Decreto nº 22426 DE 15/01/2024

Norma Municipal - Porto Alegre - RS - Publicado no DOM em 15 jan 2024

Regulamenta a Lei Complementar Nº 746/2014, que assegura aos candidatos negros à reserva de 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas em concursos públicos, para provimento de cargos efetivos e empregos públicos nos órgãos da Administração Direta e nas entidades da Administração Indireta do Município.

O PREFEITO MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, no uso das atribuições que lhe confere o art. 94, incisos II e IV, da Lei Orgânica Municipal,

Considerando a Lei Federal nº 12.288, de 20 de julho de 2010, que institui o Estatuto da Igualdade Racial,

considerando os preceitos da Lei Complementar n.º 746, de 3 de novembro de 2014,

considerando o Decreto n.º 4.886, de 20 de novembro de 2003, que institui a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial (PNPIR),

considerando a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância, aprovada pelo Decreto Legislativo nº 01, de 18 de fevereiro de 2021, e ratificada em 28 de maio de 2021,

considerando o julgamento da ADC nº 41, pelo Supremo Tribunal Federal, para considerar legítima a utilização de critérios subsidiários de heteroidentificação, além da autodeclaração,

DECRETA:

CAPÍTULO I - DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 1º Fica regulamentada a Lei Complementar nº 746, de 3 de novembro de 2014, nos termos deste Decreto.

Parágrafo único. A reserva de vagas aos candidatos negros, nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e de empregos públicos nos órgãos da Administração Direta e nas entidades da Administração Indireta do Município de Porto Alegre, observará as disposições estabelecidas neste Decreto.

Art. 2º Fica instituída a Comissão de Avaliação de Ingresso às Vagas Reservadas a Candidatos Negros.

Art. 3º A Comissão será constituída, majoritariamente, por pessoa negras e/ou pardas, representantes da administração municipal, indicados pelos respectivos titulares das pastas, e da sociedade civil, indicados por entidades ligadas ao movimento do povo negro, em regular funcionamento, reconhecidamente comprometidas com a causa antirracismo, com a seguinte composição:

I – 1 (um) servidor titular e 1 (um) suplente, detentor de cargo de provimento efetivo de Procurador Municipal, representante da Procuradoria-Geral do Município;

II – 1 (um) servidor titular e 1 (um) suplente, representante da Coordenação de Direitos e Promoção de Igualdade Racial (CDPIR), da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (SMDS);

III – 1 (um) servidor titular e 1 (um) suplente, representante da Diretoria de Seleção e Provimento (DSP), da Secretaria Municipal de Administração e Patrimônio (SMAP);

IV – 2 (dois) membros titulares, e respectivos suplentes, representantes das entidades civis ligadas ao movimento do povo negro.

Art. 4º Os membros da comissão terão mandato de 2 (dois) anos.

Art. 5º Compete à Comissão examinar os critérios de acessibilidade de candidatos negros ao provimento das vagas reservadas em cargos efetivos e em empregos públicos, nos concursos públicos realizados por órgãos da Administração Direta e pelas entidades da Administração Indireta do Município de Porto Alegre, deliberando de forma fundamentada pelo deferimento ou indeferimento do ingresso pela reserva de vagas.

Art. 6º A Comissão será presidida pelo Diretor da Diretoria de Seleção e Provimento (DSP), da SMAP.

Parágrafo único. As reuniões serão secretariadas por servidor da Equipe de Ingresso da SMAP, indicado pelo Diretor da DSP.

Art. 7º As entidades civis ligadas ao movimento do povo negro serão selecionadas para atuação voluntária na comissão, mediante chamamento público, cujos critérios de participação serão estabelecidos em edital.

Parágrafo único. Não havendo entidades inscritas no chamamento público, a Administração poderá reconduzir os representantes da Comissão para novo mandato.

CAPÍTULO II - DO FUNCIONAMENTO DA COMISSÃO

Art. 8º A Comissão reunir-se-á, de forma presencial ou por meio de video conferência, quando convocada pelo Diretor da DSP para atendimento das nomeações autorizadas.

Art. 9º As reuniões serão realizadas com o quórum mínimo de 3 (três) membros, sendo um, obrigatoriamente, representante de entidade civil.

§ 1º As decisões serão tomadas por maioria simples de votos dos presentes.

§ 2º Em caso de empate, o voto da CDPIR, da SMDS terá prevalência.

Art. 10. A ausência injustificada de representação das entidades da Comissão em 3 (três) reuniões consecutivas ou em 5 (cinco) interpoladas, em um ano, sem a apresentação de justificativa, acarretará na exclusão da entidade.

Art. 11. Cada membro da Comissão terá direito a 1 (um) voto nas deliberações.

Parágrafo único. O membro suplente somente votará na ausência, suspeição ou impedimento do respectivo titular.

Art. 12. São atribuições da Comissão de Avaliação de Ingresso de Candidatos Negros:

I – confirmar a autodeclaração do candidato quanto a sua raça e cor;

II – avaliar as características físicas individuais de fenotipia do candidato;

III – deliberar quanto ao atendimento dos requisitos de acessibilidade às vagas reservadas às pessoas negras;

IV – emitir parecer conclusivo das deliberações;

V – analisar a documentação apresentada pelo candidato e fundamentos de recursos, quando necessário;

VI – proferir decisão em caráter de reconsideração;

VII – validar a ata das reuniões.

CAPÍTULO III - DA AVALIAÇÃO DOS CANDIDATOS

Art. 13. O critério de acesso às vagas reservadas aos candidatos negros consistirá na análise das características individuais de fenotipia de pessoa negra, sendo considerada a cor da pele (preta ou parda) e os aspectos predominantes dos traços negróides: lábios, nariz e cabelos.

Art. 14. Os candidatos inscritos pela reserva de vagas para negros serão convocados para reunião de apresentação aos membros da comissão, através da publicação de edital específico no Diário Oficial eletrônico do Município (DOPA-e), além do envio de e-mail ou telegrama, se for o caso.

Art. 15. Aos candidatos inscritos às vagas reservadas às pessoas negras é obrigatória a participação em reunião especialmente designada para a avaliação individual dos critérios de acessibilidade, sob risco de eliminação do certame, no caso de não comparecimento.

Art. 16. Não será admitido ao candidato desistir de concorrer às vagas reservadas às pessoas negras após a homologação definitiva da inscrição.

Art. 17. Caso seja constatada, a qualquer tempo, a falsidade na autodeclaração,
será instaurada sindicância e será encaminhada a documentação ao órgão competente de investigação criminal.

Art. 18. O candidato que já tiver sido avaliado pela Comissão, para ingresso em outro cargo ou emprego público, no âmbito da administração municipal, será dispensado de nova avaliação, mediante requerimento devidamente instruído.

Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica às avaliações realizadas com base na Lei Complementar nº 746, de 3 de novembro de 2014.

Art. 19. O candidato convocado para a reunião presencial será fotografado em momento anterior ao início da avaliação.

Parágrafo único. A foto será realizada pela Equipe de Ingresso da SMAP, contendo obrigatoriamente a face descoberta e os ombros do candidato.

Art. 20. No caso de reunião por meio de video conferência, o Município disponibilizará local com os recursos de acesso aos candidatos que manifestarem impossibilidade de recursos para participação na reunião.

Parágrafo único. A reunião por meio de video conferência será gravada, sendo mantido o arquivo sob a guarda da Coordenação de Seleção e Ingresso da SMAP.

Art. 21. A convocação para comparecimento na reunião da Comissão não suspende os prazos em curso para as demais etapas de ingresso.

Art. 22. O ingresso do candidato pelo sistema de reserva de vagas às pessoas negras será indeferido pela comissão:

I – em caso de não comparecimento ou de comparecimento intempestivo à reunião de avaliação para a qual foi convocado;

II – caso não apresente as características físicas individuais de fenotipia, conforme decisão da Comissão;

III – caso a decisão de indeferimento seja mantida em caráter de reconsideração ou de recurso;

IV – caso seja reformada a decisão de deferimento em grau de recurso.

Parágrafo único. O indeferimento de ingresso do candidato pelo sistema de reserva de vagas às pessoas negras não prejudicará a sua classificação na lista geral.

CAPÍTULO IV - DOS IMPEDIMENTOS E DA SUSPEIÇÃO

Art. 23. É impedido de atuar a autoridade ou o membro que:

I – tenha interesse direto ou indireto na avaliação do candidato;

II – esteja litigando judicial ou administrativamente com o candidato ingressante ou respectivo cônjuge ou companheiro;

III – seja parente do candidato até terceiro grau.

Art. 24. O impedimento deverá ser comunicado pelo membro à Presidência da Comissão.

Art. 25. Poderá ser argüida a suspeição de autoridade ou membro que tenha amizade ou inimizade notória com o candidato ou com o respectivo cônjuge, companheiro, parente e afim até o terceiro grau, mediante deliberação irrecorrível da Presidência da Comissão.

Art. 26. A Presidência da Comissão assegurará que o membro impedido ou suspeito abstenha-se de atuar ou que seja substituído na avaliação do candidato.

CAPÍTULO V - DOS RECURSOS

Art. 27. Cabe recurso contra as decisões da Comissão, dirigido ao Secretário da SMAP, no prazo de 3 (três) dias úteis, a contar da publicação oficial, em face de razões de legalidade e de mérito.

Art. 28. O recurso interposto pelo candidato, cujo ingresso pelo sistema de reserva de vagas tenha sido indeferido, será inicialmente submetido a exame de reconsideração da Comissão.

§ 1º O recurso será diretamente encaminhado à autoridade superior, independentemente de exame de reconsideração, se não contiver novos argumentos ou provas.

§ 2º A decisão será comunicada ao candidato e publicada no DOPA-e.

§ 3º O recurso será encaminhado ao Secretário Municipal da SMAP, caso a decisão não seja alterada em sede de reconsideração pela Comissão.

Art. 29. Possuem legitimidade para interpor recurso administrativo:

I – os titulares de direitos e interesses que forem parte no processo;

II – aqueles cujos direitos ou interesses forem diretamente afetados pela decisão recorrida

III – as organizações e associações representativas da população negra, no tocante a direitos e interesses coletivos.

Art. 30. O recurso não tem efeito suspensivo, salvo disposição legal em contrário.

Art. 31. O recurso não será conhecido quando interposto:

I – fora do prazo;

II – perante órgão incompetente;

III – por quem não seja legitimado.

Parágrafo único. O não conhecimento do recurso não impede a Administração de rever de ofício o ato ilegal.

Art. 32. A autoridade competente para apreciar o recurso poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, fundamentadamente.

Parágrafo único. Se da aplicação do disposto neste artigo puder decorrer gravame à situação do recorrente, este deverá ser cientificado para que formule suas alegações, por escrito, no prazo de 3 (três) dias úteis.

CAPÍTULO VI - DO PROCEDIMENTO

Art. 33. A decisão da Comissão será divulgada nos sítios eletrônicos do concurso público e mediante publicação no DOPA-e.

Art. 34. Os documentos relacionados à avaliação de cada candidato constarão em processo eletrônico.

Art. 35. Os prazos começam a correr a partir da data da publicação oficial, excluindo-se da contagem o dia do começo e incluindo-se o do vencimento.

CAPÍTULO VII - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 36. O indeferimento de ingresso do candidato pelo sistema de reserva de vagas às pessoas negras não configura ato discriminatório de qualquer natureza.

Art. 37. Aplicam-se as disposições deste Decreto, no que couber, aos processos seletivos simplificados, quando houver previsão legal de reserva de vagas.

Parágrafo único. Os prazos e o formato da avaliação poderão ser reduzidos ou modificados, conforme as regras do edital, mediante prévia consulta à Comissão.

Art. 38. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 39. Fica revogado o Decreto nº 14.288, de 16 de setembro de 2003.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE, 15 de janeiro de 2024.

Sebastião Melo,

Prefeito de Porto Alegre.

Registre-se e publique-se.

Roberto Silva da Rocha,

Procurador-Geral do Município.