Solução de Consulta COTRI nº 9 DE 05/04/2022
Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 06 abr 2022
Processo 00040-00003735/2022-60.
ISS. Imunidade Tributária ?cultural? e serviços congêneres aos previstos no anexo da lei. Interpretação teleológica e sistemática.
I - Relatório
1. Trata-se de consulta formulada por pessoa jurídica de direito privado envolvendo a legislação do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS.
2. A Solução de Consulta requer esclarecimentos sobre os pontos abaixo:
a) Os livros e apostilas digitais que constituem o "Conteúdo Educativo Online" estão albergados pela IMUNIDADE ESTABELECIDA no art. 150, VI, "d" da CF/1988 ?
b) A atividade de "Coordenação e Tutoria", constituída por orientações dos professores é tributada pelo ISS ?
3. Então, os autos seguiram aos setores competentes desta SEEC para que houvesse o preparo/saneamento processual, nos termos do art. 74 c/c art. 75, ambos do Decreto nº 33.269/2011 .
4. Em ato contínuo, nas ids 80462506 e 80512190, os setores competentes manifestaram-se pela regularidade formal dos requisitos legais da consulta.
5. Nesses termos, os autos seguiram a esta GEESC para análise.
II - Análise - Fundamentação
6. Ab initio, registre-se o fato de a Autoridade Fiscal promover a análise da matéria consultada plenamente vinculada à legislação tributária.
7. Em uma análise perfunctória da imunidade albergada pelo art. 150, VI, d, da Constituição Federal (CF/1988) c/c art. 5º do Regulamento do ICMS/DF, tem-se que a chamada "imunidade cultural" apresenta os seguintes contornos, dados pela literalidade: livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
8. Ainda, ao contrário das isenções tributárias, as quais necessitam de uma interpretação literal (art. 111 do CTN) e restritiva, as imunidades genéricas (Art. 150, VI), sobretudo elas, por apresentarem a característica de imunizarem situações sob a proteção de princípios fundamentais, caros à Constituição, devem ser interpretadas de acordo com sua teleologia, sua intenção, caso em que sempre se afigurará de bom alvitre estender o alcance para além do seu enunciado legal, quando este não for suficiente para dar a valia jurídica própria.
9. Neste sentido, por exemplo, ALVES, Francisco de Assis. "Imunidade Tributária", in: MARTINS, Ives Granda da Silva (Org.). Imunidades Tributárias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p 274, para quem: a imunidade: "deve ser sempre interpretada extensivamente. O que significa dizer, deve-se extrair da norma imunizadora tudo o que na mesma se contém. Em suma, deve-se atender a intenção do legislador constituinte em toda sua plenitude."
10. Também, na esteira exposta acima, temos as lúcidas palavras de Akselrad (AKSELRAD, Moisés. "Limitações Constitucionais Ao Poder de Tributar: delineamentos dos princípios estabelecidos no artigo 150, inciso VI, da Constituição Federal", in: MARTINS, Ives Granda da Silva (Org.). Imunidades Tributárias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p), segundo quem: "na interpretação da norma imunizante deve-se dar prevalência à efetiva realização do princípio constitucional que justifica ou inspira a imunidade."
11. Na mesma linha de raciocínio, o Egrégio Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do RE 595676/RJ (Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 08.03.2017 (repercussão geral)(Info 856)) fixou a seguinte tese: A imunidade tributária constante do art. 150, VI, "d", da Constituição Federal (CF), aplica-se ao livro eletrônico ("e-book"), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.
12. Dessa forma, seria descabido, portanto, interpretar-se as disposições de imunidades tributárias (genéricas) mediante critérios gramaticais ou restritivos de sua eficácia normativa.
13. Isto porque tais preceitos imunizantes são cometidos à missão de proteger postulados constitucionais outros de elevada magnitude, dentro do contexto jurídico-político da nossa República. De modo que, reduzir-lhes o alcance ou atrofiar a intenção para a qual foi instituída é, de forma oblíqua, violar ou revogar o princípio/valor constitucional que dentro dela há. É, assim, negar vigência a um princípio ou direito fundamental, o que é explicitamente vedado na presente ordem constitucional.
14. No que tange à incidência do ISS às prestações de "Coordenação e Tutoria", insta destacar que tal serviço não consta expressamente na lista anexa do Decreto nº 25.508/2005 .
15. Entretanto, o item 8 da lista possui as seguintes naturezas de serviços:
8 - Serviços de educação, ensino, orientação pedagógica e educacional, instrução, treinamento e avaliação pessoal de qualquer grau ou natureza.
8.01 - Ensino regular pré-escolar, fundamental, médio e superior.
8.02 - Instrução, treinamento, orientação pedagógica e educacional, avaliação de conhecimentos de qualquer natureza.
16. Segundo a doutrina e a jurisprudência, os serviços hábeis à consunção da hipótese de incidência do ISS são os expressamente previstos no anexo da lei de instituição do imposto, admitindo-se, entretanto, uma interpretação mais ampla.
17. Nesse diapasão, o STF fixou tese, em sede de repercussão geral na RE 784.439: "É taxativa a lista de serviços sujeitos ao ISS a que se refere o artigo 156, III, da Constituição Federal , admitindo-se, contudo, a incidência do tributo sobre as atividades inerentes aos serviços elencados em lei em razão da interpretação extensiva".
18. Ainda, neste mesmo sentido, segundo Paulsen (Leandro, Paulsen, Curso de Direito Tributário, 10ª Edição, 2019, página 403): A lista de serviços da Lei Complementar nº 116/2003 é taxativa, de maneira que só podem ser tributados os serviços nela arrolados. Admite-se, todavia, uma leitura extensiva de cada item, a fim de enquadrar serviços correlatos àqueles previstos expressamente.
III - Conclusão
19. Pelo exposto, a presente consulta apresenta dúvida objetiva acerca da interpretação de dispositivos expressamente previstos na legislação distrital.
20. De modo que, à luz das interpretações teleológicas e sistemáticas apresentadas alhures:
a) A imunidade tributária do art. 150, VI, d, da Constituição Federal (CF/1988) c/c art. 5º do Regulamento do ICMS/DF abarca o primeiro questionamento, qual seja:
a) Os livros e apostilas digitais que constituem o "Conteúdo Educativo Online" estão albergados pela IMUNIDADE ESTABELECIDA no art. 150, VI, "d" da CF/1988
b) Há incidência do ISS aos serviços: "Coordenação e Tutoria", como atividades congêneres às elencadas no item 8 da lista anexa à lei do ISS.
21. Nos termos do disposto no art. 80 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011 (Regulamento do Processo Administrativo Fiscal - RPAF), a presente Consulta é eficaz, aplicando-se a esta o disposto no inciso III do art. 81 e caput do art. 82, ambos do PAF.
À consideração de V.S.ª.
Brasília/DF, 05 de abril de 2022
RODRIGO AUGUSTO BATALHA ALVES
Auditor-Fiscal da Receita do Distrito Federal
Ao Coordenador de Tributação da COTRI.
De acordo.
Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer supra.
Brasília/DF, 05 de abril de 2022
ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO
Gerente
Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso I do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 1, de 10 de janeiro de 2018 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 8, de 11 de janeiro de 2018, pp. 5 e 6).
A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.
Saliente-se que, independentemente de comunicação formal ao Consulente e aos demais sujeitos passivos, as considerações, os entendimentos e as respostas definitivas ofertadas ao presente caso poderão ser modificados a qualquer tempo, em decorrência de alteração na legislação superveniente.
Esclareço que o Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o art. 78, II, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.
Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.
Brasília/DF, 05 de abril de 2022
FLORISBERTO FERNANDES DA SILVA
Coordenador