
18. Importante observar que o § 3º do art. 20 da Lei nº 1.254/1996 , com redação dada pela lei nº 5.546 , de 05.10.2015, literalmente preceitua que o ICMS-DIFAL será devido ao Distrito Federal, ainda que a mercadoria adquirida por destinatário domiciliado no Distrito Federal seja entregue em outra unidade federada, in verbis:
Art. 20. É devido ao Distrito Federal o imposto correspondente à diferença entre a sua alíquota interna e a interestadual, em operações e prestações interestaduais com bens ou serviços cujo adquirente ou tomador seja consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado no Distrito Federal.
§ 3º O imposto de que trata o caput é também integralmente devido ao Distrito Federal no caso de o bem adquirido ou de o serviço tomado por destinatário não contribuinte do imposto, domiciliado no Distrito Federal, ser entregue ou prestado em outra unidade federada. (grifo nosso)
19. Em sentido convergente já se manifestou a Procuradoria Geral do Distrito Federal - PGDF, órgão competente para prestar orientação jurídico-normativa para Administração Direta e Indireta do Distrito Federal, segundo o inciso XVII do art. 4º da Lei Complementar nº 395/2001. No Parecer nº 1.048/2017 - PRCON/PGDF, solicitado por este órgão consultivo na ocasião da Solução de Consulta nº 11 de 19.12.2018, constou o trecho abaixo reproduzido:
A premissa do destinatário jurídico está compreendida na extensão do termo circulação de mercadorias, outorgando, portanto, ao ente federado onde se situa o destinatário jurídico do bem objeto da operação a prerrogativa de exigir o ICMS devido. Indo mais além, a Constituição ao fixar a expressão Estado de localização do destinatário referiu-se, segundo as lições do Supremo, a destinatário jurídico e não onde a mercadoria fisicamente foi retirada ou levada.
20. Entendimento diverso, isto é, de que o ICMS-DIFAL é devido ao Estado para onde o bem é encaminhado, a pedido do comprador, transmuda a natureza jurídica do tributo, uma vez que confere relevância jurídica à movimentação física do bem, fazendo com que a noção de circulação ganhe uma conotação inteiramente diversa daquela prevista na Constituição Federal.
21. Salienta-se que, em casos análogos, esta Subsecretaria já se pronunciou sobre o tema. Destacam-se as respostas contidas na Declaração de Ineficácia nº 19/2018, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) nº 121, de 27 de junho de 2018, na Declaração de Ineficácia de Consulta nº 4/2017, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) nº 36, de 20 de fevereiro de 2016, e na Declaração de Ineficácia nº 12/2016, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) nº 124, de 30 de junho de 2016, das quais recomenda-se leitura do inteiro teor.
22. Por oportuno, convém assinalar que o Decreto nº 37.887 , de 23 de dezembro de 2016, dispõe sobre a denúncia do Ajuste SINIEF nº 8/2016 que deu nova redação aos caputs dos incisos I e II da cláusula segunda do Ajuste SINIEF nº 13/2013.
23. Ainda, registra-se que, embora a LC nº 190/2022 tenha trazido alterações concernentes ao aspecto espacial do ICMS-DIFAL, desde a sua edição até o momento atual, as mencionadas normas locais não foram objeto de modificação por novo ato legislativo ou por novo decreto executivo distritais, pelo que se consigna que continuam vigentes. Dessa forma, a legislação distrital mantém-se como referência normativa para esse órgão consultivo, como esposado na Solução de Consulta nº 12/2022, publicada no Diário Oficial do Distrito Federal (DODF) nº 120, de 29 de junho de 2022.
24. Finalmente, cabe apontar que está em curso, pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal - STF, a Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI nº 7158, proposta pelo Distrito Federal, em que são discutidas as alterações promovidas pela LC nº 190/2022 .
25. Pelo exposto, conclui-se que o fato de determinada pessoa jurídica, localizada no Distrito Federal, adquirir bens sem transitar por seu domicílio legal - serão entregues, por sua conta e ordem, diretamente aos seus órgãos descentralizados ou a terceiros, localizados em outras unidades federadas - não tem o condão de deslocar a competência para exigir o ICMS-DIFAL da unidade federada do adquirente, responsável jurídica e economicamente pela operação, para outra qualquer.
III - Conclusão
26. Em atenção às indagações apresentadas pelo Consulente, informa-se que:
(1) Nas operações praticadas pelo Consulente o ICMS-DIFAL é devido ao Distrito Federal, local de domicílio do adquirente das mercadorias.
(2) Prejudicada. A análise da matéria consultada está adstrita à legislação tributária do Distrito Federal que prevê a competência do Distrito Federal para exigir o ICMS-DIFAL na situação narrada. Não cabe a este órgão consultivo se manifestar sobre os procedimentos fiscais adotados em outras unidades federativas.
27. A presente Consulta é ineficaz, nos termos do disposto nas alíneas "a" e "b" do inciso I do art. 77 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011, observando-se o disposto nos §§ 2º e 4º do art. 77, bem como no parágrafo único do art. 82, do mesmo diploma legal.
À consideração superior;
Brasília/DF, 03 de janeiro de 2023
LUÍSA MATTA MACHADO FERNANDES SOUZA
Auditora Fiscal da Receita do DF
Matr. 280.401-8
De acordo.
Encaminhamos à análise desta Coordenação o Parecer supra.
Brasília/DF, 03 de janeiro de 2023
ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO
Gerência de Esclarecimento de Normas
Gerente
Aprovo o Parecer supra e assim decido, declarando a ineficácia de consulta, nos termos do que dispõe a alínea "c" do inciso VI do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 129, de 30 de junho de 2022 (Diário Oficial do Distrito Federal de 5 de julho de 2022, página 4).
A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.
Saliente-se que, independentemente de comunicação formal ao Consulente e aos demais sujeitos passivos, as considerações, os entendimentos e as respostas definitivas ofertadas ao presente caso poderão ser modificados a qualquer tempo, em decorrência de alteração na legislação superveniente.
Esclareço que o Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o art. 78, II, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.
Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.
Brasília/DF, 03 de janeiro de 2023
DAVLINE BRAVIN SILVA
Coordenação de Tributação
Coordenadora