Consulta SEFAZ nº 87 DE 11/06/1997

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 11 jun 1997

Construção Civil - Tratamento Tributário


Senhor Secretário:A entidade acima nominada, visando a dirimir dúvida suscitada nas relações entre seus associados e a ...., vem expor e consultar o que segue:

1 - a ... tem exigido das empresas construtoras que destaquem o ICMS relativo aos insumos empregados nos serviços que estas lhe prestam, contratados através de licitações públicas;

2 - expõe seu entendimento, porém, segundo o qual as empresas de construção civil não compram mercadorias e, sim, adquirem insumos a serem empregados em seus próprios serviços;

3 - tais empresas, conforme afirma, não são contribuintes do ICMS porque sujeitas ao ISS, de competência municipal, não dando origem ao fato gerador do tributo estadual, que não lhes pode ser cobrado simultaneamente, dada a vedação expressa no artigo 8º, § 1º, do Decreto-lei nº 406/68;

4 - a ..., contudo, insiste que as empresas observem sua orientação, à qual condiciona a quitação das faturas emitidas contra si, causando transtornos às prestadoras de serviços;

5 - pelo exposto, requer da Secretaria de Estado de Fazenda confirmação do seu entendimento a fim de que possa efetuar gestões junto à administração daquela Estatal.

É a consulta.

Objetivando a melhor compreensão da matéria, é de se trazer à colação os preceitos que norteiam a tributação dos prestadores de serviços como os arrolados na consulta, iniciando pelo Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, que, em seu artigo 8º, determina:

"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.

§ 1º - Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.

§ 2º - O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias." Examinando a Lista de Serviços remetida, já na redação conferida pela Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, verifica-se estarem nela arroladas as seguintes atividades, conforme itens 32 e 34:"(...)

32. Execução, por administração, empreitada e subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços que fica sujeito ao ICM).

(...)

34. Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM).

(...).

"A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, determina:"Art. 2º - O imposto incide sobre:

(...)

V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.

(...)."

Editada ainda sob a égide do Convênio ICM 66/88 (então em vigor com status de lei complementar no âmbito do ICMS, conforme artigo 34, § 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), a Lei nº 5.419, de 27 de dezembro de 1988, que instituiu o tributo no Estado de Mato grosso, ao elencar as hipóteses constitutivas do seu fato gerador estabelece:

"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

VIII - no fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:

(...)

b) compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência deste imposto, como definida em lei complementar;

(...)."

Conveniente observar que não há contradição entre os dispositivos da Lei recepcionada com a ordem conferida pela LC. nº 87/96. Muito menos, a aludida Lei Complementar trouxe nova regra que alterasse o tratamento estabelecido entre os impostos estadual e municipal, ditado pelo Decreto-lei nº 406/68.

Atentando para os limites da competência estadual, o Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989, detalha:"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

IX - no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência do ICMS, como definida na lei complementar, a saber:

a) fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador do serviço, fora do local da prestação do serviço:

1) nos casos de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares;

2) nos casos de conservação, reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres;

(...)."

Por seu turno, cuidando da não-incidência, o artigo 4º do texto regulamentar dispõe:"Art. 4º - O imposto não incide sobre:

(...)

XIV - as saídas de mercadorias de estabelecimento prestador de serviços a que se refere o artigo 8º do Decreto-lei Federal nº 406, de 31 de dezembro de 1968, na redação determinada pelo Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, constante da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos VIII e IX do artigo 2º deste regulamento.

(...).

"Não é demais trazer à colação a definição de contribuinte, contida no artigo 10 do Regulamento do ICMS:

"Art. 10 - Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto.

§ 1º - Incluem-se entre os contribuintes do imposto:

(...)

10 - o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios, e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar;

(...)."

Também este dispositivo mantém consonância com a Lei nº 5.419/88 (artigo 26, parágrafo único, inciso X).

Ainda do RICMS, busca-se o disposto no artigo 21:"Art. 21 - Inscrever-se-ão no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes de iniciarem atividades:

I - as pessoas arroladas no artigo 10;

(...)

V - as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias;

(...)."

Além das disposições até aqui invocadas, estatuídas em artigos de caráter geral, o RICMS contém capítulo exclusivo normatizando as Operações relativas à Construção Civil (Capítulo III do Título VII do Livro I). Deste, incumbe transcrever:

"Art. 426 - Considera-se empresa de construção civil, para fins de inscrição e cumprimento das demais obrigações fiscais previstas neste regulamento, toda pessoa, natural ou jurídica, que executar obras de construção civil ou hidráulicas, promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros.

(...)."

"Art. 427 - O imposto não incide sobre:

I - a execução de obras por administração sem fornecimento de material;

II - o fornecimento de material adquirido de terceiros por empreiteiro ou subempreiteiro para aplicação na obra;

III - a movimentação de material a que se refere o inciso anterior, entre estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra;

IV - a saída de máquinas, veículos, ferramentas ou utensílios para prestação de serviço em obra, desde que devam retornar ao estabelecimento do remetente."Ressalva-se que o artigo 427 transcrito foi restabelecido no RICMS, com nova redação, através do Decreto nº 81, de 28 de março de 1995.

"Art. 429 - O imposto será pago sempre que a empresa de construção promover:

I - saídas de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando destinados a terceiros;

II - a saída de seu estabelecimento, de material de fabricação própria;

III - a entrada de mercadoria importada do exterior;

IV - a entrada, no estabelecimento da empresa, de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal e não esteja vinculada à operação ou prestação subseqüente alcançada pela incidência do imposto.

Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos IV e V a obrigação da empresa consistirá, afinal, em pagar o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual."

Por fim, trazem-se a lume os ditames do Convênio ICMS 71/89, celebrado entre as unidades federadas, que firmaram o seguinte entendimento:

"Cláusula primeira - ... nas operações interestaduais de bens e mercadorias destinadas a empresas de construção civil, para fornecimento em obras contratadas que executem sob sua responsabilidade, e em que ajam, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do imposto, aplica-se o disposto na letra a do inciso VII e, se for o caso, no inciso VIII, do § 2º, do artigo 155 da Constituição Federal."

A longa reprodução dos preceitos legais e regulamentares tem por escopo oferecer a sustentação para as conclusões que se seguirão.

O Decreto-lei nº 406/68, ao remeter, em seu artigo 8º, à sua anexa Lista, as hipóteses constitutivas do fato gerador do ISS, deixou a salvo do então ICM - hoje, ICMS - o fornecimento de mercadorias por empresas de construção civil, adquiridas de terceiros.

A exclusão, vale ressaltar, está assegurada no artigo 4º, inciso XIV, do RICMS e foi expressamente anunciada no inciso II do artigo 427 do mesmo Diploma Regulamentar.

De sorte que, nas hipóteses avençadas, não caberia o destaque do ICMS por não estarem no seu campo de incidência.

É bom que se diga que nenhum efeito produziria eventual destaque deste tributo: o Estado não poderia cobrá-lo, eis que lhe falta a legitimidade como sujeito ativo; o destinatário do serviço - nesta conjectura, também de "mercadoria"- não poderia aproveitá-lo como crédito porque "calculado em desacordo com as normas da legislação vigente" (artigo 60, caput, in fine, do RICMS).

Portanto, o destaque do imposto reivindicado pela estatal, posto que ilegal, seria também ineficaz.

Todavia, se as mercadorias fornecidas forem produzidas pelo prestador do serviço fora do local da obra, a hipótese adentra o campo da incidência do ICMS, que se torna exigível e, por conseguinte, devendo ser destacado no documento fiscal (v. ressalva nos itens 32 e 34 da Lista de Serviço e artigos 2º, inciso IX, alínea a e 429, inciso II, do RICMS).

Em conseqüência, o entendimento da consulente, peca quando generaliza não ser as prestadoras de serviço contribuintes do ICMS. Quer parecer que a assertiva foi vinculada às hipóteses consultadas. Por estas, de fato, não são.

Inobstante, a condição de contribuinte do imposto o estabelecimento pode adquirir por outras hipóteses, submetendo-se, por isso, às obrigações tributárias inerentes à esta qualidade, como se depreende da leitura dos artigos 10, § 1º, item 1; 21, incisos I e V; 426 e 429 do RICMS e cláusula primeira do Convênio ICMS 71/89.Em que pese o equívoco incorrido pela consulente com generalização, não se vai aqui avançar no estudo da matéria - até porque alheia à dúvida suscitada - restringindo-se às ressalvas acima alinhavadas, corroboradas com os preceitos extraídos da legislação tributária.

Feitos os reparos e uma vez admitido que as mercadorias fornecidas na prestação dos serviços descritos foram adquiridas de terceiros, é de se confirmar o entendimento esposado pela entidade.

Eis a informação, ora submetida a superior consideração, com a anotação de que os destaques apostos nos dispositivos extraídos da legislação são inexistentes no original.

Cuiabá - MT, 11 de junho de 1997.

Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
Visto:
Mailsa Silva de Jesus
Gerente de Processos Especiais
De acordo:
José Carlos Pereira Bueno
Coordenador de Tributação