Consulta de Contribuinte SEFAZ nº 23 DE 27/02/2013
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 27 fev 2013
ICMS - IMPORTAÇÃO - ISENÇÃO - PESCADO - INAPLICABILIDADE
ICMS - IMPORTAÇÃO - ISENÇÃO - PESCADO - INAPLICABILIDADE -Não há na legislação tributária mineira previsão de isenção do ICMS para as operações com pescado ou produtos comestíveis resultantes de seu abate. A título de esclarecimento, ressalte-se que o tratamento tributário recíproco previsto no acordo GATT/OMC aplica-se somente às operações realizadas com a mercadoria após sua internalização em território nacional, não alcançando o ICMS devido na importação.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente, com apuração do ICMS pelo regime de débito e crédito, informa ser detentora de Regime Especial de Tributação e exercer, dentre outras, a atividade de comércio, importação e exportação de gêneros alimentícios, no atacado e no varejo.
Discorre sobre entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca da equivalência de tratamento tributário que deve ser observada quando da importação de produtos originados de países signatários de tratados internacionais dos quais o Brasil também seja parte.
Cita o § 2º do art. 5º c/c inciso VIII do art. 84, ambos da Constituição da República de 1988, o art. 98 do Código Tributário Nacional e a Súmula 575 do STF como base do seu entendimento.
Argumenta que o STF já se pronunciou sobre a matéria relativamente à importação de bacalhau proveniente de países signatários do GATT.
Assevera que a isenção do ICMS estabelecida na legislação estadual para o pescado filetado de origem nacional deve ser aplicada ao produto similar importado de país membro do GATT, sob pena de transgressão de tratado internacional e de configurar tratamento discriminatório do bem importado em relação ao nacional.
Acrescenta que a isenção se estende à importação das espécies do gênero “pescado” (bacalhau e merluza), conforme já decidido nos Tribunais Superiores e no Tribunal de Justiça de São Paulo.
Em dúvida quanto à aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
Está correto o entendimento de que o pescado filetado de origem estrangeira, importado de País signatário do GATT, deve ser beneficiado pela isenção aplicada na comercialização do pescado filetado de origem nacional, em razão do Tratado Internacional e do princípio da reciprocidade?
RESPOSTA:
Preliminarmente, importa salientar que não há na legislação tributária mineira previsão de isenção do ICMS para as operações com pescado ou produtos comestíveis resultantes de seu abate.
Observa-se que o Convênio ICMS nº 60/91, que produziu efeitos durante o período de 1º/10/91 a 30/07/99, autorizou os Estados e o Distrito Federal a conceder isenção do ICMS nas operações internas com os pescados que especifica.
Entretanto, cumpre esclarecer que, no caso específico de Minas Gerais, as concessões previstas em convênio somente se efetivam se houver alteração expressa na legislação mineira a fim de introduzi-las. Cabe destacar que, no caso do Convênio ICMS nº 60/91, as alterações necessárias para a concessão da isenção de que trata não foram realizadas.
Ressalte-se que as operações realizadas neste território com pescado, ou com produtos comestíveis resultantes de seu abate, estão sujeitas à legislação mineira, que, por sua vez, não prevê isenção do ICMS.
No que tange à operação interna com peixes e produtos comestíveis resultantes de seu abate, em estado natural, resfriados ou congelados, a subalínea “b.1” do inciso I do art. 42 do RICMS/02 estabelece a alíquota de 12% (doze por cento), desde que sejam de produção nacional:
“Art. 42. As alíquotas do imposto são:
I - nas operações e prestações internas:
(...)
b) 12 % (doze por cento), na prestação de serviço de transporte aéreo e nas operações com as seguintes mercadorias:
b.1) arroz, feijão, fubá de milho, farinha de milho, farinha de mandioca, leite in natura, aves, peixes, gado bovino, bufalino, suíno, caprino e ovino e produtos comestíveis resultantes de seu abate, em estado natural, resfriados ou congelados, quando de produção nacional, observado o disposto no item 19 da Parte 1 do Anexo IV;”
Em se tratando de operação de importação,o inciso I do § 2º do referido art. 42 determina que, para efeito de aplicação de alíquota, considera-se operação interna a entrada, real ou simbólica, de mercadoria ou bem importados do exterior por pessoa física ou jurídica. Vale dizer, na apuração do ICMS devido na operação de importação de mercadoria do exterior, será aplicada a alíquota prevista às operações internas com a mesma mercadoria.
Portanto, para o cálculo do ICMS incidente na operação de importação de peixe ou produto resultante do seu abate, devido ao fato de não atender ao requisito determinado pela subalínea em epígrafe, ou seja, não ser de produção nacional, a alíquota aplicável será de 18% (dezoito por cento), conforme estabelece a alínea “e” do inciso I do art. 42 do RICMS/02.
Ainda, relativamente às operações com produtos comestíveis resultantes do abate de peixe, em estado natural, resfriados ou congelados, a legislação tributária estadual prevê a redução de base de cálculo de 61,11%, nas operações internas tributadas à alíquota de 18%, e de 41,66%, quando tributadas à alíquota de 12%, consoante o disposto na alínea “a” do item 19 da Parte 1 c/c item 60 da Parte 6, ambos do Anexo IV do RICMS/02.
Entretanto, ressalte-se que a referida redução da base de cálculo se aplica somente às saídas, em operação interna, realizadas em território nacional, ou seja, no caso de importação da mercadoria, somente as operações subsequentes serão beneficiadas com a redução de base de cálculo, ainda que a mercadoria seja importada de País signatário do GATT.
Isso se deve ao fato de que, diferentemente do entendimento exposto pela Consulente, o acordo GATT/OMC não se aplica ao ICMS devido na operação relativa a circulação de mercadoria ocorrida na importação. O tratado ou acordo internacional será aplicado somente após a internalização da mercadoria em território nacional.
Vale dizer, uma vez internalizada no mercado nacional, a saída subsequente da mercadoria importada constitui outro negócio jurídico distinto e independente da importação, sendo a comercialização interna ou interestadual. É sobre esta saída subsequente que se aplica o tratamento tributário recíproco previsto no acordo GATT/OMC.
Esse entendimento se mostra patente no artigo III:2 da Parte II do GATT 1994, que estabelece a obrigação de “tratamento nacional”, em tradução de seu texto original:
“Art. III. Tratamento Nacional em Regulação e Taxação Interna
(...)
“2. Os produtos originários do território de qualquer parte contratante, importados para o território de qualquer parte contratante, não deverão se sujeitar, direta ou indiretamente, a impostos internos ou outros encargos internos de qualquer espécie em excesso àqueles aplicados, direta ou indiretamente, aos produtos nacionais similares. (...)" (grifo nosso)
A obrigação de tratamento nacional, normalmente referida como a obrigação de TN, determina que os membros do GATT/OMC não discriminem produtos importados após esses produtos terem entrado no mercado doméstico, ou seja, o Artigo III:2 relaciona-se apenas a medidas internas (impostos internos ou outros encargos internos de qualquer espécie) e não a medidas de fronteira.
Sobre o tratamento nacional, vale ressaltar importante doutrina internacional, de autoria do jurista Antonio UCKMAR[1]:
“Una segunda forma de no discriminación, definida como el tratamiento nacional (TN), prescribe que una vez introducidos en el mercado los bienes deben recibir un tratamiento no menos favorable que el tratamiento reservado a los productos nacionales. Así lo prescribe el artículo III del GATT.” (grifo nosso)
Com efeito, verifica-se que o disposto no Acordo GATT não está direcionado aos impostos incidentes na importação de mercadoria do exterior (Imposto de Importação e ICMS devido na operação relativa à circulação de mercadoria ocorrida na importação). O referido Acordo será aplicado somente aos tributos incidentes nas operações que ocorrerem em território nacional, ou seja, após a internalização da mercadoria.
Desse modo, importa salientar que o Acordo GATT criou, neste aspecto, tão somente, a exigência do respeito ao ‘princípio da igualdade de tratamento tributário’, de modo que o produto importado não se sujeite, direta ou indiretamente, a taxas internas e outras cobranças de qualquer tipo em excesso ao que seria aplicado, direta ou indiretamente, aos produtos nacionais similares.
O GATT não cria, modifica ou extingue isenções ou obrigações tributárias nos países integrantes do acordo. O que ele simplesmente exige é que seja dado à mercadoria importada e internalizada no mercado interno tratamento não discriminatório àquele conferido aos produtos similares nacionais.
Esse é o sentido da Súmula 575 do Supremo Tribunal Federal - STF, citada pela Consulente:
SÚMULA 575
À MERCADORIA IMPORTADA DE PAÍS SIGNATÁRIO DO (GATT), OU MEMBRO DA (ALALC), ESTENDE-SE A ISENÇÃO DO IMPOSTO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS CONCEDIDA A SIMILAR NACIONAL.
Data de Aprovação
Sessão Plenária de 15/12/1976
Fonte de Publicação
DJ de 3/1/1977, p. 4; DJ de 4/1/1977, p. 36; DJ de 5/1/1977, p. 60.
Referência Legislativa
Emenda Constitucional 1/1969, art. 20, III.
Código Tributário Nacional de 1966, art. 97, IV; art. 98.
GATT, Parte 2, art. 3º, § 1º, § 2º.
Importante destacar que a interpretação correta à Súmula deve ser no sentido de que o tratamento dispensado ao produto importado no mercado interno não deverá ser mais gravoso do que aquele dispensado ao produto nacional na ordem jurídica interna.
O que não se pode fazer entender, erroneamente, é que a operação de importação deve ser tratada como se interna fosse. Vale dizer, não há de se confundir o tratamento tributário dispensado ao ICMS devido na importação com o ICMS devido nas operações com mercadorias dentro do país.
Portanto, no caso sob análise, tem-se que tanto as operações de importação quanto as operações internas subsequentes à importação com o produto peixe ou com produtos comestíveis resultantes de seu abate serão tributadas à alíquota de 18% (dezoito por cento), conforme alínea “e” do inciso I art. 42 do RICMS/02, visto não atender à exigência de produto nacional prevista na subalínea “b.1” do inciso I do mesmo artigo.
No que concerne as operações internas subsequentes à importação com os produtos comestíveis resultantes do abate do peixe, ou seja, a operação realizada em território mineiro com a mercadoria de origem estrangeira, a base de cálculo do imposto será reduzida em 61,11%, observado o disposto no item 19 da Parte 1 do Anexo IV do RICMS/02.
Necessário ressaltar que a Consulente é detentora de Regime Especial de Tributação que estabelece diferimento na importação de vários produtos, entre estes alguns tipos de pescado.
Por fim, se da solução dada à presente Consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta Consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA/MG, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/08.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 27 de fevereiro de 2013.
Alex Adriane Viana |
Fernanda Andrade Bonifácio Gomes |
Marcela Amaral de Almeida
Coordenadora
Divisão de Orientação Tributária
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
Antonio Eduardo M. S. P. Leite Junior
Superintendente de Tributação
[1] UCKMAR, Antonio. Aspectos fiscales de las reglas de la organización mundial del comercio. In: Uckmar, Victor. Curso de Derecho Tributario Internacional. Bogotá: Editorial Temis S.A., 2003, p.512.