Consulta de Contribuinte nº 79 DE 14/05/2021

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 14 mai 2021

ICMS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE INTERMUNICIPAL DE RESÍDUOS (LIXO) - Tratando-se de transporte intermunicipal de lixo até o aterro sanitário ou aterro industrial e prestado sob regime de direito privado, configura-se fato imponível submetido à incidência do ICMS, conforme previsão do inciso VIII do art. 1º do RICMS/2002.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente tem como atividade principal informada no cadastro estadual o transporte rodoviário de carga, exceto produtos perigosos e mudanças, municipal (CNAE 4930-2/01).

Informa que participou de processo licitatório da Prefeitura de Nova Lima, restando ganhadora do certame, com assinatura do Contrato Público nº 44/2017 (anexado à consulta), constando como objeto contratual as seguintes atividades: monitoramento, operação e manutenção da estação de transbordo (transferência), carga e transporte dos resíduos até o aterro sanitário.

Relata que todos os resíduos sólidos urbanos, coletados pelo sistema de coleta regular de Nova Lima, seriam encaminhados para a Estação de Transbordo (ou de transferência), localizada nas dependências do antigo aterro sanitário de Nova Lima, bairro Mina D’água, ficando a cargo da Consulente todas as atividades posteriores, até sua destinação final, em aterro sanitário contratado pela Prefeitura, localizado no município de Sabará.

Acrescenta que, por todos os serviços e atividades realizados, recebia, mensalmente, o preço pago por tonelada transportada, com apresentação de um único documento fiscal, qual seja, Conhecimento de Transporte emitido para faturamento, com indicação de isenção do ICMS, bem como especificação do serviço prestado no campo observações. Anexa diversos CT-e emitidos nos exercícios de 2017 e 2018.

Defende que o serviço prestado decorre de serviço público de limpeza urbana, de lixo - resíduo sólido urbano (RSU), derivado da ocupação de imóveis residenciais, coletado pelos sistemas de limpeza pública, através de caminhões coletores compactadores, que se enquadra como serviço ou atividade essencial, conforme art. 10 da Lei federal nº 7.783/1989.

Transcreve dispositivos da Lei estadual nº 18.031/2009 e da NBR 8419/1992 da ABNT para concluir que a responsabilidade pela coleta, manejo, transporte, transbordo e destinação final dos resíduos sólidos é do Poder Público Municipal, motivo pelo qual o serviço de transporte executado por ela configura-se como um serviço público, ainda que executado por um particular, mas sob regime de direito público, inclusive de acordo com a Lei federal nº 8.666/1993 (Lei de Licitações).

Cita doutrina para sustentar que, sendo o serviço prestado em regime de direto público, não havendo contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, configura-se uma hipótese de não incidência do ICMS, nos termos do inciso I do art. 5º do RICMS/2002.

Acrescenta que o incido II do art. 2º da Lei Complementar nº 87/1996, incorporado ao RICMS/2002, no inciso VIII do art. 1º e inciso X do art. 2º, restringiu a incidência do ICMS às prestações de serviço de transporte de pessoas, bens, mercadorias ou valores.

Menciona o conceito de mercadoria contido no inciso I do art. 222 do RICMS/2002 e conclui que, por ausência de circulação econômica, tratando-se de resíduo sólido urbano, eminentemente domiciliar comum, destinado a aterro sanitário, não reciclável, como destinação final, não se trata de mercadoria.

Diz que também não se trata de sucata, apara, resíduo ou fragmento, conforme conceito do art. 219 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002, ou subproduto.

Acrescenta conceitos de bem, como coisa útil e suscetível de valoração, para defender que o lixo urbano não se enquadra na definição.

Conclui que os Conhecimentos de Transporte Rodoviário de Cargas (CTRC) foram emitidos incorretamente, por tratar-se de transporte de resíduos não recicláveis/lixo, não passíveis de circulação econômica e de prestações de serviços que estão fora do campo de incidência do ICMS e foram emitidos simplesmente para o atendimento da exigência prevista no § 1º do art. 39 da Lei nº 6.763/1975 e para faturamento.

Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.

CONSULTA:

1 - Está correto o entendimento quanto à não incidência do ICMS nas prestações de serviço de transporte de responsabilidade do município, prestado mediante contrato na modalidade de direito público?

2 - Está correto o entendimento quanto à não incidência do ICMS no transporte de lixo urbano doméstico?

3 - Caso negativa as respostas a uma das questões acima, qual o procedimento deverá ser adotado pela Consulente?

4 - Qual a definição de bens e mercadorias para fins de tributação do ICMS relativo ao serviço de transporte a elas relacionado?

RESPOSTA:

Preliminarmente, cabe ressaltar que incide o ICMS sobre a prestação de serviço de transporte intermunicipal de bens, mercadorias, valores, pessoas ou passageiros, por qualquer via ou meio, nos termos do inciso VIII do art. 1º do RICMS/2002.

Saliente-se que a Consulente se caracteriza como pessoa jurídica distinta do município para o qual presta o serviço, portanto, não há que se falar em transporte próprio de lixo ou imunidade recíproca e, sim, em prestação de serviço de transporte sujeita ao ICMS, na modalidade intermunicipal (de Nova Lima para Sabará).

Nesse sentido, vide Consulta de Contribuinte nº 245/2007.

Após tal esclarecimento inicial, passa-se a responder aos questionamentos formulados:

1 - O entendimento pela não incidência do ICMS está equivocado, pois a Consulente é pessoa jurídica de direito privado que celebrou contrato com o Poder Público, mas que com este não se confunde, pois possui patrimônio e receitas próprios, bem como a prerrogativa de autogestão de seus recursos, prestando mero serviço de transporte para a municipalidade de Nova Lima.

Desse modo, não se aplica a previsão contida no inciso I do art. 5º do RICMS/2002.

2 - O entendimento pela não incidência do ICMS não está correto, conforme já consignado no item anterior, pois a Consulente foi contratada para transportar lixo e detritos de Nova Lima para o aterro sanitário ou industrial de outra municipalidade (Sabará), caracterizando, destarte, hipótese de incidência tributária do ICMS.

3 - Como a Consulente transporta o lixo de Nova Lima para Sabará, está caracterizada como contribuinte na condição de prestador de serviço de transporte e deverá observar, para efeitos procedimentais, o disposto no Anexo V do RICMS/2002, especialmente nos arts. 80 a 84 da Parte 1, e recolher o imposto correspondente, posto ser devido, ao contrário do consignado nos rodapés dos CT-e como “isento”.

Cumpre informar, ainda, que a Consulente poderá, mediante denúncia espontânea, procurar a repartição fazendária de sua circunscrição para sanar irregularidade e recolher tributo não pago na época própria, observando o disposto nos arts. 207 a 211-A do Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos (RPTA), estabelecido pelo Decreto n° 44.747/2008.

4 - O transporte do lixo é o objeto de relação jurídica que se estabelece entre o contratante e contratado, relação obrigacional que consiste em uma obrigação de fazer. O contratado/consulente tem a obrigação de remover o lixo ou os detritos em Nova Lima, depositando-os no aterro sanitário ou industrial em Sabará, caracterizando, destarte, prestação de serviços de transporte intermunicipal, consoante comprova os CT-e anexos, enquanto o contratante/municipalidade tem o direito de exigir do contratado/consulente o seu cumprimento. Se o contrato é celebrado tendo por objeto a remoção do lixo, então o lixo é o objeto do referido contrato. Logo, um “bem”, no sentido jurídico do termo, consoante art. 82 do Código Civil/2002:

Seção II
Dos Bens Móveis

Art. 82. São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.

Ademais, a utilidade, no caso, seria o próprio transporte, removendo o lixo ou os detritos.

Por fim, se da solução dada à presente Consulta resultar imposto a pagar, o mesmo poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 14 de maio de 2021.

Flávio Bartoli da Silva Júnior
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Marcela Amaral de Almeida
Assessora Revisora
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação