Solução de Consulta COTRI nº 5 DE 06/04/2017

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 12 abr 2017

PROCESSO Nº: 127-003606/2016

1 - ICMS. Serviço de impressão 3D. Operação mista. Incidência da espécie tributária. Fornecimento de mercadoria elaborada a partir de impressão 3D, sem caracterização de prestação de serviço ou com prestação de serviço não abrangido pela tributação Municipal.

I - Relatório

1. Pessoa Jurídica de Direito Privado, estabelecida no Distrito Federal, devidamente qualificada nos autos, apresenta Consulta referente à incidência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS, regulamentado neste território pelo Decreto nº 25.508 , de 19 de janeiro de 2005 (RISS).

2. Relata o Consulente que com intenção de atualizar-se e renovar-se junto ao desenvolvimento tecnológico, buscando manter-se e crescer no mercado, tem o objetivo de prestar o serviço de impressão 3D - Prototipagem, o qual, no seu entendimento, não consta explicitamente na lista de serviços alcançados pela tributação do ISS, prevista pela Lei Complementar - LC nº 116 , de 31 de julho de 2003.

3. À vista desse contexto apresenta dois questionamentos, que são transcritos, ipsis litteris:

I - Por ser considerado um SERVIÇO impressão 3D - Prototipagem, e não constar explicitamente na lista de serviços alcançados pela tributação do ISSQN, não haverá incidência do ISS neste caso?

II - Ou se enquadra em alguns dos itens relacionados implicitamente na lista de serviço alcançados pela tributação do ISSQN?

II - Análise

4. O caso em estudo trata essencialmente de esclarecer se cabe tributação sobre a atividade econômica de "impressão 3D" - Prototipagem rápida.

5. Preliminarmente, alguns elementos conceituais atinentes ao tema devem ser trazidos.

Pesquisado em fev/2017, no site:

http://www.abepro.org.br/biblioteca/TN_STO_230_345_29079.pdf

XXXVI - ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO

Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil.

João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016.

O DESENVOLVIMENTO DE PROTÓTIPOS NAS INDÚSTRIAS: UMA VISÃO GERAL E PERSPECTIVAS FUTURAS.

Joao Gabriel Gomes Carvalho (UFRJ) e Renato Florido Cameira (UFRJ)

(.....)

4. Breve apresentação das tecnologias (.....) conforme apresentado em Kaminski (2010), a prototipagem rápida é um sistema composto por um conjunto de tecnologias que usa o princípio da superposição de camadas de espessura infinitesimais de um determinado material, usando informações oriundas de um modelo digital gerado em um sistema CAD para reproduzir uma peça mecânica física. (.....)

(CHUA et al., 1999).

Em síntese, inicialmente, o modelo em CAD deve ser convertido em um arquivo do tipo STereoLitography (STL), processo que caracteriza o modelo tridimensional original em uma malha simplificada de elementos triangulares. Uma vez que o arquivo STL é gerado, o que pode ser realizado pela grande maioria dos sistemas CAD, o software de uma impressora 3D transforma esse arquivo em um novo modelo estruturado em camadas, ou seções transversais de espessuras infinitesimais, a partir do qual serão geradas as instruções específicas para que a manufatura aditiva possa ocorrer, camada após camada. Algumas das principais tecnologias de impressora 3D são: modelagem por depósito de material fundido (FDM), manufatura laminada de objeto (LOM), estereolitografia (SLA) e sinterização seletiva a laser (SLS)

(DOS ANJOS et al., 2014).

(destacou-se)

6. A designação de "impressão 3D", vulgarmente dada à atividade de confeccionar, dessa forma, objetos sólidos e tridimensionais, guarda, em si, alguma impropriedade, vez que o processo mais se aproxima dos processos típicos de industrialização, neste caso, o da manufatura aditiva, afastando-se muito dos peculiares processos da impressão 2D, e em oposição aos de manufatura subtrativa (que parte de um bloco de matéria-prima e parcialmente remove material dele; e.g., torneamento, fresamento, retificação, eletro-erosão a fio ou eletro-erosão por penetração, etc).

7. Não se pode ignorar o fato de que nem sempre é fácil afirmar, com solidez, se dada atividade configura prestação de serviços tributáveis pelo ISS, ou circulação de mercadoria, quando, então, incide o Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS. E, é cediço, a tributação pelo ICMS exclui a do ISS e vice-versa, exceto nas hipóteses preditas na lei complementar que rege o último, que pode apartar-lhes a tributação, à vista de distintas bases de cálculo.

8. O requisito essencial para incidência do ISS é o serviço prestado enquadrar-se na exaustiva lista anexa à LC nº 116/2003 , e reproduzida no Anexo I do Regulamento do ISS - RISS/DF.

9. Assim, é necessário caracterizar perfeitamente o serviço que será prestado, independentemente do nome a ele contratualmente atribuído, que será realizado com o fito de remuneração, sem a existência do vínculo empregatício que consubstanciaria relação trabalhista.

10. O serviço tributável pelo ISS idealiza-se, assim, por meio de um contrato entre prestador e tomador, configurando obrigação de fazer, devendo as partes contratantes reverenciar as estipulações preditas, à vista do Direito Privado.

11. Por seu turno, a obrigação de dar, que atrai a incidência do ICMS, consiste em um vínculo jurídico que implica a entrega de alguma coisa (bem ou mercadoria) pelo devedor.

No dizer técnico do Direito Tributário, a incidência do ICMS, no atinente a bens ou mercadorias, decorre da saída destes, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular (combinação dos aspectos material e temporal do fato gerador do imposto, consubstanciados nos artigos 2º e 5º da Lei distrital nº 1.254, de 8 de novembro de 1996).

12. De certo, os eventuais desafios de distinguir-se obrigações próprias de ICMS ou ISS não se encerram neles, mas lhes ultrapassam, por não raras vezes, os liames, para alcançar características próprias da incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, imposto federal. E este insinua a incidência do ICMS, vez que a posterior circulação do produto industrializado deflagrará o fato gerador do imposto estadual.

13. Nesse nexo, exsurge a necessidade de avançar nos conceitos afetos ao tema e colacionar excertos do artigo de internet intitulado "Industrialização por encomenda: IPI/ICMS ou ISS?", de Kiyoshi Harada, acessado em março/2017 e disponível em:

http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2760&revista_caderno=26

(.....) A fronteira entre o IPI e o ISS, também, não é sempre clara. Não basta o simples esforço humano aplicado sobre bens móveis de qualquer natureza, resultando no acréscimo ou modificação de sua utilidade pela alteração de algumas de suas características, para afirmar que houve industrialização a legitimar a incidência do IPI.

(.....) É a partir das distinções entre obrigações de dar e de fazer que identificamos as hipóteses de incidência do ICMS, do ISS e do IPI. Conforme escrevemos:

"a) o ISS só pode incidir sobre prestação de serviço, assim entendida o produto de esforço humano que se apresenta sob forma de bem imaterial, ou no caso de implicar utilização de material preserve a sua natureza no sentido de expressar uma obrigação de fazer, isto é, ter como objeto da prestação a própria atividade;

b) o ICMS incide sobre circulação de bens corpóreos e incorpóreos, mas a que expressa uma obrigação de dar, cujo objeto da prestação é uma coisa ou direito, algo já existente;

c) o IPI, apesar de a industrialização envolver um 'fazer', só pode ter por fundamento uma obrigação de dar, porque, por expressa definição legal, é um imposto que incide sobre a venda, importação ou arrematação de produto industrializado" (Cf. nosso ISS doutrina e prática. São Paulo: Atlas, 2008, p. 39).

(.....)"

14. Em interessante artigo de internet publicado pela Revista Jus Navigandi, relembram-se parâmetros à eleição entre a tributação estadual ou municipal, do qual se extrai o trecho abaixo:

A competência tributária entre Estados e Municípios segue os seguintes critérios: 1) sobre operações de circulação de mercadoria e sobre serviços de transporte interestadual e internacional e de comunicação incide ICMS; 2) sobre operações de prestação de serviços compreendidos na lista de que trata a Lei Complementar nº 116/2003 , incide ISSQN; 3) sobre operações mistas, assim entendidas as que agregam mercadorias e serviços, incide ISSQN sempre que o serviço agregado estiver compreendido na lista de que trata a LC nº 116/2003 e incide ICMS sempre que o serviço agregado não estiver na referida lista.

(destacou-se)

Recolhimento do ISSQN ou ICMS em operações mistas". Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, nº 4792, 14 ago. 2016. Disponível em: . Acesso em: 2 abr. 2017.

15. Destaque-se, ainda, a ementa exarada nos autos do AI 803296 AgR/SP - SÃO PAULO, da relatoria do Ministro Dias Toffoli, in verbis:

AI 803296 AgR/SP - SÃO PAULO

AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO

Julgamento: 09.04.2013 - Órgão Julgador: Primeira Turma

EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário. Serviço de composição gráfica com fornecimento de mercadoria. Conflito de incidências entre o ICMS e o ISSQN. Serviços de composição gráfica e customização de embalagens meramente acessórias à mercadoria.

Obrigação de dar manifestamente preponderante sobre a obrigação de fazer, o que leva à conclusão de que o ICMS deve incidir na espécie. 1. Em precedente da Corte consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, restou definida a incidência de ICMS "sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria". 2. A verificação da incidência nas hipóteses de industrialização por encomenda deve obedecer dois critérios básicos: (i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos de industrialização. 4. À luz dos critérios propostos, só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar. 5. A hipótese dos autos não revela a preponderância da obrigação de fazer em detrimento da obrigação de dar. Pelo contrário. A fabricação de embalagens é a atividade econômica específica explorada pela agravante. Prepondera o fornecimento dos bens em face da composição gráfica, que afigura-se meramente acessória. Não há como conceber a prevalência da customização sobre a entrega do próprio bem. 6. Agravo regimental não provido.

16. Volvendo ao caso concreto, pode ocorrer que o Consulente seja demando pelo cliente a fazer a criação de um objeto-modelo, em ambiente virtual. Tal modelo tridimensional alimentará o processamento eletrônico de algum dispositivo (impressora 3D) - servindo-se de recursos de informática -, capaz de interpretar-lhe os códigos para, depois, gerar o processo de fabricação física, propriamente dita.

17. Por outro lado, pode ocorrer que o cliente, desde logo, entregue à empresa, ora Consulente, o arquivo digital, eletronicamente armazenado em alguma mídia da mesma natureza, contendo todas as codificações/parametrizações do modelo tridimensional que se deseja confeccionar em 3D. Nesse caso, além de eventual tarefa de conversão de arquivo formato CAD para o formato SLT - ou outro que o dispositivo impressor possa ler e processar e, a partir dos quais, gerar comandos de execução mecânica -, restará ao Consulente a mera produção física do modelo tridimensional.

18. No entanto, saliente-se que, em ambas hipóteses, ocorre fornecimento de mercadoria (alguma matéria sólida ou líquida, que será depositada, provavelmente com aplicações de raio laser, para formar, camada por camada, o objeto real idealizado), seja sem prestação de serviço ou com prestação de serviço não abrangido pela competência tributária dos Municípios, o que atrai a materialidade do ICMS.

19. Isso encontra respaldo no Decreto nº 18.955 , de 22 de dezembro de 1997, Regulamento do ICMS - RICMS/DF:

Art. 2º O imposto incide sobre (Lei nº 1.254/1996 , art. 2º ):

I - operações relativas à circulação de mercadorias, inclusive o fornecimento de alimentação e bebidas em qualquer estabelecimento, incluídos os serviços prestados;

(.....)

IV - fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:

a) não compreendidos na competência tributária dos Municípios;

(.....)

Art. 3º Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento (Lei nº 1.254 , de 8 de novembro de 1996, art. 5º ):

I - da saída de mercadoria, a qualquer título, de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular;

(.....)

VII - do fornecimento de mercadoria com prestação de serviços:

a) não compreendidos na competência tributária dos Municípios;

III - Resposta

20. Oferecendo resposta às indagações do Consulente, informa-se que:

A atividade de confeccionar objetos sólidos a partir de modelo tridimensional e virtual - disponibilizado pelo encomendante, ou criado, à ordem deste, pelo possuidor do equipamento capaz de realizar manufatura aditiva -, configura operação mista, assim entendida a que agrega mercadorias e serviços;

Na espécie, não incide ISS, tendo em vista a falta de conformidade com as hipóteses numerus clausus previstas na lista de serviços anexa à LC nº 116/2003 e reproduzidas no Anexo I do Regulamento do ISS - RISS/DF;

Incidirá ICMS na saída do objeto manufaturado em "impressora 3D", com base no Artigos 1º e 2º do RICMS/DF.

21. Nos termos do disposto no art. 80 do Decreto nº 33.269, de 18 de outubro de 20 11 (Regulamento do Processo Administrativo Fiscal - RPAF), a presente Consulta é eficaz, aplicando-se a esta o disposto no inciso III do art. 81 e caput do art. 82, ambos do PAF.

À análise do assessor da Coordenação de Tributação;

Brasília/DF, 3 de abril de 2017.

GERALDO MARCELO SOUSA

Auditor Fiscal da Receita do Distrito Federal

À Coordenadora de Tributação da COTRI;

Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer Supra.

Brasília/DF, 4 de abril de 2017.

ANTÔNIO BARBOSA JÚNIOR

Coordenação de Tributação

Assessor

Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea a do inciso I do art. 1º da Ordem de Serviço nº 86, de 4 de dezembro de 2015 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 233, de 7 de dezembro de 2015).

A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.

Esclareço que o Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o art. 78, II, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.

Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.

Brasília/DF, 6 de abril de 2017.

MÁRCIA WANZOFF ROBALINHO CAVALCANTI

Coordenação de Tributação

Coordenadora