Parecer CJ nº 2.549 de 23/08/2001

Norma Federal

Conversão de tempo de serviço para fins de contagem recíproca

ASSUNTO: Conversão de tempo de serviço para fins de contagem recíproca.

EMENTA: Direito Constitucional e Previdenciário. Trabalho sujeito a condições especiais. Conversão do Tempo de Serviço para fins de contagem recíproca. Impossibilidade. Vedação constitucional e legal ( § 9º do art. 201 da CF de 1988 c/c o art. 96, inciso I, da Lei nº 8.213, de 1991 ). Precedente do Supremo Tribunal Federal.

1. A contagem recíproca referida no § 9º do art. 201 da Constituição Federal de 1988 é feita em relação às contribuições efetuadas pelo segurado junto aos diversos regimes de previdência que este tenha se filiado.

2. O tempo fictício de serviço não está contemplado no instituto da contagem recíproca prescrito no texto constitucional.

I - RELATÓRIO

1. Trata-se de consulta manifestada junto a esta Consultoria Jurídica pelo i. Diretor do Departamento do Regime Geral de Previdência Social, no sentido de se analisar a possibilidade de emissão de Certidão de Tempo de Contribuição, com conversão do tempo de serviço exercido sob condições especiais em comum. Dito de outra forma, indaga aquele órgão se é cabível a conversão do tempo de atividade especial em tempo de atividade comum, para fins da contagem recíproca estatuída no § 9º do art. 201 da Constituição Federal de 1988 .

2. Consoante se infere dos autos há divergência de entendimentos entre a Secretaria de Previdência Social - SPS e o Conselho de Recursos da Previdência Social - CRPS quanto à aplicação da legislação previdenciária que regula a matéria em questão.

3. Segundo o r. Conselho de Recursos da Previdência Social é cabível a conversão do tempo de atividade especial em comum, para quaisquer fins previdenciários, inclusive a obtenção de certidão de tempo de contribuição perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

4. Já a conclusão da i. Secretaria de Previdência Social é no sentido de que o tempo de serviço fictício não está contemplado no instituto da contagem recíproca, motivo pelo qual não há que se falar em conversão de tempo de serviço especial em comum quando da expedição da certidão de tempo de contribuição respectiva.

5. É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

6. A regra inserta no § 9º do art. 201 da Constituição Federal de 1988 (que repete a redação do antigo § 2º do art. 202), estabelece o seguinte:

"§ 9º Para efeito de aposentadoria é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei." (grifamos)

7. Exsurge cristalino do preceito retro-transcrito que a contagem recíproca é feita tão-somente em relação às contribuições efetuadas pelo segurado junto aos diversos regimes de previdência social que porventura tenha este participado.

8. Ao regular a matéria em foco, a Lei nº 8.213, de 1991 , dispôs que:

" Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:

I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;

..." (grifos nossos)

9. Daí, tem-se - de forma expressa - que a conversão do tempo de serviço exercido em atividade sujeita a condições especiais não pode ser admitida para fins da contagem recíproca do tempo de serviço, em consonância com o que determina o texto constitucional, pois este exige a efetiva contribuição do segurado.

10. É certo que a conversão do tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum está prevista no âmbito do Regime Geral de Previdência Social, conforme se infere do art. 70, parágrafo único, do Regulamento de Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 1999 .

11. Ocorre que, a regra em apreço é aplicável apenas para os segurados que tiveram suas atividades reconhecidas como sujeitas a condições especiais no âmbito do Regime Geral de Previdência Social e requeiram junto a este os benefícios de prestação continuada ali previstos.

12. Destarte, o fato da atividade do segurado se enquadrar como "especial" - segundo as regras do Regime Geral de Previdência Social - não lhe garante a conversão de tempo de serviço trabalhado em condições especiais em comum, para fins de requerimento de aposentadoria por tempo de serviço em outro regime.

13. Não se pode descurar que a contagem recíproca do tempo de contribuição pressupõe a compensação financeira entre os diversos regimes de previdência a que o segurado esteve filiado. Por isso, o tempo fictício de serviço não está contemplado no instituto da contagem recíproca prescrito no texto constitucional.

14. Importante anotar que no serviço público inexiste aposentadoria especial, com redução ou conversão de tempo de serviço.

15. Note-se que a Certidão de Tempo de Contribuição constitui-se num certificado do qual se extrai o efetivo exercício de atividade vinculada ao Regime Geral de Previdência Social e respectiva contribuição.

16. Com o fito de corroborar esse entendimento, transcreve-se, a seguir, trecho do voto do Relator exarado nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1664-4/DF: "(...)

Começo, nesse ponto, por observar que a contagem instituída pelo § 2º do art. 202 da Constituição (e para a qual expressamente exige esta a compensação financeira e a contribuição) tem, como pólos da reciprocidade, de um lado, a administração pública, de outro, a atividade privada, aqui compreendidas tanto a rural como a urbana. Foi o que já ficou, aliás, muito bem esclarecido pela Segunda Turma do Supremo Tribunal, em acórdão de que foi relator o eminente Ministro Marco Aurélio:

'Aposentadoria - Tempo de serviço - Rural e Urbana - Somatório. A regra da reciprocidade prevista no § 2º do art. 202 da Constituição Federal é restrita ao tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada. A referência às espécies rural e urbana informa a abrangência nesta última. A seguridade social com a universalidade da cobertura e do atendimento, bem como a alcançar a uniformização e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais resulta do teor do art. 194 , submetendo-se tais princípios ao que previsto nos arts. 195, § 5º , e 59 , os dois primeiros do corpo permanente da Lei Básica Federal e o último das Disposições Transitórias. A aposentadoria na atividade urbana mediante a junção do tempo de serviço rural somente é devida a partir de 5 de abril de 1991, isto por força do disposto no art. 145 da Lei nº 8.213, de 1991 , e na Lei nº 8.212/91 , no que implicaram a modificação, estritamente legal, do quadro decorrente da Consolidação das Leis da Previdência Social - Decreto nº 89.312, de 23 de janeiro de 1984.' (RE 162620 RTJ 158/243).

Dessas premissas, parece lícito extrair que, para a contagem recíproca corretamente dita, isto é, aquela que soma o tempo de serviço público ao de atividade privada, não pode ser dispensada a prova de contribuição, pouco importando - diante desse explícito requisito constitucional - que de contribuir, houvesse sido, no passado, dispensada determinada categoria profissional, assim limitada, bem ou mal, quanto ao benefício de reciprocidade pela ressalva estatuída na própria Constituição." (grifos nossos)

ADIn nº 1.664-0, J. em 13.11.1997, Tribunal Pleno, Relator: Ministro Octávio Gallotti, decisão unânime, publicada no DJ de 19.12.1997, p. 0041.

17. Deste precedente do Supremo Tribunal Federal destaca-se que a regra da contagem recíproca inserta no § 2º do art. 202 da Constituição Federal de 1988 é restrita ao tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada. Dito de outra forma, o tempo de serviço fictício considerado como tempo de contribuição por um regime previdenciário, não pode ser aproveitado para efeito da contagem recíproca assegurada pelo texto constitucional.

III - CONCLUSÃO

18. À vista de todo o exposto pode-se concluir que:

a) a contagem recíproca referida no § 9º do art. 201 da Constituição Federal de 1988 (que repete a redação do antigo § 2º do art. 202 ), é feita em relação às contribuições efetuadas pelo segurado junto aos diversos regimes de previdência social que porventura tenha este participado;

b) a conversão do tempo de serviço exercido em atividade sujeita a condições especiais não pode ser admitida para fins de contagem recíproca do tempo de serviço, vez que o preceito constitucional correspondente pressupõe a contribuição e compensação financeira entre os diversos regimes de previdência social;

c) o tempo fictício de serviço não está contemplado no instituto da contagem recíproca prescrito no texto constitucional, consoante o entendimento do Supremo Tribunal Federal;

d) as regras que autorizam a conversão do tempo de atividade especial em comum, no âmbito do Regime Geral de Previdência Social, aplicam-se tão-somente aos segurados que tiveram suas atividades reconhecidas como sujeitas a condições especiais, nos termos da legislação respectiva, e requeiram - junto a este sistema previdenciário - os benefícios de prestação continuada nele previstos.

É o que nos parece, sub censura.

Brasília-DF, 23 de agosto de 2001.

PEDRO HUMBERTO CARVALHO VIEIRA

Assistente Jurídico da AGU

De acordo.

À consideração do Senhor Consultor Jurídico.

Brasília-DF, 23 de agosto de 2001.

CARLOS AUGUSTO VALENZA DINIZ

3º Coordenador de Consultoria Jurídica

Aprovo.

À consideração do Senhor Ministro, para fins do art. 42 da Lei Complementar nº 73, de 1993 .

Brasília, 23 de agosto de 2001.

ANTÔNIO GLAUCIUS DE MORAIS

Consultor Jurídico

Aprovo. Publique-se. Ao INSS para as providências de sua alçada.