Parecer ECONOMIA/GEOT nº 94 DE 20/05/2024
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 20 mai 2024
Conceito de elevado grau de industrialização para fins do crédito outorgado do Pró-Goiás.
1. RELATÓRIO:
(...), com sede no (...), que atua no ramo de beneficiamento e industrialização de madeira, apresenta consulta contestando o indeferimento da solicitação 0742/2023, alegando que sua atividade não se enquadra na vedação prevista no art. 5º, inciso III, alínea "b" do Decreto 9.724/2020 do Programa PROGOIÁS, em Goiás, que veda a utilização do crédito outorgado por estabelecimento que produza "artefatos de madeira, exceto móveis e outros produtos com elevado grau de industrialização".
2. FUNDAMENTAÇÃO:
Conforme preceitua Hugo de Brito Machado, “o conceito de produto industrializado independe de lei. É um conceito pré-jurídico (...) considera-se industrializado o produto que tenha sido submetido a qualquer operação que lhe modifique a natureza ou a finalidade, ou o aperfeiçoe para o consumo”. (Curso de Direito Tributário, 31ª ed., Malheiros, p. 348).
A propósito, o Regulamento do Código Tributário Estadual, em redação semelhante à do Regulamento do IPI, conceitua industrialização no seu art. 5º, dispondo da seguinte maneira:
Art. 5º Considera-se industrialização, qualquer processo que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo, tais como (Lei nº 11.651/91, art. 12, II, “b”):
I - transformação, o que, exercido sobre a matéria-prima ou produto intermediário, importe na obtenção de nova espécie;
II - beneficiamento, o que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto;
III - montagem, o que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto, ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal;
IV - acondicionamento ou reacondicionamento, o que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação de embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria;
V - renovação ou recondicionamento, o que, exercido sobre o produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização.
Parágrafo único. São irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado para obtenção do produto, a localização e a condição da instalação ou o equipamento empregado.
Percebe-se que o conceito de produto industrializado é amplo, nele incluindo operações como o simples acondicionamento ou embalagem, que na verdade não lhe modificam a natureza, nem a finalidade, nem o aperfeiçoam para o consumo.
O referido dispositivo legal estabelece um rol exemplificativo de operações caracterizadoras de industrialização, a saber: I) transformação; II) beneficiamento; III) montagem; IV) acondicionamento ou reacondicionamento; e V) renovação ou recondicionamento.
Acrescenta o parágrafo único do art. 5º do RCTE que são irrelevantes, para caracterizar a operação como industrialização, o processo utilizado e a localização ou condições das instalações e equipamentos empregados. Ou seja, a operação de industrialização não está atrelada ao nível de automação ou sofisticação do processo produtivo, mas sim à alteração promovida no produto.
No caso em análise, verifica-se que o processo produtivo descrito pela empresa (...) envolve diversas etapas que modificam significativamente a natureza, o funcionamento, o acabamento e a finalidade da madeira bruta, tais como:
a) Desdobramento primário: etapa que transforma os troncos e galhos em peças serradas padronizadas, como pontaletes, peças de encaixe e tábuas, caracterizando operação de transformação;
b) Classificação e beneficiamento: etapas que aperfeiçoam e modificam o acabamento das peças de madeira, de acordo com sua qualidade e destinação, configurando operações de beneficiamento;
c) Montagem de paletes e portais: operações em que peças são reunidas, resultando em um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal, caracterizando montagem;
d) Acondicionamento e reacondicionamento: etapas em que as peças de madeira são embaladas ou reembaladas, alterando sua apresentação.
Além disso, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça para a caracterização do processo industrial não é necessário que se dê a alteração da classificação fiscal do produto. Ou seja, mesmo que os produtos finais permaneçam na mesma classificação fiscal, ainda assim há industrialização se houver modificação da natureza, funcionamento, acabamento, apresentação ou finalidade do produto.
Segundo relata, a empresa (...) emprega maquinários específicos e altamente automatizados em seu processo industrial, a exemplo da escavadeira dotada de cabeçote florestal (Harvester), refiladeira, destopadeira, plaina de acabamento, entre outros dispositivos.
Não obstante, a utilização intensiva de processos mecanizados na atividade desenvolvida não é fator determinante para aferir se há ou não industrialização em maior ou menor grau. Como se depreende do parágrafo único do art. 5º do Decreto 4.852/1997 (Regulamento do Código Tributário de Goiás - RCTE), é irrelevante, para fins da definição da industrialização, qual o processo utilizado, seja manual ou mecanizado, a localização do estabelecimento, situado em um parque industrial ou nas dependências da própria residência, ou ainda as condições das instalações ou equipamentos empregados.
Seguindo a regra de que o acessório segue o principal, do mesmo modo que a industrialização prescinde da sofisticação do processo, a qualificação da industrialização (em alto grau ou baixo) independe da qualificação da sofisticação do processo (rústico ou automatizado).
A esse respeito, o próprio Decreto 9.724/2020, que regulamenta o programa PROGOIÁS, fornece-nos um exemplo de produto com elevado grau de industrialização. Em seu art. 5º, inciso III, alínea “b”, vedou-se a possibilidade de utilização de crédito outorgado para os estabelecimentos que produzam artefatos de madeira, exceto móveis e outros produtos com elevado grau de industrialização.
Art. 5º É vedada a utilização do crédito outorgado previsto no art. 4º:
(...)
III - por estabelecimento que produza:
(...)
b) artefatos de madeira, exceto móveis e outros produtos com elevado grau de industrialização; e
O item mencionado como exemplo - móveis - serve como um vetor hermenêutico que auxilia na definição sobre produtos de madeira com elevado grau de industrialização. Para a legislação estadual, a fabricação de móveis, independentemente de ter sido feita num processo mecanizado ou manual, configura uma atividade passível de utilização do benefício fiscal previsto.
Em se tratando de artefatos de madeira, a fruição dos créditos outorgados do PROGOIÁS alcança somente os produtos que sofrem grande transformação entre o estado bruto da matéria-prima e o produto final, pronto para uso. Consoante a descrição detalhada pelo consulente em seu requerimento, os produtos finais entregues pela sociedade empresária (serragem, “palets”, cavacos, “composto barn”, dentre outros) resultantes da transformação da madeira bruta não são considerados produtos com alto grau de industrialização, qualificando-se tão somente produtos industrializados.
Logo, para esses produtos incide a vedação de fruição dos créditos outorgados do PROGOIÁS. Apesar disso, não vislumbramos óbice para que a empresa faça jus ao benefício previsto nos arts. 8º, VIII e 11, III do Anexo IX do RCTE/GO.
3. CONCLUSÃO:
Diante dos fundamentos legais e argumentos expendidos, conclui-se que a atividade desenvolvida pela empresa (...), embora envolva um processo produtivo com o emprego de maquinários altamente automatizados, não se caracteriza como de "elevado grau de industrialização" nos termos do art. 5º, inciso III, alínea "b" do Decreto 9.724/2020, que regulamenta o Programa PROGOIÁS.
Conforme a análise detalhada, os produtos finais entregues pela empresa, tais como serragem, paletes, cavacos, composto barn, entre outros, resultam de operações que modificam a natureza, o funcionamento, o acabamento e a finalidade da madeira bruta, configurando-se como produtos industrializados. No entanto, essas operações não alcançam o grau de transformação exigido pela legislação para serem consideradas de "elevado grau de industrialização".
O exemplo trazido pelo próprio Decreto 9.724/2020, ao excetuar a fabricação de móveis da vedação prevista, indica que essa atividade é reconhecida como de elevado grau de industrialização no setor madeireiro, servindo como um vetor interpretativo para o padrão de transformação almejada para fins de fruição do benefício.
Dessa forma, conclui-se que os produtos resultantes do processo produtivo da (...), apesar de envolverem etapas de transformação, beneficiamento, montagem, acondicionamento e reacondicionamento, não atingem o patamar de complexidade e aprimoramento da matéria-prima equivalente à fabricação de móveis.
Portanto, opina-se pelo indeferimento do requerimento da empresa (...), posto que os produtos finais por ela entregues (serragem, “palets”, cavacos, “composto barn”, dentre outros), resultantes da transformação da madeira bruta, não são considerados produtos com alto grau de industrialização, qualificando-se tão somente produtos industrializados, de modo que não se enquadram na exceção prevista no art. 5º, inciso III, alínea "b" do Decreto 9.724/2020, que permite a utilização do crédito outorgado pelo Programa PROGOIÁS apenas para "móveis e outros produtos com elevado grau de industrialização". No entanto, nada obsta que a empresa faça jus ao benefício previsto nos arts. 8º, VIII e 11, III do Anexo IX do RCTE/GO, por se tratar de atividade industrializada, ainda que não de elevado grau, devendo ser observados os demais requisitos exigidos.
É o parecer.
GOIANIA, 20 de maio de 2024.
HELVECIO VIEIRA DA CUNHA JUNIOR
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