Consulta de Contribuinte nº 71 DE 14/05/2021
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 14 mai 2021
ICMS - NÃO INCIDÊNCIA - LICENCIAMENTO OU CESSÃO DE DIREITO DE USO DE SOFTWARE -Exclui-se das hipóteses de incidência do ICMS o licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador, na forma do julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na ADI 5.659.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de aparelhos eletromédicos e eletroterapêuticos e equipamentos de irradiação (CNAE 2660-4/00) e como atividade secundária a manutenção e reparação de aparelhos eletromédicos e eletroterapêuticos e equipamentos de irradiação (CNAE 3312-1/03).
Informa que se dedica, dentre outras atividades descritas em seu contrato social, ao comércio, distribuição, importação e exportação de máquinas, aparelhos e equipamentos para uso odonto-médico-hospitalar, como aparelhos de ultrassom e ressonância magnética.
Diz que, para que os equipamentos possam funcionar nos estabelecimentos de seus clientes (usualmente hospitais e clínicas médicas), é necessária a instalação de programas de computador (softwares) específicos que promovam a interface adequada com seu usuário.
Relata que após a aquisição de equipamentos pelos seus clientes, com o passar do tempo e geralmente em razão do desenvolvimento de novas tecnologias ou de novas demandas, a Consulente licencia ou disponibiliza a tais clientes, de forma definitiva: novos programas, atualizações ou melhorias (“upgrades”) nos programas já existentes, ou licenças para habilitação de funcionalidade ou programa já instalado no equipamento, mas que estava desativado.
Afirma que os referidos programas, atualizações e licenças são padronizados e são originalmente desenvolvidos ou obtidos por empresas localizadas no exterior, não sofrendo alteração relevante no Brasil, sendo que a Consulente adquire o seu direito de comercialização ou distribuição e efetua o pagamento de valores às empresas localizadas no exterior.
Menciona que em razão da aquisição do direito de comercialização ou distribuição, a Consulente atualmente obtém os programas, atualizações e licenças utilizando-se de meio físico, porém, para acompanhar a evolução tecnológica, pretende obter os programas, atualizações e licenças mediante download, e-mail ou outra forma de disponibilização por meio eletrônico.
Declara que licencia ou disponibiliza os programas, atualizações e licenças aos seus clientes mediante remuneração.
Assevera que suas dúvidas estão relacionadas às seguintes atividades envolvendo programas, atualizações e licenças: aquisição do direito de comercialização ou distribuição a partir de empresas localizadas no exterior; e a obtenção desse direito por meio eletrônico, e o respectivo licenciamento aos seus clientes.
Argumenta que, conforme cláusulas primeira e segunda do Convênio ICMS nº 106/2017, as operações com bens e mercadorias digitais, tais como softwares e programas, que sejam padronizados, comercializadas por meio de transferência eletrônica de dados anteriores à saída destinada ao consumidor final, ficam isentas do ICMS; nos termos da sua cláusula terceira o imposto é devido nas saídas internas e nas importações realizadas por meio de site ou de plataforma eletrônica, na unidade federada onde é domiciliado ou estabelecido o adquirente do bem ou mercadoria digital, e na forma da cláusula quarta desse mesmo Convênio, a pessoa jurídica que der saída do bem ou mercadoria digital na forma de que trata o convênio deverá emitir Nota Fiscal Eletrônica (NF-e), modelo 55.
Reconhece que, regra geral, há a incidência de ICMS nas operações de importação e venda, bem como há necessidade de emissão de Nota Fiscal Eletrônica (NF-e) nas operações de importação e venda, conforme previsto nos incisos I e VI do art. 2º da Parte Geral do RICMS/2002, e inciso I do art. 1º e inciso VI do art. 20, ambos da Parte 1 do Anexo V do citado regulamento, tendo como base de cálculo o valor da operação, nos termos da alínea “a” do inciso IV do art. 43 da Parte Geral desse mesmo regulamento.
Observa que a configuração de estabelecimento prevista no artigo 58, inciso I, do RICMS/2002 considera estabelecimento o local, ainda que pertencente a terceiro, onde a mercadoria objeto da atividade do contribuinte é armazenada ou depositada.
Alega que o licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computação é tributável pelo ISS (e não pelo ICMS), conforme consta do item 1.05 da lista de serviços anexa c/c § 2º do art. 1º, ambos da Lei Complementar nº 116/2003.
Com dúvida sobre a correta interpretação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 - A aquisição do direito de comercialização ou distribuição e obtenção por meio eletrônico (“importação”) de software pela Consulente encontra-se no campo de incidência do ICMS ou do ISS?
2 - Caso a resposta do item anterior indique o âmbito de incidência do ICMS, há previsão de dispensa de emissão de NF-e, considerando-se que o Convênio ICMS nº 106/2017 isenta de ICMS as operações com software anteriores à saída destinada ao consumidor final?
3 - Considerando-se os questionamentos anteriores, na hipótese de se entender necessária a emissão de NF-e de importação, considerando que não haverá importação de mercadoria física nem, consequentemente, emissão de Declaração de Importação (“DI”) e desembaraço aduaneiro, seria correto indicar, nos respectivos campos da NF-e: “Número da DI”: Indicar “0” (zero); “Data da DI”: Indicar a data de aquisição do direito de comercialização ou distribuição; “Local de desembaraço”: Indicar “N/A”; “UF de desembaraço”: Indicar a UF da sede da Consulente; “Data de desembaraço”: Indicar a data de aquisição do direito de comercialização ou distribuição; e “NCM”: Indicar “00000000” ?
4 - De acordo com o informado nos itens anteriores, caso esteja no âmbito do ICMS, não haveria obrigação de efetuar o recolhimento do ICMS na importação, considerando-se o disposto no Convênio ICMS nº 106/2017, que isenta de ICMS as operações com software anteriores à saída destinada ao consumidor final?
5 - O licenciamento definitivo a consumidor final encontra-se no campo de incidência do ICMS ou do ISS?
6 - Caso a resposta do item anterior conclua que está no âmbito do ICMS, deve ser emitida NF-e de saída, tanto se a Consulente tiver reconhecida a licença como um ativo seu, como se não tiver reconhecido esse ativo?
7 - Considerada a resposta dos itens 5 e 6, caso esteja no âmbito do ICMS, apenas na hipótese de se entender necessária a emissão de NF-e de saída, estaria correto indicar, no campo “NCM”, a informação “00000000”?
8 - Observada as respostas dos itens 5 a 7, há obrigação de efetuar o recolhimento do ICMS (alíquota interna ou interestadual com diferencial, caso haja)?
9 - O licenciamento de programas, atualizações e licenças aos clientes da Consulente, utilizando-se ou não de “site” ou meio eletrônico para a sua disponibilização, encontra-se no campo de incidência do ICMS ou do ISS?
10 - Caso a resposta do item anterior indique o âmbito de incidência do ICMS, há necessidade de utilizar estabelecimento com inscrição estadual autônoma?
11 - De acordo com a resposta do item 5, considerado o âmbito de incidência do ICMS, em relação a operações interestaduais, estaria correto emitir NF-e e efetuar o pagamento do ICMS mediante Guia Nacional de Recolhimento de Tributos Estaduais - GNRE nos termos do § 2º da cláusula quarta do Convênio ICMS nº 106/2017?
12 - Em relação ao estoque, caso a operação esteja no campo de incidência do ICMS, a Consulente estaria dispensada de efetuar qualquer registro de entrada ou de estoque em relação à aquisição, por meio eletrônico, do direito de comercialização ou distribuição de programas, atualizações e licenças a partir de empresas localizadas no exterior, inclusive em relação ao Bloco K da EFD ICMS IPI e/ou ao livro de Registro de Controle da Produção e do Estoque, considerando-se que não haveria suporte físico?
13 - Caso a operação esteja no campo de incidência do ICMS, em relação ao disposto na Resolução nº 13/2012 do Senado Federal, está correto aplicar a alíquota de 4% de ICMS nas operações interestaduais após a aquisição, por meio eletrônico, do direito de comercialização ou distribuição de programas, atualizações e licenças a partir de empresas localizadas no exterior (exceto caso não haja similar nacional, conforme lista Camex), mesmo que inexistente o desembaraço aduaneiro (já que não há suporte físico sujeito ao desembaraço aduaneiro)?
RESPOSTA:
Preliminarmente, cumpre salientar que o egrégio Supremo Tribunal Federal (STF), em sessão do plenário ocorrida em 18/02/2021, julgou, na ADI 5.659, que o art. 5º da Lei nº 6.763/1975 e os incisos I e II, ambos do art. 1º do Decreto nº 43.080/2002 (RICMS/2002), bem como o art. 2º da Lei Complementar federal nº 87/1996 fossem interpretados no sentido de excluir das hipóteses de incidência do ICMS o licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador, modulando os efeitos da decisão para dotá-la de eficácia a partir da data da publicação da ata de julgamento.
Em continuidade de julgamento, ocorrido em 24/02/2021, o STF, por maioria, modulou os efeitos da decisão, atribuindo eficácia ex nunc, a contar da publicação da ata de julgamento do mérito para:
a) impossibilitar a repetição de indébito do ICMS incidente sobre operações com softwares em favor de quem recolheu esse imposto, até a véspera da data da publicação da ata de julgamento do mérito, vedando, nesse caso, que os municípios cobrem o ISS em relação aos mesmos fatos geradores; b) impedir que os estados cobrem o ICMS em relação aos fatos geradores ocorridos até a véspera da data da publicação da ata de julgamento do mérito. Ficaram ressalvadas (i) as ações judiciais em curso, inclusive de repetição de indébito e execuções fiscais em que se discutam a incidência do ICMS e (ii) as hipóteses de comprovada bitributação, caso em que o contribuinte terá direito à repetição do indébito do ICMS. Por sua vez, incide o ISS no caso de não recolhimento do ICMS ou do ISS em relação aos fatos geradores ocorridos até a véspera da data da publicação da ata de julgamento do mérito (...)
Em 03/03/2021. o STF divulgou a Ata nº 4, de 24/02/2021 onde constava a referida decisão, conforme publicação no Diário de Justiça Eletrônico (DJE) nº 39.
Feitos estes esclarecimentos, passa-se às respostas dos questionamentos propostos.
1, 3, 5 e 9 - Nas operações realizadas pela Consulente que envolvam o “software de prateleira”, tais como aquisição do direito de comercialização ou distribuição de atualizações e licenças a partir de empresas localizadas no exterior, obtido por meio eletrônico, bem como o posterior licenciamento do direito de uso aos seus clientes, ocorrem sem incidência do ICMS, conforme decidido pelo STF na ADI 5659.
Dessa forma, em cumprimento à ADI 5659 na comercialização de tais serviços, incide o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), observada a modulação dos efeitos estabelecidas pelo STF.
Para a correta emissão dos documentos pertinentes ao licenciamento ou cessão de direito de uso de programas de computador, a Consulente deverá consultar a repartição fiscal municipal competente.
2, 4, 6, 7, 8, 10 a 13 - Prejudicadas.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 14 de maio de 2021.
Jorge Odecio Bertolin |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso |
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação