Consulta SEFAZ nº 137 DE 18/08/1997

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 18 ago 1997

Construção Civil - ICMS Garantido - Diferencial Alíquota

Senhor Secretário:

A empresa acima nominada, estabelecida à Rua ..., ..... , inscrita no CGC sob o nº... e no CCE sob o nº ..., vem expor e requerer o que segue:

1. em 28.05.97, a requerente adquiriu de ..., Piracicaba-SP, o equipamento discriminado na Nota Fiscal nº ..., no valor de R$ 125.000,00;

2. a Secretaria de Estado de Fazenda, pela operação, emitiu DAR-1, com Código de Receita 3395 - ICMS SERVIÇOS - DIFERENCIAL DE ALÍQUOTA, no montante de R$ 12.500,00, fixando vencimento em 10.08.97;

3. alega que a exigência está fundamentada no artigo 155, § 2º, inciso VII, da Constituição Federal, que trata exclusivamente de contribuintes do ICMS, asseverando não ser este o seu caso, já que é prestadora de serviço;

4. para corroborar sua afirmação, remete ao espelho contendo seus dados cadastrais, que a desobriga da apresentação da DAME;

5. comenta que, em contato com os servidores incumbidos do exame do ICMS GARANTIDO, sua argumentação não foi aceita, com respaldo em parecer não formal da Assessoria Tributária, que entende ser esta empresa "extensão dos contribuintes previstos no art. 426 do Dec. 1994, sendo tal entendimento alicerçado em manifestação judicial que considerou as construtoras como contribuintes do ICMS, ao cassar Mandato de Segurança" ( sic);

6. pondera que o artigo 426, § 1º, que define obras de construção civil é claro ao elencar, no item 5, obras de terraplenagem, desde que promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros;

7. declara não se enquadrar em qualquer das hipóteses;

8. requer o cancelamento do lançamento efetuado.

Instruem o requerimento a cópia da Nota Fiscal mencionada, o DAR-1 emitido e o espelho do Sistema de Informações Cadastrais, referente à inscrição estadual da requerente (fls. 03 a 05).

É o relatório.

De plano, incumbe registrar que a contribuinte está cadastrada com o Código de Atividade Econômica 6.00.90, que, de acordo como espelho exibido, refere-se a desmatamento e terraplenagem.

Ocorre que o citado CAE não consta do Anexo III do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989.

Ausente do processo o contrato social da empresa, não é possível identificar o seu objetivo social, a fim de buscar seu correto enquadramento.

Diante da divergência, examinar-se-á a questão, tomando como base as atividades indicadas no CAE utilizado, terraplenagem e desmatamento, as quais, inclusive, figuram na razão social da contribuinte.

Objetivando a melhor compreensão da matéria, é de se trazer à colação os preceitos que norteiam a tributação dos prestadores de serviços, iniciando pelo Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, que, em seu artigo 8º, determina:

"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.

§ 1º - Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.

§ 2º - O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias."Examinando a Lista de Serviços remetida, já na redação conferida pela Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, verifica-se estarem nela arroladas as seguintes atividades, conforme itens 32 e 34:"(...)

32. Execução, por administração, empreitada e subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços que fica sujeito ao ICM).

(...)

34. Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM).

(...)."

A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, determina:

"Art. 2º - O imposto incide sobre:

(...)

V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.

(...)."

Editada ainda sob a égide do Convênio ICM 66/88 (então em vigor com status de lei complementar no âmbito do ICMS, conforme artigo 34, § 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), a Lei nº 5.419, de 27 de dezembro de 1988, que instituiu o tributo no Estado de Mato Grosso, ao elencar as hipóteses constitutivas do seu fato gerador, estabelece:

"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

VIII - no fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:

(...)

b) compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência deste imposto, como definida em lei complementar;

(...)."

Conveniente observar que não há contradição entre os dispositivos da Lei recepcionada com a ordem conferida pela LC nº 87/96. Muito menos, a aludida Lei Complementar trouxe nova regra que alterasse o tratamento estabelecido entre os impostos estadual e municipal, ditado pelo Decreto-lei nº 406/68.

Atentando para os limites da competência estadual, o Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989, detalha:

"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

IX - no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência do ICMS, como definida na lei complementar, a saber:

a) fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador do serviço, fora do local da prestação do serviço:

1) nos casos de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares;

2) nos casos de conservação, reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres;

(...)."

Por seu turno, cuidando da não-incidência, o artigo 4º do texto regulamentar dispõe:"Art. 4º - O imposto não incide sobre:

(...)

XIV - as saídas de mercadorias de estabelecimento prestador de serviços a que se refere o artigo 8º do Decreto-lei Federal nº 406, de 31 de dezembro de 1968, na redação determinada pelo Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, constante da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos VIII e IX do artigo 2º deste regulamento.

(...)."Não é demais trazer à colação a definição de contribuinte, contida no artigo 10 do Regulamento do ICMS:

"Art. 10 - Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto.

§ 1º - Incluem-se entre os contribuintes do imposto:

(...)

10 - o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios, e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar;

(...)."

Também este dispositivo mantém consonância com a Lei nº 5.419/88 (artigo 26, parágrafo único, inciso X).

Ainda do RICMS, busca-se o disposto no artigo 21:

"Art. 21 - Inscrever-se-ão no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes de iniciarem atividades:

I - as pessoas arroladas no artigo 10;

(...)

V - as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias;

(...)."

Além das disposições até aqui invocadas, estatuídas em artigos de caráter geral, o RICMS contém capítulo exclusivo normatizando as Operações relativas à Construção Civil (Capítulo III do Título VII do Livro I). Deste, incumbe transcrever:

"Art. 426 - Considera-se empresa de construção civil, para fins de inscrição e cumprimento das demais obrigações fiscais previstas neste regulamento, toda pessoa, natural ou jurídica, que executar obras de construção civil ou hidráulicas, promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros.

§ 1º Entendem-se por obras de construção as adiante relacionadas, quando decorrentes de obras de engenharia civil:

(...)

5 - execução de obras de terraplenagem, de pavimentação em geral, hidráulicas, marítimas ou fluviais;

(...)

§ 2º O disposto neste capítulo aplica-se também aos empreiteiros e subempreiteiros, responsáveis pela execução da obra no todo ou em parte.""Art. 427 - O imposto não incide sobre:

I - a execução de obras por administração sem fornecimento de material;

II - o fornecimento de material adquirido de terceiros por empreiteiro ou subempreiteiro para aplicação na obra;

III - a movimentação de material a que se refere o inciso anterior, entre estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra;

IV - a saída de máquinas, veículos, ferramentas ou utensílios para prestação de serviço em obra, desde que devam retornar ao estabelecimento do remetente."

Ressalva-se que o artigo 427 transcrito foi restabelecido no RICMS, com nova redação, através do Decreto nº 81, de 28 de março de 1995."Art. 429 - O imposto será pago sempre que a empresa de construção promover:

I - saídas de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando destinados a terceiros;

II - a saída de seu estabelecimento, de material de fabricação própria;

III - a entrada de mercadoria importada do exterior;

IV - a entrada, no estabelecimento da empresa, de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal e não esteja vinculada à operação ou prestação subseqüente alcançada pela incidência do imposto.

Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos IV e V a obrigação da empresa consistirá, afinal, em pagar o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual."A longa reprodução dos preceitos legais e regulamentares tem por escopo oferecer a sustentação para as conclusões que se seguirão.

O Decreto-lei nº 406/68, ao remeter, em seu artigo 8º, à sua anexa Lista, as hipóteses constitutivas do fato gerador do ISS, deixou a salvo do então ICM - hoje, ICMS - o fornecimento de mercadorias por empresas de construção civil, adquiridas de terceiros.

A exclusão, vale destacar, está claramente explicitada no artigo 4º inciso XIV do RICMS.

Por conseguinte a empresa que, atuando no ramo em tela, em regime de administração, empreitada ou subempreitada, não forneça mercadorias de fabricação própria, produzida fora do local da obra, não configura, por esta atividade, contribuinte do imposto.

O entendimento esposado é ratificado pelo § 1º do artigo 10 do RICMS, que, no que pertine ao prestador de serviços submetido ao imposto municipal, considera-o contribuinte do ICMS, quando também fornecer mercadorias ressalvadas em lei complementar (item 10).

Prosseguindo na análise das indicações, há que se investigar os fundamentos da parcela do imposto devido a título de diferencial de alíquota.

A Carta Magna de 1988, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993, preconiza:

"Art. 155 - Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(...)

§ 2º - O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

(...)

VII - em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:

a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto;

b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele;

VIII - na hipótese da alínea 'a' do inciso anterior, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;

(...)."

Daí, as hipóteses previstas nos incisos II e III do já invocado artigo 2º do Convênio ICM 66/88, que tipificam fatos geradores do ICMS:

"Art. 2º - ...

(...)

II - na entrada no estabelecimento de contribuinte de mercadoria oriunda de outro Estado, destinada a consumo ou a ativo fixo;

III - na utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação subseqüente alcançada pela incidência do imposto;

(...)."

(Mais uma vez, as regras estão inseridas na lei estadual e seu diploma regulamentar, sob a mesma capitulação).

Ora, se as empresas consideradas não são contribuintes do imposto, não cabe exigir-se-lhes o diferencial de alíquota, eis que ausente elemento necessário à tipificação do fato gerador do imposto.

Em contrapartida, porém, não se-lhes aplica a alíquota interestadual; vale dizer, nas aquisições de mercadorias de outras unidades da Federação, as operações devem ser gravadas com a alíquota interna, vigente na unidade federada de localização do remetente.

Ocorre que, via de regra, as empresas em questão dedicam-se a mais de uma atividade - é comum estatutos sociais prevendo não só atividades em questão, mas também outras de natureza correlata, com submissão ao ICMS (fornecimento de mercadoria ressalvada em lei complementar) e, até mesmo, atos de comércio, senão em geral, pelo menos, de sobras e resíduos, como indicado no inciso I do artigo 429 do RICMS.

De sorte que, em tese, no desempenho de suas atividades, as empresas enumeradas nos §§ do artigo 426, praticam também fatos que lhe conferem a condição de contribuinte, ainda que em caráter excepcional.

Para a exigibilidade do diferencial de alíquota, é necessária a qualidade, mesmo que em potencial, de contribuinte do ICMS, mas não se perquire se a mercadoria vai ser destinada a atividade afeta a este imposto, ou não.

Uma vez contribuinte, a alíquota aplicável nas aquisições de outros Estados é a interestadual, ainda que o bem ou material seja empregado em prestação de serviço sujeita apenas ao ISS.

Daí a celebração do Convênio ICMS 71/89 firmando o seguinte entendimento:

"Cláusula primeira - ... nas operações interestaduais de bens e mercadorias destinadas a empresas de construção civil, para fornecimento em obras contratadas que executem sob sua responsabilidade, e em que ajam, ainda que excepcionalmente, como contribuinte do imposto, aplica-se o disposto na letra 'a' do inciso VII e, se for o caso, no inciso VIII, do § 2º, do artigo 155 da Constituição Federal."

Os incisos IV e V do artigo 429 do RICMS, se tomados isoladamente, poderiam levar a concluir que a qualquer empresa impõe-se o recolhimento do diferencial de alíquota. A ilação é falsa. Os dispositivos hão que ser interpretados à luz dos demais, hierarquicamente superiores, que norteiam a matéria, sem perder a correlação com os incisos citados do artigo 2º do RICMS.

Por empresa, nos incisos em exame, deve-se entender apenas aquelas enquadradas na condição de contribuintes do ICMS - ainda, que, excepcionalmente, porém, contribuintes -, respeitando-se, portanto, os limites legais definidores do arquétipo do diferencial de alíquota.

Em não sendo contribuinte, isto é dedicando-se exclusivamente a atividade sujeita ao ISS, não estaria, sequer, inscrita no Cadastro do Estado não podendo, então, apresentar-se como tal nas aquisições interestaduais, devendo exigir do fornecedor o destaque do ICMS pela alíquota interna da unidade federada de origem.

No entanto, as próprias empresas dão azo para que se lhes considere como contribuinte ao recorrer a este caráter para utilização da alíquota interestadual. Neste caso, as mesmas se auto-qualificam contribuinte, valendo-se de sua inscrição no Cadastro Estadual como prova.

Se as próprias empresas confessam-se contribuintes, se as aquisições são gravadas por alíquota minorada, resta a exigibilidade do diferencial de alíquota, como previsto nos incisos II e III do artigo 2º, combinado com os incisos IV e V do artigo 429, ambos do RICMS.

Este é o entendimento reiteradamente manifestado, antes, pela extinta Assessoria Tributária e, agora, pela Gerência de Processos de Legislação Tributária da Coordenadoria de Tributação.

Todavia, o caso em tela consiste em requerimento para cancelamento de Documento de Arrecadação, emitido para cobrança do ICMS GARANTIDO - diferencial de alíquota.

Em que pese a inexistência de regras formais disciplinando as atribuições das unidades fazendárias, como sucessora da antiga Assessoria Tributária, entende-se ser esta Gerência incompetente para apreciar o pedido, tendo discorrido sobre o tema como hipótese, nos limites conferidos a Órgão consultivo que é.

Assim sendo, sugere-se a remessa do presente ao Grupo de Atendimento ao Contribuinte, vinculado ao ICMS GARANTIDO, subordinado à Coordenadoria de Fiscalização, para deliberação final sobre o pleito.

É a informação, S.M.J, com a ressalva de que os destaques apostos nos preceitos da legislação reproduzida inexistem no original.

Cuiabá-MT, 18 de agosto de 1997.
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
De acordo: José Carlos Pereira Bueno
Coordenador de Tributação