Lei nº 11298 DE 23/01/2019
Norma Estadual - Paraíba - Publicado no DOE em 25 jan 2019
Institui, no âmbito do Estado da Paraíba, o Estatuto do Portador de Câncer e dá outras providências.
O Presidente da Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba Faz saber que a Assembleia Legislativa decreta, e eu, em razão da sanção tácita, nos termos do § 1º do Art. 196 da Resolução nº 1.578/2012 (Regimento Interno) c/c o § 7º do art. 65, da Constituição Estadual, Promulgo a seguinte Lei:
Art. 1º Fica instituído, no âmbito do Estado da Paraíba, como referência de políticas públicas de interesse social, o Estatuto do Portador de Câncer (Arts. 1º, III; 196; 197, II, CF/1988; Arts. 2º, I; 196, CEPB/1989).
Parágrafo único. O Estatuto de que trata o caput deste artigo reúne e estabelece as diretrizes, normas e critérios básicos para assegurar, promover, proteger e resguardar o exercício pleno da cidadania em condições de igualdade de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais pelas pessoas com câncer, visando sua inclusão social e cidadania participativa efetiva.
Art. 2º Para fins de aplicação desta Lei, considera-se:
I - apoios especiais: a orientação e a supervisão, entre outros elementos que auxiliem ou permitam compensar uma ou mais limitações físicas da pessoa com câncer, favorecendo a sua autonomia, de forma a contribuir com sua inclusão social, bem como beneficiar o processo de habilitação e reabilitação ou qualidade de vida;
II - ajudas técnicas: qualquer elemento que facilite a autonomia pessoal ou possibilite o acesso e o uso de meio físico, visando a melhoria da funcionalidade e qualidade de vida da pessoa com câncer, como insumos, instrumentos, equipamentos ou tecnologia inclusive os adaptados ou especialmente projetados, como órteses e próteses, bolsas coletoras para ostomizados, entre outros;
III - procedimentos especiais: meios utilizados para auxiliar a pessoa que, devido ao estágio de sua enfermidade, exige condições peculiares para o desenvolvimento de atividades, como jornada de trabalho variável, horário flexível, entre outros;
IV - portador de câncer clinicamente ativo: o paciente que tenha esta condição atestada por dois médicos especialistas (cirurgião oncológico, oncologista clínico, hematologista ou radioterapeuta) da rede pública ou conveniada ao SUS.
Parágrafo único. O atestado médico mencionado no inciso IV deverá conter o seu prazo de validade que não poderá exceder a 03 (três) meses, podendo, entretanto, ser revalidado quantas vezes for necessário durante a comprovada atividade da doença a ser feita mediante a apresentação de exames clínicos pelo paciente e avaliação médica do mesmo.
Art. 3º São princípios fundamentais deste Estatuto:
I - respeito à dignidade da pessoa humana e à autonomia individual, promovendo a melhoria das condições de assistência à saúde dos portadores de câncer;
II - não discriminação;
III - inclusão e participação plena e efetiva na sociedade, proporcionando melhor qualidade de vida às pessoas em tratamento e pós-tratamento;
IV - igualdade de oportunidades, orientando as pessoas em tratamento sobre os direitos e procedimentos cabíveis;
V - velar pela humanização, buscando estimular a autoestima da pessoa enferma, em seus amplos espectros.
Art. 4º É dever do Estado, da sociedade, da comunidade e da família assegurar, com preferência, as pessoas portadoras de câncer, a plena efetivação dos direitos referentes a vida, a saúde, a alimentação, a habitação, a previdência social, habilitação e reabilitação, a convivência familiar e comunitária, dentre outros decorrentes da Constituição Federal e das Leis, que propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.
Art. 5º O direito de preferência no atendimento ao portador de câncer previsto no art. 4º desta Lei compreende, dentre outras medidas:
I - a de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
II - o pronto atendimento, seja ou não por serviço especializado em câncer, obedecendo ao nível de complexidade, nos serviços públicos estaduais ou de relevância pública junto aos órgãos públicos e privados prestadores de serviços à população;
III - destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a pessoa portadora de câncer;
IV - priorização do atendimento da pessoa com câncer por sua própria família, em detrimento de abrigo ou entidade de longa permanência, exceto das que não possuam ou careçam de condições de manutenção da própria sobrevivência, prevendo:
Criação e aparelhamento de serviços multidisciplinares de atenção domiciliar;
Formação de cuidadores habilitados;
Orientação (treinamento) familiar direcionado.
V - capacitação e educação continuada dos recursos humanos nas áreas da pessoa com câncer, bem como na de prestação de serviços;
VI - estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre aspectos ligados à enfermidade e os mecanismos de tratamento e cura.
§ 1º Entende-se por preferência de atendimento, aquele prestado à pessoa com câncer cuja doença esteja em atividade, antes de qualquer outra, depois de concluído o atendimento que estiver em andamento, respeitadas e conciliadas às normas que garantem o mesmo direito a idosos, gestantes e portadores de deficiência física, entre outros.
§ 2º Nos serviços públicos e privados de atendimento à saúde, a preferência conferida por esta Lei fica condicionada à avaliação médica em face da gravidade, nível de abrangência de complexidade do serviço e conveniência dos casos a atender.
Art. 6º Nenhuma pessoa portadora de câncer será objeto de negligência, discriminação, tratamento desumano ou degradante, punida na forma da Lei qualquer ação ou omissão aos seus direitos.
§ 1º Considera-se discriminação qualquer distinção, restrição ou exclusão em razão da doença, mediante ação ou omissão, que tenha o propósito ou efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício de seus direitos e liberdades fundamentais.
§ 2º Não constitui discriminação a diferenciação ou preferência adotada para promover a inclusão social ou o desenvolvimento pessoal, não sendo as pessoas com a enfermidade obrigadas a aceitar tal diferenciação ou preferência.
Art. 7º O Poder Executivo, através dos gestores de saúde, criará mecanismo de acesso e inclusão da pessoa portadora de câncer de acordo com as leis vigentes no Estado.
Parágrafo único. Leis que beneficiam a pessoa portadora de câncer como a Lei nº 9.115 , de 07 de maio de 2010, e demais normas devem ser do inteiro conhecimento do público a que se destina.
Art. 8º É dever de todos comunicar à autoridade competente qualquer forma de ameaça ou violação dos direitos da pessoa com câncer, devendo o Poder Executivo, através de órgão competente, promover de forma contínua a devida orientação de como proceder no ato de acionar tais mecanismos de proteção.
Art. 9º A atenção à saúde do portador de câncer será prestada com base nos princípios e diretrizes previstos na Constituição Federal e demais legislações vigentes.
Art. 10. Incumbe ao Poder Público Estadual desenvolver políticas públicas de saúde específicas voltadas para as pessoas com câncer, que incluam, entre outras, as seguintes ações:
I - promoção de ações e campanhas preventivas da doença, de forma a garantir, para tanto, a escuta dos diversos segmentos e especialidades médicas, que cuidam da pessoa com câncer, dando respaldo e destaque às patologias, por ventura, não contempladas nas campanhas de massa;
II - garantia do acesso com base nos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS);
III - estabelecimento de normas técnicas e padrões de conduta a serem observados pelos serviços públicos e privados de saúde no atendimento da pessoa com câncer;
IV - criação de uma rede de serviços de saúde regionalizada e hierarquizada em níveis de complexidade crescente, voltada ao atendimento da pessoa portadora de câncer, com elaboração de protocolos de atuação de cada serviço, incluindo serviços especializados no tratamento, habilitação e reabilitação;
V - disseminação de práticas e estratégias de atendimento e de reabilitação baseadas na comunidade, a partir da atuação privilegiada dos agentes comunitários de saúde e das equipes de saúde da família, com o vislumbrar da criação do Serviço de Atenção Domiciliar;
VI - fomento à realização de estudos epidemiológicos e clínicos, com periodicidade e abrangência adequadas, de modo a produzir informações sobre a ocorrência da doença;
VII - estímulo ao desenvolvimento científico e tecnológico que promova avanços na prevenção, no tratamento e atendimento das pessoas portadoras de câncer, prevendo a destinação de recursos para produção científica nos hospitais e universidades públicas e privadas de fomento ao avanço na prevenção, tratamento e possíveis estratégias de cura dos diversos tipos de câncer;
VIII - promoção de processos contínuos de capacitação dos profissionais que atuam no sistema público de saúde, em todas as áreas, para o atendimento da pessoa com câncer, por meio do estabelecimento de parceria de educação continuada, envolvendo o Conselho Regional de Medicina e Universidades;
IX - fornecimento de medicamentos comprovadamente eficazes, órteses, próteses e demais recursos necessários ao tratamento, habilitação e reabilitação da pessoa portadora de câncer previstos na tabela do Sistema Único de Saúde (SUS).
Art. 11. O direito à saúde do portador de câncer será assegurado mediante a efetivação de políticas sociais públicas de modo a construir seu bem-estar físico, psíquico, emocional e social no sentido da construção, preservação ou recuperação de sua saúde.
Art. 12. É obrigatório o atendimento integral à saúde da pessoa com câncer por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS).
Parágrafo único. Entende-se por atendimento integral, aquele realizado nos diversos níveis de hierarquia e de complexidade, bem como nas diversas especialidades médicas, de acordo com as necessidades de saúde das pessoas com câncer, incluindo a assistência médica e de medicamentos, psicológica, odontológica, ajudas técnicas, oficinas terapêuticas e atendimentos especializados, inclusive atendimento e internação domiciliares.
Art. 13. A pessoa com câncer clinicamente ativo terá direito a atendimento especial nos serviços de saúde, públicos e privados, que consiste, no mínimo, em:
I - assistência imediata, respeitada a precedência dos casos mais graves e oferecimento de acomodações acessíveis de acordo com a legislação em vigor;
II - disponibilização de locais apropriados para o cumprimento da prioridade no atendimento, conforme legislação em vigor, em casos tais como agendamento de consultas, realização de exames, procedimentos médicos, entre outros;
III - direito à presença de acompanhante, durante os períodos de atendimento e de internação, devendo o órgão de saúde proporcionar as condições adequadas para a sua permanência em tempo integral, excetuando-se em ambientes de UTIs.
Art. 14. A assistência social à pessoa com câncer será prestada de forma articulada e com base nos princípios e diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), de forma articulada com as demais políticas sociais, observadas também as demais normas pertinentes.
Art. 15. O acolhimento da pessoa com câncer em situação de risco social, por adulto ou núcleo familiar, caracteriza a dependência econômica para os efeitos legais.
Parágrafo único. O Poder Público estimulará, por meio de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, o acolhimento de pessoa com câncer em situação de risco.
Art. 16. O direito ao transporte da pessoa com câncer, comprovadamente carente, será assegurado no sistema de transporte público coletivo intermunicipal por meio do passe livre, concedido e utilizado de acordo com as seguintes condições:
I - o benefício será concedido à pessoa com câncer clinicamente ativo ou em tratamento oncológico cuja renda familiar per capita não exceda a 02 (dois) salários mínimos;
II - o benefício aplica-se aos serviços de transporte público coletivo intermunicipal operados em linhas regulares, com veículos convencionais, nas modalidades rodoviária, ferroviária e aquaviária;
III - a gratuidade concedida compreende a tarifa relativa ao serviço de transporte propriamente dito, a taxa de embarque em terminal de transporte e a tarifa de pedágio, quando houver;
IV - o bilhete de viagem fornecido pelo transportador ao portador de passe livre é intransferível.
§ 1º Os prestadores de serviço de transporte público intermunicipal de passageiros são obrigados a reservar, em cada viagem, quantidade de assentos equivalente a 3% (três por cento) da capacidade indicada de cada veículo, para uso preferencial de beneficiário do passe livre e de seu acompanhante, quando for o caso.
§ 2º Havendo necessidade, atestada por equipe médica autorizada, o beneficiário do passe livre terá direito a um acompanhante, que será identificado como seu responsável durante toda a viagem.
§ 3º Em casos específicos, constatada a necessidade de transporte urgente em ambulância, seja garantido pelo Poder Público o acesso a esta modalidade com o devido aparato técnico e humano, de acordo com a exigência de cada caso.
Art. 17. Ao portador de câncer deverá ser concedido, pelo médico assistente ou pelo hospital, mediante requerimento do interessado ou de seu representante, feito em duas vias, os dados de seu prontuário médico ou hospitalar, atestados, laudos, resultados de exames, biópsias e demais procedimentos, que servirão para instruir todos os pedidos e, com isso, fazer valer seus direitos.
Art. 18. Na interpretação desta Lei, levar-se-á em conta o princípio da dignidade da pessoa humana, os fins sociais a que ela se destina e as exigências do bem comum.
Art. 19. Os direitos e garantias previstos nesta Lei não excluem os já estabelecidos em outras legislações.
Art. 20. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 21. Revogam-se as disposições em contrário.
Paço da Assembléia Legislativa do Estado da Paraíba, "Casa de Epitácio Pessoa", João Pessoa, 23 de janeiro de 2019.
GERVÁSIO MAIA
Presidente