Parecer GEOT/ECONOMIA nº 25 DE 01/02/2024
Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 01 fev 2024
Consulta da Superintendência de Recuperação de Créditos (SRC) sobre aplicação em massa em processos administrativos tributários exequíveis do limitador de penalidade previsto no § 11 do art. 71 Código Tributário do Estado de Goiás.
I –RELATÓRIO
(...), expõe para ao final consultar o seguinte:
“Como aventado em reuniões, tem chegado com frequência a esta superintendência requerimento da PGE no sentido de analisar a possibilidade de aplicar os limitadores do inciso II do parágrafo 11 do art.71 da Lei 11.651/91 em PATs que estão sendo objeto execução fiscal. Diante disto, e seguindo orientação de Vossa Senhoria, o objetivo deste é abrir consulta à GEOT com os seguintes quesitos:
1) A Superintendência de Recuperação de Crédito tem competência para aplicar tal dispositivo?
2) Caso positivo, considerando que se tratam de PATs já julgados, que as questões de mérito destes já se encontram peremptas ou superadas, que há impossibilidade operacional de se determinar a operação, prestação, mercadoria ou serviço correspondente a cada lançamanento; poderia esta superintendência, ao aplicar o dispositivo em massa, considerar tão somente a alínea “b” para todos os PATs aplicáveis que ainda não sofreram tal limitação no CAT”?
II - FUNDAMENTAÇÃO
A questão abordada (...) diz respeito à norma constante do § 11 do art. 71 da Lei nº 11.651/91 – CTE, cuja redação é a seguinte:
"Art. 71. Serão aplicadas as seguintes multas:
(...)
§ 11. Nas infrações previstas neste artigo cujo valor da multa seja obtido por meio da aplicação de percentual sobre o valor da operação, prestação, mercadoria ou serviço, deve ser observado o seguinte, sem prejuízo do disposto nos §§ 8° e 9°: (Redação acrescida pela Lei nº 19.965 - vigência: 16.01.18)
I - se a penalidade for aplicada de forma conjunta com o imposto, o valor da multa fica limitado ao valor do imposto;
II - se a penalidade for aplicada isoladamente, o valor da multa fica limitado ao valor obtido pela aplicação:
a) da alíquota prevista para a operação, prestação, mercadoria ou serviço, sem considerar benefício fiscal porventura aplicável;
b) do percentual de 12% (doze por cento), na impossibilidade de se determinar a operação, prestação, mercadoria ou serviço correspondentes ao lançamento".
De imediato, depreende-se da leitura do dispositivo legal em apreço, que a partir de 16/01/2018, data de início de sua vigência, para todo novo auto de infração lavrado a partir desta data deve ser observada automaticamente essa limitação da penalidade imposta pelo § 11 do art. 71 do CTE, pois há a determinação de sua aplicação, alcançando as autoridades fiscais no ato do lançamento do crédito tributário.
Entretanto, para os autos de infração lavrados anteriormente à data de 16/01/2018, onde essa norma não estava em vigência, e logo, não havia a obrigatoriedade de sua aplicação pela autoridade fiscal no exercício de sua competência de lançar o crédito tributário, sua observância remete-nos à leitura do disposto no art. 106, inciso II, alínea “c” da Lei nº 5.172/66 – CTN, que transcrevemos a seguir para clareza desta orientação:
"Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
(...)
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
(...)
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vigente ao tempo da sua prática".
O CTN determina a aplicação retroativa da penalidade mais benéfica ao sujeito passivo, e a limitação da penalidade a um patamar inferior ao constante dos incisos do art. 71 do CTE desagua necessariamente na aplicação de uma penalidade mais benéfica, o que decorre de lógica elementar.
Contudo, o CTN estabelece uma restrição ao ressaltar que a penalidade mais benéfica será aplicada ao ato não definitivamente julgado, incumbindo-nos debruçar sobre tal expressão para realizar sua interpretação clareando seu alcance e aplicação.
Nesse sentido, atentemo-nos ao que preleciona a doutrina pátria sobre tal expressão do CTN. A propósito, a abalizada obra de "SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 8. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018. p. 836", assim se manifesta:
“Que dizer, entretanto, do lançamento não impugnado, ou da decisão administrativa definitiva? Num e noutro caso, em matéria administrativa, ter-se-á um ato final, que permitirá a inscrição do crédito na dívida ativa.
Isso não significa que o sujeito passivo não possa continuar a discutir o tema, já que o acesso ao Poder Judiciário lhe é assegurado constitucionalmente.
Poderá ele propor ação anulatória ou, mesmo, embargos à Execução. Diante de tal possibilidade, não há como considerar esteja "definitivamente julgado" o ato.
Aliás, o próprio Código Tributário Nacional, em diversas ocasiões, reserva a expressão "julgado" para se referir à decisão judicial, não à administrativa. Assim é que o artigo 156, ao versar sobre as hipóteses de extinção do crédito tributário, prevê, em seu inciso X, a decisão judicial passada em julgado. O artigo 168 é ainda mais explícito na diferenciação, já que fala em "tornar definitiva a decisão administrativa" e "passar em julgado a decisão judicial", evidenciando que a expressão "julgado" só se aplica ao último caso.
Assim, até que haja decisão judicial final, a sobreveniência de lei tributária penal mais benéfica poderá aproveitar ao sujeito passivo”.
A avaliação quanto ao significado da expressão "ato não definitivamente julgado", presente no inciso II do artigo 106 do Código Tributário Nacional, também foi realizada no Parecer PGFN/CAT/CDA nº 1.961/2008, cujo trecho vale a transcrição:
“É certo que o “ato não definitivamente julgado”, necessariamente, implica que ainda haveria um novo julgamento; pressupõe, portanto, a pendência de uma decisão judicial. Em outras palavras, o “ato não definitivamente julgado” consiste no ato sobre o qual incida “decisão judicial de que já não caiba recurso” – o que, aliás, corresponde ao conceito legal de coisa julgada plasmado no §3º do artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil”.
Portanto, da interpretação do disposto no art. 106, inciso II, alínea “c” do CTN, depreende-se, inconteste pela doutrina brasileira, que a penalidade mais benéfica ao sujeito passivo que exsurge do diploma legal deverá ser aplicada a atos pretéritos nos casos em que ainda não houve superveniência de decisão judicial definitiva, sendo que a decisão definitiva administrativa não é limitadora de tal conclusão, posto que sua finalidade restringe-se apenas à inscrição do crédito tributário em dívida ativa, não pondo fim à discussão do crédito tributário em definitivo, pois que este sempre poderá ser objeto de apreciação pelo Judiciário, ao qual compete a decisão definitiva sobre a procedência total, parcial, ou improcedência do crédito tributário.
Conclui-se, logo, que a Superintendência de Recuperação de Créditos – SRC poderá aplicar a limitação da penalidade do § 11 do art. 71 do CTE a todo o estoque da dívida ativa, em relação aos processos não submetidos à decisão final do Poder Judiciário.
Por outro lado, quanto ao segundo questionamento, que diz respeito à aplicação da alínea “b” do inciso II do § 11 do art. 71 do CTE, necessário se faz o entendimento sobre a possibilidade de submissão dos autos à apreciação da autoridade fiscal, após o trâmite final no Contencioso fiscal, ou sua não impugnação, que reflete o mesmo resultado.
Nesse sentido, devemos observar atentamente o que dispõe os arts. 23, 24 e 25 da Lei nº 16.469/09, que transcrevemos a seguir para clareza da nossa manifestação. Veja-se:
"Art. 23. São definitivas, na esfera administrativa, as decisões que não possam ser objeto de defesa.
Art. 24. São exeqüíveis os créditos tributários decorrentes:
I - da Notificação de Lançamento ou do Auto de Infração com característica de não contenciosidade que:
a) não foi objeto de pedido de descaracterização de não contenciosidade;
b) teve o pedido de descaracterização de não contenciosidade inadmitido pelo Julgador de Primeira Instância;
II - do Auto de Infração que não foi objeto de impugnação:
a) em instância única;
b) em segunda instância;
III - da decisão condenatória, no caso de instância única;
IV - da decisão em primeira instância condenatória recorrível, quando não apresentado recurso voluntário no prazo legal;
V - da decisão cameral condenatória não recorrida para o Conselho Superior no prazo legal;
VI - da decisão condenatória proferida pelo Conselho Superior.
Art. 25. O crédito tributário exeqüível, esgotado o prazo para pagamento, deve ser inscrito em dívida ativa".
Depreende-se da leitura dos dispositivos legais retrotranscritos, que após a lavratura do auto de infração ou Notificação de Lançamento, e não sendo impugnado ou objeto de recurso, ou sendo impugnado ou objeto de recurso sobrevenha decisão definitiva no Conselho Administrativo Tributário do Estado de Goiás, o crédito tributário torna-se definitivo, devendo ser inscrito em dívida ativa, esgotado o prazo para pagamento.
Traduz-se tal imperativo legal na impossibilidade de determinação de novas diligências após a constituição definitiva do crédito tributário, para determinação do valor exiquível, ou seja, a penalidade não poderá mais ser revista, posto que definitiva. Somente o Poder Judiciário terá atribuição para retificar o lançamento do crédito tributário, após a constituição definitiva na esfera administrativa.
Nesse pormenor, sobressai-se a determinação da alínea “b” do inciso II do § 11 do art. 71 do CTE. Isso significa que dada a impossibilidade material de determinação da alíquota própria para cálculo da limitação da penalidade, deve-se aplicar o percentual de 12% (doze por cento), na impossibilidade de se determinar a operação, prestação, mercadoria ou serviço correspondentes ao lançamento, por consequência.
Trata-se de aplicação da penalidade mais benéfica ao sujeito passivo no âmbito administrativo, à vista da impossibilidade de conversão dos autos em diligência para essa determinação específica, visto que a Superintendência de Recuperação de Créditos – SRC não é contemplada pela legislação processual com a competência para a conversão de processo, definitivamente julgado em instância administrativa, em diligência para eventuais adequações do quantum devido.
Portanto, plenamente pertinente a conclusão no sentido de que a SRC pode proceder à aplicação da limitação da penalidade que, sendo mais benéfica ao sujeito passivo, deve retroagir enquanto não sobrevier decisão definitiva na esfera judicial, e à vista da impossibilidade de determinação da operação, prestação, mercadoria ou serviço, deve-se, em qualquer caso, proceder à limitação da penalidade conforme previsto na alínea “b” do inciso II do § 11 do art. 71 do CTE, ou seja, 12% (doze por cento), ressalvados, entretanto, os processos em que a limitação da penalidade tenha sido objeto de apreciação e julgamento no Conselho Administrativo Tributário.
III – CONCLUSÃO
Posto isso, concluímos orientando a Superintendência de Recuperação de Créditos – SRC nos seguintes termos, conforme cada questionamento formulado no requerimento de consulta:
QUESTIONAMENTO 1) A Superintendência de Recuperação de Crédito tem competência para aplicar tal dispositivo [§ 11 do art. 71 do CTE]?
RESPOSTA: Sim, a SRC deve aplicar o limitador do § 11 do art. 71 do CTE ao estoque de processos administrativos tributários, inscritos ou não em dívida ativa, em fase de execução fiscal ou não, presentes naquela repartição fazendária, considerando que a partir de 16/01/2018 tornou-se obrigatória para toda nova autuação e, para autuações anteriores a 16/01/2018, face ao disposto na alínea “c” do inciso II do art. 106 do CTN, que determina a aplicação retroativa da penalidade mais benéfica ao sujeito passivo enquanto não sobrevier decisão definitiva do ato na esfera Judicial.
QUESTIONAMENTO 2) Caso positivo, considerando que se tratam de PATs já julgados, que as questões de mérito destes já se encontram peremptas ou superadas, que há impossibilidade operacional de se determinar a operação, prestação, mercadoria ou serviço correspondente a cada lançamanento; poderia esta superintendência, ao aplicar o dispositivo em massa, considerar tão somente a alínea “b” para todos os PATs aplicáveis que ainda não sofreram tal limitação no CAT”?
RESPOSTA: Sim, plenamente pertinente a conclusão no sentido de que a SRC pode proceder à aplicação da limitação da penalidade que, sendo mais benéfica ao sujeito passivo, deve retroagir enquanto não sobrevier decisão definitiva na esfera judicial, e à vista da impossibilidade material de determinação da operação, prestação, mercadoria ou serviço, diante da inviabilidade de conversão dos autos em diligência com vistas à adequação do quantum devido, deve-se, em qualquer hipótese, proceder à limitação da penalidade conforme previsto na alínea “b” do inciso II do § 11 do art. 71 do CTE, ou seja, 12% (doze por cento), ressalvados, entretanto, os processos em que a limitação da penalidade tenha sido objeto de apreciação e julgamento no Conselho Administrativo Tributário.
É o parecer.
GOIANIA, 01 de fevereiro de 2024.
DAVID FERNANDES DE CARVALHO
Auditor-Fiscal da Receita Estadual