Parecer PGFN/CAT nº 2.998 de 18/09/2002

Norma Federal - Publicado no DO em 19 set 2002

Dispõe sobre a responsabilidade tributária em casos de tributação definitiva na fonte.

Responsabilidade tributária em casos de tributação definitiva na fonte. Quando as rendas forem tributadas sob o regime de exclusividade de fonte, e esta estiver impedida de fazer a retenção por decisão judicial, a responsabilidade tributária desta não afasta a do contribuinte pelo pagamento do crédito tributário.

O CoordenadorGeral de Assuntos Tributários desta ProcuradoriaGeral determinou a elaboração de parecer, para esclarecer a quem cabe a responsabilidade tributária pelo recolhimento do Imposto de Renda, nas hipóteses de tributação exclusiva na fonte, quando houver decisão judicial impeditiva da retenção pela fonte pagadora.

2. O esclarecimento se faz necessário em face da jurisprudência administrativa dominante nos Conselhos de Contribuintes no sentido de que a responsabilidade seria unicamente da fonte, excluindo-se a do contribuinte, mesmo quando aquela estiver impedida de exercer sua obrigação por decisão judicial, já que, segundo os julgados dos referidos Colegiados, o contribuinte seria parte ilegítima para ser autuado pelo Fisco, sendo nulo de pleno direito o auto de infração que lhe administrativa dominante nos Conselhos de Contribuintes no sentido de que a responsabilidade seria unicamente da fonte, excluindo-se a do contribuinte, mesmo quando aquela estiver impedida de exercer sua obrigação por decisão judicial, já que, segundo os julgados dos referidos Colegiados, o contribuinte seria parte ilegítima para ser autuado pelo Fisco, sendo nulo de pleno direito o auto de inflação que lhe atribuir a responsabilidade pelo pagamento do tributo não retido.

3. A conseqüência prática dessa interpretação escatológica seria a impossibilidade de recebimento do crédito tributário, eis que, por um lado, a fonte não poderia retê-lo e repassá-lo por conta de uma decisão judicial, bem como, por outro, a autuação do contribuinte não sobreviveria em face da jurisprudência administrativa dominante nos Conselhos de Contribuintes.

4. Ou seja, o crédito tributário, mesmo que devidamente lançado, existente e exigível, não poderia ser cobrado pelo Estado, nem da fonte, pois que está sob a égide de uma decisão judicial, nem do contribuinte, como propugna, equivocadamente, a jurisprudência administrativa. Daí exsurge a preocupação desta Coordenação-Geral de Assuntos Tributários: afastar essa interpretação absurda, que tem criado dificuldades para o Fisco, ao impedir que o crédito tributário, devidamente lançado, certo e exigível, efetivamente ingresse no Tesouro Federal.

5. Antes, entrementes, de ferir a questão de fundo, é fundamental demonstrarmos a possibilidade jurídica de a PGFN exercer atividade de consultoria jurídica no âmbito do Ministério da Fazenda. Tal possibilidade assentase na Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. Com efeito, assim rezam os arts. 13 e 42 da LC nº 73, de 1993:

"Art. 13. A ProcuradoriaGeral da Fazenda Nacional desempenha as atividades de consultoria e assessoramento jurídicos no âmbito do Ministério da Fazenda e seus órgão autônomos e entes tutelados.

Art. 42. Os pareceres das Consultorias Jurídicas, aprovados pelo Ministro de Estado pelo SecretárioGeral e pelos titulares das demais Secretarias da Presidência da República ou pelo Chefe do EstadoMaior das Forças Armadas, obrigam também, os respectivos órgãos autónomos e entidades vinculadas." (destacou-se).

7. Como se pode perfeitamente notar, a PGFN é o órgão de assessoramento jurídico no âmbito do Ministério da Fazenda, sendo seus pareceres, quando aprovados pelo respectivo Ministro de Estado, vinculantes para todos os órgãos administrativos subalternos.

8. Por outro lado, a chamada Lei de Reforma Administrativa (Decreto-Lei nº 200, de 1967) permite ao Ministro de Estado da Fazenda o poder de supervisionar e controlar as decisões dos órgãos que lhe são subordinados. Com efeito, assim está vazada a dicção dos mencionados dispositivos (os destaques não constam do original):

"Art. 19. Todo e qualquer órgão da Administração Federal, direta ou indireta, está sujeito à supervisão do Ministro de Estado competente, excetuados unicamente os órgãos mencionados no art. 32, que estão submetidos à supervisão direta do Presidente da República.

Art. 20. O Ministro de Estado é responsável perante o Presidente da República, pela supervisão dos órgãos da Administração Federal enquadrados em sua área de competência.

Parágrafo único. A supervisão ministerial exercer-se-á através da orientação, coordenação e controle das atividades dos órgãos subordinados ou vinculados ao Ministério, nos termos desta lei."

9. Pela simples leitura desses dispositivos da lei da reforma administrativa, bem já se pode entrever a perfeita utilização do controle de legalidade a ser feito, pelo Ministro da Fazenda.

10. Aliás, nesse mesmo diapasão está caminhando o Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que vem confirmando a possibilidade jurídica da supervisão ministerial. Com efeito, recentemente, em Writ impetrado contra decisão administrativa do Ministro da Fazenda, aquela Corte Superior atestou a plena plausibilidade jurídica do Ministro da Fazenda supervisionar os seus órgãos subordinados (Mandado de Segurança nº 6.737/DF, Proc. Orig. nº 1999/01194121, Relatora Min. Laurita Vaz). Nesse julgado, restou assentado que:

"Conforme é de sabença, o recurso hierárquico é consectário da gradação hierárquica em que se estrutura a administração pública e se compatibiliza com o controle hierárquico consagrado como uma dos cânones da reforma administrativa federal (Decreto-Lei nº 200/67, art. 6, V, e art. 13)."

11. Em outra linha de palavras: é perfeitamente possível ao órgão de assessoramento e consultoria jurídica deste Ministério, elaborar parecer que sirva de fundamento jurídico para que o Ministro da Fazenda, no exercício do seu poder hierárquico, exerça o controle administrativo sobre quaisquer órgãos subordinados ou vinculados à Pasta.

12. Enfim, o parecer da PGFN, aprovado pelo Ministro da Fazenda, fixa a interpretação jurídica no âmbito no Ministério, e deve ser uniformemente seguido pelos órgãos e entidades autônomos e entes vinculados (LC nº 73, art. 13). Este, portanto, é objetivo precípuo do presente trabalho.

13. O ponto basilar da questão submetida a exame é: quando a tributação for definitiva na fonte, e esta estiver impedida de reter e recolher o tributo por causa de uma decisão judicial, a quem cabe recolher o tributo? própria fonte, ao contribuinte ou a ambos?

14. Essa questão torna-se ainda mais instigante quando a fonte não recolhe, não por vontade própria, mas, sim, por determinação do próprio Estado, que se manifestou por intermédio do Poder Judiciário. Assim, têm-se, em princípio, conflito entre o Estado-fisco, que quer receber o crédito tributário, e o Estado-juiz, que impede a fonte pagadora de cumprir sua obrigação, qual seja, a de reter e repassar o tributo.

15. O Código Tributário Nacional, em seu art. 121 assim dispõe:

"Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.

Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua respectivo fato gerador;

II - responsável quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei." (destacouse).

O responsável, portanto, mesmo sem revestir a condição de contribuinte, constitui-se em sujeito passivo, nos casos em que a lei expressamente previr. Isto ocorre, também, nas hipóteses sujeitas à tributação na fonte.

16. Diz o art. 45 do CTN

"Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o art. 43 sem prejuízo de atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos tributáveis.

Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam." (grifo nosso)

17. Com efeito, o contribuinte do imposto de renda é o beneficiário da renda ou dos proventos que lei sujeitar à tributação. Todavia, a lei pode atribuir a condição de sujeito passivo (responsável) a quem não reveste a condição de contribuinte e o parágrafo único do art. 45 do CTN confirma a possibilidade de se atribuir à fonte pagadora, a condição de responsável pelo respectivo imposto.

18. Essa regra está reproduzida no regulamento do imposto de renda (Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999), que prevê a submissão de determinadas rendas ao regime de exclusividade da fonte.

19. Assim, resta comprovada a possibilidade de a fonte pagadora figurar como responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam. Mas, quando a fonte fica impedida de reter e recolher o tributo por uma decisão judicial, sempre sobrará ao Estado a possibilidade de autuar o contribuinte.

20. Do contrário, criar-se-ia a absurda situação de um órgão do Estado (o Fisco) desafiar um outro órgão do Estado (o Poder Judiciário). Assim, quando a fonte ficar impedida por decisão judicial, é evidente que o Fisco não pode autuá-la; todavia, é evidente também que o Estado não pode ficar sem receber um crédito fiscal líquido e certo. Nesse caso, o que fazer? A resposta já parece ser intuitiva: autuar o contribuinte.

21. Nem se diga que, na hipótese de decisão judicial impeditiva da retenção na fonte, seria necessário disposição expressa de lei para autuar o contribuinte. Em absoluto. Tornar a fonte responsável pelo tributo, por uma questão de omitmização da arrecadação tributária, não tem o condão de afastar o princípio básico do direito tributário estapado no art. 121 do CTN de que sujeito passivo da obrigação tributária, por excelência, é quem pratica o fato gerador; portanto, na impossibilidade legal de se autuar o responsável, a fonte, que se autue o contribuinte.

22. Com efeito, sustentar tese contrária é ferir de morte os princípios da moralidade e da razoabilidade que devem pautar a ação pública. Ora, não é razoável o Estado exigir o cumprimento de uma obrigação que o próprio Estado proibiu fosse cumprida. Não se pode olvidar que, para a parte (no caso, a fonte pagadora), a decisão judicial tem força de lei, portanto, afastou, para o caso concreto, ainda que temporariamente a eficácia da lei que impõe a obrigação. Destarte, seria irracional a sanção estatal que impusesse ônus pelo cumprimento da decisão judicial.

23. Por fim, seria imoral o Estado que impediu o administrado de cumprir sua obrigação, no momento em que esse cumprimento era possível, transferir a responsabilidade pela arrecadação do tributo não retido, impondo-lhe os ônus, manifestamente ilegais: o primeiro, pagar o tributo devido pelo contribuinte, não retido por ordem estatal; o segundo, ainda ter de cobrar, provavelmente no próprio Judiciário, o "tributo" que era devido pelo contribuinte beneficiário da decisão. Ora, isso, efetivamente, não se coaduna com o princípio da moralidade administrativa.

24. Enfim, é de concluir que, havendo decisão judicial impeditiva da retenção do tributo pela fonte pagadora, mesmo se tratando de tributação definitiva, a Administração Tributária pode e deve autuar o contribuinte, não só porque tal procedimento encontra fulcro na legalidade tributária nacional, como, também, porque se conforma plenamente aos princípios da moralidade e da razoabilidade. Este é o parecer que submetemos à consideração superior.

Coordenação-Geral de Assuntos Tributários,
em 18 de setembro de 2002.

MANOEL FELIPE REGO BRANDÃO
Coordenador-Geral de Assuntos Tributários

De acordo. Encaminhe-se ao Procurador-Geral da Fazenda Nacional.

Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional,
em 18 de setembro de 2002.

DITIMAR SOUSA BRITO
Procurador-Geral Adjunto da Fazenda Nacional

Aprovo. Submeta-se à consideração superior do Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado da Fazenda, sugerindo-se a aprovação do presente Parecer.

Após a aprovação do Senhor Ministro, encaminhe-se cópias às unidades da PGFN e à Secretaria da Receita Federal.

Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional,
em 18 de setembro de 2002.

ALMIR MARTINS BASTOS
Procurador-Geral da Fazenda Nacional

DESPACHO DO MINISTRO

Em 18 de setembro de 2002

Assunto: Responsabilidade tributária em casos de tributação definitiva na fonte. Quando as rendas forem tributadas sob o regime de exclusividade de fonte, e esta estiver impedida de fazer a retenção por decisão judicial, a responsabilidade tributária desta não afasta a do contribuinte pelo pagamento do crédito tributário.

Despacho: Aprovo o Parecer PGFN/CAT/Nº 2998, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, cuja conclusão foi no sentido de que havendo decisão judicial impeditiva da retenção do tributo pela fonte pagadora, mesmo se tratando de tributação definitiva, a Administração Tributária pode e deve autuar o contribuinte, não só porque tal procedimento encontra fulcro na legalidade tributária nacional, como, também, porque se conforma plenamente aos princípios da moralidade e da razoabilidade.

PEDRO SAMPAIO MALAN