Consulta nº 126 DE 04/09/2007

Norma Estadual - Paraná - Publicado no DOE em 04 set 2007

ICMS. IMPORTAÇÃO DE BENS. IMUNIDADE. NÃO RECONHECIMENTO.

A Consulente, entidade religiosa sem fins lucrativos, informa que para atender as suas finalidades essenciais necessita importar bens do exterior, sendo que a Receita Federal do Brasil já firmou posicionamento no sentido de que inexiste incidência do Imposto de Importação (II) e do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) relativamente a tais importações, conforme Soluções de Consulta SRRF/8ª RF/DISIT n. 227 e 254, datadas, respectivamente, de 02/08/2004 e 06/09/2004, cópias anexadas.

Manifesta seu entendimento de que deve ser desonerada também do recolhimento do ICMS que ainda lhe é exigido quando da importação de seus bens, invocando, para tanto, a imunidade tributária prevista no art. 150, inc. VI, al. “b” e § 4º da Constituição da República.

Sustenta que o alcance da imunidade tributária já foi amplamente discutido no passado pela doutrina nacional e que o Supremo Tribunal Federal não só repeliu os entendimentos que restringiam a sua aplicação, como tratou de destacar seu caráter abrangente, transcrevendo, neste sentido, seis ementas de acórdãos proferidos por aquela Egrégia Corte.

Aduz que sendo o ICMS um imposto que desfalca o seu patrimônio, prejudicando consequentemente o desenvolvimento de suas finalidades estatutárias, resta claro que a imunidade tributária prevista na Constituição Federal para os templos de qualquer culto deve alcançá-la, inclusive porque a Consulente é, ao mesmo tempo “contribuinte de direito” e “contribuinte de fato”.

Ressalta, ainda, que o próprio Estado do Paraná, por intermédio da Lei n. 14.586/2004, proibiu a cobrança do ICMS sobre os serviços públicos de água, luz, telefone e gás prestados aos templos de qualquer culto.

Esclarece, por fim, que o Procurador Geral da República emitiu parecer contrário à ADIN n. 3421-9, proposta pelo Senhor Governador deste Estado em face à referida Lei n 14.586/2004, afirmando que a lei paranaense nada mais fez do que reafirmar e aplicar, na prática, a disposição constitucional que garante a imunidade tributária aos templos de qualquer culto.

Isto posto, indaga:

1) A imunidade tributária constitucionalmente prevista alcança o ICMS incidente na importação de bens de uso/consumo próprio relacionados às suas finalidades essenciais?

2) Em sendo positiva a resposta acima, como se dará, na prática, o procedimento para exoneração do pagamento do ICMS nessas importações?

RESPOSTA

Sobre a aludida imunidade tributária, veja-se o que dispõe o art. 150, inc. VI, al. “b” e “c” e § 4º da Constituição Federal, “verbis”:

“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

...

VI – instituir impostos sobre: (...)

b) templos de qualquer culto;

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;

...

§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.

Analisando-se tal dispositivo, depreende-se que se trata de imunidade objetiva e direcionada aos impostos sobre o patrimônio, a renda ou serviços, tanto em relação aos “templos de qualquer culto” (al. “b” e § 4º), como em relação às “instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos” (al. “c”, e § 4º).

Portanto, tratando-se de ICMS, seja na condição de “igreja”, seja na condição de “associação educacional e de assistência social sem fins lucrativos”, (finalidades essenciais para as quais foi constituída a Consulente, conforme artigo 2º do seu estatuto), não há falar-se em “imunidade constitucional” nas importações efetuadas, pois a vedação contida no artigo 150, inc. VI, al. “b” e “c”, restringe-se aos impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, e tão somente sobre estes.

O Código Tributário Nacional, ao tratar dos IMPOSTOS (Livro Primeiro, Título III) separa-os por “grupos”, sendo que no Capítulo III estão disciplinados os “Impostos sobre o patrimônio e a renda”, que são os seguintes:

Seção I – Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (art. 153, VI da CF/88 e 29 do CTN);

Seção II - Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (art. 156,I e § 1º da CF/88 e 32 do CTN);

Seção III – Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a ele Relativos (art. 155, I, a e 156,II da CF/88 e 35 do CTN);

Seção IV – Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (art. 153,III da CF/88 e 43 do CTN).

Assim, os três primeiros impostos (o terceiro dividido em 2) são aqueles diretamente atingidos pela vedação imposta pelo termo “patrimônio” (ITR, IPTU e ITCMD/ITBI) e também o quarto e último (IR).

É equivocada a interpretação extensiva que se pretende dar ao dispositivo constitucional ora em análise, pois quisesse o legislador constituinte estender a imunidade tributária também a outros impostos, a exemplo do ICMS, de que ora se trata, teria feito menção expressa no § 4º do art. 150 da CF/88.

Neste sentido, importa destacar a opinião do Professor Sacha Calmon Navarro Coelho - que, contrariamente às teses defendidas por outros tributaristas, que foram trazidas à colação pela Consulente – assim se manifestou, “verbis”:

“A imunidade das instituições de educação e assistência social as protege da incidência do IR, dos impostos sobre o patrimônio e dos impostos sobre serviços, não de outros, quer sejam as instituições contribuintes “de jure” ou “de facto”. Destes outros só se livrarão mediante isenção expressa, uma questão diversa”. (“in” Comentários à Constituição de 1988 – Sistema Tributário “, Ed. Forense 6ª ed, pág. 349).

Com efeito, a aquisição de bens ou de mercadorias, mediante importação do exterior constitui fato gerador do ICMS, conforme dispõem a Constituição Federal, no seu art. 155, inc IX, al. “a”, com a redação dada pela EC nº 33/2001, e a Lei Orgânica do ICMS do Paraná (Lei n. 11.580/1996), no seu art. 2º , inc. I, § 1º, “verbis”:

“Art. 2º O imposto incide sobre:

I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em bares, restaurantes e estabelecimentos similares;

...

§ 1º O imposto incide também:

I - sobre a entrada de mercadoria ou bem importados do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade (Lei Complementar nº.114/02);

Nova redação dada ao inciso I pelo art. 1º, alteração 1ª, da Lei n. 14.050, de 14.05.2003, produzindo efeitos a partir de 17.12.2002.

Redação original, em vigor no período de 1º.11.96 a 16.12.2002:

I - sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, por pessoa física ou jurídica, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo permanente do estabelecimento;"

Quanto à referida obtenção, pela entidade Consulente, do reconhecimento da imunidade tributária constitucional relativamente aos Impostos de Importação e de Produtos Industrializados junto à Receita Federal do Brasil, deixa-se de fazer qualquer comentário, haja vista a autonomia dos entes tributantes de que trata a mesma Constituição Federal nos seus artigos 145 e 146, sendo certo, ademais, que o posicionamento adotado por aquele órgão não vincula, nem obriga a Secretaria da Fazenda deste Estado.

No que se refere aos acórdãos do STF,  transcritos pela Consulente, não se aplicam ao caso específico objeto da presente consulta, pois dizem respeito à desoneração do II e do IPI em favor das instituições de assistência social.

Quanto ao aludido Parecer do Senhor Procurador Geral da República, contrário à ADIN 3421-9, proposta pelo Senhor Governador deste Estado em face à Lei n 14.586/2004, esclareça-se que o mesmo ainda depende da análise do relator do processo no Supremo Tribunal Federal, ministro Marco Aurélio Mello. Portanto, estando a questão sub-judice, inexiste, até a presente data, qualquer decisão sobre a mesma, de forma que aquele entendimento poderá, eventualmente, ser refutado pelos Senhores Ministros da Suprema Corte Brasileira.

E, ainda, sobre a matéria discutida naquela ADIN, este Setor Consultivo deixa de se manifestar, em face ao disposto no art. 583 do RICMS/PR, aprovado pelo Decreto n. 5.141/2001.

De conformidade com o contido no art. 591 do Regulamento do ICMS/2001, tem a Consulente o prazo de quinze dias, a partir da sua ciência, para adequar seu procedimento, bem como sanar eventuais irregularidades pendentes, no caso de ter procedido diferentemente do contido nesta resposta.