Parecer CJ/MPS nº 3.391 de 09/12/2004

Norma Federal - Publicado no DO em 20 dez 2004

Dispõe sobre a contribuição para a seguridade social em contratos celebrados com fundamento nos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90.

REFERÊNCIA: Comando nº 15553890

INTERESSADO: Procuradoria Federal Especializada - INSS

ASSUNTO: Conflito entre a Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG e o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Contribuição Previdenciária.

Previdenciário. Contribuição para a seguridade social. Contratos celebrados com fundamento nos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90. Contratos de locação de serviços. Revogação pela Lei nº 8.745/93. Manutenção dos efeitos dos contratos anteriores pelo período de vigência pactuado. Obediência ao princípio da pacta sunt servanda. Impossibilidade de prorrogação dos contratos após o advento da Lei nº 8.745/93.

1. Os contratos de locação de serviços fundados no que preceituavam os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90, e que estavam em vigor quando foi editada a Lei nº 8.745/93, continuaram produzindo efeitos na forma pactuada pelas partes, sem incidência de contribuição para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

2. A prorrogação dos contratos expirados já na vigência da Lei nº 8.745/93 era incabível. Incide contribuição previdenciária sobre o período prorrogado.

1. Trata-se de pedido de solução de controvérsia formulado pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG à Advocacia-Geral da União - AGU, com vistas a anular a NFLD nº 35.072.579-9 lavrada pela fiscalização do Instituto Nacional do Seguro Social em Belo Horizonte/MG.

2. O Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - MPOG, por meio do PARECER/MP/CONJUR/IC/nº 0519 - 2.9/2002, impugnou o lançamento fiscal efetivado pelo INSS, o qual havia sido confirmado, em sede recursal, pelo Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS.

3. O Excelentíssimo Sr. Advogado-Geral da União, aprovando a NOTA N.AGU/GV 07/2004, determinou a constituição de câmara especial de arbitramento para, após deliberação conjunta, oferecer solução para a controvérsia.

4. O processo foi, então, distribuído ao Sr. Consultor da União Marcelo de Siqueira Freitas, que elaborou a NOTA N.AGU/MS 01/2004 fixando o trabalho da câmara especial de arbitramento em dois pontos controvertidos a saber:

a) a não aceitação pela fiscalização do INSS da caracterização como autônomos de alguns dos contratados pela UFMG, em relação aos quais se considerou haver relação de emprego;

b) a definição acerca da integração das parcelas recebidas a título de auxílio-alimentação e auxílio pré-escolar (creche) ao salário de contribuição dos trabalhadores contratados com lastro na Lei nº 8.745/93.

5. O Sr. Consultor-Geral da União concordou com os termos da Nota AGU/MS-01/2004, mas quanto à exigência de contribuição previdenciária sobre as parcelas de "auxílio-creche" e auxílio-alimentação" do servidor público temporário entendeu por bem dirimir logo a controvérsia, por ser questão de direito, com base no inciso X do art. 4º da Lei Complementar nº 73/93, no sentido da não incidência de contribuição previdenciária sobre essas prestações pagas pela Administração Pública ao servidor contratado por prazo determinado.

6. Ao final do seu despacho, o ilustre Consultor-Geral da União sugeriu:

a) ouvir a Consultoria do Ministério da Previdência a respeito da expedição de enunciado da Súmula Administrativa que ante o entendimento pela não incidência da contribuição previdenciária do servidor temporário "auxílio-creche" e "alimentação";

b) constituir câmara ad hoc para dirimir a real natureza entre a UFMG e os "autônomos", sob a coordenação do Sr. Consultor da União que a subscreve e os integrantes a serem indicados pelos órgão interessados.

7. No dia 5 de outubro de 2004, foi realizada a 1ª reunião da câmara especial de arbitramento, que contou com a participação dos representantes do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, do Ministério da Previdência Social e da Universidade Federal de Minas Gerais, e teve como coordenador o Consultor da União já referido.

8. Conforme relata o coordenador da câmara, na ATA AGU/MS S/N de 05.10.2004, da reunião foram extraídas duas controvérsias jurídicas a serem examinadas pelos representantes dos órgãos e entidade envolvidos, quais sejam:

- Os contratos de locação de serviço fundados no que preceituavam os arts. 232 e 233, IV da Lei nº 8.112/90, e que estavam em vigor quando foi editada a Lei nº 8.745/93, poderiam continuar produzindo efeitos, a despeito daqueles dispositivos terem sido revogados por esta Lei?

- Se positiva a resposta à questão anterior, esses contratos, uma vez expirados já na vigência da Lei nº 8.745/93, poderiam ser prorrogados, desde que respeitado o limite máximo de duração de 4 anos?

9. Também restou consignado na supracitada ata que o exame dos lançamentos fiscais em relação aos plantonistas da UFMG seria realizado em um segundo momento, pois os documentos indispensáveis a tal exame ainda não haviam sido disponibilizados pelo INSS. Contudo, como foram disponibilizadas, logo em seguida, cópias do processo administrativo fiscal a todos os interessados, a matéria já pode ser objeto de análise e apresentação de solução por parte dos membros da câmara especial de arbitramento.

10. Quanto à exigência de contribuição previdenciária sobre as parcelas de "auxílio-creche" e "auxílio-alimentação" do servidor temporário, o Ministério da Previdência Social já se manifestou por meio do Parecer CJ/MPS nº 3345/2004, aprovado pelo Sr. Ministro da Pasta, motivo pelo qual a matéria não será abordada na presente manifestação.

11. É o relatório.

12. Antes de adentrar o exame da controvérsia, cumpre esclarecer que, a partir do advento da Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, os contratados pela Administração Pública Federal por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público são segurados obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

13. A Lei nº 8.745, de 9 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, dispõe em seu art. 8º que:

Art. 8º Ao pessoal contratado nos termos desta Lei aplica-se o disposto na Lei nº 8.647, de 13 de abril de 1993.

14. A Lei nº 8.647, de 13 de abril de 1993, que dispõe sobre a vinculação do servidor público civil, ocupante de cargo em comissão sem vínculo efetivo com a Administração Pública Federal, ao Regime Geral de Previdência Social, traz os seguintes dispositivos:

Art. 1º O servidor público civil ocupante de cargo em comissão, sem vínculo efetivo com a União, Autarquias, inclusive em regime especial, e Fundações Públicas Federais, vincula-se obrigatoriamente ao Regime Geral de Previdência Social de que trata a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991.

Art. 3º O art. 12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

I - como empregado:

a) ..............................................................................

g) o servidor público ocupante de cargo em comissão, sem vínculo efetivo com a União, Autarquias, inclusive em regime especial, e Fundações Públicas Federais."

15. Observa-se que a legislação federal concedeu, em termos previdenciários, o mesmo tratamento ao servidor ocupante de cargo em comissão e ao servidor contratado por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do inciso IX do art. 37 da Constituição Federal.

16. Tanto o temporário quanto o ocupante de cargo em comissão são considerados empregados para os fins da Lei nº 8.212/91. Portanto, não resta dúvida que todos aqueles que foram os contratados pela Administração Pública com fundamento na Lei nº 8.745/93, desde a sua publicação, são segurados obrigatórios do Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

17. Definida a questão acima, impõe-se analisar se os contratos de locação de serviço fundados no que preceituavam os arts. 232 e 233, IV, da Lei nº 8.112/90, e que estavam em vigor quando foi editada a Lei nº 8.745/93, poderiam continuar produzindo efeitos, a despeito daqueles dispositivos terem sido revogados por esta Lei.

18. Ainda examinando o disposto no art. 8º da Lei nº 8.745/93, observa-se que a norma impõe a vinculação ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS somente aos que foram contratados pela Administração Pública com fundamento nesta mesma lei, sem fazer nenhuma referência aos contratados, anteriormente, com base nos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90.

19. Tanto os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90 quanto a Lei nº 8.745/93 foram editadas com o objetivo de disciplinar a forma de contratação prevista no inciso IX do art. 37 da Constituição Federal de 1988. Como a lei mais recente regulou toda a matéria, os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90 tinham que ser revogados, e o foram, expressamente, por meio do art. 18 da Lei nº 8.745/93.

20. Contudo, a revogação dos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90 não conduz à conclusão de que os dispositivos da Lei nº 8.745/93 devam ser aplicados aos contratos celebrados na forma da legislação revogada, nem tampouco determina a anulação dos contratos que estavam em vigor.

21. A questão sob exame versa acerca de contratação por tempo determinado para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, em período anterior ao advento da Lei nº 8.745/93. Trata-se, na espécie, de contrato de locação de serviços firmado pela Administração Pública com particulares com base nos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90. Não se trata, portanto, de uma relação estatutária, na qual a admissão do servidor e toda a sua disciplina jurídica funcional decorre diretamente de um estatuto legal, mas sim de uma relação contratual, na qual as condições são fixadas no instrumento de contratação, a partir de diretrizes fixadas pela legislação.

22. Nas relações estatutárias a alteração legislativa - alteração do estatuto - tem incidência imediata e plena. Ao se modificar o estatuto, modificam-se, de imediato, as condições das relações já existentes, salvo previsão expressa da própria lei em sentido contrário.

23. Por sua vez, nas relações contratuais impera o princípio da pacta sunt servanda, pelo qual o que foi avençado pelas partes deve ser cumprido, salvo exceções previstas expressamente no ordenamento jurídico. A alteração legislativa, em regra, não tem incidência sobre os efeitos futuros dos contratos já celebrados e vigentes.

24. Como a Lei nº 8.745/93 não traz nenhuma disposição acerca dos contratos existentes antes de sua publicação, devem prevalecer as condições firmadas entre a Administração Pública e os contratados para atender necessidade temporária de excepcional interesse público, com base nos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/95, em obediência ao princípio da pacta sunt servanda.

25. No mesmo sentido decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 386.227/RS (2001/0160939-2), relator Ministro Felix Fischer, conforme se pode constatar do seu acórdão, abaixo transcrito, verbis:

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ACÓRDÃO RECORRIDO. OMISSÃO E NULIDADE. INEXISTÊNCIA. CONTRATO TEMPORÁRIO. REDAÇÃO ORIGINAL. LEI Nº 8.112/90. ADICIONAIS DE FÉRIAS E TEMPO DE SERVIÇO. GRATIFICAÇÃO NATALINA. DIREITO. INEXISTÊNCIA. LEI Nº 8.745/93. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

I - O acórdão recorrido expressamente apreciou as teses suscitadas pelas recorrentes, inclusive no que diz respeito à comprovação documental do pagamento realizado com atraso.

II - Ainda que se lance mão dos princípios de interpretação das normas jurídicas inscritos no art. 4º da LICC e no art. 126 do CPC, invocados no especial, e atribua-se interpretação amplíssima ao art. 235 da Lei nº 8.112/90, não é possível concluir que o legislador, ao determinar que nas contratações temporárias seriam "observados os padrões de vencimentos dos planos de carreira do órgão ou entidade contratante", estivesse deferindo o direito à percepção dos adicionais por tempo de serviço e de férias e da gratificação natalina.

III - O art. 11 da Lei nº 8.745/93 estabelece que suas disposições são aplicáveis ao pessoal do contrato nos termos mesmo diploma, não determinando sua retroação àqueles admitidos anteriormente, ou seja, quando vigoravam os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90.

IV - Irrelevante, in casu, que o contrato de locação de serviços tenha se extinguido após a novel legislação, que seria mais benéfica para as contratadas, uma vez que, em face da sua ausência de previsão legal de incidência da nova lei nos contratos vigentes, prevalece o que fora avençado entre as partes, em obediência ao princípio da pacta sunt servanda.

Recurso não-conhecido.

26. Portanto, a primeira questão deve ser respondida positivamente, no sentido de que os contratos de locação de serviço fundados no que preceituavam os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90, e que estavam em vigor quando foi editada a Lei nº 8.745/93, continuaram produzindo efeitos na forma pactuada pelas partes, sem incidência de contribuição para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

27. Como foi positiva a resposta à primeira questão, cumpre analisar se esses contratos, uma vez expirados já na vigência da Lei nº 8.745/93, poderiam ser prorrogados, desde que respeitado o limite máximo de duração de 4 anos, previsto no inciso III do § 1º do art. 233 da Lei nº 8.112/90.

28. Seguindo a linha de raciocínio já desenvolvida, a resposta ao presente questionamento passa pela análise dos contratos celebrados entre a UFMG e os contratados na forma dos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90.

29. As cópias destes contratos, disponibilizadas pela própria UFMG, revelam que não há nenhuma previsão contratual de prorrogação. Confira a redação da cláusula sétima de uma das cópias fornecidas pela UFMG (todas têm teor semelhante), que trata do prazo de vigência do contrato, verbis:

CLÁUSULA SÉTIMA - O prazo de vigência deste Contrato é de 01.05.1992 a 31.08.1992, quando será considerado rescindido de pleno direito, sem qualquer ônus para a LOCATÁRIA.

30. Independente do prazo máximo fixado no inciso III do § 1º do art. 233 da Lei nº 8.112/90, não era cabível a prorrogação dos contratos expirados já na vigência da Lei nº 8.745/93. Nem se pode considerar a situação como prorrogação de contrato, na medida que se trata, na verdade, de novo contrato firmado pela UFMG, sem respaldo legal. Assim, incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos pela UFMG em decorrência da prorrogação dos contratos efetuada após a entrada em vigor da Lei nº 8.745/93.

31. Cumpre destacar, ainda, que a UFMG não poderia promover a prorrogação destes contratos mesmo que houvesse previsão contratual nesse sentido.

32. A prorrogação de contrato, no caso, consubstanciaria ato discricionário da Administração Pública, posto que não se cogita de prorrogação obrigatória ou vinculada. A previsão contratual possibilitando a prorrogação da vigência do contrato por certo representaria, acaso existente, uma faculdade para a UFMG e para o próprio contratado. Nessa hipótese a revogação dos arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90 constituiria obstáculo intransponível à atuação da UFMG, que submetida ao princípio da legalidade restrita, como toda a Administração Pública, não teria autorização legal para promover a prorrogação desses contratos.

33. A última questão a ser enfrentada refere-se aos lançamentos fiscais feitos em relação aos médicos plantonistas.

34. A UFMG alega que os médicos plantonistas foram contratados por intermédio da Cooperativa de Trabalho dos Médicos do Hospital das Clínicas da UFMG (HCCOOP), sem vínculo direto com a universidade.

35. Não procede a alegação da UFMG. A fiscalização do INSS esclarece às fls. 807 do processo fiscal que as contribuições apuradas em relação aos médicos plantonistas abrangem o período de agosto de 1991 a agosto de 1993, enquanto a Cooperativa de Trabalho dos Médicos do Hospital das Clínicas da UFMG - HCCOOP só foi constituída em 16 de junho de 1993. Informa, ainda, que a prestação de serviços médicos dos plantonistas por meio da cooperativa somente se iniciou a partir da competência maio/95, após a assinatura de contrato entre a FUNDEP e a cooperativa. Portanto, a notificação fiscal não deve sofrer nenhuma alteração quanto aos valores referentes aos médicos plantonistas.

36. Ante o exposto, conclui-se que:

36.1 Os contratos de locação de serviços fundados no que preceituavam os arts. 232 a 235 da Lei nº 8.112/90, e que estavam em vigor quando foi editada a Lei nº 8.745/93, continuaram produzindo efeitos na forma pactuada pelas partes, sem incidência de contribuição para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS.

36.2 A prorrogação dos contratos expirados já na vigência da Lei nº 8.745/93 era incabível. Incide contribuição previdenciária sobre o período prorrogado.

36.3 A notificação fiscal (NFLD nº 35.072.579-9) não deve sofrer nenhuma alteração quanto aos valores referentes aos médicos plantonistas.

À consideração superior.

Brasília, 2 de dezembro de 2004.

DANIEL DEMONTE MOREIRA

Advogado da União

Coordenador da 2ª Coord. CJ/MPS

De acordo.

À consideração superior.

Brasília, 8 de dezembro de 2004.

IDERVÂNIO DA SILVA COSTA

Advogado da União

Coordenador-Geral de Direito Previdenciário

Substituto

Aprovo.

À consideração do Senhor Ministro.

Brasília, 8 de dezembro de 2004.

WILSON DE CASTRO JUNIOR

Consultor Jurídico

Substituto

DESPACHO DO MINISTRO

Em 9 de dezembro de 2004

Aprovo. Publique-se.

AMIR LANDO