Consulta de Contribuinte nº 32 DE 26/02/2021

Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 26 fev 2021

ICMS - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA - As hipóteses de responsabilidade solidária previstas no inciso I do art. 21 da Lei nº 6.763/1975 encontram fundamento no inciso II do art. 124 do CTN, o qual dispõe que são solidariamente obrigadas as pessoas expressamente designadas por lei.

EXPOSIÇÃO:

A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal, informada no cadastro estadual, o transporte rodoviário de carga, exceto produtos perigosos e mudanças, intermunicipal, interestadual e internacional (CNAE 4930-2/02).

Informa que é empresa do grupo econômico que exercerá a atividade de operador logístico, ofício regido pelas normas estabelecidas pelo Decreto nº 48.054, de 07/10/2020, editado sob a égide do art. 225 da Lei nº 6.763/1975 (proteção da economia mineira em razão de benefício fiscal concedido por outra unidade da federação).

Afirma que seu projeto, que inclui vultosos investimentos, tenciona disponibilizar uma solução logística que consistirá em receber, administrar, armazenar temporariamente e despachar mercadorias de terceiros, oriundas de qualquer unidade da federação, para serem entregues em todo o território nacional.

Esclarece que o intuito de incremento de suas atividades econômicas no Estado culminou com a abertura de negociações no âmbito governamental, envolvendo, como de praxe, a participação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SEDE), do Instituto Integrado de Desenvolvimento Econômico (INDI) e Secretaria de Estado de Fazenda (SEF/MG).

Relata que se deparou com dúvidas em relação à interpretação e ao alcance da responsabilidade solidária que poderá assumir, em relação às atividades decorrentes do depósito temporário de mercadorias de terceiros, sendo que o cerne da questão repousa na exegese do art. 21, incisos I, VII e XII, da Lei nº 6.763/1975, invocada na minuta do Protocolo de Intenções, e os consequentes entraves, riscos e passivos tributários que poderão ser gerados em decorrência de sua aplicação.

Salienta que o tratamento tributário a ser concedido ao operador logístico encontra-se disciplinado na cláusula sexta da minuta do Protocolo de Intenções e, em síntese, estabelece que os contribuintes localizados em outra unidade da federação poderão solicitar a inscrição no cadastro de contribuintes do ICMS em Minas Gerais, com endereço no local de armazenagem (exceto as ME e EPP, que ficam dispensadas) e estabelece a dispensa, para o operador logístico, da emissão de documentos fiscais e da escrituração de livros fiscais, em relação às atividades decorrentes do depósito temporário.

Ressalta que a alínea “a” do inciso V da cláusula sexta estabelece que será atribuída ao operador logístico responsabilidade solidária ao depositante, nos termos dos incisos I, VII e XII do art. 21 da Lei nº 6.763/1975, em relação às atividades decorrentes do depósito temporário de mercadorias.

Entende que, com exceção da alínea “a” do inciso I do artigo em comento, todas as demais hipóteses indicam a necessidade de ocorrência de atos ou omissões concorrenciais para embasar a responsabilidade solidária do operador logístico, em total sintonia com o art. 124 do Código Tributário Nacional, a doutrina especializada e a jurisprudência pátria, formada no Superior Tribunal de Justiça.

Alega que é patente que o art. 124 do CTN estabelece que a solidariedade pode alcançar o responsável, a depender da configuração do interesse comum (inciso I) ou da indicação da expressa previsão em lei (inciso II).

Adverte que, na primeira hipótese, o interesse comum a ser demonstrado, conforme já assentado nos tribunais, é o jurídico e não o meramente econômico, consubstanciado na atuação em conjunto, concorrente, que se amolda à hipótese de incidência prevista na norma tributária, sendo necessário comprovar o nexo causal do responsável solidário em sua participação na configuração do ato ilícito com o resultado prejudicial aos cofres públicos.

Observa que, em relação à segunda hipótese, já pacificada no STJ, a responsabilidade legal não poderá jamais ser aleatória ou arbitrária, “mas calcar-se na solidariedade obrigacional ou na ocorrência da infração, como preconiza o art. 135 do CTN” (REsp 1.305.856/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves).

Aduz que a redação da hipótese prevista na alínea “a” do inciso I do art. 21 da Lei nº 6.763/1975, pretensamente, parece indicar a possibilidade de extensão da responsabilidade para circunstâncias que exorbitam a necessidade da configuração da culpa, do dolo, da má-fé, do conluio etc., por parte do operador logístico.

Transcreve excertos da Portaria CAT nº 31, de 18 de junho de 2019, do estado de São Paulo.

Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente CONSULTA.

CONSULTA:

1 - Poderá ser atribuída responsabilidade tributária ao operador logístico em relação ao não recolhimento do ICMS devido pelo vendedor inscrito ou não inscrito no Estado, que depositar a mercadoria em seu estabelecimento? Quais os limites e condições para a atribuição desta responsabilidade?

2 - Poderá ser atribuída a responsabilidade tributária ao operador logístico pelo descumprimento de obrigações acessórias por parte dos vendedores inscritos ou não inscritos no Estado? Quais os limites e condições para a atribuição desta responsabilidade?

3 - A responsabilidade tributária atribuída ao operador logístico poderá ser afastada no caso de boa-fé demonstrada?

RESPOSTA:

Preliminarmente, esclareça-se que, em matéria tributária, o Código Tributário Nacional (CTN) - Lei nº 5.172, de 26 de outubro de 1966, dispõe sobre a solidariedade passiva como instrumento jurídico mediante o qual ao Fisco é garantido exigir o adimplemento do crédito tributário, integralmente, de qualquer dos responsáveis pela obrigação tributária, não se permitindo, sequer, a invocação do benefício de ordem.

Conforme estabelecido no art. 124 do CTN, há duas espécies de devedores solidários, os quais, embora não se achem vinculados diretamente ao fato gerador, ficam sujeitos ao cumprimento do dever tributário dele decorrente, a saber:

Art. 124. São solidariamente obrigadas:

I - as pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal;

II - as pessoas expressamente designadas por lei.

Parágrafo único. A solidariedade referida neste artigo não comporta benefício de ordem.

Ressalte-se que o “interesse comum”, apto a ensejar a responsabilidade tributária, deve envolver, necessariamente, a atuação de mais de uma pessoa na situação de conformação do fato gerador do tributo.

Feitos esses esclarecimentos, passa-se a responder os questionamentos formulados.

1 - Inicialmente, é importante ressaltar que as hipóteses de responsabilidade solidária previstas no inciso I do art. 21 da Lei nº 6.763/1975 encontram fundamento no inciso II do art. 124 do CTN, o qual dispõe que são solidariamente obrigadas as pessoas expressamente designadas por lei.

Por tal disposição, não se pode considerar que seja dado ao legislador amplos poderes para eleger livremente os responsáveis solidários pela obrigação tributária, sem qualquer vínculo entre estes e o fato ensejador do descumprimento da obrigação tributária.

Para essa eleição, portanto, depreende-se que o legislador realiza, a priori, um exame da relação entre os eleitos e o contribuinte, bem como sua vinculação, por ato comissivo ou omissivo, à infração cometida.

Assim, uma vez inserida na lei uma hipótese de responsabilidade solidária com base no inciso II do art. 124 do CTN, cabe ao aplicador da lei tão somente verificar a subsunção do fato, devidamente comprovado, à norma.

Nesse sentido, o inciso I do art. 21 da Lei nº 6.763/1975 assim dispõe:

Art. 21. São solidariamente responsáveis pela obrigação tributária:

I - o armazém-geral, a cooperativa, o depositário, o estabelecimento beneficiador e qualquer outro encarregado da guarda, do beneficiamento ou da comercialização de mercadorias, nas seguintes hipóteses:

a) relativamente à saída ou à transmissão de propriedade de mercadoria depositada, inclusive por contribuinte de fora do Estado;

b) no caso de receber, manter em depósito, dar entrada ou saída a mercadoria de terceiro, sem documento fiscal hábil e sem pagamento do imposto;

c) quando receberem para depósito ou quando derem saída a mercadorias sem documentação fiscal idônea;

A responsabilidade solidária prevista na alínea “a” do inciso I do art. 21 retrotranscrito alcança o não recolhimento do ICMS devido a Minas Gerais pelo vendedor inscrito ou não inscrito no Estado, relativamente àquele incidente na saída de mercadoria do operador logístico ou na transmissão de propriedade de mercadoria depositada no operador logístico.

Ressalte-se que tal responsabilidade restringe-se ao imposto incidente nessas operações específicas e às informações indicadas nos documentos fiscais a serem emitidos nessas operações, não abrangendo, desse modo, o saldo devedor decorrente da apuração normal do imposto realizada pelo estabelecimento contratante dos serviços do operador logístico.

Exemplificativamente, a indicação de imposto menor que o devido no documento fiscal relativo à operação de saída de mercadoria do operador logístico ou na transmissão de propriedade de mercadoria depositada no operador logístico ensejaria a responsabilidade solidária de que trata a alínea “a” do inciso I do art. 21 mencionado, mas estando corretas as informações consignadas nos documentos fiscais, não é atribuível a responsabilidade solidária na eventual falta de recolhimento do saldo devedor do ICMS apurado na escrita fiscal do depositante.

No entanto, é relevante ressaltar que na hipótese em que ao operador logístico é concedido o regime especial de cumprimento de obrigação tributária principal de que trata o inciso II do art. 615 da Parte 1 do Anexo IX do RICMS/2002 e haja vinculação dos depositantes às disposições do referido regime especial, há a assunção de responsabilidade solidária pelo operador logístico com relação ao ICMS e acréscimos legais, inclusive multas, devidos e não pagos pelo depositante vinculado conforme disposto no § 2º do art. 615 aludido c/c inciso XII do art. 21 da Lei nº 6.763/1975, in verbis:

RICMS/2002

Art. 615  - Os regimes especiais a que se refere o art. 613 terão como objeto:

I - o cumprimento de obrigações tributárias acessórias pelo operador logístico, que poderá ser concedido pelo titular da Delegacia Fiscal a que estiver circunscrito o requerente;

II - o cumprimento de obrigação tributária principal pelo operador logístico, que poderá ser concedido pelo Superintendente de Tributação;

III - a vinculação do depositante vinculado ao tratamento tributário previsto no regime especial a que se refere o inciso II, que poderá ser concedido pelo titular da Delegacia Fiscal a que estiver circunscrito o requerente.

§ 1º - Cada regime especial a que se refere o inciso II do caput consistirá na concessão de um único tratamento tributário dentre os albergados pelo art. 2º da Lei nº 23.090, de 21 de agosto de 2018, que tenha sido padronizado nos termos da Resolução do Secretário de Estado de Fazenda nº 4.751, de 9 de fevereiro de 2015.

2º - O requerimento do regime especial a que se refere o inciso II do caput implicará a assunção de responsabilidade solidária pelo operador logístico com relação ao ICMS e acréscimos legais, inclusive multas, devidos e não pagos pelo depositante vinculado em razão da vinculação a que se refere o inciso III do caput.

Lei nº 6.763/1975

Art. 21. São solidariamente responsáveis pela obrigação tributária:

XII - qualquer pessoa pelo recolhimento do imposto e acréscimos legais devidos por contribuinte ou responsável, quando os atos ou as omissões daquela concorrerem para o não-recolhimento do tributo por estes.

2 - Saliente-se, de início, que a obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária, consoante § 3º do art. 113 do CTN.

Desse modo, a solidariedade se estabelece em relação à penalidade pecuniária aplicada por descumprimento da obrigação acessória vinculada à obrigação principal, cuja responsabilidade solidária é atribuída a terceiros pela lei.

Por exemplo, se do estabelecimento do operador logístico houver saída de mercadoria de terceiro desacobertada de documento fiscal, além do imposto incidente na operação, o operador logístico é responsável solidário relativamente à multa aplicável por essa infração.

Por outro lado, em relação ao descumprimento de obrigações acessórias não vinculadas diretamente com o fato gerador ensejador da responsabilidade solidária, tais como falta de escrituração do documento fiscal ou falta de entrega da Escrituração Fiscal Digital, não há previsão para a atribuição de solidariedade no tocante à penalidade pecuniária aplicável.

3 - Não. Caso reste evidenciado o "interesse comum" de que trata o preceito estabelecido no inciso I do art. 124 do CTN ou as hipóteses do art. 21 da Lei nº 6.763/1975, correta será a imputação que atribua à Consulente a responsabilidade tributária solidária pelo pagamento do crédito tributário porventura constituído, independentemente de ter ou não agido de boa-fé.

O art. 136 do CTN assenta que “salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infrações da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato”.

DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 26 de fevereiro de 2021.

Alberto Sobrinho Neto
Assessor
Divisão de Orientação Tributária

Ricardo Wagner Lucas Cardoso
Coordenador
Divisão de Orientação Tributária

De acordo.

Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária

De acordo.

Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação