Consulta SEFAZ nº 106 DE 02/07/1997

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 03 jul 1997

Crédito Fiscal - Bens de Uso e Consumo

Senhor Secretário:

A empresa acima indicada, estabelecida na Rua ..., Cuiabá-MT, inscrita no CGC sob o... e no CCE sob o nº ..., expõe e consulta o que segue:

1 - a consulente, de plano, transcreve o disposto nos artigos 19 e 20, § 1º, da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996;

2. a seguir, pondera que a partir de 1º.11.96, as empresas que adquirirem mercadorias para integrar o seu ativo permanente, poderão aproveitar o crédito do ICMS destacado nas Notas Fiscais, desde que as saídas das mercadorias produzidas ou comercializadas sejam tributadas pelo ICMS;

3. e indaga:

3.1 - o valor do ICMS destacado nas Notas Fiscais de aquisição das mercadorias pedra, areia, cimento, aço, etc. adquiridas e utilizadas na construção de usinas hidrelétricas, portanto, destinadas ao ativo permanente da consulente, pode ser apropriado como crédito desde 1º de novembro de 1996?

3.2 - em respeito ao princípio da não cumulatividade, previsto no artigo 155, § 2º, I, da Constituição Federal, o valor do ICMS destacado nas Notas Fiscais de aquisições de mercadorias, para integrarem o ativo permanente, efetuadas em data anterior a 1º de novembro de 1996, pode ser aproveitado como crédito pela consulente?

3.3 - no caso de execução de obras contratadas com empreiteiras, nas quais as prestadoras de serviços ficam encarregadas de fornecer todos os equipamentos e materiais, como proceder para que os valores do ICMS destacados nas Notas Fiscais emitidas em nome do prestador de serviços sejam aproveitados pela consulente?

É a consulta.

Para efeitos didáticos, inverter-se-á a ordem no exame das questões formuladas, com o intuito de separar, inicialmente, as hipóteses sujeitas ao ICMS daquelas regidas pelo imposto de competência municipal.

Desta forma, passar-se-á a responder a terceira indagação.

Objetivando a melhor compreensão da matéria, é de se trazer à colação os preceitos que norteiam a tributação dos prestadores de serviços como os arrolados na consulta, começando pelo Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, que, em seu artigo 8º, determina:

"Art. 8º - O imposto, de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante da lista anexa.

§ 1º - Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias.

§ 2º - O fornecimento de mercadorias com prestação de serviços não especificados na lista fica sujeito ao imposto sobre circulação de mercadorias."

Examinando a Lista de Serviços remetida, já na redação conferida pela Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, verifica-se estarem nela arroladas as seguintes atividades, conforme itens 32 e 34:

"(...)

32. Execução, por administração, empreitada e subempreitada, de construção civil, de obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços que fica sujeito ao ICM).

(...)

34. Reparação, conservação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador dos serviços fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM).

(...)."

A Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe sobre o ICMS, determina:

"Art. 2º - O imposto incide sobre:

(...)

V - fornecimento de mercadorias com prestação de serviços sujeitos ao imposto sobre serviços, de competência dos Municípios, quando a lei complementar aplicável expressamente o sujeitar à incidência do imposto estadual.

(...)."

Editada ainda sob a égide do Convênio ICM 66/88 (então em vigor com status de lei complementar no âmbito do ICMS, conforme artigo 34, § 8º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), a Lei nº 5.419, de 27 de dezembro de 1988, que instituiu o tributo no Estado de Mato Grosso, ao elencar as hipóteses constitutivas do seu fato gerador estabelece:

"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

VIII - no fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:

(...)

b) compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência deste imposto, como definida em lei complementar;

(...)."

Conveniente observar que não há contradição entre os dispositivos da Lei recepcionada com a ordem conferida pela LC nº 87/96. Muito menos, a aludida Lei Complementar trouxe nova regra que alterasse o tratamento estabelecido entre os impostos estadual e municipal, ditado pelo Decreto-lei nº 406/68.

Atentando para os limites da competência estadual, o Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 1.944, de 06 de outubro de 1989, detalha:

"Art. 2º - Ocorre o fato gerador do imposto:

(...)

IX - no fornecimento de mercadorias com prestação de serviços compreendidos na competência tributária dos municípios e com indicação expressa de incidência do ICMS, como definida na lei complementar, a saber:

a) fornecimento de mercadorias produzidas pelo prestador do serviço, fora do local da prestação do serviço:

1) nos casos de execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção civil, obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive serviços auxiliares ou complementares;

2) nos casos de conservação, reparação e reforma de edifícios, estradas, pontes, portos e congêneres;

(...)."

Por seu turno, cuidando da não-incidência, o artigo 4º do texto regulamentar dispõe:

"Art. 4º - O imposto não incide sobre:

(...)

XIV - as saídas de mercadorias de estabelecimento prestador de serviços a que se refere o artigo 8º do Decreto-lei Federal nº 406, de 31 de dezembro de 1968, na redação determinada pelo Decreto-lei 834, de 8 de setembro de 1969, constante da Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, ressalvadas as hipóteses previstas nos incisos VIII e IX do artigo 2º deste regulamento.

(...)."

Não é demais trazer à colação a definição de contribuinte, contida no artigo 10 do Regulamento do ICMS:

"Art. 10 - Contribuinte é qualquer pessoa, física ou jurídica, que realize operação de circulação de mercadoria ou prestação de serviços descritos como fato gerador do imposto.

§ 1º - Incluem-se entre os contribuintes do imposto:

(...)

10 - o prestador de serviços compreendidos na competência tributária dos Municípios, e que envolvam fornecimento de mercadorias ressalvadas em lei complementar;

(...)."

Também este dispositivo mantém consonância com a Lei nº 5.419/88 (artigo 26, parágrafo único, inciso X).

Ainda do RICMS, busca-se o disposto no artigo 21:

"Art. 21 - Inscrever-se-ão no Cadastro de Contribuintes do ICMS, antes de iniciarem atividades:

I - as pessoas arroladas no artigo 10;

(...)

V - as demais pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que praticarem habitualmente, em nome próprio ou de terceiros, operações relativas à circulação de mercadorias;

(...)."

Além das disposições até aqui invocadas, estatuídas em artigos de caráter geral, o RICMS contém capítulo exclusivo normatizando as Operações relativas à Construção Civil (Capítulo III do Título VII do Livro I). Deste, incumbe transcrever:

"Art. 426 - Considera-se empresa de construção civil, para fins de inscrição e cumprimento das demais obrigações fiscais previstas neste regulamento, toda pessoa, natural ou jurídica, que executar obras de construção civil ou hidráulicas, promovendo a circulação de mercadorias em seu próprio nome ou de terceiros.

(...)."

"Art. 427 - O imposto não incide sobre:

I - a execução de obras por administração sem fornecimento de material;

II - o fornecimento de material adquirido de terceiros por empreiteiro ou subempreiteiro para aplicação na obra;

III - a movimentação de material a que se refere o inciso anterior, entre estabelecimentos do mesmo titular, entre estes e a obra ou de uma para outra obra;

IV - a saída de máquinas, veículos, ferramentas ou utensílios para prestação de serviço em obra, desde que devam retornar ao estabelecimento do remetente."

Ressalva-se que o artigo 427 transcrito foi restabelecido no RICMS, com nova redação, através do Decreto nº 81, de 28 de março de 1995.

"Art. 429 - O imposto será pago sempre que a empresa de construção promover:

I - saídas de materiais, inclusive sobras e resíduos decorrentes da obra executada, ou de demolição, quando destinados a terceiros;

II - a saída de seu estabelecimento, de material de fabricação própria;

III - a entrada de mercadoria importada do exterior;

IV - a entrada, no estabelecimento da empresa, de mercadoria oriunda de outro Estado ou do Distrito Federal e não esteja vinculada à operação ou prestação subseqüente alcançada pela incidência do imposto.

Parágrafo único - Nas hipóteses dos incisos IV e V a obrigação da empresa consistirá, afinal, em pagar o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual."A longa reprodução dos preceitos legais e regulamentares tem por escopo oferecer a sustentação para as conclusões que se seguirão.

O Decreto-lei nº 406/68, ao remeter, em seu artigo 8º, à sua anexa Lista, as hipóteses constitutivas do fato gerador do ISS, deixou a salvo do então ICM - hoje, ICMS - o fornecimento de mercadorias por empresas de construção civil, adquiridas de terceiros.

A exclusão, vale ressaltar, está assegurada no artigo 4º, inciso XIV, do RICMS e foi expressamente anunciada no inciso II do artigo 427 do mesmo Diploma Regulamentar.

De sorte que, na hipótese avençada, não caberia o destaque do ICMS por não estarem no seu campo de incidência.

É bom que se diga que nenhum efeito produziria eventual destaque deste tributo: o Estado não poderia cobrá-lo, eis que lhe falta a legitimidade como sujeito ativo; o destinatário do serviço - nesta conjectura, também de "mercadoria"- não poderia aproveitá-lo como crédito porque "calculado em desacordo com as normas da legislação vigente" (artigo 60, caput, in fine, do RICMS).

Portanto, é de se alertar a interessada que mesmo que tenha havido o destaque indevido do ICMS na Nota Fiscal, está a mesma impedida de aproveitar tal crédito, ficando prejudicada a terceira indagação.

Todavia, se as mercadorias fornecidas forem produzidas pelo prestador do serviço fora do local da obra, a hipótese adentra o campo da incidência do ICMS, que se torna exigível e, por conseguinte, devendo ser destacado no documento fiscal (v. ressalva nos itens 32 e 34 da Lista de Serviço e artigos 2º, inciso IX, alínea a e 429, inciso II, do RICMS).

primeira indagação Cabe a transcrição do artigo 20 da Lei Complementar nº 87/96:

"Art. 20 Para a compensação a que se refere o artigo anterior, é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

(....)."

Reproduzem-se, ainda, os incisos I e III do artigo 33 da aludida Lei Complementar:

"Art. 33 Na aplicação do artigo 20 observar-se-á o seguinte:

I - somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao uso e consumo do estabelecimento, nele entradas a partir de 1º de janeiro de 1998;

(...)

III - somente darão direito de crédito as mercadorias destinadas ao ativo permanente do estabelecimento, nele entradas a partir da data da entrada desta Lei Complementar em vigor."

De acordo com o exarado no artigo 36 da LC 87/96, esta entrou em vigor em 1º.11.96.

A questão de número 1 reporta-se a crédito do ICMS relativo à aquisição de "pedra, areia, cimento, aço, etc."

Mercadorias como as elencadas não configuram item do ativo permanente. São, sim, material de uso e consumo, ainda que, combinados, possam resultar em momento futuro em bem do ativo permanente.

Destarte, a sua aquisição, por hora, não tipifica hipótese constitutiva de crédito fiscal.

Todavia, tendo em vista o disposto no inciso I do artigo 33 reproduzido, a partir de 1º.01.98 não mais haverá impeditivo, posto que os materiais de uso e consumo ensejarão, então, direito de crédito.
segunda indagação

A resposta é negativa. A Carta Magna de 1988 estabeleceu o princípio da não-cumulativiadade (artigo 155, § 2º, inciso I), mas previu também que à lei complementar cabe disciplinar o regime de compensação do imposto (artigo 155, § 2º, inciso XII, alínea "c").

Por outro lado, o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, assegurou às unidades federadas a celebração de Convênio para fixar normas regulando provisoriamente a matéria, enquanto não editada a exigida lei complementar (artigo 34, § 8º).

Foi celebrado, então, o Convênio ICM 66/88, que, até a edição da Lei Complementar 87/96, disciplinou o ICMS. Asseverou o aludido Convênio:"Art. 31 - não implicará crédito para compensação com o montante do imposto devido nas operações ou prestações seguintes:

(...)

II - a entrada de bens destinados a consumo ou a integração no ativo fixo do estabelecimento.

(...)."

Se é da lei complementar que emana o direito de crédito vinculado a entrada de bens para o ativo permanente do estabelecimento, a partir de 1º.11.96, é de ato, que vigorou como se lei complementar fosse, que decorre a restrição à configuração do crédito na hipótese avençada.

Destaca-se que a própria Lei Complementar nº 87/96 postergou para momento futuro o termo de início do direito ao crédito comentado, não fazendo coincidir, como em outras matérias de que se ocupou, com a data da sua edição ou de sua publicação. Trata-se de mais um exercício de sua prerrogativa de disciplinar a compensação do crédito, consitucionalmente outorgada.

Eis a informação, ora submetida a superior consideração, com a anotação de que os destaques apostos nos dispositivos extraídos da legislação são inexistentes no original.

Cuiabá-MT, 02 de julho de 1997.
Yara Maria Stefano Sgrinholi
FTE
Visto:
Mailsa Silva
Gerente de Processos Especiais
De acordo:
José Carlos Pereira Bueno
Coordenador de Tributação