Consulta s/nº DE 04/12/2008

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 04 dez 2008

Contribuinte enquadrado no Simples Nacional que venha apurar, por si, falta de emissão de documento fiscal, antes de iniciado procedimento pelo fisco, deverá emiti-lo extemporaneamente em conformidade com as disposições do § 6°, do art. 84, no que couber, do Decreto n° 18.955/97, para regularizar o Livro Registro de Saídas, desde que recolhidos integral e espontaneamente os tributos faltantes.

Senhor Gerente,
 
O consulente em epígrafe formula consulta  que assim se resume:

Informa ser contemplado pela sistemática do Simples Nacional, desde julho de 2007.

Relata, após constatada discrepância entre os valores efetivamente faturados e documentos fiscais emitidos em alguns meses do exercício de 2007, haver feito a devida correção relativamente ao pagamento dos tributos em DAS – Documento de Arrecadação do Simples, considerando que é contemplado pela sistemática do Simples Nacional. Cita ainda que, ao se debruçar sobre o Decreto n° 18.955/1997, constatou a correta orientação, sem contudo defini-la, quanto à possível regularização no que diz respeito às empresas tributadas de acordo com a sistemática normal de apuração do ICMS. Vindo, ao final, diante de todo o exposto, solicitar orientação quanto à emissão de nota fiscal referente a fatos geradores anteriores para regularização dos livros fiscais, em especial, no Livro Fiscal Eletrônico de Saídas.

É o relatório.

Diante do exposto, analisamos se o pedido atende os pressupostos de admissibilidade constantes na legislação.

A Lei n° 657, de 25 de janeiro de 1994, no seu art. 44, estabelece que ao sujeito passivo é facultado formular consulta sobre aplicação da legislação tributária do Distrito Federal a fato determinado.

Presentes os requisitos dos artigos 42 e 43 do Decreto n. 16.106, de trinta de novembro de 1994, que regulamenta o Processo Administrativo Fiscal no Distrito Federal, confere-se admissibilidade à presente Consulta.

Inicialmente, passamos a analisar os procedimentos fiscais de saneamento adotados pelo consulente frente à irregularidade que cometeu pela falta de emissão de documentos fiscais e pela ausência de lançamento das discrepâncias constatadas nos livros fiscais.

O consulente relata ter promovido o recolhimento integral dos tributos faltantes com a devida correção em DAS – Documento de Arrecadação do Simples. Tendo, conforme relatou, verificado, por si próprio, a ausência de lançamento de valores efetivamente faturados nos livros fiscais, infere-se que o contribuinte deva ter procedido à devida regularização, mediante manutenção ou re-enquadramento em correta faixa de receita bruta para fins de apuração e recolhimento dos tributos faltantes. Em consonância com esses procedimentos, salientamos o disposto nos §§ 2° e 3°, art. 4°, Resolução CGSN n° 10, de 28.6.2007,  que dispõe sobre as obrigações acessórias relativas às microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional:

 “ Art. 4º A ME e a EPP optantes do Simples Nacional apresentarão, anualmente, declaração única e simplificada de informações socioeconômicas e fiscais que será entregue à Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), por meio da internet, até o último dia do mês de março do ano-calendário subseqüente ao de ocorrência dos fatos geradores dos impostos e contribuições previstos no Simples Nacional.

...

§ 2º A declaração simplificada poderá ser retificada independentemente de prévia autorização da administração tributária e terá a mesma natureza da declaração originariamente apresentada, observado o disposto no parágrafo único do art. 138 do CTN.

§ 3º A retificação da declaração simplificada por iniciativa do próprio declarante, quando vise reduzir ou excluir tributo, só é admissível antes do início de procedimento fiscal.”.

Observamos, assim, no § 2°, do art 4°, da Resolução supra, previsão de retificação espontânea da declaração simplificada do contribuinte, que a fez com inexatidão, o que, à inteligência do art. 138 do CTN, o exime das penalidades incidentes sobre a obrigação tributária principal, sem, contudo, eximi-lo do pagamento da multa acessória definida no inciso I, do art. 368, do Decreto n° 18.955/97 - RICMS. No § 3° do mesmo artigo da referida Resolução, normatizou o Comitê, antes do início de procedimento fiscal, a retificação de declaração que vise reduzir ou excluir tributo. Diante do exposto, podemos orientar o consulente a assim proceder, quanto à retificação de declaração que vise aumentar tributo. Dessa forma, adotando o contribuinte procedimento em consonância com a legislação tributária do Simples, estará ele preservado de eventual possibilidade de lançamento de ofício por parte da administração tributária, em virtude do disposto no art. 1° da Recomendação CGSN n° 2, de 1° de setembro de 2008:

“Art. 1° Os débitos relativos aos impostos e contribuições resultantes das informações prestadas na Declaração Anual do Simples Nacional (DASN) encontram-se devidamente constituídos, não sendo cabível lançamento de ofício por parte das administrações tributárias federal, estaduais ou municipais.”  (grifamos).

Pelos dispositivos acima, entendemos ser possível, ao contribuinte enquadrado no Simples, verificando que deixou de emitir documentos fiscais em razão de suas operações sujeitas à incidência do imposto, regularizar-se espontaneamente, antes do início de procedimento fiscal. Ressaltamos que o saneamento deva ocorrer tão logo detecte a irregularidade e antes do início de procedimento do fisco, preservando, assim, sua manutenção no regime diferenciado e favorecido do Simples Nacional. A contrario sensu, estaríamos diante da possibilidade de instauração de procedimento fiscal ou auditoria tributária, que além de apurar os tributos devidos e acréscimos legais, deveria aplicar a exclusão do regime do Simples, de ofício, considerando o disposto no art. 33, combinado com o inciso XI, do art. 29, da Lei Complementar n° 123/2006, bem como na Resolução CGSN n° 15, de 23.7.2007.

Entendemos que tendo sido efetuado o pagamento dos tributos faltantes e devidos acréscimos com a devida correção por meio de DAS, integral e espontaneamente, conforme relatos do consulente, estamos diante de procedimentos efetuados pelo sujeito passivo ao abrigo da previsão legal de recolhimento espontâneo de tributos, disposta no art. 138, CTN. Resta, diante da regularidade dos procedimentos, prestar os esclarecimentos demandados pelo contribuinte quanto à emissão de notas fiscais referentes a fatos geradores anteriores, com vistas à regularização dos livros fiscais que relata utilizar.

Afirma o consulente constatar a correta orientação no Decreto n° 18.955/97(RICMS), quanto à possível regularização no tocante às empresas tributadas, conforme a sistemática normal de apuração do ICMS. Entretanto, no sentido contrário a suas afirmações, não há previsão na legislação tributária do DF de emissão extemporânea de documento fiscal visando acobertar fatos geradores anteriores, cuja emissão não tenha sido efetuada no momento da ocorrência do fato gerador, obrigação essa disposta no art. 78, do RICMS:

“Art. 78. O contribuinte é obrigado a emitir o documento fiscal e a entregá-lo ao destinatário, juntamente com a mercadoria, bem ou serviço objeto da operação ou prestação, ainda que não seja por este solicitado (Lei n° 1.254/96, art. 49).” (grifamos).

Ao procedermos à integração da legislação tributária, nos deparamos, contudo, com os dispositivos a seguir, que não nos permitem a dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.

Assim, o art. 111, do Código Tributário Nacional (CTN) dispõe:

“Art. 111. Interpreta-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre:                    

...

III – dispensa do cumprimento de obrigações tributárias acessórias.”

Pelo dispositivo legal acima, podemos inferir que a dispensa do cumprimento de obrigação tributária acessória  deva ocorrer expressamente pela legislação tributária, cuja interpretação não seja feita de outra forma, senão a literal.  Nesse contexto, salientamos, embora haja previsão quanto ao recolhimento espontâneo de tributos para contribuinte que vise sua regularização perante o fisco, não há legislação que o dispense do cumprimento de obrigações tributárias acessórias. Nesse sentido, ressaltamos os comandos do inciso I, do art. 26, da Lei Complementar 123/2006 que obrigam as microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional a emitir documento fiscal de venda ou prestação de serviço, de acordo com instruções expedidas pelo Comitê Gestor. Verificamos também a importância da emissão de documentos fiscais em passagens da legislação do Simples como a disposta no inciso I, art. 5°, Resolução CGSN n° 38, de 1° de setembro de 2008:

“Art. 5° O optante pelo regime de apuração de receitas de que trata o art. 2° deverá manter registro dos valores não recebidos, em modelo a ser estabelecido pelo CGSN, no qual constarão, no mínimo, as seguintes informações, relativas a cada prestação de serviço ou operação com mercadorias, à vista ou a prazo:

I - número e data de emissão de cada documento fiscal;

(...)”.

Assim, para ser dada orientação ao contribuinte, na ausência de disposição expressa em legislação quanto à dispensa de emissão de documentos fiscais, necessário se faz o emprego da analogia, disposta no art. 108, CTN:

“Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará, sucessivamente, na ordem indicada:

I – a analogia;

II – os princípios gerais de direito tributário;

III – os princípios gerais de direito público;

IV – a equidade.”  (grifamos).         

Segundo CARVALHO, Paulo de Barros, in  Curso de Direito Tributário. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 100, ao comentar sobre o art. 108 do CTN, escreve:

“O preceito tem endereço certo: a autoridade competente para aplicar a legislação tributária, seja ela o funcionário da Fazenda, seja o órgão judicial que preside o feito”.        

Sobre a utilização da analogia, NADER, Paulo, in Introdução ao estudo do direito. 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 210, escreve:

“Não havendo lei ou não constituindo ela critério razoável de apreciação do justo, cabe ao juiz buscar a integração do direito com a analogia, que consiste em aplicar, a um caso não previsto pelo legislador, a solução por ele apresentada para um outro caso fundamentalmente semelhante àquele.” .

Define “analogia”  MACHADO, Hugo de Brito, in Curso de Direito Tributário. 26ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 118, 119:

“Analogia. É o meio de integração pelo qual o aplicador da lei, diante de lacuna desta, busca solução para o caso em norma pertinente a casos semelhantes, análogos. O legislador nem sempre consegue disciplinar expressa e especificamente todas as situações. O mundo fático é complexo e dinâmico, de sorte que é impossível uma lei sem lacunas. Assim, diante de uma situação para a qual não há dispositivo legal específico, aplica-se o dispositivo a situações semelhantes, idênticas, análogas, afins.

A analogia presta-se tanto em favor do fisco como do contribuinte. Qualquer lacuna na legislação tributária pode, e deve, ser preenchida pelo recurso à analogia, respeitada apenas a ressalva do § 1° do art. 108, já mencionada.”.

Constatada, portanto, a necessidade de emissão de documento fiscal, face à ausência de legislação tributária que dispense o cumprimento de obrigação acessória (art. 111, CTN), presente a obrigatoriedade de emissão de documento fiscal (art. 26, I, LC n° 123/2006), frente à lacuna existente na legislação para contribuinte que se mobiliza espontaneamente com pagamento integral dos tributos faltantes, é mister que a autoridade competente na aplicação da legislação que vise a orientar o contribuinte, utilize-se dos comandos prescritos no art. 108, CTN. Ao fazê-lo, encontra a analogia como primeira orientação a ser perseguida, de forma a definir como um contribuinte enquadrado no Simples, deverá, diante do exposto, e já tendo cumprido com a obrigação tributária principal, emitir extemporaneamente documentos fiscais, ou seja, em momento posterior ao da ocorrência do fato gerador, com vistas a regularizar seus documentos e livros fiscais.

Examinando nossa legislação tributária – em especial o RICMS – encontramos caso não exatamente idêntico, mas que guarda correlação com o que se pretende definir. A correlação refere-se ao fato de haver uma única hipótese prevista no RICMS em que ocorre saída de mercadoria mediante emissão extemporânea de documento fiscal. Trata-se dos incisos, IV e V, do art. 84, bem como do § 6°, do mesmo artigo, abaixo transcritos:

“Seção II

Dos Documentos Fiscais Relativos a Operações com Mercadorias

Subseção I

Da Nota Fiscal em Modelo Completo

Art. 84. As notas Fiscais modelos 1 e 1-A serão emitidas na hipótese de:

...

 IV - regularização em virtude de diferença no preço de operação ou prestação, ou na quantidade de mercadoria, quando efetuada no período de apuração do imposto em que tiver sido emitido o documento fiscal original;

 V - correção do valor do imposto, se este tiver sido destacado a menor, em virtude de erro de cálculo, quando a regularização ocorrer no período de apuração do imposto em que tiver sido emitido o documento fiscal original (Ajuste SINIEF 1/89, cláusula segunda);

(...)              

§ 6º Na hipótese dos incisos IV e V do caput deste artigo, se a regularização se efetuar após o período de apuração, o documento fiscal também será emitido, devendo o contribuinte:

I - recolher, em Documento de Arrecadação - DAR específico, a diferença do imposto com as especificações necessárias à regularização, indicando, na via do documento presa ao talão, essa circunstância e a data do pagamento;

II - efetuar, no livro Registro de Saídas:

a) a escrituração do documento fiscal;

b) a indicação da ocorrência, na coluna “Observações”, nas linhas correspondentes à escrituração do documento fiscal original e do documento fiscal complementar; “

À semelhança do que se deseja orientar, o disposto no art. 84 visa estabelecer àquele contribuinte que pretende espontaneamente se regularizar, procedimento de emissão extemporânea de documento fiscal que servirá de base ao recolhimento dos impostos faltantes. Pelo exame da legislação tributária local, não encontramos outra hipótese de emissão extemporânea de documento fiscal, por iniciativa do contribuinte que, identificando a ocorrência de fato gerador, intenciona se regularizar perante o fisco com  integral recolhimento dos impostos, senão aquela prevista no art. 84, RICMS, acima transcrita.

Destarte, pelo emprego da analogia, e considerando todas as circunstâncias e variáveis do caso concreto, orientamos o contribuinte:

1)  a se pautar pelas disposições do § 6°, do art. 84, do RICMS, no que couber, com emissão de nota ou cupom fiscal, relativa a cada período de apuração, fazendo constar informações relativas à regularização das operações em que não se emitiu documento fiscal, bem como período ou datas a que se referem (XIII, art. 85, RICMS). Ressaltamos que essas orientações não se aplicam ao contribuinte optante pelo Simples Nacional que não tenha recolhido, espontânea e integralmente, os tributos faltantes relativos ao período em que foram constatadas as discrepâncias relatadas.

2) retificar os livros fiscais eletrônicos, com base no disposto nos artigos 1º e 2º , da Portaria n° 210, de 14 de julho de 2006, bem como art. 1°,  do Ato COTEPE n° 35/2005.

3) retificar a declaração simplificada, visando sua majoração, relativamente aos tributos faltantes, nos termos do § 2°, do art. 4°, Resolução CGSN n° 10, de 28.6.2007.

Considerando que a consulta foi formulada após vencido o prazo legal para cumprimento da obrigação a que se referiu, não produzirá os efeitos a que se refere o art. 44 do Decreto nº 16.106, de 30 de novembro de 1994, nos termos do inciso VIII de seu art. 46.

É o parecer.

Brasília,  3  de dezembro de 2008.

Fayad Ferreira

Núcleo de Esclarecimento de Normas

Chefe

Aprovo o parecer do Núcleo de Esclarecimento de Normas – NUESC, desta Gerência de Legislação Tributária, com fulcro no que dispõe o inciso II do art. 1º do da Ordem de Serviço n. 29, de 27 de março de 2007.

A presente decisão terá efeito normativo 10 (dez) dias após a sua publicação no Diário Oficial do Distrito Federal, conforme dispõe o art. 54 do Decreto nº 16.106/94.

Esclarecemos que a consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda, no prazo de 20 (vinte) dias contado de sua publicação no Diário Oficial do Distrito Federal, conforme dispõe o art. 53 do Decreto nº 16.106/94.

Publique-se nos termos da competência constante do inciso II do art. 113 do Anexo Único à Portaria SEFP nº 648, de 2001, com a redação da Portaria SEFP nº 563, de 2002.

Após, adotem-se as demais providências aplicáveis ao caso.

Brasília-DF, 4 de  dezembro  de 2008.

CÉLIO LOPES DE JESUS

Gerência de Legislação Tributária

GERENTE SUBSTITUTO