Consulta de Contribuinte nº 109 DE 27/06/2022
Norma Estadual - Minas Gerais - Publicado no DOE em 27 jun 2022
ICMS – SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA – BASE DE CÁLCULO – FRETE FOB – Na hipótese de o remetente, contribuinte substituto, encontrar-se impossibilitado de incluir o valor do frete na composição da base de cálculo do ICMS/ST, o estabelecimento destinatário recolherá a parcela do imposto a ele correspondente, aplicando a alíquota interna prevista para a mercadoria submetida ao regime de substituição tributária sobre o valor do frete, acrescido do percentual de margem de valor agregado estabelecido para a respectiva mercadoria, conforme previsto no inciso III do § 2º do art. 19 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002.
EXPOSIÇÃO:
A Consulente apura o ICMS pela sistemática de débito e crédito e tem como atividade principal informada no cadastro estadual o comércio atacadista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios (CNAE 4691-5/00).
Informa que recebeu em 29/11/2021 uma correspondência da Delegacia Fiscal de Contagem/MG solicitando informações sobre inconsistências verificadas quando do procedimento fiscal auxiliar de cruzamento eletrônico de dados, e que tal correspondência não configura o início de ação fiscal, sendo possível a apresentação da presente consulta.
Destaca que é pessoa jurídica de direito privado e tem como objeto social, em síntese, o comércio atacadista e varejista de mercadorias em geral, com predominância de produtos alimentícios, nos termos do seu estatuto social e, portanto, é contribuinte do ICMS.
Relata que remete seus produtos para outros estados para armazenagem em depósitos fechados para posterior distribuição e entrega aos clientes finais e que realiza a aquisição de diversas mercadorias fornecidas por estabelecimentos situados em outras unidades da Federação.
Aduz que alguns produtos adquiridos estão enquadrados no regime de recolhimento antecipado do ICMS, denominado como “substituição tributária para frente” (ICMS/ST), nos termos do § 7º do art. 150 da Constituição da República de 1988 (CR/1988) e, em algumas dessas operações, é responsável pela contratação e pagamento do prestador do serviço que realiza o transporte da mercadoria do estabelecimento do vendedor até o seu.
Entende que nessa hipótese, quando é responsável pela contratação e pagamento do prestador do serviço de transporte (frete), está diante de uma operação denominada como cláusula Free on Board (FOB).
Ressalta que, de acordo com a modalidade FOB, as despesas com o frete são de responsabilidade do destinatário das mercadorias, inexistindo transferência do custo do serviço de transporte pelo vendedor da mercadoria.
Acrescenta que, no caso concreto, a dúvida reside na intepretação das disposições contidas no inciso III do § 2º do art. 19 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002 c/c item 2 do § 19 do art. 13 da Lei nº 6.763/1975.
Sustenta que, para efeitos tributários, nos termos do art. 110 do Código Tributário Nacional, considera-se “valor da operação” o preço da mercadoria ou do serviço, acordado entre comprador e vendedor e, se a hipótese de incidência tributária do ICMS consiste em operação de circulação de mercadoria ou na prestação de serviços, o “valor da operação” somente pode ser o preço cobrado do adquirente da mercadoria ou do tomador do serviço.
Defende que, não sendo o frete FOB encargo cobrável ou transferível aos adquirentes dos produtos sujeitos ao ICMS/ST, a exigência da inclusão desta modalidade de frete na base de cálculo do ICMS devido a título de substituição tributária é indevida.
Transcreve conceitos teóricos e doutrinários não só da cláusula FOB, como de definições de base de cálculo.
Infere que, na literal disposição dos mencionados inciso III do § 2º do art. 19 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002 c/c item 2 do § 19 do art. 13 da Lei nº 6.763/1975, a inclusão do frete FOB na base de cálculo do ICMS/ST somente poderia ocorrer se, e somente se, o valor da prestação do serviço de transporte fosse cobrado ou transferido para o adquirente.
Afirma que os dispositivos acima determinam, na mesma orientação do inciso II do art. 8º e inciso II do § 1º do art. 13, ambos da Lei Complementar nº 87/1996, que o frete e as demais despesas apenas integrarão a base de cálculo do ICMS/ST quando forem debitadas ao estabelecimento destinatário.
Cita que, no entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de recurso repetitivo, foi reconhecida a ilegalidade da inclusão do frete na base de cálculo do ICMS/ST quando o adquirente for responsável pela contratação e pagamento do serviço de transporte - frete sob a cláusula FOB.
Informa que além disso, na contratação do prestador do serviço de transporte (frete FOB) há a incidência e o recolhimento do ICMS ao estado de origem, que é repassado no preço arcado pela Consulente.
Com dúvida sobre a aplicação da legislação tributária, formula a presente consulta.
CONSULTA:
1 – Está correto o entendimento de que a inclusão do frete “FOB” na base de cálculo do ICMS/ST somente poderia ocorrer se o valor do serviço de transporte fosse cobrado ou transferido para a Consulente? Em outras palavras, a complementação do ICMS/ST sobre o serviço de transporte somente seria exigível da Consulente se o vendedor das mercadorias fosse responsável pela contratação e pagamento do frete (frete CIF)?
2 – No mesmo sentido da pergunta anterior, está correto o entendimento de que “valor da operação” para fins de apuração da base de cálculo do ICMS/ST pode compreender somente os valores cobrados ou transferidos pelo vendedor?
3 – Na remota hipótese de serem negativas as respostas aos quesitos acima, está correto o entendimento da Consulente de que a exigência da complementação do ICMS/ST nas operações de frete realizadas sob a cláusula FOB constituiria bis in idem, haja vista o recolhimento do imposto de competência estadual no início da prestação do serviço de transporte?
RESPOSTA:
1, 2 e 3 – Preliminarmente, esclareça-se que, por expressa disposição constitucional, apenas os julgados em Controle Concentrado de Constitucionalidade (Ação Declaratória de Constitucionalidade/ADC e Ação Direta de Inconstitucionalidade/ADI) e as Súmulas Vinculantes (art. 103-A da CR/1988) são de observância obrigatória pela Administração Pública direta e indireta, em todas as esferas (federal, estadual e municipal).
Diante dessa realidade, as decisões proferidas em sede de recurso extraordinário, ainda que em regime de repercussão geral, ou em sede de recurso especial, ainda que em regime de recursos repetitivos, e as súmulas persuasivas editadas não só pelo STF, como também pelo STJ, não geram efeitos vinculantes aptos a ensejar sua observância pelo estado de Minas Gerais, desde que este não seja parte da ação.
Entrementes, verifica-se que a decisão do STJ referida pela Consulente é o REsp nº 931.727/ RS, cujo conteúdo abrange o entendimento de que o valor relativo ao frete FOB não integra a base de cálculo do ICMS/ST de responsabilidade do remetente, posto que este não se encontra vinculado ao contrato de transporte da mercadoria.
No entanto, o disposto no inciso III do § 2º do art. 19 da Parte 1 do Anexo XV do RICMS/2002, assim como o item 2 do §19 do artigo 13 da Lei Estadual nº 6.763/1975 referem-se à atribuição de responsabilidade da apuração e recolhimento do ICMS/ST, com base no item 1 do § 8º do art. 22 da Lei nº 6.763/1975, sobre a parcela relativa ao frete FOB ao próprio destinatário da mercadoria, vinculado ao respectivo contrato de transporte.
Portanto, depreende-se que os fatos narrados na exposição se configuram em uma situação diversa da julgada no REsp nº 931.727/RS.
Lado outro, acrescente-se que a base de cálculo do ICMS/ST está prevista no art. 8º da Lei Complementar nº 87/1996:
Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:
(...)
II - em relação às operações ou prestações subsequentes, obtida pelo somatório das parcelas seguintes:
a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou pelo substituído intermediário;
b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;
c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações subsequentes.
Dessa forma, a norma suprarreferida contida na alínea “b” do inciso II do art. 8º da LC 87/1996 é cristalina ao estabelecer que o valor do frete transferível ao adquirente ou tomador do serviço é uma das parcelas que integra o cálculo do ICMS/ST.
Portanto, se a Consulente contrata, em seu nome, o serviço de transporte interestadual de carga para fazer chegar, em seu estabelecimento, a mercadoria por ela adquirida (cláusula FOB), claro está que o valor referente ao frete, ao invés de lhe ser cobrado pelo remetente, lhe é transferido e, portanto, a Consulente arca, diretamente, com seu pagamento, constituindo custo da mercadoria adquirida, tendo, portanto, repercussão no preço da mercadoria ao final da cadeia de sua circulação.
Portanto, não há bis in idem relativamente ao imposto cobrado pela prestação do serviço de transporte da mercadoria pelo estado de início da prestação, tendo em vista que a parcela do ICMS/ST cobrada se refere a fato gerador distinto, qual seja, a circulação da própria mercadoria e não a prestação do serviço de transporte.
Ressalte-se que o imposto relativo à prestação de serviço de transporte cujo tomador seja o destinatário da mercadoria submetida ao regime da substituição tributária poderá ser apropriado como crédito na escrita fiscal do tomador, nos termos do inciso I do art. 66 do RICMS/2002.
Esta Diretoria já se manifestou sobre a temática por ocasião das respostas dadas às Consultas de Contribuinte nos 027/2022 e 049/2022.
Por fim, se da solução dada à presente consulta resultar imposto a pagar, este poderá ser recolhido sem a incidência de penalidades, observando-se o prazo de 15 (quinze) dias contados da data em que a Consulente tiver ciência da resposta, desde que o prazo normal para seu pagamento tenha vencido posteriormente ao protocolo desta consulta, observado o disposto no art. 42 do RPTA, estabelecido pelo Decreto nº 44.747/2008.
DOT/DOLT/SUTRI/SEF, 27 de junho de 2022.
Flávio Bartoli da Silva Júnior |
Ricardo Wagner Lucas Cardoso |
De acordo.
Ricardo Luiz Oliveira de Souza
Diretor de Orientação e Legislação Tributária
De acordo.
Marcelo Hipólito Rodrigues
Superintendente de Tributação