Solução de Consulta COTRI nº 13 DE 20/07/2022
Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 21 jul 2022
PROCESSO Nº 00040-00014893/2022-45
I - Relatório
1. Trata-se de consulta formulada por Pessoa jurídica de direito privado, envolvendo a legislação do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS.
2. Na id 84696874, a consulente retrata uma situação fática de saldo credor acumulado devido às suas atividades.
3. Fundamenta que a legislação do Distrito Federal possibilita a atualização monetária dos créditos tributários devidos aos contribuintes.
4. Assim, procede ao questionamento exposto "ipsis litteris":
"A CONSULENTE possui saldo credor decorrente das atividades próprias do seu negócio. O objeto desta consulta terá por fim identificar a possibilidade e a norma atinente a realização da atualização monetária do saldo credor decorrentes das atividades próprias da CONSULENTE. De acordo com o parágrafo único do art, 39 da Lei 1.254 , de 08 de novembro de 1996, o saldo credor verificado a favor do contribuinte pode ser monetariamente atualizado. Confira, in verbis: "Lei 1254 de 08/11/1996 (.....) Art. 39. O saldo do imposto verificado a favor do contribuinte, apurado com base em qualquer dos regimes estabelecidos no art. 36 ou no inciso I do art. 37, transfere-se para o período ou períodos subsequentes, segundo o respectivo regime de apuração. Parágrafo único. O saldo credor de que trata este artigo e a crédito a soe estomado na forma do art. 35 serão também atualizados monetariamente, pelos mesmos índices utilizados, pelo Distrito Federal, na cobrança de seus tributos.[.....]"
5. Em ato contínuo, os autos seguiram aos demais setores competentes desta SEEC para as providências formais cabíveis.
6. Nesses termos, os autos foram remetidos a esta GEESC para apreciação e manifestação.
II - ANÁLISE - Fundamentação
7. Registre-se que a autoridade fiscal manifesta-se nos autos plenamente vinculada aos estritos preceitos da legislação tributária do Distrito Federal.
8. Além disso, o pedido de esclarecimento de normas deve apresentar descrição clara e objetiva da dúvida e elementos imprescindíveis a sua solução, nos termos do inciso IV, do art. 74 , do Decreto nº 33.269/2011 .
9. Ainda, é necessário que o casuístico não esteja definido ou declarado em disposição literal de legislação, conforme alínea a, do inciso I, do art. 77 do Decreto nº 33.269/2011 .
10. Destacamos que utilizaremos a expressão: atualização monetária automática, pura e simples, às correções monetárias desatreladas de qualquer aspecto punitivo ou de mora.
11. De plano, é mister destacar que a legislação distrital prevê a possibilidade de atualização monetária do saldo credor, bem como do crédito estornado devidos aos contribuintes do ICMS.
12. Vejamos as disposições da Lei 1254/1996 :
"DOS REGIMES DE APURAÇÃO
Art. 36. O regime de apuração normal consiste no cálculo do montante do imposto, por período, o qual resultará da diferença, a maior, entre o devido nas operações e prestações tributadas com mercadorias ou serviços e o cobrado, relativamente às operações e prestações anteriores.
Parágrafo único. O valor do imposto relativo ao período de apuração considerado será demonstrado e apurado em livros ou documentos fiscais próprios exigidos na legislação.
Art. 37. Em substituição ao regime de apuração normal mencionado no artigo anterior, o Poder Executivo poderá:
I - determinar que o montante do imposto seja apurado:
a) por mercadoria ou serviço, dentro de determinado período;
b) por mercadoria ou serviço, à vista de cada operação ou prestação;
c) em função do porte ou da atividade do estabelecimento, por estimativa, fixa ou variável, calculado em relação a cada contribuinte, observados, no que couber, os critérios do § 4º do art. 6º e do art. 14, e seja pago em parcelas periódicas, assegurado ao sujeito passivo o direito de impugnar o lançamento e instaurar o processo contencioso;
(.....)
Art. 39. O saldo do imposto verificado a favor do contribuinte, apurado com base em qualquer dos regimes estabelecidos no art. 36 ou no inciso I do art. 37, transfere-se para o período ou períodos subseqüentes, segundo o respectivo regime de apuração.
Parágrafo único.O saldo credor de que trata este artigo e o crédito a ser estornado na forma do art. 35 serão também atualizados monetariamente, pelos mesmos índices utilizados, pelo Distrito Federal, na cobrança de seus tributos."
13. Dessa forma, os créditos acumulados em favor do contribuinte, decorrentes de suas operações normais, em uma primeira leitura, estariam sujeitos à atualização monetária, à luz da Lei nº 1.254/1996 .
14. Ademais, como se depreende da parte final do parágrafo único do art. 39 da LC 435/2001 , essa atualização monetária está atrelada aos índices praticados pelo Distrito Federal na cobrança de seus tributos.
15. De outro ponto, a Lei complementar 435/2001 passou a disciplinar a forma como as atualizações, correções e juros de mora passariam a viger no Distrito Federal.
16. Assim, o art. 1º da Lei Complementar nº 435/2001 trata da atualização monetária, anual, dos valores expressos na legislação do Distrito Federal.
17. Entretanto, o caso em análise recai em créditos escriturais, que não são valores expressos na legislação do Distrito Federal, e que possuem periodicidade de contabilização e compensação, em regra, inferiores a um ano.
18. Portanto, seja por sua natureza, seja pela periodicidade, os créditos acumulados aqui debatidos não se subsumem à hipótese do citado art. 1º da Lei Complementar nº 435/2001 .
19. Sob outro prisma, o § 2º do art. 2º da Lei Complementar nº 435/2001 atualizou a forma como o Distrito Federal realiza suas cobranças, nos seguintes termos:
"§ 2º Sobre o montante a que se refere o caput incidem juros de mora equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir do primeiro dia do mês subsequente ao vencimento do prazo até o último dia do mês anterior ao do pagamento, e juros de 1% no mês do pagamento."
20. Assim, para as cobranças de seus tributos, o Distrito Federal não utiliza mais um método de atualização monetária automática, pura e simples, mas sim uma taxa de juros de mora, a SELIC, a qual, como cediço, é um índice federal que abarca correção monetária e juros moratórios, ou seja, vai além de uma simples atualização monetária.
21. Nesse diapasão, durante o prazo de vencimento do imposto a pagar, não ocorre atualização monetária dos créditos devidos pelos contribuintes. As correções monetárias ocorrem em um segundo momento, quando não há o adimplemento da obrigação principal.
22. Ratificando o entendimento acima esposado, caminha a reiterada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que exclui a aplicação de atualização monetária quando aplicável a SELIC, posto que esta engloba aquela, conforme apontado no Ato Declaratório Interpretativo nº 06 - SUREC/SEF.
23. Convém repisar que esta análise recai em créditos escriturais, os quais não resultam em dívida do fisco com o contribuinte, nesse sentido:
"A não cumulatividade (.....) parte da mesma premissa: os créditos (.....) são meramente escriturais, e, portanto, não geram dívida do Poder Público para com o contribuinte. Seu fim é puramente contábil, para nada mais se prestando além do cálculo do valor devido, salvo se a lei dispuser em contrário (.....)" (MOREIRA, André Mendes. A não cumulatividade dos tributos. 2ª ed. São Paulo: Noeses, 2012, p. 435)."
24. Nessa esteira, o fato esposado acima diferencia os créditos escriturais de eventuais créditos derivados de uma restituição, que possuem regras de atualização próprias, previstas no § 4º, do art. 2º da Lei Complementar 435/2001 .
25. Assim, à luz da LC 435/2001 , alterada pela LC nº 943/2018 , há o afastamento da atualização monetária automática, pura e simples, dos créditos escriturais acumulados ou estornados, dispostos no art. 39 da Lei nº 1254/1996 .
26. Em reforço argumentativo, a jurisprudência dos tribunais superiores é firme ao conceder correção monetária aos créditos escriturais apenas em casos de resistência ilegítima do fisco (vide súmula 411 do STJ) ou de mora desarrazoada no direito à sua utilização, nesses termos:
"O termo inicial da correção monetária de ressarcimento de crédito escritural excedente de tributo sujeito ao regime não cumulativo ocorre somente após escoado o prazo de 360 dias para a análise do pedido administrativo pelo Fisco (art. 24 da Lei nº 11.457/2007 ).
STJ. 1ª Seção. REsp 1.767.945-PR, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 12.02.2020 (Recurso Repetitivo - Tema 1.003) (Info 670)."
27. Em uma análise sistemática, o aparente conflito de normas representa uma antinomia aparente, haja vista que o critério da especialidade é determinante. Isso porque a LC 435/2001 dispõe exclusivamente do tema afeto à correção monetária, ao passo que a Lei 1254/1996 aduz temas amplos e gerais acerca do ICMS, nesse sentido são as regras muito bem expostas na obra Conflito de Normas, de Maria Helena Diniz (Conflito de Normas. São Paulo: Editora Saraiva, 2003, p. 34 a 51).
28. Desse modo, a despeito da aparente previsão de ampla atualização monetária dos créditos tributários elencados no art. 39 da Lei 1.254/1996 , a Lei Complementar específica posterior nº 435/2001 alterou os termos de cobrança dos créditos em favor do Distrito Federal, que servem de parâmetro para a atualização monetária preconizada pelo parágrafo único do art. 39 da Lei 1.254/1996 .
29. Portanto, quando a LC 435/2001 afasta a atualização monetária automática pura e simples de seus créditos, por paralelismo, esse entendimento deve ser levado à interpretação do citado parágrafo único do art. 39 da Lei 1.254/1996 .
30. Nessa linha, considerando que, em regra, os créditos escriturais no Distrito Federal sequer dependem de prévia autorização para sua utilização, resta clara a incongruência de eventual atualização monetária automática, pura e simples.
31. Desse modo, tirante a hipótese de restituição de tributos, já detalhada no § 4º, do art. 2º da Lei Complementar 435/2001 , o saldo credor em favor do contribuinte, apurado nos regimes de apuração ordinários, previstos na Lei 1254/1996 , bem como o crédito estornado não estão sujeitos à atualização monetária automática, pura e simples.
III - Conclusão - Resposta
32. Pelo exposto, em resposta à consulente, asseveramos que não há possibilidade de atualização monetária automática, pura e simples (vide item 11 deste parecer), de seus créditos escriturais, auferidos nos termos dos arts. 35 , 36 e 37 da Lei 1254/1996 .
33. Ao cabo, destacamos que não foram avaliadas circunstâncias específicas além da detalhada no item 5 deste parecer, qual seja, atualização monetária de créditos escriturais ordinários.
34. Nos termos do disposto no art. 80 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011 (Regulamento do Processo Administrativo Fiscal - RPAF), a presente Consulta é eficaz, aplicando-se a esta o disposto no inciso III do art. 81 e caput do art. 82, ambos do PAF.
À consideração de V - S.ª.
Brasília/DF, 20 de julho de 2022
RODRIGO AUGUSTO BATALHA ALVES
Auditor-Fiscal da Receita do Distrito Federal
Ao Coordenador de Tributação da COTRI.
De acordo.
Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer supra.
Brasília/DF, 20 de julho de 2022
ZENÓBIO FARIAS BRAGA SOBRINHO
Gerente
Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso I do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 1, de 10 de janeiro de 2018 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 8, de 11 de janeiro de 2018, pp. 5 e 6).
A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.
Saliente-se que, independentemente de comunicação formal à Consulente e aos demais sujeitos passivos, as considerações, os entendimentos e as respostas definitivas ofertadas ao presente caso poderão ser modificados a qualquer tempo, em decorrência de alteração na legislação superveniente.
Esclareço que a Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Economia no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o art. 78, II, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.
Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.
Brasília/DF, 20 de julho de 2022
SEBASTIÃO MELCHIOR PINHEIRO
Coordenação de Tributação Coordenador