Parecer GEOT nº 80 DE 29/05/2020

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 29 mai 2020

ICMS. Restituição de indébito tributário. Tributação integral na saída de mercadoria já alcançada pela substituição tributária. Cupom fiscal (ECF) emitido com alíquota de 17%. Arts. 172 a 175-A do CTE-GO e 166 do CTN.

I - RELATÓRIO

A GERÊNCIA DE AUDITORIA DE VAREJO E SERVIÇOS desta Secretaria, solicita análise da legislação tributária com o objetivo de se verificar a possibilidade de utilização dos arts. 166 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional - CTN, 174 da Lei 11.651, de 26 de dezembro de 1991, que instituiu o Código Tributário do Estado de Goiás - CTE-GO e 489 do Decreto nº 4.852, de 29 de dezembro de 1997, que regulamentou o Código Tributário do Estado de Goiás – RCTE-GO para a situação em que a empresa (...) requer a restituição de indébito de ICMS, no valor total de R$ 61.855,62, decorrente do recolhimento indevido nas saídas em ECF com tributação normal do imposto, no período de 10/2014 a 05/2015, de itens enquadrados no regime de substituição tributária.

Relata que a requerente apresentou planilhas contendo os números dos cupons fiscais emitidos, inscrição estadual, UF, filial, ano, mês, data de emissão, código da mercadoria, descrição da mercadoria, alíquota, valor de venda e valor do ICMS.

Acrescenta que, de acordo com verificação realizada em alguns cupons fiscais, a Gerência constatou que eles foram escriturados conforme emitidos, com alíquota de 17%, e que o erro advém da confecção do documento fiscal, tributando integralmente a operação de venda ao consumidor final para mercadorias sujeitas à substituição tributária.

Por último, considerando que o ICMS é um imposto indireto, formula os seguintes questionamentos:

1. Não obstante a incidência do ICMS pelo regime de substituição tributária pelas operações posteriores para as mercadorias, a alíquota destacada no cupom fiscal permite concluir-se que o imposto foi repassado novamente, ou seja, em duplicidade, para o consumidor final, transferindo todo o ônus financeiro para o destinatário?

2. Caso positivo, há necessidade de que o contribuinte esteja expressamente autorizado pelos consumidores finais, destinatários das mercadorias, a receber a restituição consoante os arts. 166 do CTN, 174 do CTE-GO e 489 do RCTE-GO?

3. A mudança do entendimento na definitividade da ST altera o entendimento ou procedimento em relação ao art. 166 do CTN?

II - FUNDAMENTAÇÃO

O pedido apresentado visa esclarecimentos acerca do respaldo legal para a restituição de indébito tributário de ICMS na situação em que a empresa efetuou, indevidamente, o recolhimento do imposto para itens enquadrados no regime de substituição tributária pelas operações posteriores, promovendo saídas com destino a consumidor final não contribuinte do imposto, com tributação normal integral em cupom fiscal emitido via ECF, à alíquota de 17%, ocorrência verificada pelo fisco nos referidos documentos fiscais e em sua respectiva escrituração.

Inicialmente, esclareça-se que a situação relatada pressupõe a regularidade do pagamento antecipado, por meio de documento próprio de arrecadação, do ICMS devido por substituição tributária pelas operações posteriores.

Para melhor compreensão, cabe individualizar particularidades determinantes na análise da operação. Tem-se:

- a mercadoria comercializada, com uma única saída em ECF;

- o remetente, sujeito passivo da obrigação tributária, ou seja, o substituto tributário, que recolheu devidamente o ICMS, por meio de documento de arrecadação próprio, no momento da remessa, respondendo por toda a carga tributária incidente na cadeia de comercialização da mercadoria, vale dizer, quitando a totalidade do imposto devido até o consumidor final;

- o destinatário da mercadoria (revendedor varejista), contribuinte de direito e substituído, que, ao vender esse produto, deveria emitir documento fiscal sem destaque do imposto, vez que este já fora devidamente recolhido pelo remetente (substituto tributário), e que, por equívoco, efetuou a tributação normal em cupom fiscal emitido via ECF, com o respectivo recolhimento do tributo, cuja carga total suportou, implicando duplicidade de pagamento em favor do Estado de Goiás;

- o consumidor final, contribuinte de fato do ICMS incidente sobre a aquisição desse produto, e que, uma única vez, pagou por ele, arcando com o ônus financeiro do imposto correspondente, cobrado pelo regime de substituição tributária;

- o sujeito ativo da obrigação tributária, o Estado de Goiás, que, sobre uma mesma operação de circulação de mercadoria, recebeu duplamente o ICMS: na entrada, por meio de documento de arrecadação próprio, e na saída do mesmo produto, por meio de novo documento de arrecadação próprio alusivo ao imposto apurado na escrituração fiscal do contribuinte revendedor.

Vê-se, no retrato acima, de um lado, o Estado (tesouro estadual) que recebeu duas vezes o mesmo tributo; de outro, o consumidor final que pagou esse tributo (embutido no preço) uma só vez, já que não poderia haver duas vendas da mesma mercadoria. Ressalte-se: o imposto foi pago duas vezes para o Estado e repassado uma única vez ao consumidor final, dado que não houve duas saídas em ECF.

É notória a caracterização do indébito tributário, sendo também patente que o evento que a ele deu origem foi o segundo recolhimento feito pelo estabelecimento revendedor. O primeiro pagamento era devido por substituição tributária, tendo ocorrido normalmente em conformidade com a legislação. O segundo decorreu de erro na emissão do cupom fiscal, o que não configura, por si, duplo repasse do ônus financeiro ao consumidor final, que realizou uma única aquisição.

A restituição em causa, deve, porquanto, ser conduzida às disposições seguintes, do CTE-GO:

“ Art. 172. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo e seus acréscimos, seja qual for a modalidade do seu pagamento, nas seguintes hipóteses:

(...)

II - erro de identificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;

(...)

Art. 175. A restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa de restituição.

§ 1º Ao tributo restituído acrescer-se-á juros de mora e correção monetária, calculados segundo os mesmos critérios adotados pela legislação tributária para pagamento de tributos em atraso, computados a partir da data do pagamento indevido.

§ 2º A restituição de indébito tributário, oriundo de pagamento do ICMS, poderá ser efetivada sob a forma de aproveitamento de crédito em futuras operações ou prestações, nas situações e de acordo com as normas fixadas em regulamento.

§ 3º Das restituições será deduzida importância correspondente a 5% (cinco por cento) do total a ser restituído, que se destinará ao atendimento das despesas de exação, limitada a dedução ao equivalente ao valor de R$ 5.559,65 (cinco mil quinhentos e cinqüenta e nove reais e sessenta e cinco centavos)

(...)

Art. 175-A. A Secretaria da Fazenda, antes de proceder à restituição do imposto, deve verificar se o contribuinte tem débito inscrito em dívida ativa, caso em que o valor da restituição deve ser, de ofício, compensado, total ou parcialmente, com o valor do débito.”

Caracterizado o indébito decorrente de dupla tributação da mesma operação, tem o contribuinte revendedor direito ao ressarcimento do imposto destacado erroneamente no cupom fiscal, se comprovado o ingresso do recurso no tesouro estadual, sem necessidade de autorização do consumidor final, que, nesse caso, não arcou com o ônus financeiro correspondente, ou seja, não houve transferência do respectivo encargo financeiro pelo contribuinte revendedor. Desse modo, não há falar em aplicação do art. 166 do CTN, que estabelece:

“Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.”

Por outro lado, o direito à restituição está condicionado a que o contribuinte revendedor não tenha apropriado, em sua escrituração fiscal, o crédito correspondente ao ICMS normal e ao ICMS ST retido, incidentes sobre a operação de entrada da mercadoria. Caso contrário, caracterizar-se-ia o desfazimento da substituição tributária e a operação de saída ocorreria no sistema normal de débito e crédito, não se configurando indébito tributário.

Oportuno lembrar, ainda, que a operação tratada neste Parecer tem como consumidor final pessoa natural ou jurídica não contribuinte do imposto estadual. Caso se tratasse de consumidor final contribuinte, para a efetivação da restituição em razão de ter sido dado tratamento tributário do regime normal ao produto, o postulante deveria comprovar que o destinatário não apropriou como crédito o valor do ICMS destacado.

Sobre a mudança do entendimento na definitividade da ST, o Parecer Normativo nº 013/18-SPT, de 23 de julho de 2018, abordou, de forma exaustiva, o tema, oferecendo a conclusão abaixo transcrita:

“1 - é devida a restituição do ICMS recolhido antecipadamente, em virtude da substituição tributária pelas operações posteriores, progressiva ou “para frente”, quando a base de cálculo do fato gerador presumido for superior ao valor praticado com o consumidor final, em consonância com o Acórdão do Supremo Tribunal Federal – STF, proferido no RE 593.849/MG, com vigência a partir de 22/02/2018 (trânsito em julgado), desde que obedecidas as disposições do art. 166 do CTN, reproduzido integralmente no art. 174 do CTE, bem como da Súmula 546 do STF;

2 - como a tributação deve acompanhar a realidade do processo econômico, cabe ao Estado de Goiás cobrar a diferença de ICMS recolhida a menor, em virtude da substituição tributária pelas operações posteriores, progressiva ou “para frente”, relativa à base de cálculo do fato gerador presumido ser inferior ao valor da operação efetiva praticada com o consumidor final, com vigência, também, a partir de 22 de fevereiro de 2018 (trânsito em julgado do RE 593.849/MG).”

A definitividade está relacionada com a equivalência entre a base de cálculo presumida e a base de cálculo real praticada na operação com mercadorias enquadradas no regime de substituição tributária e, como se depreende, não altera o entendimento ou procedimento em relação ao art. 166 do CTN, que deve ser respeitado.

Conforme o item 2 da conclusão do Parecer Normativo nº 013/18-SPT, caso a base de cálculo do fato gerador presumido seja inferior ao valor efetivo da operação com o consumidor final, cabe ao Estado de Goiás cobrar a diferença do ICMS recolhido a menor, com os acréscimos correspondentes.

Nesse sentido, impõe-se a verificação, pelo Fisco estadual, do preço praticado pelo contribuinte revendedor consignado no cupom fiscal. Caso este seja superior ao valor da base de cálculo utilizada pelo remetente para recolhimento do ICMS-ST, deve-se exigir o complemento do imposto, com as atualizações. Não se pode, entretanto, confundir a não definitividade do pagamento efetuado por substituição tributária, que implica complemento ou devolução, com as disposições do art. 166 do CTN, que não se aplicam no caso da restituição de indébito decorrente do recolhimento em duplicidade, motivado por erro na emissão do documento fiscal, em que não houve transferência do encargo financeiro ao consumidor final.

Por tais considerações, comprovado que o contribuinte revendedor não apropriou, em sua escrituração fiscal, o crédito correspondente ao ICMS normal e ao ICMS ST retido, incidentes sobre a operação de entrada da mercadoria, a restituição do indébito tributário, na hipótese descrita, dever ser fundamentada nos arts. 172 a 175-A do CTE-GO (exceção ao art. 174), sem a necessidade de autorização do consumidor final, visto que não houve transferência do respectivo encargo financeiro pelo contribuinte revendedor, quando da tributação pelo regime normal.

Todavia, uma vez constatado que a base de cálculo real foi maior que a base de cálculo presumida, deve-se exigir a diferença de ICMS, devidamente atualizada, deduzindo-a do imposto a restituir, hipótese em que a restituição será parcial, em face do disposto no art. 35 do Anexo VIII do RCTE-GO, que estabelece:

“Art. 35. Fica solidariamente obrigado ao pagamento do imposto devido por substituição tributária o contribuinte estabelecido neste Estado que adquirir mercadoria cujo imposto não tenha sido retido, hipótese em que o adquirente obriga-se, ainda, ao pagamento da multa pelo mesmo devida, dos juros e demais acréscimos legais, calculados desde a data em que deveria ter sido efetuada a retenção.”

III – CONCLUSÃO

Em face ao exposto, pode-se concluir:

1. A duplicidade de pagamento do ICMS, decorrente de erro na emissão do cupom fiscal, tributando-se pelo regime normal, à alíquota de 17%, a saída em ECF de mercadoria já alcançada pela substituição tributária com destino a consumidor final não contribuinte, não implica duplo repasse do ônus financeiro correspondente. O mesmo tributo foi pago duas vezes ao Estado e repassado ao consumidor uma única vez, já que não poderia haver duas vendas da mesma mercadoria ou duas saídas reais em ECF do mesmo produto.

Entretanto, a caracterização de indébito tributário está condicionada a que o contribuinte revendedor comprove não haver apropriado, em sua escrituração fiscal, o crédito correspondente ao ICMS normal e ao ICMS ST retido, incidentes sobre a operação de entrada da mercadoria;

2. Nesse caso, não há necessidade de que o contribuinte esteja expressamente autorizado pelos consumidores finais, destinatários das mercadorias, a receber a restituição consoante o art. 166 do CTN (174 do CTE-GO e 489 do RCTE-GO). A restituição seguirá a regra de indébito tributário normal abrigada nos arts. 172 a 175-A do CTE-GO, exceto o 174;

3. A definitividade está relacionada com a equivalência entre a base de cálculo presumida e a base de cálculo real praticada na operação com mercadorias enquadradas no regime de substituição tributária e não alterou o entendimento em relação ao art. 166 do CTN, conforme expresso no Parecer Normativo nº 013/18-SPT. Não se pode, entretanto, confundir a não definitividade do pagamento efetuado por substituição tributária, que implica complemento ou devolução, com as disposições do art. 166 do CTN, não aplicáveis no caso da restituição de indébito decorrente do recolhimento em duplicidade, motivado por erro na emissão do documento fiscal, em que não houve transferência do encargo financeiro ao consumidor final.

Há que se lembrar, contudo, que, uma vez constatado que a base de cálculo real foi maior que a base de cálculo presumida, deve-se exigir a diferença de ICMS, devidamente atualizada, deduzindo-a do imposto a restituir, hipótese em que a restituição será parcial, em face do disposto no art. 35 do Anexo VIII do RCTE-GO.

É o parecer.

GERÊNCIA DE ORIENTAÇÃO TRIBUTÁRIA, aos 29 dias do mês de maio de 2020.

Documento assinado eletronicamente por OLGA MACHADO REZENDE, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 18/06/2020, às 17:34, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.

Documento assinado eletronicamente por ELIZABETH DA SILVA FERNANDES FARIAS, Auditor(a) Fiscal da Receita Estadual, em 19/06/2020, às 15:39, conforme art. 2º, § 2º, III, "b", da Lei 17.039/2010 e art. 3ºB, I, do Decreto nº 8.808/2016.