Lei Complementar nº 946 DE 18/07/2022

Norma Municipal - Porto Alegre - RS - Publicado no DOM em 19 jul 2022

Dispõe sobre a outorga onerosa do direito de construir no Município de Porto Alegre, cria o Fundo Municipal de Gestão de Território (FMGT), altera o inc. VII do art. 2º e inc. XII do art. 6º da Lei Complementar nº 612, de 19 de fevereiro de 2009, altera o inc. III do art. 53-A e o § 5º do art. 111 da Lei Complementar nº 434 , de 1º de dezembro de 1999, e revoga a Lei Complementar nº 850, de 17 de abril de 2019.

O Prefeito Municipal de Porto Alegre

Faço saber que a Câmara Municipal aprovou e eu, no uso das atribuições que me confere o inciso II do artigo 94 da Lei Orgânica do Município, sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º A outorga onerosa do direito de construir, prevista no art. 28 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001, e alterações posteriores, é um instrumento urbanístico que terá como objetivos gerais:

I - utilizar a plena infraestrutura urbana disponível, permitindo, assim, densificação populacional em regiões da Cidade melhor atendidas com redes de serviço, saneamento e equipamentos públicos;

II - evitar o adensamento populacional incompatível com a estrutura urbana existente;

III - implementar e melhorar a infraestrutura existente de modo a permitir um adensamento compatível com as necessidades da Cidade;

IV - buscar o ordenamento e o direcionamento da expansão urbana, constituição de reserva fundiária, visando à regularização fundiária e à execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;

V - propiciar a criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes, a criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental, a implantação de equipamentos públicos urbanos, comunitários e o desenvolvimento e a implementação de planos, programas, ações e projetos previstos nos incs. I a VIII do art. 26 da Lei Federal nº 10.257, de 2001, e alterações posteriores; e

VI - auxiliar e incentivar políticas públicas voltadas ao planejamento e desenvolvimento da política urbana do Município de Porto Alegre.

Art. 2º A outorga onerosa do direito de construir é definida no Município de Porto Alegre como a permissão do Poder Público ao beneficiário para fins de construção na Área Urbana acima do índice de aproveitamento básico, utilizando-se dos estoques construtivos públicos denominados Solo Criado, variáveis de acordo com cada região da Cidade.

Art. 3º Qualquer aumento do potencial construtivo da Cidade, seja por incorporação de novas áreas à área urbana de ocupação intensiva ou por aumento da capacidade de edificação, dar-se-á na forma de Solo Criado, Transferência de Potencial Construtivo ou Índice Construtivo.

Art. 4º O incremento da capacidade de edificação por meio do Solo Criado será mantido pelo Poder Público na forma de Estoques Construtivos, que poderão ser concedidos nos moldes já estabelecidos pela Lei Complementar nº 434 , de 1º de dezembro de 1999, e alterações posteriores - Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PDDUA).

§ 1º A outorga onerosa do direito de construir é constituída por:

I - Solo Criado Não Adensável o que corresponde a áreas incentivadas e complementares à atividade principal que não causam impacto nos equipamentos urbanos e na paisagem e estão disponíveis em todas as Unidades de Estruturação Urbana (UEUs);

II - Solo Criado de Pequeno Adensamento aquele com área de até 300m² (trezentos metros quadrados), correspondendo a áreas adensáveis em quantidades que não causem impacto significativo nos equipamentos e na paisagem urbana, disponíveis em todas as UEUs;

III - Solo Criado de Médio Adensamento aquele com área superior a 300m² (trezentos metros quadrados) e de até 1.000m² (mil metros quadrados), correspondendo a áreas adensáveis em quantidades que causem baixo impacto nos equipamentos e na paisagem urbana, disponíveis nas UEUs e nos quarteirões liberados para adensamento pelo sistema de monitoramento da densificação; e

IV - Solo Criado de Grande Adensamento aquele com área de mais de 1.000m² (mil metros quadrados), correspondendo a áreas adensáveis que podem causar impacto nos equipamentos e na paisagem urbana, disponíveis nas UEUs e nos quarteirões liberados para adensamento pelo sistema de monitoramento da densificação.

§ 2º O benefício do Solo Criado será concedido diretamente ao interessado, de forma vinculada ao projeto arquitetônico a ser aprovado e licenciado, formalizado por meio de Certidão de Solo Criado, em procedimento regulamentado por decreto, ou convertido em contrapartida, na forma do art. 8º desta Lei Complementar.

§ 3º A emissão da Certidão de Solo Criado de Médio Adensamento e de Grande Adensamento observará critério isonômico, de acordo com a ordem cronológica dos requerimentos para sua utilização, até que haja o esgotamento do potencial construtivo da UEU ou do quarteirão.

§ 4º A emissão da Certidão de Solo Criado será imediatamente suspensa, mediante decreto do Executivo Municipal, em caso de ser constatado impacto negativo na infraestrutura decorrente da aplicação do Solo Criado ou quando for verificada a inviabilidade de sua aplicação em face dos limites estabelecidos pelas UEUs ou pelo quarteirão.

Art. 5º O preço público do Solo Criado, será calculado em tabela elaborada pelo Executivo Municipal, de acordo com a seguinte fórmula:

Parágrafo único. Na fórmula referida no caput deste artigo, entende-se por:

I - VSC o valor do Solo Criado a ser adquirido;

II - VMT o valor de mercado do metro quadrado de terreno de face de quarteirão;

III - AC a área construída adensável adicional pretendida no empreendimento;

IV - FP o fator de planejamento; e

V - IA o índice de aproveitamento de face de quarteirão.

Art. 6º O fator de planejamento (FP) a que se refere o inc. IV do parágrafo único do art. 5º desta Lei Complementar terá coeficiente variável entre 0 (zero) e 1,3 (um e três décimos) e será utilizado para a implementação da política urbana do Município de Porto Alegre nos seguintes casos:

I - quando constatada a existência de áreas da Cidade dotadas de infraestrutura, equipamentos públicos e comunitários capazes de suportar um maior adensamento;

II - quando houver motivado interesse do Executivo Municipal em estimular o desenvolvimento de determinada área da Cidade;

III - quando houver motivado interesse do Executivo Municipal em estimular a construção de habitações de interesse social em determinada área da Cidade;

IV - quando constatado que existem áreas da Cidade capazes de suportar um maior adensamento, mas que necessitam de investimentos em infraestrutura e equipamentos públicos;

V - quando a aplicação se der em zona de acentuada concentração urbana; e

VI - quando a aplicação se der em zona urbana crítica.

§ 1º Os critérios para aplicação do FP no intervalo entre 0 (zero) e 0,5 (cinco décimos) e no intervalo entre 1 (um) e 1,3 (um e três décimos) serão regulamentados por lei ordinária.

§ 2º Até a edição de lei ordinária, considerar-se-á 1 (um) o valor do FP.

§ 3º O valor da variável FP deverá constar da Declaração Municipal Informativa (DMI) de ocupação e uso do solo de cada imóvel e não poderá ser alterado mais de uma vez dentro do intervalo de 1 (um) ano.

Art. 7º O valor apurado a partir da fórmula estabelecida no art. 5º desta Lei Complementar será atualizado automaticamente anualmente, conforme índice monetário vigente, e será reavaliado periodicamente pelo Executivo Municipal no prazo de 2 (dois) anos, conforme as condições de mercado.

Art. 8º Por meio de Termo de Aquisição de Solo Criado por Contrapartida (TASCC), o Executivo Municipal poderá aceitar como contrapartida à outorga onerosa imóvel ou permuta de área construída, bens, obras e serviços, inclusive de engenharia.

Parágrafo único. Em qualquer caso, a contrapartida somente será aceita se vinculada ao disposto nos arts. 26 e 31 da Lei Federal nº 10.257, de 2001, e alterações posteriores, e à política urbana do Município de Porto Alegre, mediante manifestação expressa do gestor público.

Art. 9º Para fins de conversão do valor da outorga onerosa do direito de construir em contrapartida, poderá ser contabilizada a soma do valor de todas as espécies de Solo Criado previstas nos incs. I a IV do § 1º do art. 4º desta Lei Complementar, de acordo com o projeto arquitetônico a ser aprovado e licenciado pelo Município.

§ 1º Caso o valor da outorga onerosa seja superior ao orçamento da contrapartida, na forma do caput deste artigo, o TASCC poderá ser aditado até o valor total da outorga onerosa, a fim de contemplar outras contrapartidas vinculadas aos arts. 26 e 31 da Lei Federal nº 10.257, de 2001, e alterações posteriores, e à política urbana do Município de Porto Alegre, nos termos desta Lei Complementar.

§ 2º O saldo não executado ou não convertido em contrapartida, na forma do § 1º deste artigo, será pago pelo beneficiário proporcionalmente aos fundos municipais a que se refere o art. 18 desta Lei Complementar, consideradas as espécies de Solo Criado que constituam a outorga onerosa objeto de TASCC.

Art. 10. O Executivo Municipal aceitará obras para produção de habitação de interesse social, para criação, revitalização, conservação e proteção de espaços públicos de lazer, áreas verdes, unidades de conservação, áreas de interesse ambiental, histórico, cultural e paisagístico e seus equipamentos comunitários.

Parágrafo único. No local de execução de obra de contrapartida oferecida nos termos desta Lei Complementar, constará placa informativa evidenciando o motivo da contrapartida e as respectivas partes envolvidas, o valor da obra, a identificação do responsável técnico e o prazo para sua conclusão.

Art. 11. É vedada a aquisição ou a contratação de desenvolvimento de software por meio de TASCC, exceto para fins de ordenamento e direcionamento da expansão urbana, nos seguintes casos:

I - gestão do planejamento e desenvolvimento urbano ambiental e instrumentalização da política urbana do Município por meio de sistemas de informação geográfica, geoprocessamento e georreferenciamento de dados, simulações e outras soluções tecnológicas utilizadas no planejamento urbano; e

II - racionalização e automação do licenciamento urbano ambiental, com simulação de impactos nas estruturas urbanas e no patrimônio ambiental, histórico, cultural e paisagístico da cidade.

Art. 12. Para fins de reciclagem de uso, sem aumento de área, ficam isentas do ônus do Solo Criado as edificações já existentes cuja capacidade construtiva esteja em conformidade com a legislação urbanística vigente na época da construção.

Art. 13. Não se aplicam os limites de Índice de Aproveitamento máximo do Anexo 6 do PDDUA e as restrições de utilização do Solo Criado para os Grupamentos de Atividades 01, 03 e 19:

I - aos ajustes de projetos com aumentos ou reciclagens de uso em edificações existentes, nos termos do art. 159-B do PDDUA; e

II - às edificações regulares que estejam adquirindo Solo Criado Não Adensável ou Solo Criado de Pequeno Adensamento.

Art. 14. Outros casos de utilização da outorga onerosa do direito de construir como forma de incentivo ou isenção serão disciplinados por lei ordinária.

Art. 15. Fica o Executivo Municipal autorizado a revisar a densificação da Área de Ocupação Intensiva (AOI), considerando a utilização plena da capacidade da infraestrutura urbana, sistema viário e transportes, equipamentos públicos e comunitários existentes e aspectos da paisagem urbana, conforme critérios técnicos, de acordo com estudos, nos termos do art. 70 do PDDUA.

Art. 16. Poderão ser autorizados empreendimentos com benefício de Solo Criado e capacidade construtiva superiores ao estabelecido no PDDUA, desde que previstos em lei específica.

Art. 17. O Solo Criado terá prazo decadencial para a utilização de 10 (dez) anos, contados a partir da emissão da Certidão de Solo Criado, findo o qual, se não utilizado, retornará ao Município de Porto Alegre de pleno direito.

§ 1º A utilização a que se refere o caput deste artigo será contada a partir da data do ato de licenciamento do projeto de edificação pelo Município de Porto Alegre.

§ 2º Após a utilização, o Solo Criado terá a mesma validade do projeto licenciado, finda a qual, se não utilizado, retornará ao Município de Porto Alegre de pleno direito.

§ 3º Iniciada a obra, se não executada no prazo determinado pelo PDDUA, o Solo Criado empregado no projeto licenciado retornará ao Município de Porto Alegre de pleno direito.

Art. 18. Os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito de construir serão depositados em fundos específicos relacionados com a política urbana do Município de Porto Alegre, distribuídos da seguinte forma:

I - os recursos auferidos com o Solo Criado Não Adensável e Solo Criado de Pequeno Adensamento, no Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social (FMHIS), criado por meio da Lei Complementar nº 612, de 19 de fevereiro de 2009, e alterações posteriores; e

II - os recursos auferidos com o Solo Criado de Médio Adensamento e Solo Criado de Grande Adensamento, no Fundo Municipal de Gestão de Território (FMGT), criado por meio do art. 23 desta Lei Complementar.

Art. 19. Fica alterado o inc. VII do art. 2º da Lei Complementar nº 612, de 2009, e alterações posteriores, conforme segue:

"Art. 2º .....

VII - recursos auferidos com o Solo Criado Não Adensável e com o Solo Criado de Pequeno Adensamento;

....." (NR)

Art. 20. Fica alterado o inc. XII do art. 6º da Lei Complementar nº 612, de 2009, e alterações posteriores, conforme segue:

"Art. 6º .....

XII - desapropriações, despesas administrativas e judiciais decorrentes de obras vinculadas ao sistema de transporte viário e projetado que envolvam reassentamento ou realocação de famílias atingidas pela sua implantação.

....." (NR)

Art. 21. Fica alterado o inc. III do art. 53-A da Lei Complementar nº 434 , de 1º de dezembro de 1999, e alterações posteriores, conforme segue:

"Art. 53-A. .....

III - Solo Criado de Grande Adensamento, correspondendo a áreas adensáveis que podem causar impacto nos equipamentos e na paisagem urbana, sendo disponíveis nas UEUs, conforme Anexo 6 desta Lei Complementar, e nos quarteirões liberados para adensamento pelo sistema de monitoramento da densificação, adquirido de forma direta; e

....." (NR)

Art. 22. Fica alterado o § 5º do art. 111 da Lei Complementar nº 434, de 1999, e alterações posteriores, conforme segue:

"Art. 111. .....

§ 5º Solo Criado de grande adensamento é constituído de potencial construtivo adensável maior que 1.000 m² (mil metros quadrados) e até os limites estabelecidos no Anexo 6 desta Lei Complementar.

....." (NR)

Art. 23. Fica criado o Fundo Municipal de Gestão de Território (FMGT), de natureza contábil especial, destinado à arrecadação e à aplicação de valores do Solo Criado de Médio Adensamento e do Solo Criado de Grande Adensamento, do recebimento de recursos do orçamento próprio do Município de Porto Alegre, das transferências do Estado do Rio Grande do Sul e da União, de recursos de financiamentos nacionais e internacionais e de doações vinculadas à implantação da política urbana do Município de Porto Alegre, a ser regulamentado por decreto.

§ 1º Os recursos do FMGT serão aplicados nos termos do art. 31 da Lei Federal nº 10.257, de 2001, e alterações posteriores, preferencialmente na criação, instalação, revitalização, reforma e conservação de equipamentos públicos urbanos e comunitários, praças, parques, áreas verdes e demais áreas de interesse ambiental, bens tombados ou inventariados e na contratação de projetos, tecnologias, sistemas e serviços vinculados ao ordenamento e direcionamento da expansão urbana.

§ 2º O Fundo Municipal de Gestão de Território instituído pela Lei Complementar nº 850, de 17 de abril de 2019, fica incorporado ao FMGT, que passa a ser regido por esta Lei Complementar e pelos atos normativos que regem o funcionamento dos fundos municipais.

§ 3º O FMGT será gerido por Comitê Gestor, ao qual caberá a aplicação e o controle dos valores arrecadados, a ser regulamentado por decreto.

Art. 24. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 25. Fica revogada a Lei Complementar nº 850, de 17 de abril de 2019.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 18 de julho de 2022.

Sebastião Melo,

Prefeito de Porto Alegre.

Registre-se e publique-se.

Roberto Silva da Rocha,

Procurador-Geral do Município.