Resposta à Consulta nº 18914 DE 31/05/2019
Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 07 jun 2019
ICMS – Incidência – Obrigações acessórias – Transporte seccionado de mercadorias remetidas por produtores paulistas para filiais industriais em outros Estados – Entrada e permanência de mercadorias em estabelecimento atacadista paulista para transporte a filiais industriais em outros Estados – Transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular. I. Nas hipóteses de transporte seccionado, realizado por duas transportadoras, previamente conhecidas pelo remetente das mercadorias, a manutenção da mercadoria por certo tempo (estadia) no estabelecimento de uma das transportadoras envolvidas e devidamente consignada no documento fiscal de venda da mercadoria, é hipótese cabível desde que seja inerente à atividade de transporte e por tempo razoável e compatível com a atividade. A entrada física de mercadorias em estabelecimento atacadista pertencente ao mesmo titular do destinatário das mercadorias (filial industrial) não pode ser considerada etapa do serviço de transporte e, neste caso, não há que se falar em transporte seccionado. II. Há incidência de imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular (artigo 1º, inciso I, RICMS/2000). III. O fato gerador do ICMS ocorre na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (artigo 2º, inciso I, RICMS/2000). IV. A base de cálculo a ser considerada, na transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, será o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria (artigo 39 do RICMS/2000).
Ementa
ICMS – Incidência – Obrigações acessórias – Transporte seccionado de mercadorias remetidas por produtores paulistas para filiais industriais em outros Estados – Entrada e permanência de mercadorias em estabelecimento atacadista paulista para transporte a filiais industriais em outros Estados – Transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.
I. Nas hipóteses de transporte seccionado, realizado por duas transportadoras, previamente conhecidas pelo remetente das mercadorias, a manutenção da mercadoria por certo tempo (estadia) no estabelecimento de uma das transportadoras envolvidas e devidamente consignada no documento fiscal de venda da mercadoria, é hipótese cabível desde que seja inerente à atividade de transporte e por tempo razoável e compatível com a atividade. A entrada física de mercadorias em estabelecimento atacadista pertencente ao mesmo titular do destinatário das mercadorias (filial industrial) não pode ser considerada etapa do serviço de transporte e, neste caso, não há que se falar em transporte seccionado.
II. Há incidência de imposto nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular (artigo 1º, inciso I, RICMS/2000).
III. O fato gerador do ICMS ocorre na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (artigo 2º, inciso I, RICMS/2000).
IV. A base de cálculo a ser considerada, na transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade, será o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria (artigo 39 do RICMS/2000).
Relato
1. A Consulente, que declara no Cadastro de Contribuintes do ICMS – CADESP, exercer, como atividade principal, a “fabricação de produtos de carne” (Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE 10.13-9/01) e, entre as diversas atividades secundárias, a de “comércio atacadista de carnes bovinas e suínas e derivados” (CNAE 46.34-6/01), relata que, em junho de 2019, pretende iniciar, em uma nova filial que está sendo construída no Estado de São Paulo, a atividade de comércio atacadista de carnes bovinas, suínas, avícolas e demais derivados, bem como de laticínios e massas alimentícias.
2. Informa que essa nova filial atacadista será abastecida com produtos fabricados e remetidos por suas unidades industrializadoras localizadas em outros Estados, como Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Mato Grosso do Sul.
3. Acrescenta que os insumos utilizados em sua produção industrial são adquiridos junto a fornecedores localizados no Estado de São Paulo e transportados até as filiais industrializadoras da Consulente situadas em outros Estados.
4. Nesse sentido, objetivando reduzir seus custos operacionais, a Consulente descreve que pretende seccionar o transporte contratado para efetuar todo o processo de abastecimento realizado entre suas unidades fabris e a filial paulista, de forma que, a transportadora contratada para levar as mercadorias industrializadas de suas fábricas localizadas em outros Estados até sua nova filial comercializadora paulista, após a entrega dessas mercadorias, retornaria às filiais industriais em outros Estados levando os insumos adquiridos junto aos fornecedores localizados no Estado de São Paulo, otimizando o serviço de transporte e, consequentemente, reduzindo os custos operacionais.
5. Para viabilizar tal operação, a Consulente pretende reservar em seu novo estabelecimento (filial comercializadora paulista) um espaço individualizado destinado exclusivamente para recebimento e organização dos insumos adquiridos pelas filiais em outros Estados, junto aos fornecedores situados em território paulista, para aguardar a chegada dos caminhões da transportadora contratada que, após descarregar as mercadorias remetidas pelas filiais industriais localizadas em outros Estados, retornarão aos estabelecimentos industriais carregando os insumos que estavam aguardando o transporte no estabelecimento da filial atacadista paulista, mas que foram adquiridos pelas unidades industrializadoras da Consulente em outros Estados.
6. Ressalta que esses insumos, cujos destinatários são suas filiais industrializadoras situadas em outros Estados, serão remetidos à filial atacadista paulista somente por razões logísticas, aguardando neste estabelecimento apenas pelo tempo necessário para serem organizadas e despachadas às suas filiais industriais em outros Estados (adquirentes), ou seja, não transitarão pelos estoques da filial paulista.
7. Entende, assim, que, à semelhança da Resposta à Consulta nº 16047/2017, a operação pretendida caracteriza-se como um transporte seccionado nos seguintes moldes:
7.1. No primeiro trecho, referente ao trajeto realizado no Estado de São Paulo, com início nos fornecedores paulistas e com destino ao estabelecimento atacadista da Consulente, no Conhecimento de Transporte Eletrônico – CT-e emitido, a filial comercializadora paulista constaria como “recebedora”, o fornecedor dos insumos como “remetente” e o estabelecimento filial industrializador situado em outro Estado (adquirente) constaria como “destinatário”, sendo que o tomador do serviço de transporte poderia ser o fornecedor ou a filial industrializadora, com o destaque do ICMS incidente sobre a prestação de serviço de transporte devido ao Estado de São Paulo;
7.2. No segundo trecho, trajeto interestadual, da filial comercializadora paulista até suas unidades industrializadoras situadas em outros Estados, constaria, no respectivo CT-e, a filial comercializadora paulista como “expedidora”, no campo “remetente” os dados dos fornecedores paulistas e no campo “destinatário”, o estabelecimento industrial localizado em outro Estado (adquirente), que também figurará como o tomador do serviço de transporte.
8. Complementa que, nas Notas Fiscais de venda emitidas pelos fornecedores paulistas dos insumos, para acompanhar o trânsito dessas mercadorias e que tem como destinatárias as filiais industriais situadas em outros Estados, no campo referente ao transportador, serão informados os dados referentes à transportadora que efetuará o primeiro trecho (do estabelecimento paulista do fornecedor de insumo até a filial comercializadora paulista da Consulente) e no campo “Informações Adicionais”, a menção de que o transporte será seccionado e o segundo trecho será realizado por outra transportadora, sem informar quem realizará o segundo trecho, pois este dado só será conhecido conforme disponibilidade da transportadora que virá do estabelecimento industrial da Consulente para abastecer a filial paulista e que realizará a entrega dos insumos nas unidades da Consulente situadas em outros Estados.
9. Diante do exposto, questiona se poderá realizar o transporte seccionado conforme descrito.
Interpretação
10. De início, cabe esclarecer que a presente resposta não tratará do trecho da prestação de serviço de transporte relativo à remessa dos produtos industrializados das unidades fabris situadas em outros Estados com destino à filial atacadista paulista, visto que a referida prestação de serviço de transporte se inicia em outra Unidade Federativa, a quem compete o imposto incidente sobre tal prestação. Ademais, adotam-se as seguintes premissas: (i) as mercadorias em análise não se encontram sob a sistemática da substituição tributária, e (ii) que toda prestação de serviço de transporte analisada no caso em tela é executada por terceiros, ou seja, não se trata de transporte de carga em veículos próprios; (iii) que as filiais (paulista e fora do Estado) pertencem a um mesmo titular, operando sob um único número básico de inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ.
11. Feitas as observações preliminares, depreende-se, do relato, que a Consulente, no intuito de reduzir seus custos operacionais, pretende estabelecer, em sua nova filial atacadista situada em território paulista, um entreposto que possibilite armazenar os insumos remetidos por fornecedores paulistas para aguardar a chegada de uma transportadora que os recolherá e, efetivamente, realizará a entrega nas filiais industriais da Consulente, destinatárias finais desses insumos.
12. Destaca-se que, a empresa transportadora que realizará a entrega dos insumos nas unidades fabris da Consulente (destinatários finais) será a mesma que abastecerá a filial atacadista paulista com as mercadorias remetidas para revenda e que foram produzidas por essas unidades fabris. Assim, como forma de aproveitar a viagem de regresso, já que essa transportadora deverá retornar após realizar a entrega das mercadorias no estabelecimento paulista, a mesma carrega seus veículos com os insumos que foram entregues na filial atacadista paulista e os transporta diretamente para uma das filiais industriais da Consulente, adquirente e destinatária dos insumos, evitando a necessidade de se contratar outra transportadora para realizar tal trajeto.
13. Isso posto, cumpre esclarecer que a Resposta à Consulta nº 16047/2017, mencionada pela Consulente, trata de situação fática distinta envolvendo a prestação de serviço de transporte na modalidade seccionado, realizado por duas transportadoras, previamente conhecidas pela remetente das mercadorias, sendo que o primeiro trecho é realizado até o estabelecimento da transportadora responsável pelo trecho final do transporte, ou seja, apesar de as mercadorias serem entregues pela primeira transportadora em estabelecimento distinto do destinatário final, não há alteração em relação aos destinatários da mercadoria, porque “a mercadoria é descarregada no estabelecimento do operador logístico no âmbito da prestação de serviço de transporte e lá permanece pelo estrito período necessário à organização das cargas”.
14. Com efeito, destaca-se que é entendimento deste órgão consultivo que, nas hipóteses de transporte seccionado, a manutenção da mercadoria por certo tempo (estadia) no estabelecimento de uma das transportadoras envolvidas e devidamente consignada no documento fiscal de venda da mercadoria, é hipótese cabível e inerente à atividade de transporte, ressalvando que, no aspecto temporal, logicamente, essa estadia deve ocorrer pelo menor tempo possível, mantendo, a empresa transportadora, a posse temporária das mercadorias até que ocorra a efetiva saída de seu estabelecimento, realizando, assim, a prestação de serviço de transporte relativa ao trecho final demonstrado no documento fiscal.
15. Dessa forma, a estadia no estabelecimento de uma das empresas transportadoras envolvidas deve se dar em função de questões operacionais e inerentes ao próprio transporte realizado de forma seccionada. No caso em tela, diferentemente da situação abordada na Resposta à Consulta nº 16047/2017, os insumos seriam entregues a um estabelecimento atacadista, que não se enquadra como transportadora e não realiza nenhum dos trechos do serviço de transporte, de modo que a permanência das mercadorias no estabelecimento da Consulente não configura etapa necessária para a realização do serviço de transporte.
16. Portanto, a entrada física das mercadorias no estabelecimento da Consulente não pode ser considerada inerente ao serviço de transporte e, neste caso, não há que se falar em transporte seccionado. Dessa feita, registre-se que a operação em análise, de remessa dos insumos pelos fornecedores paulistas até o estabelecimento atacadista da Consulente situado neste Estado, sujeita-se às regras gerais do ICMS, devendo, esses fornecedores, ao remeter tais mercadorias, emitir Nota Fiscal de venda, destacando o imposto devido e tendo como destinatária a filial atacadista paulista.
16.1. Por conseguinte, a filial paulista da Consulente deverá registrar a entrada dos insumos em seu estabelecimento em seu Livro Registro de Entradas consignando o CFOP 1.101 (“compra para industrialização ou produção rural”).
17. Posteriormente, ao remeter tais insumos para suas filiais industrializadoras localizadas em outros Estados, a filial atacadista paulista deverá emitir Nota Fiscal com destaque do imposto devido, consignando o CFOP 6.152 (“transferência de mercadoria adquirida ou recebida de terceiros”), tendo em vista ocorrência do fato gerador do imposto na saída da mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, conforme determinação expressa prevista no inciso I, do artigo 2º, do RICMS/2000, respaldado pelo artigo 12, inciso I, da Lei Complementar nº 87/96, conforme transcrevemos:
“Artigo 2º do RICMS/2000 - Ocorre o fato gerador do imposto:
I - na saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;”
“Art. 12 da Lei Complementar 87/96. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:
I - da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;”
18. Recorda-se, também, que a ausência de preço estipulado entre as partes não fulmina a tributação do ICMS, sendo que na transferência de mercadorias da filial paulista para suas filiais localizadas em outros Estados, deve ser seguido o que disciplina o artigo 39 do RICMS/2000 (c/c artigo 13, § 4º, da Lei Complementar nº 87/96), que trata, especificamente, das saídas interestaduais para estabelecimentos pertencentes ao mesmo titular:
“Artigo 39 - Na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, a base de cálculo é (Lei 6.374/89, art. 26, na redação da Lei 10.619/00, art. 1º, XV, e Convênio ICMS-3/95):
I - o valor correspondente à entrada mais recente da mercadoria;
(...)”
18.1. Desse modo, nas referidas transferências, o valor da operação (base de cálculo para o ICMS) deverá ser o valor de aquisição correspondente à entrada mais recente da mesma mercadoria na filial situada neste Estado, que promoverá a transferência, ou seja, o valor constante no documento fiscal que acobertou a operação de aquisição mais recente da mercadoria a ser transferida.
19. Ante o exposto, em relação ao serviço de transporte, também deverão ser seguidas as regras gerais do imposto, sendo que no caso em tela, teremos dois serviços de transportes distintos que serão acobertados cada qual por seu respectivo CT-e.
20. Por derradeiro, dada a singularidade e a complexidade do modelo negocial pretendido, a Consulente poderá pleitear regime especial, nos termos do artigo 479-A e seguintes do RICMS/2000, combinado com a Portaria CAT 43/2007. Recorda-se que a solicitação de regime especial deve ser feita junto ao Posto Fiscal de vinculação do contribuinte e dirigida à Diretoria Executiva da Administração Tributária – DEAT, competente para analisar, conforme critérios de conveniência e oportunidade, a viabilidade da adoção, pelos contribuintes, de procedimentos especiais relativos às obrigações acessórias (artigo 38 do Decreto nº 60.812/2014).
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.