Parecer GTRE nº 97 DE 29/06/2015

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 29 jun 2015

Utilização de crédito de ICMS recebido em transferência para extinção de débito (Lei nº 18.459/2014 - REGULARIZA).

..................., Sociedade Empresária Limitada estabelecida na .............................., inscrita no CNPJ sob o nº ................... e no CCE/GO sob o nº ..............., encaminha à Gerência de Recuperação de Créditos – GERC requerimento para utilização de crédito de ICMS, recebido em transferência de terceiros, para extinção de débito (Auto de Infração nº ...................), nos termos da Lei nº 18.459/2014 – REGULARIZA.

Anexa aos autos cópia do DARE 2.1 nº ................, referente ao pagamento à vista de 30% (trinta por cento) do crédito favorecido (art. 14, inciso II da Instrução Normativa nº 1.182/14-GSF), além de cópias das notas fiscais eletrônicas nºs ....... (transferência de crédito) e ............ (extinção de débito tributário).

A Gerência de Recuperação de Créditos, por meio do Despacho nº ........-GERC, fls. ...., encaminhou o processo à Delegacia Regional de Fiscalização de Goiânia, para fins de homologação do crédito utilizado, nos termos do art. 17 da referida Instrução.

Por intermédio do Despacho nº ............., fls. ..., consubstanciado no Relatório de fls. .../..., a Delegacia Regional de Fiscalização de Goiânia manifestou-se pelo indeferimento do pedido de utilização do crédito de ICMS recebido em transferência para extinção de débito, dada a impossibilidade de verificação da regularidade do saldo credor da empresa remetente dos créditos, .....................

O Relatório mencionado informa que a escrituração dos créditos objeto da transferência ora em análise “teve início em 05/2002 e fim em 04/2004, quando, a partir de então, não houve nenhuma escrituração, mas apenas o repasse do crédito para os meses posteriores. Assim, conforme a legislação vigente, ainda ressaltamos que o direito à utilização daqueles supostos créditos se extinguiu [...]”.

Na sequência, os autos retornaram à GERC e, posteriormente, foram encaminhados à Superintendência da Receita, conforme trâmite estabelecido na IN nº 1.182/14-GSF, a qual, por sua vez, solicita desta Gerência que profira orientação acerca da ocorrência de decadência ou prescrição do crédito objeto do pedido.

De início, cumpre esclarecer que a análise refere-se a suposta decadência, definida por Vittorio Cassone como a “perda de um direito em consequência de não tê-lo exercido durante determinado período de tempo.[1]

O prazo decadencial previsto no art. 23, parágrafo único, da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, com redação reproduzida pelo art. 58, § 4º, da Lei nº 11.651/91 - Código Tributário do Estado de Goiás, abaixo transcritos, tem a função de punir a inércia da parte que não exerceu um direito que lhe cabia.

Art. 23. O direito de crédito, para efeito de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à idoneidade da documentação e, se for o caso, à escrituração nos prazos e condições estabelecidos na legislação.

Parágrafo único. O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento.

Art. 58. É assegurado ao sujeito passivo, nos termos do disposto na legislação tributária, o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações ou prestações resultantes:

[...]

§ 4º O direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento.

[...]

A questão que se impõe, portanto, na determinação da ocorrência da decadência com relação aos créditos ora examinados, reside na interpretação da expressão “utilizar o crédito”, contida na legislação acima. Refere-se a mesma à escrituração do crédito, ou à sua efetiva compensação com débitos relativos às saídas promovidas pelo contribuinte?

O que se tem, em matéria interpretativa, tanto por parte da Administração Tributária Estadual, quanto da doutrina, é que o termo empregado na redação do texto legal “utilizar o crédito” refere-se ao prazo concedido para que o contribuinte faça o registro na sua escrita fiscal, e jamais para a efetiva utilização do crédito.

Sobre o tema, cito trecho do Parecer nº 537/2010-GEPT, desta Gerência:

Na forma do art. 58, § 4º, do Código Tributário Estadual, CTE, “o direito de utilizar o crédito extingue-se depois de decorridos cinco anos contados da data de emissão do documento”. Esta regra do CTE reproduz o texto do art. 23, § único, da LC nº 087/96 e, embora aparentemente possa induzir ao entendimento de que se refere ao prazo para utilização do crédito, na realidade refere-se ao prazo para que o contribuinte exerça o direito de escriturar (apropriar) o crédito.

Entendemos que o prazo consignado no art. 58, em comento, refere-se a prazo decadencial (extinção do direito), o qual não está sujeito a interrupção nem suspensão. De qualquer modo, resulta suficientemente claro do artigo acima referenciado que o prazo decadencial, para efeito de escrituração do crédito de ICMS, inicia na data de emissão do documento ou na data do evento (manutenção de crédito, estorno a maior de crédito, etc.) que assegura o direito ao crédito. Assim, o curso do prazo extintivo inicia-se no momento em que surge para o contribuinte o direito ao crédito na forma da legislação aplicável.

Na obra intitulada “A Não Cumulatividade dos Tributos”, de André Mendes Moreira, 2ª edição, o doutrinador assim se manifestou acerca do assunto:

Apenas um reparo merece ser feito no dispositivo [art. 23, parágrafo único, da LC n. 87/96]: teria andado melhor o legislador complementar se tivesse estipulado o quinquênio decadencial para a “escrituração” do crédito pelo contribuinte e não para a “utilização” desse mesmo crédito, como constou da norma. (...) Ora, não é facultado ao legislador vedar o transporte do saldo credor para as competências subsequentes mediante a estipulação de um limite temporal (...). Por essa razão, pode-se dizer que o art. 23 possui uma falha redacional que, todavia, não impede a apreensão do seu verdadeiro sentido, dentro do qual a norma deve ser considerada válida.[2]

Quanto à escrituração dos créditos dentro do quinquênio previsto, por parte da empresa ..................., a informação colhida nos autos provém do documento de fls. .../..., onde a empresa alega a impossibilidade de apresentação das notas fiscais de compras e vendas no período de junho de 2002 a maio de 2004, bem como as guias de ICMS, conforme solicitado por meio da Notificação Fiscal nº ................-DRF-GNA-NOTFIS (fls. ...), tendo em vista que as referidas notas fiscais encontram-se retidas nos autos de nº .................

A empresa que procedeu a transferência dos créditos informa que os mesmos foram objeto de fiscalização no ano de 2003, não tendo sido constatada nenhuma irregularidade na escrituração da empresa, ficando registrado, ainda, pela autoridade fiscal, no Livro Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrências do contribuinte, que os sucessivos acúmulos de créditos de ICMS ocorreram em virtude da alíquota de entrada ser superior à alíquota de saída, por ser a empresa uma filial de tecelagem mineira, que adquire algodão em pluma internamente, a 17%, e o transfere para Minas Gerais, a 12%.

Ainda conforme alegações da empresa que efetuou a transferência dos créditos de ICMS à requerente, outras duas auditorias teriam sido realizadas na empresa Horizonte Têxtil Ltda., nos anos de 2004 e 2006, as quais também teriam constatado ausência de irregularidade nos créditos de ICMS.

Quanto à análise que nos compete empreender, conclui-se que a afirmação contida no relatório da Delegacia Regional de Fiscalização de Goiânia, às fls. .../..., de que “o direito à utilização daqueles supostos créditos se extinguiu”, tendo em vista o disposto no art. 58, § 4º, da Lei nº 11.651/91 (CTE), não procede, pois que, conforme acima elucidado, o prazo a que se refere o dispositivo aludido, qual seja, cinco anos contados da data da emissão do documento, refere-se ao prazo para que o contribuinte exerça o direito de escriturar (apropriar) o crédito, e consta do relatório apontado que os créditos foram escriturados no período compreendido entre .../... e .../.... A decadência em comento somente haveria de ser considerada caso os créditos não tivessem sido objeto de escrituração.

Um exame mais percuciente sobre a definitiva regularidade dos créditos em questão envolve matéria afeta ao trabalho de auditoria, por meio da análise dos documentos fiscais que ensejaram a apropriação dos créditos de ICMS, a fim de averiguar, inclusive, se essa apropriação ocorreu dentro do prazo estabelecido pelo art. 58, § 4º do CTE.

Finalizando, reiteramos que a afirmação contida no relatório da Delegacia Regional de Fiscalização de Goiânia, às fls. .../..., de que “o direito à utilização daqueles supostos créditos se extinguiu”, tendo em vista o disposto no art. 58, § 4º, da Lei nº 11.651/91 (CTE), não procede, pois que, o prazo a que se refere o dispositivo aludido, qual seja, cinco anos contados da data da emissão do documento, refere-se ao prazo para que o contribuinte exerça o direito de escriturar (apropriar) o crédito, e consta do relatório apontado que os créditos foram escriturados no período compreendido entre .../... e .../.... A decadência somente operaria seus efeitos caso os créditos não tivessem sido objeto de escrituração.

É o parecer.

Goiânia, 29 de junho de 2015.

RENATA LACERDA NOLETO

Assessora Tributária

Aprovado:

CÍCERO RODRIGUES DA SILVA

Gerente de Tributação e Regimes Especiais