Parecer GEOT nº 429 DE 10/09/2014

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 10 set 2014

Aproveitamento de crédito de ICMS relativo à notas fiscais declaradas inidôneas posteriormente às operações.

O titular da Gerência de Arrecadação e Fiscalização encaminha a esta Gerência consulta apresentada pela Delegacia Regional de Fiscalização de Anápolis, solicitando esclarecimentos acerca da regularidade dos créditos de ICMS destacados em documentos fiscais considerados inidôneos posteriormente às respectivas operações.

O processo do qual se origina a presente consulta versa sobre pedido de verificação fiscal oriundo da Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda de São Paulo, a respeito de operações de venda de mercadorias realizadas pelo contribuinte paulista ......................................., ao contribuinte goiano ....................., inscrito no Cadastro de Contribuintes do Estado sob o nº .................

Em que pese, o Fisco do Estado de São Paulo, em 19/03/2012, mediante procedimento administrativo, declarou nula a inscrição estadual do contribuinte .........................................., com efeitos ex tunc, pelo que todos os documentos fiscais emitidos pelo contribuinte foram considerados inidôneos.

O contribuinte goiano ..........................., no período compreendido entre ..../..../..... e ..../..../...., realizou operações de aquisição de mercadorias do contribuinte paulista em questão. O montante do crédito de ICMS aproveitado, referente a estas operações, totaliza a importância de R$................ (........................).

Diante da decisão do Fisco do Estado de São Paulo de declarar nula, desde a origem, a inscrição estadual atribuída à empresa .................. e ..........................., e tendo em vista o disposto no art. 58, §3º, inciso I, da Lei nº 11.651/91, que instituiu o Código Tributário do Estado de Goiás (CTE), surge a questão relativa à regularidade dos créditos de ICMS destacados nas notas fiscais emitidas pela empresa e apropriados pelo contribuinte goiano citado.

Segue transcrição do dispositivo legal referenciado:

Art. 58. É assegurado ao sujeito passivo, nos termos do disposto na legislação tributária, o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações ou prestações resultantes:

[...]

§ 3º O direito de crédito, para efeito de compensação com débito do imposto, reconhecido ao estabelecimento que tenha recebido as mercadorias ou para o qual tenham sido prestados os serviços, está condicionado à:

I - idoneidade da documentação fiscal;

[...]

Interpretando literalmente o dispositivo citado, o valor escriturado pelo contribuinte goiano a título de crédito do ICMS seria indevido, devendo ser estornado de ofício.

Entretanto, pela análise processual efetuada no âmbito da Delegacia Regional de Fiscalização de Anápolis, por meio do Relatório de fls. 263 e 263-A, a respeito do procedimento fiscal de estorno de crédito de ofício, concluiu a autoridade fiscal pela necessidade de emissão de parecer por esta Gerência, tendo em vista a natureza controversa da matéria, a qual requer interpretação da norma tributária, de modo a estabelecer a extensão de seus efeitos e a uniformização de procedimentos.

Constam dos autos cópias do Registro de Entradas do contribuinte goiano e dos comprovantes de pagamento das compras realizadas do contribuinte paulista.

                    São comuns autos de infração lavrados pelos Fiscos Estaduais contra empresas que se aproveitaram de créditos de ICMS provenientes de aquisição de mercadorias, por meio de nota fiscal declarada inidônea posteriormente às operações.

No entanto, para o Superior Tribunal de Justiça, o comprador de boa-fé não pode ser culpado pela verificação futura da inidoneidade da documentação apresentada pelo vendedor, uma vez que tal atribuição é de competência da Secretaria da Fazenda, de forma que, uma vez demonstrada a efetividade das operações, o direito ao crédito lhe é garantido.

De fato, o tema foi objeto da Súmula 509, do STJ, que tem o seguinte teor: “É lícito ao comerciante de boa-fé aproveitar os créditos de ICMS decorrentes de nota fiscal posteriormente declarada inidônea, quando demonstrada a veracidade da compra e venda”.

Portanto, para que o contribuinte possa fazer jus ao crédito do ICMS de acordo com a orientação do STJ, é necessário (i) que a nota fiscal tenha sido emitida anteriormente à declaração de inidoneidade do vendedor, (ii) provar que este agiu com boa-fé e (iii) que a operação de compra e venda de fato ocorreu.

 Isso quer dizer que se o cancelamento da inscrição estadual e o ato de declaração de inidoneidade da empresa remetente foram publicados após a celebração da operação refletida na nota fiscal, pode-se presumir pela efetividade da operação e pela boa fé do adquirente.

Na prática, uma vez constatado que o ato de declaração de inidoneidade da empresa remetente se deu após a celebração do negócio jurídico, o contribuinte pode demonstrar que a aquisição realmente ocorreu e, consequentemente, que agiu com boa-fé, através de documentos como comprovantes de pagamento, notas fiscais da operação, SINTEGRA da época, controle de estoque, Livro de Registro de Entrada, entre outros.

 Acerca do tema, segue transcrição de julgados do STJ:

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS DE ICMS. APROVEITAMENTO (PRINCÍPIO DA NÃO-CUMULATIVIDADE). NOTAS FISCAIS POSTERIORMENTE DECLARADAS INIDÔNEAS. ADQUIRENTE DE BOA-FÉ. 1. O comerciante de boa-fé que adquire mercadoria, cuja nota fiscal (emitida pela empresa vendedora) posteriormente seja declarada inidônea, pode engendrar o aproveitamento do crédito do ICMS pelo princípio da não-cumulatividade, uma vez demonstrada a veracidade da compra e venda efetuada, porquanto o ato declaratório da inidoneidade somente produz efeitos a partir de sua publicação (Precedentes das Turmas de Direito Público: EDcl nos EDcl no REsp 623.335/PR, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 11.03.2008, DJe 10.04.2008; REsp 737.135/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 14.08.2007, DJ 23.08.2007; REsp 623.335/PR, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 07.08.2007, DJ 10.09.2007; REsp 246.134/MG, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, julgado em 06.12.2005, DJ 13.03.2006; REsp 556.850/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 19.04.2005, DJ 23.05.2005; REsp 176.270/MG, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 27.03.2001, DJ 04.06.2001; REsp 112.313/SP, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, julgado em 16.11.1999, DJ 17.12.1999; REsp 196.581/MG, Rel. Ministro Garcia Vieira, Primeira Turma, julgado em 04.03.1999, DJ 03.05.1999; e REsp 89.706/SP, Rel. Ministro Ari Pargendler, Segunda Turma, julgado em 24.03.1998, DJ 06.04.1998). 2. A responsabilidade do adquirente de boa-fé reside na exigência, no momento da celebração do negócio jurídico, da documentação pertinente à assunção da regularidade do alienante, cuja verificação de idoneidade incumbe ao Fisco, razão pela qual não incide, à espécie, o artigo 136, do CTN, segundo o qual "salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato" (norma aplicável, in casu, ao alienante). 3. In casu, o Tribunal de origem consignou que: "(...) os demais atos de declaração de inidoneidade foram publicados após a realização das operações (f. 272/282), sendo que as notas fiscais declaradas inidôneas têm aparência de regularidade, havendo o destaque do ICMS devido, tendo sido escrituradas no livro de registro de entradas (f. 35/162). No que toca à prova do pagamento, há, nos autos, comprovantes de pagamento às empresas cujas notas fiscais foram declaradas inidôneas (f. 163, 182, 183, 191, 204), sendo a matéria incontroversa, como admite o fisco e entende o Conselho de Contribuintes." 4. A boa-fé do adquirente em relação às notas fiscais declaradas inidôneas após a celebração do negócio jurídico (o qual fora efetivamente realizado), uma vez caracterizada, legitima o aproveitamento dos créditos de ICMS. 5. O óbice da Súmula 7/STJ não incide à espécie, uma vez que a insurgência especial fazendária reside na tese de que o reconhecimento, na seara administrativa, da inidoneidade das notas fiscais opera efeitos ex tunc, o que afastaria a boa-fé do terceiro adquirente, máxime tendo em vista o teor do artigo 136, do CTN. 6. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

(STJ - REsp: 1148444 MG 2009/0014382-6, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 14/04/2010, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 27/04/2010, undefined)

TRIBUTÁRIO - CRÉDITO DE ICMS - APROVEITAMENTO. NOTAS FISCAIS CONSIDERADAS INIDÔNEAS - OPERAÇÕES COMPROVADAS. BOA-FÉ DO CONTRIBUINTE. 1. Constatada a veracidade da operação comercial de compra e venda, não pode o adquirente de boa-fé (que, no caso, é presumida) ser responsabilizado por eventuais irregularidades posteriormente verificadas nas notas fiscais emitidas pela empresa vendedora. Precedentes. 2. Recurso especial provido.

(STJ - REsp: 246134 MG 2000/0006353-3, Relator: Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 06/12/2005, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJ 13/03/2006 p. 233, undefined)

RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. CRÉDITO DE ICMS. OPERAÇÃO MERCANTIL. NOTAS FISCAIS POSTERIORMENTE DECLARADAS INIDÔNEAS. COMPROVAÇÃO DA REALIZAÇÃO DA OPERAÇÃO COMERCIAL. ÔNUS DA PROVA DO CONTRIBUINTE. EXAME DA PROVA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA 7/STJ. RECURSO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça pacificou-se no sentido de que é possível o aproveitamento de crédito de ICMS relativo a notas fiscais consideradas inidôneas pela fiscalização. Todavia, para tanto, é necessário que o contribuinte demonstre, pelos registros contábeis, que a operação de compra e venda efetivamente se realizou, incumbindo-lhe, portanto, o ônus da prova. 2. O disposto no art. 136 do CTN não dispensa o contribuinte, empresa compradora, da comprovação de que as notas fiscais declaradas inidôneas correspondem a negócio efetivamente realizado. 3. É inviável, em sede de recurso especial, em virtude do óbice da Súmula 7/STJ, reexaminar o conjunto fático-probatório constante dos autos, para possibilitar o direito ao creditamento do ICMS. 4. Recurso especial desprovido

(STJ - REsp: 625791 MG 2003/0231594-7, Relator: Ministra DENISE ARRUDA, Data de Julgamento: 06/06/2006, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 22.06.2006 p. 180, undefined).

Por meio do Despacho nº 1358/2014-GEAF, da Gerência de Arrecadação e Fiscalização, fls. 575, consubstanciado nas informações constantes do Relatório de fls. ... e  ...., contribuinte paulista e a adquirente goiana ........................., uma vez que a destinatária das mercadorias apresentou os comprovantes de pagamento das compras realizadas da empresa paulista.

Frise-se que, na situação apresentada, as transações comerciais entre o adquirente goiano e o contribuinte paulista ocorreram no período compreendido entre 01 de março de 2011 e 26 de abril de 2012, ao passo que a declaração de nulidade da inscrição estadual atribuída à empresa paulista foi publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo em 20 de março de 2012, de onde se infere que apenas as operações praticadas até esta data presumem-se regulares e efetivas, conferindo ao contribuinte goiano de boa-fé o direito ao crédito do ICMS destacado nos respectivos documentos fiscais. 

Destarte, uma vez caracterizada a boa-fé do adquirente em relação às notas fiscais declaradas inidôneas após a celebração do negócio jurídico, tendo em vista a comprovação da regularidade e efetividade das operações, revela-se legítimo o aproveitamento dos créditos de ICMS.

É o parecer.

Goiânia,10 de setembro de 2014.

RENATA LACERDA NOLETO

Assessora Tributária

Aprovado:

GENER OTAVIANO SILVA

Gerente de Orientação Tributária