Consulta de Contribuinte nº 59 DE 13/04/2022
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 13 abr 2022
ICMS - REGIME ESPECIAL - REVOGAÇÃO - NORMA SUPERVENIENTE - Nos termos do art. 63 do RPTA, o regime especial fica revogado com a superveniência de norma de legislação tributária naquilo que esta com aquele conflitar, independentemente de comunicação.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual a fabricação de defensivos agrícolas (CNAE 2051-7/00).
Informa que atua na fabricação e comercialização de defensivos agrícolas e importa matérias-primas empregadas na industrialização de inseticida, fungicida, formicida, herbicida, parasiticida, germicida, acaricida, nematicida, raticida, desfolhante, dessecante, espalhante, adesivo, estimulador ou inibidor de crescimento (reguladores).
Menciona que no intuito de preservar a competitividade da indústria mineira, o art. 8, § 1º, inciso II da Parte Geral e o item 37, alínea "a", da Parte 1 do Anexo II, ambos do RICMS/2002, autorizavam a concessão de diferimento nas operações de importação de matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem que são empregados em processo industrial.
Afirma que suas operações estão abarcadas pelos benefícios fiscais previstos no item 4 da Parte 1 do Anexo I e no item 1 da Parte 1 do Anexo IV, ambos do RICMS/2002, que tratam, respectivamente, de isenção nas operações internas e redução de base de cálculo nas operações interestaduais com defensivos agrícolas.
Diz que os subitens 4.1 e 4.2 do citado item 4 e subitens 1.1 e 1.2 do mencionado item 1, autorizados pelo Convênio ICMS 100/1997, permitem a manutenção dos respectivos créditos.
Alega que o regime especial concedido à Consulente a autoriza a realizar a importação ao abrigo do diferimento e, posteriormente, a venda interna com aplicação da isenção ou a venda interestadual com redução de base de cálculo, sem que esta fase implique na exigência de recolhimento do imposto diferido na operação antecedente.
Argumenta que, recentemente, houve a publicação do Decreto no 48.337/2021, alterando a mencionada legislação.
Entende que essas alterações contrariam o objetivo dos regimes especiais em vigor, qual seja, tornar as indústrias mineiras, que necessitam adquirir insumos no exterior, competitivas.
Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 - Está mantida a regra do regime especial em vigor que garante o não recolhimento do imposto diferido quando a operação subsequente for beneficiada por isenção ou redução de base de cálculo, a fim de preservar a competividade da indústria mineira?
2 - A referida regra, prevista nos regimes especiais em vigor, está mantida até que a Consulente seja intimada de sua alteração?
3 - Em caso negativo, está correto o entendimento no sentido de que só será exigível o recolhimento do imposto diferido após 90 (noventa) dias contados da publicação do Decreto no 48.337/2021, em atenção ao disposto no art. 150, inciso III, alínea "c" da Constituição Federal de 1988 (CF/1988)?
RESPOSTA:
1 - Não. A revogação da dispensa do estorno do crédito na saída de mercadoria beneficiada com redução de base de cálculo e isenção previstas, respectivamente, nos subitens 1.1 e 1.2 do item 1 da Parte 1 do Anexo IV e nos subitens 4.1 e 4.2 do item 4 da Parte 1 do Anexo I, todos do RICMS/2002 (revogados pelo art. 3º e vigência estabelecida pelo art. 4º, ambos do Decreto nº 48.337, de 30/12/2021), determinou o encerramento do diferimento, na forma disposta no art. 6º do Regime Especial de Tributação e-PTA-RE nº 45.000000076-76, devendo a Consulente recolher o imposto diferido, no prazo previsto no inciso IV do § 5º do art. 85 do RICMS/2002.
Note-se que, com a superveniência dessa revogação, a partir de 1º/01/2022, a Consulente deverá recolher o imposto diferido em documento de arrecadação distinto, sem direito ao aproveitamento do valor como crédito do imposto, nos termos do inciso I do art. 7º do RET, considerando-se que ocorreu, ainda, a revogação tácita dos §§ 1º e 2º desse art. 7º.
2 - Não. Nos termos do art. 63 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008, o regime especial fica revogado com a superveniência de norma de legislação tributária naquilo que esta com aquele conflitar, independentemente de comunicação.
3 - Importa observar que a instituição ou majoração de tributo (definição de fato gerador e majoração de alíquota e/ou base de cálculo) estão no campo do delineamento da hipótese de incidência tributária, o que está adstrito aos princípios da reserva legal e da anterioridade, tanto no que tange à anterioridade quanto à noventena, em observância ao inciso I e às alíneas “a”, “b” e “c” do inciso III do art. 150 da CF/1988.
Assim, a anterioridade anual e nonagesimal incidem nas hipóteses de criação de novo tributo ou majoração de tributo já existente, não cabendo aplicá-la na alteração de benefício fiscal de isenção ou redução de base de cálculo.
Já a modificação de uma isenção ou redução de base de cálculo, prevista no art. 8º da Lei nº 6.763/75, encontra-se no campo da exclusão da obrigação tributária. Ou seja, ocorreu, no campo fático, o fato gerador, surgiu a obrigação tributária, com todos os elementos previamente definidos pela lei, contudo tal obrigação foi parcialmente excluída.
Assim, a modificação de um benefício fiscal não importa em redução ou majoração do tributo em abstrato, ações adstritas aos ditames constitucionais acima mencionados, mas sim da obrigação tributária em concreto, não devendo se sujeitar aos referidos princípios.
Indispensável ressaltar que o restabelecimento de tributação via revogação ou alteração de decreto que instituiu benefício fiscal, por meio de outro decreto, tem respaldo na jurisprudência, conforme se vê:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DECLARATÓRIA - INEXIGIBILIDADE DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO - TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA - ICMS - RESTABELECIMENTO DA ALÍQUOTA PADRÃO DE DEZOITO POR CENTO POR MEIO DE DECRETO - PREVISÃO EM LEI ESTADUAL - LEGALIDADE - AUSÊNCIA DA PROBABILIDADE DO DIREITO. 1. A tutela provisória de urgência exige a comprovação da probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, conforme art. 300 do CPC/2015; 2. Não há ilegalidade do decreto que restabelece a alíquota padrão de 18% do ICMS, revogando decreto anterior que reduziu a alíquota para 12%, de forma regulamentar à Lei Estadual nº 6.763/1975 e dentro dos limites atribuídos ao Poder Executivo;
3. Ausente a probabilidade do direito, deve ser indeferida a tutela provisória de urgência.
(...)
Efetuada a redução da alíquota do ICMS sobre os produtos médicos hospitalares pelo Decreto nº 46.368/2013, que alterou a subalínea b.47, do art. 42, I, do RICMS, não haverá ilegalidade no restabelecimento da alíquota anterior por meio do Decreto nº 46.859/2015, pois ambos os decretos atuam de forma regulamentar à Lei Estadual nº 6.763/1975 e dentro dos limites atribuídos ao Poder Executivo.
Não há afronta ao princípio da legalidade, tendo em vista que a alíquota de 18% decorre de previsão legal e a sua redução para a alíquota de 12% foi facultada ao Poder Executivo pela Lei Estadual nº 6.763/1975. Ocorrendo a redução da alíquota por ato do Poder Executivo, não há ilegalidade na revogação também por decreto, de forma secundária à lei.
(TJMG. Agravo de Instrumento-Cv 1.0000.16.038655-3/001. Des. Renato Dresch. Julgado em 08/09/2016. Publicado em 09/09/2016). (Destacou-se)
Nesse sentido, o STF já se posicionou sobre a questão da não aplicação da anterioridade em casos de benefício fiscal, cite-se:
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. COMPENSAÇÃO. PREJUÍZOS FISCAIS. LIMITAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE. EXISTÊNCIA DE PRECEDENTES DO PLENÁRIO SOBRE O TEMA CONSTITUCIONAL DEBATIDO. JULGAMENTO DA MATÉRIA NOS TERMOS DO ART. 557, CAPUT, DO CPC. POSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
I - A possibilidade de compensação de prejuízos fiscais apurados em exercícios anteriores caracteriza benefício fiscal cuja restrição ou ausência não importa ofensa ao texto constitucional.
II - A revisão ou revogação de benefício fiscal, por se tratar de questão vinculada à política econômica que pode ser revista pelo Estado a qualquer momento, não está adstrita à observância das regras de anterioridade tributária previstas na Constituição.
III - A existência de orientação do Plenário da Corte sobre a questão constitucional debatida legitima o julgamento monocrático do recurso nos termos do art. 557 do CPC. IV - Agravo regimental improvido. (STF. A G .REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 617.389 SÃO PAULO. Julgado em 08/05/2012. Publicado DJe em 22/05/2012). (destacou-se)
Na hipótese de a Consulente ter recolhido a menor o imposto, pela aplicação inadequada dos procedimentos acima indicados, poderá, mediante denúncia espontânea, recolher tributo não pago na época própria, observado o disposto no Capítulo XV do Regulamento do Processo e dos Procedimentos Tributários Administrativos - RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 13 de abril de 2022.
Jorge Odecio Bertolin |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso |
De acordo.
Tábata Hollerbach Siqueira
Diretora de Orientação e Legislação Tributária em exercício
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação