Solução de Consulta COTRI nº 4 DE 01/03/2024

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 01 mar 2024

ISS. Aplicação do inciso VIII do art. 8º do RISS. Órgãos e entidades estabelecidos em outras unidades federadas. Extraterritorialidade. Lei Complementar nº 116/2003. Faculdade ainda não exercida pelo Distrito Federal.

I - Relatório

1. Trata-se de Consulta formulada por pessoa jurídica de direito público (Procuradoria de República de Goiás- PRGO), com circunscrição em Goiás, envolvendo a legislação do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISS, regulamentado neste território pelo Decreto nº 25.508/2005 (RISS) e alterações legislativas posteriores.

2. Na inicial, o Consulente questiona esta Secretaria de Fazenda acerca do regime de substituição tributária preconizado pelo inciso VIII do art. 8º do RISS. Isso porque ele compõe a relação jurídico-tributária de incidência do ISS na posição de tomador de serviços prestados por estabelecimento localizado no Distrito Federal (DF).

3. Nessa esteira, o Consulente apresenta os seguintes questionamentos, "ipsis litteris":

"1) a PRGO, mesmo estado fora do território do Distrito Federal (extraterritorialidade tributária), deve reter e recolher ISS na fonte para o Distrito Federal referente ao serviço prestado pela empresa Capacity Treinamento e Aperfeiçoamento Ltda, faturado pela nota fiscal nr. 203 de 30.10.2023."

4. Em ato contínuo, os autos seguiram aos demais setores competentes desta Secretaria de Fazenda para as providências formais cabíveis.

5. Nesses termos, os autos foram remetidos a esta GEESC para apreciação e manifestação.

II - ANÁLISE - Fundamentação

6. Por oportuno, cabe destacar que a Solução de Consulta não se presta a verificar a exatidão dos fatos apresentados pelo interessado, uma vez que se limita a apresentar a interpretação da legislação tributária conferida a tais fatos, partindo da premissa de que há conformidade entre os fatos narrados e a realidade factual. Nesse sentido, não convalida nem invalida quaisquer informações ou interpretações e não gera qualquer efeito caso se constate, a qualquer tempo, que não foram descritos, adequadamente, os fatos, aos quais, em tese, se aplica a Solução de Consulta.

7. Registre-se que a autoridade fiscal se manifesta nos autos plenamente vinculada aos estritos preceitos da legislação tributária do Distrito Federal.

8. De plano, convém apontar que o serviço tributado em análise, isto é, ensino a distância - EAD (item 8 do anexo I do RISS), não se enquadra nas hipóteses em que o aspecto espacial de incidência se concretiza onde ocorre a prestação dos serviços (art.

5º do RISS). Isso descarta a necessidade de análises adicionais a respeito. Logo, o sujeito ativo da exação é o Distrito Federal, unidade federada de localização do estabelecimento prestador.

9. De outro prisma, traz-se à lume a disposição legal atacada (inciso VIII do art. 8º do RISS):

"Art. 8º Fica atribuída a responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto cujo local da prestação do serviço situe-se no Distrito Federal, àqueles a seguir discriminados, vinculados ao fato gerador na condição de contratante, fonte pagadora ou intermediário: (...)

VIII - aos órgãos e entidades da Administração Pública Direta e Indireta;" (grifos nossos)

10. Como cediço, as Procuradorias da República nos Estados, que fazem parte do Ministério Público Federal (MPF), possuem autonomia processual dentro do quadro normativo e constitucional brasileiro. Essa autonomia é um reflexo da independência garantida ao Ministério Público pela Constituição Federal de 1988 , que estabelece suas funções, princípios e garantias.

11. Segundo o artigo 126 do Código Tributário Nacional (CTN), salvo disposição de lei em contrário, a pessoa jurídica de direito público interno tem a mesma capacidade tributária passiva que as demais pessoas jurídicas, o que inclui, por extensão, os órgãos autônomos que possuem personalidade jurídica própria (unidades descentralizadas com CNPJ próprio). Isso significa que, quando tais entidades realizam atividades ou possuem propriedades que se enquadram na incidência de tributos, elas podem ser responsáveis pelo pagamento desses tributos.

12. Isto posto, o cerne da questão reside no fato de o tomador dos serviços (PRGO) estar localizado em unidade federada diversa do DF e no fato de que a extraterritorialidade tributária é exceção, conforme prescrição do Código Tributário Nacional (CTN), vejamos:

"Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União." (grifos nossos)

13. Como cediço, o conceito de legislação tributária abarca atos normativos que versem, no todo ou em parte, sobre tributos e relações jurídicas pertinentes, conforme o art. 96 do CTN. Nessa esteira, a regra matriz de substituição tributária também se enquadra como legislação tributária, em vista da consequente observância do princípio da territorialidade como regra.

14. Entretanto, a Lei Complementar nº 116/2003 (LC nº 116/03 ), que é uma norma geral de direito tributário, dispõe o seguinte em seu art. 6º:

"Art. 6º Os Municípios e o Distrito Federal, mediante lei, poderão atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação, inclusive no que se refere à multa e aos acréscimos legais." (grifos nossos)

15. Com base no cânone hermenêutico da totalidade do sistema jurídico1, pode-se interpretar que a LC nº 116/2003 atribuiu a faculdade aos entes federados de dar vigência extraterritorial às suas respectivas legislações tributárias, afetas ao regime de sujeição passiva indireta. Ademais, em uma interpretação literal do texto, percebe-se que a única restrição destacada é a necessidade de que o responsável tributário seja terceiro vinculado ao fato gerador, conforme previsão conhecida do art. 128 do CTN.

16. Como destaca Machado (2020)2, a responsabilidade tributária não pode ser presumida sem uma base legal expressa. No sistema jurídico brasileiro, assim como em muitos outros sistemas jurídicos, os princípios da legalidade e da tipicidade fechada regem a instituição e a cobrança de tributos, incluindo a definição de responsabilidades tributárias. Isso significa que qualquer obrigação tributária, seja direta ou indireta, deve ter previsão expressa em lei.

17. Dessa forma, a despeito da autorização dada pela LC nº 116/2003 para que os entes federados dessem vigência extraterritorial à sua legislação tributária, no talante à responsabilidade tributária, essa faculdade ainda não foi exercida de modo expresso pelo Distrito Federal.

III - Conclusão - Resposta

18. Pelo exposto, em resposta ao Consulente, destacamos a introdução e os questionamentos apresentados:

"1) a PRGO, mesmo estado fora do território do Distrito Federal (extraterritorialidade tributária), deve reter e recolher ISS na fonte para o Distrito Federal referente ao serviço prestado pela empresa Capacity Treinamento e Aperfeiçoamento Ltda, faturado pela nota fiscal nr. 203 de 30.10.2023."

19. Resposta: Apesar da autorização dada pela LC nº 116/2003 para que os entes tributantes do ISS apliquem a vigência extraterritorial da sua matriz normativa de substituição tributária, o Distrito Federal ainda não adotou tal medida. Dessa forma, os órgão públicos a que alude o inciso VIII do art. 8º do RISS, estabelecidos fora do DF, não estão sujeitos ao regime de substituição tributária do art. 8º do RISS.

Assim, no caso apresentado, a obrigação de retenção e recolhimento recai sobre o prestador dos serviços tributados estabelecido no DF.

20. Pelo exposto, nos termos do disposto no art. 80 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011 (Regulamento do Processo Administrativo Fiscal - RPAF), a presente Consulta é eficaz aplicando-se a esta o disposto no inciso III do art. 81 e caput do art. 82, ambos do PAF.

À consideração de V.S.ª.

Brasília/DF, 08 de fevereiro 2024

RODRIGO AUGUSTO BATALHA ALVES

Auditor-Fiscal da Receita do Distrito Federal

1 - BECHER, Alfredo Augusto. Teoria Geral do Direito Tributário. São Paulo: Noeses, 2018, p. 121.

2 - MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 41ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2020.

À Coordenadora de Tributação da COTRI.

De acordo.

Encaminhamos à aprovação desta Coordenação o Parecer supra.

Brasília/DF, 08 de fevereiro 2024

LUÍSA MATTA MACHADO FERNANDES SOUZA

Gerência de Esclarecimento de Normas

Gerente

Aprovo o Parecer supra e assim decido, nos termos do que dispõe a alínea "d" do inciso VI do art. 1º da Ordem de Serviço SUREC nº 129, de 30 de junho de 2022 (Diário Oficial do Distrito Federal nº 124, de 05 de julho de 2022, pág.4).

A presente decisão será publicada no DODF e terá eficácia normativa após seu trânsito em julgado.

Saliente-se que, independentemente de comunicação formal ao Consulente e aos demais sujeitos passivos, as considerações, os entendimentos e as respostas definitivas ofertadas ao presente caso poderão ser modificados a qualquer tempo, em decorrência de alteração na legislação superveniente.

Esclareço que o Consulente poderá recorrer da presente decisão ao Senhor Secretário de Estado de Fazenda no prazo de trinta dias, contado de sua publicação no DODF, conforme dispõe o inciso II do art. 78, combinado com o caput do art. 79 do Decreto nº 33.269 , de 18 de outubro de 2011.

Encaminhe-se para publicação, nos termos do inciso III do artigo 89 do Decreto nº 35.565 , de 25 de junho de 2014.

Brasília/DF, 15 de fevereiro de 2024

DAVILINE BRAVIN SILVA

Coordenação de Tributação

Coordenadora