Parecer GEOT nº 183 DE 27/05/2014

Norma Estadual - Goiás - Publicado no DOE em 27 mai 2014

Procedimento a ser adotado na venda de bens integrados ao seu ativo imobilizado.

......................................, sociedade empresária com estabelecimento nas ......................................................, e na ......................................................., inscrita no CNPJ sob o nº ................................ e ................................. e no CCE sob o nº ........................ e .........................., respectivamente, representada por seu procurador ................................., formula a presente consulta a respeito do procedimento a ser adotado na venda de bens integrados ao seu ativo imobilizado.

Informa a consulente que, no período de julho de 2007 a agosto de 2011, efetuou a venda de bens do ativo imobilizado, os quais haviam permanecido integrados ao seu acervo por menos de um ano, com não incidência do ICMS, conforme disposição expressa do art. 79, I, "m", do RCTE, destacando que a partir do momento da venda deixou de se creditar do saldo remanescente dos referidos bens escriturados no CIAP.

Acrescenta que tendo constatado, posteriormente, que esses bens tinham menos de um ano de integração ao ativo imobilizado, optou por pagar o ICMS relativo às referidas vendas, apesar da norma tributária não estabelecer um prazo mínimo de permanência para que a saída seja feita com não incidência.

Neste sentido, efetuou o pagamento do imposto mediante guia especial de recolhimentos, com os acréscimos de juros e multa de mora (doc. 2); emitiu as notas fiscais complementares para lançamento do imposto; formalizou a espontaneidade em relação às referidas infrações mediante termo lavrado no livro de Ocorrências (doc. 3); e apresentou denúncia espontânea à Delegacia Regional de Fiscalização nos termos do art. 484, do Livro III, do RCTE.

Aduz que, em razão de haver pago o ICMS sobre a venda, tem o direito se creditar do ICMS relativo à transposição dos bens para o ativo imobilizado, na forma do art. 47, III, do RCTE, o qual estabelece, em seu § 2º, II, que quando se tratar de contribuinte beneficiário dos Programas FOMENTAR ou PRODUZIR, deve se proceder aos ajustes no valor do financiamento.

Relativamente à obrigação de proceder ajustes no valor do financiamento, entende que “ao efetuar o lançamento do valor do ICMS a crédito no livro de apuração do ICMS, do período apuração atual, estará ajustando o valor do financiamento, não sendo necessária qualquer providência em relação ao passado”.

Argumenta que o lançamento efetuado no período de apuração em curso tem o efeito de ajustar o financiamento e é menos oneroso para o Erário, haja vista que afasta a necessidade restituição dos valores que foram recolhidos indevidamente aos cofres públicos.

Ao final, indaga se está correto o entendimento de que ao efetuar o lançamento do valor do ICMS relativo à transposição dos bens para o ativo imobilizado a crédito, no livro de apuração do ICMS, no período apuração atual, está cumprindo a obrigação de ajuste do valor do financiamento, não sendo necessária qualquer providência em relação ao passado?

Em caso negativo, solicita orientação quanto ao procedimento a ser adotado.

A consulta encontra-se instruída com a planilha de cálculo, de fl. 06, cópia de folhas do Livro Registro de Utilização de Documentos Fiscais e Termos de Ocorrência, de fls. ............, Documentos de Arrecadação de Receitas Estaduais – DARE’s, de fls. ...,  dentre outros documentos.

Recebido o pedido para apreciação, a Gerência de Orientação Tributária determina o encaminhamento dos autos em diligência à Delegacia Regional de Fiscalização de Catalão, a fim de que a consulente proceda a juntada das notas fiscais complementares por ela emitidas e, se for o caso, comprove quem de fato assumiu o ônus pelo pagamento do ICMS, relativo às respectivas notas fiscais, conforme preceitua o art. 166, do CTN.

Em resposta, a consulente apresenta os arquivos XML’s correspondentes às notas fiscais complementares emitidas (CD em anexo) e informa que nos arquivos referidos não foram geradas as TAGs relativas à cobrança, o que comprova não houve transferência do encargo financeiro.

Em seguida, mediante protocolo nº ............................. (processo apenso), é apresentado aditamento à consulta, ante a consideração de que o despacho que determinou a diligência “deixa transparecer que o entendimento da Gerência de Orientação Tributária é de que o ICMS não incide nas operações de venda de ativo com menos de um ano de integração”, porquanto “o art. 166, do CTN, tratada restituição ou compensação de tributos transferidos ao adquirente nas operações de venda e não do imposto pago nas aquisições, objeto da consulta originalmente elaborada”.

Assim, a consulente modifica os termos da consulta anteriormente formulada, para fazer nela constar os seguintes questionamentos:

a) Há incidência do ICMS nas vendas de bens com menos de um ano de integração ao ativo imobilizado?

b) Caso não haja incidência, a consulente pode se creditar do ICMS indevidamente destacado nas notas fiscais de venda de bens do ativo imobilizado (em anexo), vez que, não houve repercussão posterior do imposto recolhido?

c) A consulente somente teria o direito a restituir/compensar o imposto, multa e juros pagos efetivamente?

d) Não sendo este o procedimento correto para a restituição/compensação do imposto pago indevidamente, qual seria procedimento correto?

e) Caso a consulente possa restituir também o valor que foi destacado na nota e este financiado, está correto o entendimento da Consulente de que é desnecessário ajustar o valor do financiamento do Programa FOMENTAR em relação ao passado, em função da compensação/restituição do ICMS feita no período de apuração atual?

f) Sendo necessário algum ajuste, qual seria o procedimento correto e como deveria ser feito em relação aos leilões da divida e aos saldos dos financiamentos quitados?

Em resposta às questões acima, apresentamos as seguintes considerações.

Como já mencionado pela consulente, ao invocar a disposição contida no art. 79, I, "m", do RCTE, a saída de bem alocado no ativo imobilizado do contribuinte não está sujeita à incidência do ICMS. A disposição regulamentar mencionada reproduz a regra insculpida no art. 37, I, “m” do Código Tributário Estadual, verbis:

Art. 37. O imposto não incide sobre:

I - operações:

[...]

m) de saídas decorrentes de alienação de mercadorias integradas ao ativo imobilizado do contribuinte;

O conceito de ativo imobilizado não é próprio das normas tributárias, devendo ser extraído da legislação específica, a saber, a Lei das S.A. (Lei nº 6.404/76), cujo art. 179, V, estabelece que serão classificadas no ativo imobilizado os direitos que tenham por objeto bens corpóreos destinados à manutenção das atividades da companhia ou da empresa ou exercidos com essa finalidade, inclusive os decorrentes de operações que transfiram à companhia os benefícios, riscos e controle desses bens.

É certo que existem normas infralegais, especialmente algumas resoluções aprovadas pelo Conselho Federal de Contabilidade - CFC[1], que agregam ao conceito legal supratranscrito uma distinção de caráter temporal, de modo a se considerar classificável no imobilizado os bens tangíveis com expectativa de utilização por mais de um período contábil.

No entanto, o que é relevante, em face do que dispõe a legislação tributária estadual, é saber se os atos normativos, tais quais os emanados do poder normativo atribuído ao CFC[2], devem ser considerados para o fim de restringir ou alargar conceitos legais e disto se extrair efeitos tributários.

Em matéria de ICMS, a inclusão de um item de produção própria no ativo imobilizado o retira, por isso mesmo, do conceito de mercadoria, visto que este contempla os objetos destinados à mercancia[3]. Daí, a restrição temporal adicionada ao conceito legal de ativo imobilizado estipulado pela Lei das S.A. acaba por transmutar o item que não preencheu o requisito temporal para o conceito de mercadoria, implicando efeito tributário diverso daquele que seria obtido sem essa distinção.

A rigor – é nosso entendimento – a distinção até poderia ser feita se estivesse expressamente positivada na legislação tributária do ICMS, o que não é o caso.

Ademais, se nos abstrairmos momentaneamente da regra de não-incidência enunciada no art. 37, I, “m” do CTE (supratranscrita), não há como deixar de considerar que a doutrina e a jurisprudência pátria tem firmado o entendimento de que não há incidência de ICMS sobre a saída de bens que integram o ativo imobilizado do sujeito passivo.

A esse respeito, ensina Roque Antônio Carrazza: “O ICMS também não incide quando são vendidos os bens do ativo fixo (ativo imobilizado) da empresa, que, como demonstraremos mais adiante, não são mercadorias, já que não estão preordenados à prática de atos de comércio, nem sua venda tem por fito a obtenção de lucro” (ICMS, 16ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 54).

O Supremo Tribunal Federal, mesmo em relação ao antigo ICM, já manifestava entendimento idêntico em relação à matéria, como abaixo se demonstra:

TRIBUTÁRIO. ICM. VENDA DE BENS DO ATIVO FIXO DA EMPRESA ANTES DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 23/83. NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO.

É inadmissível o Recurso Especial quando se fundamenta em ofensa a dispositivos de lei impertinentes e desinfluentes no desate da lide e, por isso mesmo, indenes de decisão nas instâncias ordinárias.

Para efeito de incidência do ICM, somente se entende como mercadoria (cuja circulação constitui o fato imponível) o objeto ou coisa adquirida pelo comerciante (ou mercador) para servir de objeto de sua mercância.

Não constituindo mercadoria, na definição a legislação tributária, o ICM não incide na operação de venda ou transferência do ativo fixo, desde que não foi adquirido para ser vendido, como objeto do negócio da empresa.

Recurso não conhecido. Decisão indiscrepante. (Recurso Especial nº 43.057-7-SP. Rel. Min. Demócrito Reinaldo, Primeira Turma, DJ 27/07/1994) [grifamos]

Caminham no mesmo sentido, as decisões atuais da Corte Suprema em relação do ICMS:

ICMS. VENDA DE BENS DO ATIVO FIXO DA EMPRESA. NÃO INCIDÊNCIA DO TRIBUTO.

A venda de bens do ativo fixo da empresa não se enquadra na hipótese de incidência determinada pelo art. 155, I, b, da Carta Federal, tendo em vista que, em tal situação, inexiste circulação no sentido jurídico-tributário: os bens não se ajustam ao conceito de mercadorias e as operações não são efetuadas com habitualidade.

Recurso extraordinário não conhecido. (Recurso Especial nº 194.300, rel. min. Ilmar Galvão, Primeira Turma, DJ de 29/04/1997) [grifamos]

Decisões com o mesmo teor constam do Recurso Extraordinário 195.263 e do Agravo de Instrumento 177.698, ambos do STF, dentre outras.

De se considerar ainda que a habitualidade, por diversas vezes referida nas decisões dos tribunais pátrios, torna-se irrelevante no presente caso, em razão do fato de que a legislação tributária goiana, que estabelece a não-incidência, não estipula nenhuma condição ou regra adicional para a hipótese.

Destarte, é forçoso concluir que na alienação de bens integrados ao ativo imobilizado de contribuinte, assim entendidos os bens corpóreos comprovadamente destinados à manutenção das atividades da empresa ou exercidos com essa finalidade, não ocorre a incidência do ICMS, independentemente de qualquer distinção de caráter temporal em relação ao bem alienado.

Nestes termos, encontra-se respondida, de forma negativa, a pergunta constante do item “a” do aditamento à consulta (protocolo nº .......................) e, ipso facto, fica prejudicada a apreciação do questionamento apresentado na consulta original.

No que se refere à forma de restituição do indébito decorrente da tributação da alienação de bens de seu ativo imobilizado (segunda indagação da consulente no aditamento à consulta), mesmo não havendo repercussão posterior do imposto indevidamente recolhido, não é possível o creditamento do ICMS indevidamente destacado nas notas fiscais de venda.

A hipótese prevista no art. 47, inciso III, do RCTE – que possibilita o creditamento de valores pagos indevidamente – é restrita aos casos em que o indébito decorra de “erro de fato ocorrido na escrituração dos livros fiscais ou no preparo do documento de arrecadação”, o que não é o caso.

Na situação narrada na peça de consulta houve erro de julgamento quanto à regra tributária aplicável à situação determinada, o que caracteriza erro de direito, não se cuidando do erro de fato específico relativo à falha na escrituração de livros ou no preparo do documento de arrecadação, como requer a norma.

Desta forma, cabe a consulente formular pedido regular de restituição, consoante previsto no art. 486, I, do Regulamento do Código Tributário do Estado de Goiás, em razão do pagamento indevido.

No que se refere aos valores passíveis de serem restituídos, há que se ter em conta que o objeto da restituição é o indébito, isto é, a quantia paga indevidamente, de modo que a restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição [4].

Tratamento diverso deve ser dado à parcela financiada pelo Programa Fomentar, que não é passível de restituição, visto que não foi paga – e não compõe o indébito – porquanto corresponde a empréstimo obtido junto Estado, suprido com recursos orçamentários, nos termos do art. 2º, II, Lei nº 11.180, de 19 de abril de 1990.

Esse entendimento, aliás, já foi expresso por esta Gerência de Orientação Tributária, no Parecer nº 218/2012-GEOT, que propôs o reencaminhamento de pedido de restituição de valores indevidamente fomentados à Secretaria de Indústria e Comércio para deliberação.

Portanto, não cabe a restituição ou ressarcimento dos valores correspondentes à parcela incentivada pelo Programa Fomentar, devendo a consulente pleitear junto à Superintendência do PRODUZIR/FOMENTAR, da Secretaria de Estado de Indústria e Comércio, órgão executivo e de assessoramento do CD/FOMENTAR[5], a recomposição do saldo do seu financiamento.

Com efeito, compete à Superintendência do PRODUZIR/FOMENTAR o exame e a solução relativa à parcela do financiamento que tenha sido objeto de quitação ou liquidação antecipada (leilão), nos termos da legislação específica.

Diante do exposto, sintetizamos a presente consulta, concluindo que:

a) na alienação de bens integrados ao ativo imobilizado de contribuinte, assim entendidos os bens corpóreos comprovadamente destinados à manutenção das atividades da empresa ou exercidos com essa finalidade, não ocorre a incidência do ICMS, independentemente de qualquer distinção de caráter temporal em relação ao bem alienado, consoante previsto no art. 37, I, “m” do CTE;

b) a restituição do indébito decorrente da tributação indevida da alienação de bens do ativo imobilizado não pode ser feita mediante o creditamento do ICMS destacado nas notas fiscais de venda, porquanto a hipótese prevista no art. 47, inciso III, do RCTE é restrita aos casos em que o indébito decorra de “erro de fato ocorrido na escrituração dos livros fiscais ou no preparo do documento de arrecadação”;

c) a restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição (CTN, art. 167);

d) não cabe a restituição ou ressarcimento dos valores correspondentes à parcela incentivada pelo Programa Fomentar, devendo a consulente pleitear junto à Superintendência do PRODUZIR/FOMENTAR, da Secretaria de Estado de Indústria e Comércio, a recomposição do saldo do seu financiamento.

É o parecer.

Goiânia, 27 de maio de 2014.

JORGE ANTÔNIO BEZERRA OLIVEIRA

Assessor Tributário

Aprovado:

GENER OTAVIANO SILVA  

Gerente de Orientação Tributária          

[1] Resolução CFC nº 1.025/05, que aprovou a NBC T 19.1 e Resolução CFC nº. 1.177/09, que aprovou a NBC TG 27, atual NBC TG 27 (R1)

[2] Decreto-lei nº 9.295, de 27 de maio de 1946, art. 6º, “f”.

[3] CTE, art. 12, II, “a”.

[4] CTN, art. 167.

[5] Lei Estadual nº 11.180, de 19 de abril de 1990, art. 6º, § único.