Parecer PGFN/PGA nº 354 de 22/02/2001

Norma Federal - Publicado no DO em 03 abr 2001

Lei de Responsabilidade Fiscal. Fundamento constitucional. Operações de crédito. O alcance do art. 32. Competência do Senado Federal. Os limites do art. 30. As exigências do art. 32. Inaplicabilidade às empresas estatais não dependentes. Ratificação de manifestação anterior desta Procuradoria-Geral.

Senhor Procurador-Geral,

No Parecer PGFN/CAF nº 1821/2000, esta Procuradoria-Geral concluiu que, não obstante a literalidade do art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal, ele se aplica tão-somente às operações de crédito das pessoas políticas, seus fundos, suas autarquias, suas fundações e suas empresas estatais dependentes.

2. Esta interpretação tem suscitado dúvidas, notadamente no Banco Central do Brasil, entidade a quem, por portaria ministerial, foi delegada a competência para verificar o atendimento dos limites e condições para as operações de crédito dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e entidades vinculadas, sem, no entanto, abranger, essa delegação, as empresas estatais não dependentes.

3. A fim de esclarecer a questão, examino neste parecer, com bastante vagar, a matéria.

4. O art. 163, da Constituição, atribui à lei complementar a regulação de diversas matérias ligadas às finanças públicas, dentre elas a de dispor sobre dívida pública externa e interna dos entes políticos e das entidades integrantes da respectiva administração pública.

5. Portanto, poderia o legislador complementar regular sobre operações de crédito de toda a administração pública.

6. A questão que se coloca é se assim o fez.

7. No exercício parcial a Lei Complementar nº 101 não trata de operações de câmbio de entes públicos nem da fiscalização das instituições financeiras, embora tais matérias pudessem ser por ela reguladas, conforme incisos V e VI do referido art. 163. A Lei de Responsabilidade Fiscal regulou, também parcialmente, o art. 165, § 9º, da Constituição, ao dispor sobre a lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária anual, sem esgotar a autorização constitucional daquela atribuição, foi expedida a Lei Complementar nº 101, de 2000 (a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, doravante referida pela sigla LRF), que em seu art. 32, atribui ao Ministério da Fazenda o encargo de verificar o atendimento dos limites e condições para as operações de crédito da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das entidades por eles controlados direta e indiretamente.

8. Em entendimento literal, o comando é abrangente: todo o setor público estaria a ele subordinado.

9. Exegese bem diferente exsurge se utilizarmos os métodos sistemático e integrador de interpretação para a finalidade desse estudo, sistemática é a interpretação do dispositivo em face das demais normas da lei, enquanto que integradora é a leitura com atenção às demais leis vigentes.

10. A LRF traz, em seu art. 2º, a informação de que ela obriga os entes da Federação e, mais adiante, estabelece o que são esses entes: a pessoa política e suas autarquias, fundos absolutamente desnecessária a referência eis que fundos não têm personalidade jurídica, sendo, isto sim, massa de recursos com destinação específica. Deve-se reconhecer, aqui, que há instituições, de natureza autárquica, denominadas de fundos (e.g., o Fundo Nacional de Desenvolvimento), fundações e entidades estatais dependentes.

11. Assim, há, sob a ótica da literalidade, conflito entre este dispositivo e o antes mencionado art. 32, já que aquele açambarcaria conjunto maior.

12. Para tentar esclarecer a dúvida, recorro aos demais dispositivos da LRF.

13. Em primeiro lugar, examino o próprio caput do art. 32. Quais são os limites e condições de que trata a regra?

14. Quanto aos limites, remeto-me à Seção II da LRF, denominada "Dos Limites da Dívida Pública e das Operações de Crédito", composta de apenas um artigo, o de nº 30. Este artigo, por sua vez, determina ao Presidente da República que, no prazo de 90 dias da publicação da lei, encaminhe:

a) ao Senado Federal, proposta de limites para a dívida consolidada da União, dos Estados e dos Municípios, nos termos do inciso VI do art. 52 da Constituição, bem como de limites e condições relativos aos incisos VII, VIII e IX do mesmo artigo;

b) ao Congresso Nacional, projeto de lei estabelecendo limites para a dívida mobiliária federal, nos termos do inciso XIV do art. 48 da Constituição.

15. Os parágrafos do art. 30 estabelecem regras para os limites e a periodicidade de verificação deles, além de regra específica para precatórios não pagos no ano de sua inclusão no orçamento.

16. Não trazendo a LRF outros limites, esses constantes do art. 30 são os limites a que se refere o caput do art. 32.

17. Por outro lado, examinando-se os incisos do art. 52 da Constituição, tem-se que não detém aquela Casa Legislativa competência para dispor sobre operações de crédito de todas as entidades integrantes da administração pública, mas somente de algumas. Com efeito desnecessária aqui a referência aos demais incisos do artigo constitucional, eis que não cuidam da administração indireta, diz a Lei Maior:

"Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

VII - dispor sobre limites globais e condições para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo poder público federal;"

18. Portanto, não tem o Senado Federal competência para estabelecer limites para as operações de crédito das entidades integrantes da administração indireta de Estados e Municípios, com exceção das autarquias.

19. Aliás, regulando a matéria, encontra-se em vigor a Resolução nº 78, de 1998, na qual o Senado Federal dispõe sobre as operações de crédito dos entes políticos e de suas autarquias e fundações. Este acréscimo, embora nunca tenha sido contestado, parece ir além do que autoriza a Constituição, nada dispondo sobre todas as demais entidades controladas direta ou indiretamente.

20. Dessa forma, é de se concluir que, quanto aos limites, não os há, por ausência na lei e por incompetência do Senado Federal a respeito, para toda a administração pública, mas tão-somente para (a) a União e todas as suas entidades controladas - art. 52, VII, (b) os Estados, Municípios e suas autarquias e fundações - idem, e (c) se estabelecidos dessa forma pelo Senado, também para as empresas estatais dependentes estaduais e municipais, a teor do art. 3º, b, da LRF. Admito que se o Senado Federal estabelecer limites para as operações de crédito de Estados e Municípios adotando o conceito amplo que deu a essas pessoas políticas a LRF, há possibilidade de questionamento jurídico, baseado em extrapolação da competência atribuída pelo art. 52, VI, da Constituição.

21. Passo agora a examinar as condições para as operações de crédito. São elas enumeradas no § 1º do art. 32, conforme segue, analisadas uma a uma:

I - existência de prévia e expressa autorização para a contratação, no texto da lei orçamentária, em créditos adicionais ou lei específica;

22. Embora o art. 165, § 5º, da Constituição, disponha que a lei orçamentária anual compreenderá (a) o orçamento fiscal referente aos Poderes da União, seus fundos, órgãos e entidades da administração direta e indireta, (b) o orçamento de investimentos das empresas em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto e (c) o orçamento da seguridade social, abrangendo todos os órgãos e entidades a ela vinculados, da administração direta ou indireta, de há muito que as Leis de Diretrizes Orçamentárias, inclusive a de nº 9.995, de 25 de julho de 2000. Já na vigência, portanto, da LRF, abrangem conjunto menor, in verbis:

"Art. 6º Os orçamentos fiscal e da seguridade social compreenderão a programação dos Poderes da União, seus fundos, órgãos, autarquias, inclusive especiais, e fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, bem como das empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades em que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto e que dela recebam recursos do Tesouro Nacional, devendo a correspondente execução orçamentária e financeira ser registrada na modalidade total no Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal - Siafi.

Parágrafo único. Excluem-se do disposto neste artigo as empresas que recebam recursos da União apenas sob a forma de:

I - participação acionária;

II - pagamento pelo fornecimento de bens e pela prestação de serviços;

III - pagamento de empréstimos e financiamentos concedidos; e

IV - transferência para aplicação em programas de financiamento nos termos do disposto nos arts. 159, inciso I, alínea c, e 239, § 1º, da Constituição." Texto e número de artigo idênticos ao da LDO anterior. (grifei)

23. Ou seja, com alguma variação, a LDO adotou a unicidade orçamentária apenas para a União, seus fundos, autarquias, fundações e empresas estatais dependentes, em simetria com o conceito amplo de ente da Federação adotado pela LRF.

24. A Constituição, no § 8º do art. 165, estabelece que "a lei orçamentária anual não conterá dispositivo estranho à previsão da receita e à fixação da despesa, não se incluindo na proibição a autorização para... a contratação de operações de crédito".

25. Parece claro que as operações de crédito a que se refere o dispositivo constitucional são aquelas que impactam as receitas e, eventualmente, se houver delas alguma amortização no exercício, as despesas constantes da lei orçamentária.

26. Como a LDO, que orienta a elaboração da lei orçamentária anual Constituição, art. 165, § 2º, determina que o orçamento inclua apenas a programação da União e de seus fundos, autarquias, fundações e estatais dependentes, somente as operações de crédito dessas entidades poderiam ser autorizadas na lei orçamentária anual.

27. Dessa forma, não é compatível com as normas orçamentárias, pelo menos no plano federal, a exigência de autorização na lei orçamentária ou em seus créditos adicionais que nada mais são do que alterações à lei orçamentária, integrando-a a partir de sua publicação, para a contratação de operações de crédito por integrantes da administração indireta, outros que aqueles já referidos na LRF e na Lei de Diretrizes Orçamentárias.

28. Menos ainda aplicável a exigência de lei específica, notadamente à luz do ombreamento às empresas privadas, quanto a seus direitos e obrigações, que a Constituição deu às empresas públicas e sociedades de economia mista Constituição, art. 173, II.

29. Como se não bastasse, leitura a contrario sensu do § 6º do art. 5º da LRF leva ao entendimento de que não devem integrar a lei orçamentária da União as receitas e despesas das empresas controladas.

30. Com efeito, tal dispositivo comanda a integração, no orçamento da União, como sua despesa, das despesas do Banco Central do Brasil com custeio e investimentos. A conclusão é inafastável: de ordinário, as despesas das entidades vinculadas não integram o orçamento da União.

II - inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos provenientes da operação, exceto no caso de operações por antecipação de receita;

31. Mutatis mutandis, aplica-se aqui a argumentação apresentada quanto ao inciso anterior.

III - observância dos limites e condições fixados pelo Senado Federal;

32. Como já dito anteriormente, não detém o Senado Federal competência para estabelecer limites e condições para as operações de crédito de entidades estaduais e municipais outros que os entes políticos e suas autarquias. Quanto à administração federal, a competência da Casa Legislativa a respeito abrange todas as entidades.

IV - autorização específica do Senado Federal, quando se tratar de operação de crédito externo;

33. Nesse ponto específico, a competência do Senado Federal, nos termos do art. 52, V, da Constituição, se limita às operações de crédito externo das pessoas políticas.

V - atendimento do disposto no inciso III do art. 167 da Constituição;

34. Segundo o mencionado dispositivo constitucional, é vedada "a realização de operações de crédito que excedam as despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta."

35. Esse comando traz a chamada "regra de ouro", que pretende coibir o financiamento, via operação de crédito, de despesas correntes. É matéria orçamentária, ou seja, o limite das operações de crédito é o montante das despesas de capital previsto na lei orçamentária anual. Aqui, além de as controladas não dependentes não integrarem o orçamento, como visto antes, cabe o comentário de que a contabilidade empresarial, que é utilizada pelas sociedades de economia mista, se sociedade anônima, obrigatoriamente, por força da Lei nº 6.404, e empresas públicas, não apresenta a dicotomia, própria da administração pública, entre despesas de capital e despesas correntes. Tais conceitos, na verdade, não são contábeis, mas orçamentários. Exemplificando: a compra de um imóvel à vista, não impacta contas de despesa, mas duas contas do ativo: caixa e permanente. Sob a ótica orçamentária, é despesa de capital.

36. Aliás, admitir-se que a "regra de ouro" alcança as estatais não dependentes levaria a uma situação no mínimo esdrúxula: a administração direta, pela exceção constante do art. 167, III, pode, presente autorização orçamentária excepcional, realizar operações de crédito além do montante das despesas de capital. Às estatais não dependentes, por não serem, de modo algum, objeto de legislação orçamentária, o impedimento seria absoluto!

37. Por outro lado, como as receitas e despesas das controladas não dependentes não integram o orçamento do ente político, não há como onerar o limite de operações de crédito deste com as operações daquelas.

VI - observância das demais restrições estabelecidas nesta Lei Complementar.

38. As restrições estão espalhadas no texto legal. Examino-as a seguir.

39. A primeira delas, que é, na verdade, uma vedação, se encontra no art. 23, que dispõe que a não-observância dos critérios e prazos para a redução da despesa com pessoal leva à proibição da realização de operações de crédito, ressalvadas as de refinanciamento da dívida mobiliária ou destinadas à redução das despesas com pessoal. Como não há limite às despesas com pessoal na administração indireta, a ela não se aplica esta vedação.

40. A seguir, outra proibição, constante do art. 31, vinculada ao excesso do limite para a dívida consolidada de um ente da Federação. Não eliminado o excesso, na forma e prazo lá estabelecidos, o ente da Federação ficará proibido, até a regularização, de realizar operação de crédito, ressalvado o refinanciamento do principal da dívida mobiliária. Como as controladas não dependentes não integram o conceito amplo de ente da Federação constante da LRF, a elas igualmente não se aplica esta restrição.

41. O art. 35 traz vedação que atinge a toda a administração pública, ao proibir a realização de operação de crédito entre um ente da Federação e outro, neste último incluída toda a administração indireta. Como ao Ministério da Fazenda compete verificar o atendimento dos limites e condições para a realização de tais operações pelos entes da Federação, estes, como um dos partícipes de eventual operação vedada dependem da verificação ministerial para a concretização da operação. Assim sendo, despiciendo controlar a observância desta norma pelo lado da controlada não dependente.

42. O mesmo raciocínio se aplica (a) à exceção constante do § 1º do art. 35 em relação às operações entre instituição financeira de um ente e outro ente e (b) à vedação, mencionada no § 2º do mesmo artigo, de operações entre instituição financeira estatal e seu controlador. Verifica-se a infringência pelo tomador, o ente da Federação.

43. Pelo art. 37, são equiparadas a operação de crédito e estão vedadas: (a) a "captação de recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição...", (b) o "recebimento antecipado de valores de empresa em que o Poder Público detenha, direta ou indiretamente, a maioria do capital social com direito a voto, salvo lucros ou dividendos...", (c) a "assunção direta de compromisso, confissão de dívida ou operação assemelhada, com fornecedor de bens, mercadorias ou serviços, mediante emissão, aceite ou aval de título de crédito, não se aplicando esta vedação a empresas estatais dependentes," e (d) a "assunção de obrigação, sem autorização orçamentária, com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e serviços".

44. Tais vedações não se aplicam às empresas controladas, mas ao Poder Público, ao ente político. Seguindo as alíneas, só tem titularidade para instituir tributo ou contribuição a pessoa política ou suas autarquias. Em seguida, o que se veda é o recebimento, não o pagamento. Logo, a proibição tem como destinatário o controlador. A alínea c, de redação confusa, ao excetuar as estatais dependentes sinaliza no sentido de que o destinatário, também aqui, é o ente político. Finalmente, a última alínea, vinculada a orçamento, restringe o alcance às pessoas incluídas na lei orçamentária anual do ente político.

45. O art. 38 traz as condições para as operações de crédito por antecipação de receita orçamentária. Operação típica de ente político. Essas condições não se aplicam à administração indireta.

46. O art. 40 cuida das regras para a concessão de garantias pelos entes, submetendo-a às normas do art. 32 e, quanto à União, também aos limites e condições estabelecidos pelo Senado Federal. A explicação para somente a União estar submetida adicionalmente às determinações do Senado Federal é encontrada no art. 52, VIII, da Constituição, que dá à Casa Legislativa competência apenas para cuidar de garantias concedidas pela União, nada havendo quanto às garantias prestadas pelos demais entes da Federação.

47. O § 6º do art. 40 traz regra proibitiva, vedando a todas as entidades integrantes da administração indireta a concessão de garantias, exceção feita, no § 7º do mesmo artigo, às garantias prestadas (a) pelas instituições financeiras às empresas nacionais e (b) por controlada a suas subsidiárias e controladas. Como é regra proibitiva absoluta, não há nada a ser examinado pelo Ministério da Fazenda.

48. A exceção referida na alínea a do artículo anterior é inteiramente sem sentido, eis que o § 8º do art. 40 diz textualmente que "excetua-se do disposto neste artigo a garantia prestada por instituições financeiras estatais, que se submeterão às normas aplicáveis às instituições financeiras privadas, de acordo com a legislação pertinente". Se não se aplica o artigo inteiro, por óbvio não se aplicam nem a vedação do § 6º, nem a exceção do § 7º!

49. O último parágrafo deste artigo determina que ente da Federação que tiver dívida honrada pela União ou por Estado, em razão de garantia prestada, ficará impedido de ter acesso a novos créditos até a liquidação da dívida. Novamente, restrição não incidente sobre a administração indireta.

50. Na Seção relativa aos Restos a Pagar, composta unicamente do art. 42, encontra-se a vedação a que titular de Poder ou órgão contraia, nos últimos oito meses de mandato, obrigação de despesa que não possa ser cumprida inteiramente no seu mandato ou que, havendo parcelas para o exercício seguinte, não haja disponibilidade de caixa suficiente para o pagamento. Claro, apenas a administração pública stricto sensu é destinatária da norma.

51. Por fim, o § 2º do art. 51, combinado com o § 2º do art. 52 e com o § 3º do art. 53 impede, até que a situação esteja regularizada, que os entes da Federação recebam transferências voluntárias e contratem operações de crédito se, nos prazos previstos, (a) deixar a União de publicar a consolidação nacional das contas, (b) deixarem Estados e Municípios de enviarem suas contas ao Poder Executivo da União, ou (c) não publicarem os Poderes Públicos e o Ministério Público o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão Fiscal. Mais uma vez, regra não destinada à administração indireta.

52. De todo o exposto até aqui, resta claro não haver limites e condições aplicáveis às entidades integrantes da administração pública, outras que aquelas incluídas no conceito amplo de ente da Federação constante da Lei de Responsabilidade Fiscal, com a grande exceção das empresas controladas pela União, cujos limites e condições a serem verificados são exclusivamente aqueles fixados pelo Senado Federal, no exercício da competência a ele atribuída pelo art. 52, VII, da Constituição, não lhes havendo a LRF imposto qualquer outra restrição.

53. Voltarei às estatais federais não dependentes mais adiante.

54. Passo, agora, a examinar a questão sob outra ótica, a das normas incidentes sobre as operações realizadas em desacordo com a LRF.

55. Segundo o art. 33 da Lei Complementar imediatamente seguinte, portanto, ao que determina ao Ministério da Fazenda a verificação dos limites e condições para a contratação das operações de crédito. Ademais, compõe a subseção que cuida da "Contratação" das operações de crédito, a "instituição financeira que contratar operação de crédito com ente da Federação... deverá exigir comprovação de que a operação atende às condições e limites estabelecidos".

56. Portanto, nas contratações com todas as estatais não dependentes, incluídas as federais, não há a obrigação de a instituição financeira exigir tal comprovação.

57. O § 1º do art. 33 diz que a operação realizada com infração do disposto na LRF será considerada nula, procedendo-se ao seu cancelamento, mediante a devolução do principal, vedados o pagamento de juros e demais encargos financeiros. Sendo parágrafo, esta disposição se refere apenas às operações referidas no caput do artigo, ou seja, às operações financeiras dos entes da Federação.

58. Mesmo que se quisesse admitir que o legislador cometeu uma atecnia e que o parágrafo teria vida autônoma, isto é, que alcançaria as operações de crédito de toda a administração pública, a leitura dos demais parágrafos do mesmo artigo deixa patente que o dispositivo inteiro somente incide sobre as contratações dos entes da Federação.

59. De fato, o § 2º do art. 33 cuida de como se procede à devolução dos recursos, em caso de operação de crédito considerada nula, se não realizada no mesmo exercício. E aí, determina a consignação de reserva específica na lei orçamentária, algo estranho às estatais não dependentes.

60. O § 3º sujeita o tomador à vedação de realização de novas operações de crédito enquanto não cancelada ou amortizada a operação nula ou constituída a respectiva reserva na lei orçamentária. Tratando de lei orçamentária, o destinatário, também aqui, é somente o ente da Federação.

61. Finalmente, o § 4º estende a obrigatoriedade de constituição de reserva para o excesso observado quanto à "regra de ouro". Novamente, nada a ver com estatais não dependentes.

62. Lendo conjuntamente os arts. 32 e 33, um cuidando dos limites e condições para as operações de crédito, outro tratando da nulidade - e seus efeitos - das operações em infração à lei, chego à conclusão de que também as estatais federais não dependentes que, como visto anteriormente, somente estão sujeitas aos limites e condições estabelecidos pelo Senado Federal - não estão sujeitas ao regramento da LRF, em suas operações de crédito.

63. Isto porque não há sentido lógico jurídico em entender-se que a LRF criou uma norma que, dependendo do ator, sanciona ou não uma conduta. Em outras palavras, se o ente da Federação infringir as normas da lei quanto às operações de crédito, ela será considerada nula; se a operação for de estatal não dependente, silente é a lei quanto aos efeitos da irregularidade.

64. Veja-se a lei por inteiro e a conclusão de quem é seu objeto fica ainda mais cristalina. A que se destina a Lei Complementar nº 101, de 2000? A obrigar à responsabilidade na gestão fiscal. E para esse objetivo, tentou criar um conjunto abrangente, partindo da elaboração da lei de diretrizes orçamentárias e da lei orçamentária anual, seguindo pela execução do orçamento, pelas regras para receita e despesa públicas (tratando especificamente a despesa com pessoal, refletindo a preocupação do legislador constitucional, expressa no art. 169 da Carta Magna) e cuidando das operações de crédito e da gestão do patrimônio público.

65. Para propiciar um controle eficiente sobre a obediência a essas normas, traz a lei a seguir regras quanto à transparência, o controle e a fiscalização. E quem são os obrigados à transparência? Os entes de Federação e seus agentes (chefes de Poderes e de órgãos estatais). Quem presta contas? Os Chefes de Poderes e do Ministério Público. Onde a obrigação, por força da LRF, para os dirigentes de estatais não dependentes ou mesmo para os chefes dos Executivos quanto às operações dessas empresas?

66. Não tem sentido, do ponto de vista sistêmico, submeter-se as operações de crédito das controladas não dependentes aos ditames da LRF, sem que elas se sujeitem aos mecanismos de controle na lei estabelecidos.

67. Cabe, ainda, destacar que não é tênue a linha divisória, do ponto de vista legislativo, entre estatais dependentes ou não dependentes. Pelo contrário, a distinção é expressamente legal: havendo previsão orçamentária de transferência de recursos do ente da Federação para a empresa, é estatal dependente; não o havendo, não o é.

68. Finalmente, deixo claro que este parecer não afirma que a LRF não atinge as empresas estatais não dependentes. Há esparsas regras na multimencionada lei complementar que obrigam estas empresas E.g., arts. 40, §§ 6º, 7º e 8º, I, e 47. Restringe-se esta manifestação ao alcance do art. 32 e sua inaplicabilidade in casu.

69. De todo o exposto, ratificando a manifestação anterior desta Procuradoria-Geral, consubstanciada no Parecer PGFN/CAF nº 1821/2000, entendo ser inaplicável o art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal às estatais não dependentes, não cabendo ao Ministério da Fazenda, em conseqüência, por força da LRF, a verificação de quaisquer limites e condições nas operações de crédito dessas entidades.

Em 19 de fevereiro de 2001.

CARLOS EDUARDO DA SILVA MONTEIRO

Procurador-Geral Adjunto

De acordo. À consideração do Senhor Ministro da Fazenda.

Em 22 de fevereiro de 2001.

ALMIR MARTINS BASTOS

Procurador-Geral da Fazenda Nacional