Parecer CJ/MPS nº 2.968 de 24/02/2003

Norma Federal - Publicado no DO em 26 fev 2003

Dispõe sobre a representação no âmbito do CNAS.

Assunto: Arquivamento de Representação pelo CNAS.

Ementa: Direito Assistencial. Representação Fiscal. Interpretação do § 2º art. 7º do Decreto nº 2.536/98.

1. A competência para representar ao CNAS sobre irregularidades praticadas por entidades beneficentes que ensejam o cancelamento do CEBAS é conferida ao órgão genericamente, cuja autoridade administrativa competente para a prática do ato deverá ser definida no seu Regimento Interno.

2. A representação trata-se de uma denúncia e não tem forma predeterminada em norma legal.

3. Revogação do Parecer/CJ nº 2.875/2002.

Cuida o presente parecer da questão atinente à representação fiscal encaminhada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS, com o intuito de denunciar irregularidades que ensejam o cancelamento do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social - CEBAS, prevista no § 2º do art. 7º do Decreto nº 2.536, de 6 de abril de 1998.

2. O ato de representar contra entidades beneficente de assistência social junto ao CNAS constitui um ato administrativo. No âmbito do direito, é sabido que o ato administrativo, para ser válido, deve cumprir os requisitos de competência, finalidade, forma, motivo e objeto.

3. Vejamos então o que dispõe o § 2º do art. 7º do Decreto nº 2.536, de 6 de abril de 1998:

Art. 7º (...)

§ 2º Qualquer Conselheiro do CNAS, os órgãos específicos dos Ministérios da Justiça e da Previdência e Assistência Social, o INSS, a Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda ou o Ministério Público poderão representar àquele Conselho sobre o descumprimento das condições e requisitos previstos nos arts. 2º e 3º, indicando os fatos, com suas circunstâncias, o fundamento legal e as provas ou, quando for o caso, a indicação de onde estas possam ser obtidas, sendo observado o seguinte procedimento:

I - recebida a representação, será designado relator, que notificará a empresa sobre o seu inteiro teor;

II - notificada, a entidade terá o prazo de trinta dias para apresentação de defesa e produção de provas;

III - apresentada a defesa ou decorrido o prazo sem manifestação da parte interessada, o relator, em quinze dias, proferirá seu voto, salvo se considerar indispensável a realização de diligências;

IV - havendo determinação de diligências, o relator proferirá o seu voto em quinze dias pós a sua realização;

V - O CNAS deliberará acerca do cancelamento do Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos até a primeira sessão seguinte à apresentação do voto do relator, não cabendo pedido de reconsideração;

VI - da decisão poderá a entidade interessada ou o INSS interpor recurso ao Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social no prazo de trinta dias, contados da data de publicação do ato no Diário Oficial da União.

4. Da transcrição supra, percebe-se que motivo e o objeto da representação vêm previstos na norma legal, qual seja, levar ao conhecimento do CNAS as irregularidades praticadas pela entidade, então não verificadas no momento da concessão do CEBAS (motivo), para que o Conselho cancele o certificado (objeto), confirmado o não cumprimento dos requisitos necessários para sua concessão.

5. Quanto ao requisito da forma, percebe-se que a norma legal não exige a utilização de um instrumento específico predeterminado, o que nos leva ao entendimento de que incide, no caso, o princípio da instrumentalidade das formas, nos termos do art. 22 da Lei nº 9.784/99, que dispõe: "Os atos do processo administrativo não dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir".

6. Nesse diapasão, a denominação do instrumento formal utilizado pelo INSS para denunciar irregularidades verificadas em entidades beneficentes que implicam no cancelamento do CEBAS é por demais irrelevante. Entende-se exagerado formalismo exigir que a denúncia seja rigorosamente feita mediante Representação Fiscal, e atribuir nulidade àquela que assim não seja apresentada ou denominada. A nomenclatura utilizada não tem importância categórica, mas sim os fatos contidos na representação.

7. Entende-se que a expressão "representar", no atual contexto, significa "levar ao conhecimento" sem se preocupar com o rigorismo formalista, sendo o bastante que essa informação contenha os fatos, com suas circunstâncias, o fundamento legal e as provas ou, quando for o caso, a indicação de onde estas possam ser obtidas.

8. Depreende-se também que a norma legal não estabeleceu procedimento próprio para a denúncia de irregularidades, se deste ou daquele modo, portanto, subtraindo-se o rigorismo da forma, não pode o CNAS deixar de conhecer e arquivar denúncias de irregularidades pelo simples fato de não utilizarem a nomenclatura "Representação".

9. Temos ainda a considerar que não é condição sine qua non da representação que a mesma contenha expressamente um pedido. A denúncia ou representação presta-se a levar ao conhecimento do CNAS fatos tidos como irregulares. Cabe a este apurá-los e, se for o caso, cancelar o CEBAS.

10. Além do mais, o § 2º do art. 7º do Decreto nº 2.536, de 1998, acima transcrito, exige apenas que a pessoa ou órgão competente para representar indique tão-somente os fatos, com suas circunstâncias, o fundamento legal e as provas ou, quando for o caso, a indicação de onde estas possam ser obtidas. Conclui-se, portanto, que o pedido expresso de cancelamento é dispensável, uma vez que, comprovada as irregularidades na concessão do CEBAS a providência de cancelamento deve ser praticada de ofício pelo CNAS.

11. Quanto ao requisito da finalidade, este já foi exposto anteriormente, pois a representação visa levar ao conhecimento do CNAS fatos tidos como irregulares, praticados pelas entidades beneficentes de assistência social, não detectados no momento da concessão do CEBAS.

12. Quanto à questão da competência, que entendemos a mais tormentosa, temos que voltar à redação do Decreto para melhor interpretação:

Art. 7º (...)

§ 2º Qualquer Conselheiro do CNAS, os órgãos específicos dos Ministérios da Justiça e da Previdência e Assistência Social, o INSS, a Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda ou o Ministério Público poderão representar àquele Conselho sobre o descumprimento das condições e requisitos previstos nos arts. 2º e 3º.

13. A norma confere legitimidade para apresentar denúncia ao CNAS, contra as entidades beneficentes de assistência social portadoras do CEBAS, a determinadas pessoas e entidades, a saber: os Conselheiros do CNAS, órgãos específicos do Ministério da Justiça, órgãos específicos do Ministério da Previdência e Assistência Social, o INSS, a Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda e o Ministério Público.

14. Neste particular, com exclusão dos Conselheiros do CNAS e do Ministério Público, onde todos os seus membros são representantes da instituição, discute-se quem tem legitimidade, dentro de cada órgão, para encaminhar a denúncia ao CNAS.

15. Os mais afoitos poderiam dizer que a competência e a autoridade para falar em nome do órgão é do seu dirigente máximo, como ocorreu outrora com esta Consultoria Jurídica, na elaboração do Parecer/CJ/nº 2.875/2002, que concluiu que, com o advento do Decreto nº 2.536, de 1998, a representação do INSS, com o intuito de cancelar o CEBAS, deve ser formalizada pelo seu Diretor-Presidente, bem como com o Excelentíssimo Senhor Ministro da Previdência ao baixar as Portarias MPAS nº 3.596, de 6 de novembro de 2001, e nº 3.563, de 30 de outubro de 2001.

16. Entretanto, numa análise mais profunda, percebe-se que o Decreto nº 2.536, de 1998, confere a competência para representar ao CNAS, ao INSS, aos órgãos específicos do Ministério da Previdência, aos órgãos específicos do Ministério da Justiça e à Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.

17. Como se trata de competência conferida ao órgão genericamente, a questão sobre qual a autoridade competente para praticar o ato torna-se matéria de trato interno; portanto, a distribuição de competências deve ser realizada pelo regimento interno de cada órgão, ao qual cabe dizer quem é a autoridade ou quem são as autoridades competentes para a prática daquele ato específico, para melhor desempenho de suas atividades.

18. Na hipótese de ser silente o regimento interno dos referidos órgãos, a competência conferida genericamente ao órgão concentrar-se-á na pessoa do seu representante legal, ou seja, do dirigente máximo, que é a autoridade automaticamente legitimada para manifestar-se em nome do órgão. Todavia, esta competência, até que seja inserida no regimento interno, pode ser objeto de delegação a outras autoridades administrativas do órgão, nos termos do Decreto-Lei nº 200, de 25.02.1967, regulamentado pelo Decreto nº 83.937, de 6 de setembro de 1979, ainda vigente.

19. Confirmando a exegese aqui apresentada, caso o Decreto nº 2.536, de 1998, pretendesse concentrar a competência e a legitimidade em determinada pessoa, o teria feito expressamente, como o fez em relação aos Conselheiros do CNAS. Portanto, o dispositivo não pode ser interpretado restritivamente, de forma a concluir que a competência para denunciar irregularidades ao CNAS é exclusiva do dirigente do órgão.

20. De outro lado, foge das atribuições do CNAS e extrapola sua competência definir qual a autoridade administrativa que representa outros órgãos ou a autoridade legitimada para apresentar-lhe denúncias de irregularidades praticadas pelas entidades beneficentes, pois a prática deste ato administrativo encontra-se na esfera de competência de outro órgão.

21. Em obediência ao princípio da legalidade e moralidade administrativa os Conselheiros, tendo conhecimento das irregularidades praticadas pelas entidades beneficentes, têm o dever legal e moral de apurá-las, de ofício, em processo próprio e, se restarem comprovadas, aquele conselho tem a obrigação de cancelar o CEBAS respectivo.

22. Ante o exposto, esta Consultoria Jurídica entende que a representação de que trata o § 2º do art. 7º do Decreto nº 2.536/98:

a) trata-se de uma denúncia e não tem forma predeterminada em lei, bem como não se exige pedido expresso de cancelamento de CEBAS, por constituir dever, de ofício, do CNAS;

b) a autoridade competente para apresentá-la ao CNAS é aquela prevista no regimento interno dos órgãos legitimados e, na inexistência de previsão regimental, a competência concentra-se na pessoa do dirigente máximo do órgão, o qual poderá delegá-la às demais autoridades;

23. Nesta ocasião, esta Consultoria Jurídica reconhece o erro de interpretação constante do Parecer/CJ/nº 2.875/2002, razão pela qual o referido parecer fica revogado e sem efeito, devendo o processo que o originou, no qual figura como interessa a entidade Sociedade Paranaense de Cultura, ser desarquivado e submetido ao julgamento do mérito pelo CNAS.

24. Em razão do presente parecer, o CNAS fica obrigado a rever todos os processos em que não conheceu a denúncia ou em que decidiu pelo arquivamento da representação sem a análise do mérito.

À consideração superior.

Brasília, 24 de fevereiro de 2003.

IDERVÂNIO DA SILVA COSTA

Advogado da União

Coordenador da 3ª Coord. da CJ/MPS

Aprovo.

À consideração do Senhor Ministro, para fins do disposto no art. 42, da Lei Complementar nº 73, de 1993.

Brasília, 24 de fevereiro de 2003.

JEFFERSON CARÚS GUEDES

Consultor Jurídico

Aprovo. Publique-se

RICARDO BERZOINI