Parecer CJ/MPAS nº 2.413 de 16/02/2001

Norma Federal - Publicado no DO em 16 fev 2001

Dispõe sobre a relação de trabalho entre Representante Comercial e representado.

ASSUNTO: Representante Comercial Autônomo.

EMENTA: Previdenciário. Representante Comercial Autônomo. Presentes na relação laboral entre representante e representado, a subordinação, pessoalidade e a não-eventualidade configura-se o vínculo empregatício.

Esta Consultoria Jurídica foi instada a se manifestar a respeito da relação laboral dos Representantes Comerciais Autônomos no âmbito da Previdência Social.

2. Antes, faz-se primordial realizarmos uma abordagem sobre o que é o representante comercial autônomo regido pela Lei nº 4.886, de 9 de dezembro de 1965, e o que é o empregado, tutelado pela CLT.

3. A Representação Comercial Autônoma é regida pela já mencionada Lei nº 4.886, de 1965. A referida norma traz em seu art. 1º o conceito de Representante Comercial Autônomo, como sendo a pessoa física ou jurídica, sem relação de emprego que desempenha em caráter não eventual por conta de uma ou mais pessoas, a mediação para realização de negócios mercantis, agenciando propostas ou pedidos, para, transmiti-los aos representados, praticando ou não atos relacionados com a execução dos negócios.

4. Note-se que a norma é explicita ao impor a inexistência de relação de emprego entre o representante e o representado. A inexistência de vínculo empregatício se dá quando constem do contrato de Representação Comercial Autônoma os elementos indispensáveis que a caracterizam, dispostos no art. 27 e alíneas, da Lei nº 4.886, de 1965, abaixo transcritos:

Art. 27. Do contrato de representação comercial, quando celebrado por escrito, além dos elementos comuns e outros, a juízo dos interessados, constarão, obrigatoriamente:

a) condições e requisitos gerais da representação;

b) indicação genérica ou específica dos produtos ou artigos objeto da representação;

c) prazo certo ou indeterminado da representação;

d) indicação da zona ou zonas em que será exercida a representação, bem como da permissibilidade ou não de a representada ali poder negociar diretamente;

e) garantia ou não, parcial ou total, ou por certo prazo, da exclusividade de zona ou setor de zona;

f) retribuição e época do pagamento, pelo exercício da representação, dependente da efetiva realização dos negócios, e recebimento, ou não, pelo representado, dos valores respectivos;

g) os casos em que se justifique a restrição de zona concedida com exclusividade;

h) obrigações e responsabilidades das partes contratantes;

i) exercício exclusivo ou não da representação a favor do representado;

j) indenização devida ao representante pela rescisão do contrato fora dos casos previstos no art. 34, cujo montante não será inferior a um vinte avos (1/20) do total da retribuição auferida durante o tempo em que exerceu a representação, a contar da vigência desta lei.

5. Portanto, para que um contrato seja considerado como de representação comercial, deve conter todos os elementos acima elencados sob pena de configurar o vínculo empregatício.

6. Não obstante, o representado deve atentar no sentido de que a subordinação, a não-eventualidade, a onerosidade e a pessoalidade são pressupostos da relação de emprego, e que verificada a existência destes pressupostos, mesmo que atendidos ao disposto no art. da Lei nº 4.886, de 1965, a relação entre o Representante e o Representado passará a ser trabalhista e regida pela CLT.

7. Assim a CLT no seu art. 3º define o que seja empregado.

Art. 3º Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.

8. Extrai-se, portanto, do texto acima transcrito, que o primeiro requisito para ser empregado é ser pessoa física, uma vez que a CLT tutela a pessoa física do trabalhador.

9. Ao tratar da matéria, o Professor Sérgio Pinto Martins, em sua obra Direito do Trabalho, diz que o serviço prestado pelo empregado deve ser de caráter não eventual, e o trabalho deve ser de natureza contínua, não podendo ser episódico, ocasional. Um dos requisitos do contrato de trabalho é a continuidade na prestação de serviços, pois aquele pacto e um contrato de trato sucessivo, de duração, que não se exaure numa única prestação, como ocorre com a compra e venda, em que é pago o preço e entregue a coisa. No contrato de trabalho há a habitualidade na prestação dos serviços que, na maioria das vezes, é feita diariamente, mas poderia ser de outra forma, por exemplo: bastaria que o empregado trabalhasse uma vez ou duas por semana, toda vez no mesmo horário, para caracterizar a continuidade da prestação de serviços. (p. 128, 12ª edição revista, atualizada e ampliada, Editora Atlas).

10. No que se refere a dependência ou subordinação, esta é vista como poder de direção ao qual o empregado é subordinado e dirigido. Não incidindo o poder de direção sobre o trabalhador, ou seja, se este não é dirigido por outrem têm-se o autônomo ou outro tipo de trabalhador.

11. Dessa forma podemos dizer que a subordinação é o estado de sujeição do empregado em relação ao empregador, recebendo e cumprindo ordens, e se apresenta de quatro maneiras distintas, abaixo transcritas:

a) econômica: pois o empregado dependeria economicamente do empregador. Contudo essa orientação não é precisa, pois o filho depende economicamente do pai, porém, à primeira vista, não é empregado deste último. O empregado rico não dependeria economicamente do patrão;

b) técnica: no sentido de que o empregado dependeria tecnicamente do empregador. Entretanto, verificamos que os altos empregados, executivos, não dependem do empregador, mas este depende tecnicamente daqueles;

c) hierárquica: significando a situação do trabalhador por se achar inserido no âmbito da organização da empresa, recebendo ordens;

d) jurídica: em função da situação do contrato de trabalho, em que está sujeito a receber ordens, em decorrência do poder de direção do empregador, de seu poder de comando, que é a tese mais aceita.

(MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 12. ed. Revista, Atualizada e Ampliada Ed. Jurídica Atlas. p. 129)

12. Outro requisito do contrato de trabalho, não menos importante, é a onerosidade, no qual o empregado recebe salários pela prestação de seus serviços.

13. A pessoalidade também é requisito essencial do contrato de trabalho, uma vez que este é firmado com pessoa certa, específica.

14. A principal característica portanto da relação laboral do Representante Comercial Autônomo, diferentemente do empregado, é a inexistência do vínculo empregatício entre o Representante e o Representado, que se configura com o cumprimento do disposto na Lei nº 4.886, de 1965, e também pela inexistência dos pressupostos da relação de emprego.

15. Sérgio Pinto Martins ainda ensina:

"A característica fundamental do representante comercial autônomo é sua autonomia, tanto que o art. 1º da Lei nº 4.886 prevê que não há vínculo de emprego entre as partes. O representante comercial autônomo não é dirigido ou fiscalizado pelo tomador de serviços, não tem obrigação de cumprir horário de trabalho, de produtividade mínima, de comparecer ao serviço etc. o trabalhador autônomo não tem de obedecer a ordena, de ser submisso às determinações do empregador. Age com autonomia na prestação dos serviços. O representante comercial autônomo recebe apenas diretivas, orientações ou instruções de como deve desenvolver seu trabalho, não configurando imposição ou sujeição ao tomador dos serviços, mas apenas de como tem de desenvolver seu trabalho, caso queira vender os produtos do representado." (Op. cit. p. 150/151)

16. Esta Consultoria Jurídica adotou o entendimento de descaracterizar o Contrato de Representação Comercial, quando este possuir todas as características da relação de emprego, conforme precedente Parecer CJ nº 1.083/1997.

EMENTA: Direito Tributário. Contribuição Previdenciária. A hipótese de incidência para essa exação sobre a folha de salários requer o vínculo empregatício. Entendimento pacificado na Corte Excelsa. Constitui vício de forma o contrato de representação comercial que possua todas as características de empregado, mormente, quando presente a subordinação jurídica. Parecer pela avocatória ex-officio.

17. O egrégio Tribunal Superior do Trabalho, também tem se manifestado nesse sentido conforme jurisprudência abaixo transcrita:

"Relação de emprego-contrato de representação comercial.

O simples fato de o prestador de serviços ser considerado representante comercial autônomo, tendo registro no órgão competente, não afasta a possibilidade do judiciário, em face do disposto nos autos, concluir pela existência do vínculo de emprego entre as partes, pois, diante do princípio da realidade de rege o direito do trabalho, ao aspecto meramente formal, sobrepõe-se o que ocorre no dia-a-dia da relação jurídica que aproxima o prestador do tomador dos serviços.

O contrato de trabalho e o de representação comercial autônomo (regulado pela Lei nº 4.886/1965) possuem elementos comuns, tais como serviços. No entanto, divergem quanto à existência da subordinação hierárquica e jurídica, posto que esta caracteriza apenas o contrato de trabalho, estando ausente no caso da representação comercial.

O trabalho autônomo, segundo a doutrina especializada, só se caracteriza quando há inteira liberdade de ação, ou seja, quando o trabalhador atua como patrão de si mesmo, com os poderes jurídicos de organização própria, por meio dos quais desenvolve o impulso de sua livre iniciativa e presta serviços a mais de uma empresa ou pessoa.

A prestação de serviços, in casu, conforme ressaltado pelo tribunal a quo, ocorreu com subordinação, pessoalidade, exclusividade, além de contar com os outros fatores caracterizadores da relação e emprego.

Revista provida."

(RR-193404, de 1995, 2ª Região São Paulo. Acórdão 7996, de 1996, 4ª Turma, Ministro Leonaldo Silva)

Representante comercial relação de emprego.

1. Delio Maranhão, em sua obra Direito do Trabalho, 13. ed., Ed. da Fundação Getúlio Vargas, RJ, mil novecentos e oitenta e cinco, página cinqüenta e nove, ensina que, verbis:

"A atividade dos representantes comerciais autônomos é disciplinada pela Lei quatro mil oitocentos e oitenta e seis, de nove de dezembro de sessenta e cinco. Com é óbvio, há uma larga zona cinzenta, que torna, muitas vezes, difícil, no caso concreto, dar, ou não, configurada a existência do contrato de trabalho, distinguindo-o do mandato como representação, que a doutrina classifica, também, com contrato subordinante, porque uma das partes, como no contrato de trabalho, está, por cumprimento da obrigação, assumida. O representante autônomo é um empresário, exercitando uma atividade econômica organizada. Elementos de certeza, pois, quanto a inexistência do contrato de trabalho, são: ter o representante empregados, arcar com as despesas de seu negocio, fazer-se substituir por pessoa de sua escolha e outros que se ajustem aos aspectos formais (filiação ao CORE, inscrição para efeito de imposto de renda, pagamento de impostos) e ao nomen juris do contrato celebrado. A exclusividade da esfera na Lei quatro mil oitocentos e oitenta e seis (artigo trinta e seis). Como não a desfigura, por si só, a fixação de um mínimo de produção."

2. A situação do representante comercial é distinta daquela do balconista ou do viajante.

3. Revista conhecida e provida.

(RR-4295, de 1987, 2ª Região São Paulo. Acórdão nº 3214, de 1988, 2ª Turma, Ministro José Ajuricaba da Costa e Silva)

18. Diante do exposto, concluímos que, sendo o representante comercial subordinado ao tomador, seu trabalho caracterizado pela não-eventualidade e pessoalidade e ainda ausente a autonomia no seu desempenho, configura-se o vínculo empregatício, ficando o tomador sujeito aos encargos previdenciários incidentes sobre a folha de salários.

À consideração superior.

Brasília, 16 de fevereiro de 2001.

INDIRA ERNESTO SILVA QUARESMA

Coordenadora-Geral de Direito Previdenciário

Aprovo.

À consideração do Senhor Ministro, para os fins do art. 42 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro 1993.

Brasília, 16 de fevereiro de 2001.

ANTÔNIO GLAUCIUS DE MORAIS

Consultor Jurídico

Aprovo na forma proposta.

Publique-se.

Em 19 de fevereiro de 2001.

WALDECK ORNÉLAS