Resolução CONSEMA nº 461 DE 19/05/2022

Norma Estadual - Rio Grande do Sul - Publicado no DOE em 15 jun 2022

Define critérios e procedimentos para o uso de lodos gerados em estações de tratamento de água (LETAs) e seus produtos derivados em solos, e dá outras providências.

O Conselho Estadual do Meio Ambiente - CONSEMA, no uso de suas atribuições, conferidas pela Lei nº 10.330, de 27 de dezembro de 1.994,

Considerando que a produção de LETAs é uma característica intrínseca dos processos de tratamento de água, que tende a um crescimento no mínimo proporcional ao crescimento da população humana e a solução para sua disposição é medida que se impõe com urgência;

Considerando que os LETAs são constituídos essencialmente de partículas naturais de argila e matéria orgânica, originalmente contidas na água bruta, podendo conter, ou não, produtos resultantes dos reagentes aplicados durante o processo de tratamento, não sendo fontes potenciais de riscos à saúde pública;

Considerando que os solos brasileiros são em sua predominância ácidos e possuem geralmente baixos teores de nutrientes, apresentando naturalmente concentrações significativas de elementos como Alumínio, Ferro e Manganês, em teores totais e disponíveis;

Considerando que devido a sua origem, a fatores naturais e do processo de tratamento, os LETAs podem apresentar pH ácido (< 6,5) e conter teores disponíveis de metais Alumínio, Ferro e Manganês em níveis limitantes ao pleno desenvolvimento das culturas agrícolas;

Considerando a necessidade de destinar os LETAs de forma adequada à proteção do meio ambiente e de manter a qualidade dos solos;

Considerando que os LETAs podem liberar nutrientes para as plantas, com a possibilidade de incrementar o teor de matéria orgânica e a capacidade de troca de cátions (CTC) de solos de textura arenosa, pobres em nutrientes, em áreas degradadas, ou compor produtos cuja aplicação pode trazer benefícios ao solo;

Considerando que o uso do LETA em solos é uma alternativa que apresenta vantagens econômicas e ambientais quando comparado a outras práticas de destinação final; e/p>

Considerando que a aplicação d e L ETA s em solos se enquadra nos princípios de reutilização de resíduos de forma ambientalmente adequada, de acordo com as diretrizes das Políticas Nacional e Estadual de Resíduos Sólidos,

Resolve:

Seção I - Das Disposições Preliminares

Art. 1º Esta Resolução define critérios e procedimentos para o uso de lodos gerados em estações de tratamento de água (LETAs) e seus produtos derivados em solos, e dá outras providências.

Art. 2º Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:

I - Aplicação no solo: ação de aplicar LETA s ou produto s derivado s uniformemente, podendo ser aplicado sobre a superfície do terreno seguida de incorporação ou sulcos/covas, em mistura com o solo, com fertilizantes, condicionadores de solos ou substratos para plantas;

II - Áreas de aplicação d e LETA s: áreas em que LETA s ou produto s derivado s são aplicado s;

III - Carga máxima acumulada de substâncias inorgânicas: quantidade máxima de substâncias inorgânicas, em kg/ha, acumulada ao longo de todas as aplicações de LETAs em solos, que determina o impedimento de novas aplicações;

VI - Correção: processo que altera o s LETAs, tornando-os aptos para o uso em solos, não apresenta n d o potencial de contaminação do meio ambiente;

  Nota: Redação conforme publicação oficial.

V - Estação de Tratamento de Água (ETA): conjunto de unidades destinadas a adequar as características da água aos padrões de potabilidade;

VI - LETA corrigido: LETA ou produto derivado que não apresenta potencial de contaminar o solo, de acordo com os níveis estabelecidos nesta Resolução;

VII - Lodo de estação de tratamento de água (LETA): subproduto sólido ou semissólido da ETA, formado pelos sólidos suspensos originalmente contidos na água bruta, acrescidos, ou não, de produtos resultantes dos reagentes aplicados durante o processo de tratamento;

VIII - Lote de LETA ou produto derivado: quantidade de LETA ou produto derivado destinad a para aplicação no solo, gerada por uma ETA;

IX - Produto derivado: produto destinado à aplicação no solo que contenha lodo de estação de tratamento de água em sua composição e que caso seja composto de outros materiais, estes sejam de uso consolidado na agricultura e não ofereçam risco ao ambiente;

X - Taxa de aplicação: quantidade de LETA ou produto derivado aplicada em toneladas (base seca) por hectare, calculada com base nos critérios definidos nesta Resolução.

Art. 3º Os lodos gerados em sistemas de tratamento de água, para terem sua aplicação permitida em solos, devem ser submetidos a processo de correção do pH, quando necessário.

Parágrafo único. O pH (1:5) do LETA deve ficar entre 6,5 e 7,5 antes da sua incorporação ao solo.

Art. 4º Os LETAs e produtos derivados devem respeitar os limites estabelecidos no Art. 8º, Tabela 1, desta Resolução.

Art. 5º Para o uso de LETA como componente de produtos derivados, o lote de LETA deve atender aos limites estabelecidos para as substâncias potencialmente tóxicas, definidos no Art. 8º, Tabela 1 desta Resolução.

Art. 6º A caracterização do LETA ou produto derivado a ser aplicado em solos deve incluir os parâmetros relacionados a o potencial agronômico e as concentrações de substâncias inorgânicas potencialmente tóxicas presentes no material.

§ 1º Para a caracterização do potencial agronômico do LETA, ou produto derivado, devem ser determinados os seguintes parâmetros:

I - Alumínio + Hidrogênio trocável (acidez potencial);

II - Alumínio trocável (Al 3+);

III - Boro disponível;

IV - Carbono orgânico total;

V - Cálcio trocável;

VI - Capacidade de troca de cátions efetiva;

VII - Capacidade de troca de cátions potencial (pH 7,0);

VIII - Cobre disponível;

IX - Enxofre disponível;

X - Ferro disponível (Fe 3+);

XI - Fósforo disponível;

XII - Magnésio trocável;

XIII - Manganês disponível;

XIV - Matéria orgânica;

XV - Potássio disponível;

XVI - pH em água (1:5);

XVII - Sódio extraível; e

XVIII - Zinco disponível.

§ 2º Para a caracterização do LETA ou produto derivado quanto à presença de contaminantes, devem ser determinadas as concentrações dos seguintes parâmetros:

I - Arsênio total;

II - Cádmio total;

III - Chumbo total;

IV - Cromo total ou hexavalente;

V - Mercúrio total;

VI - Níquel total; e

VII - Selênio total.

Art. 7º O órgão ambiental competente pode solicitar, mediante motivação, outros ensaios e análises não listados nesta Resolução.

Seção II - Requisitos Mínimos de Qualidade de Lodos de Estação de Tratamento de Água ou Produtos Derivados Destinado à Agricultura

Art. 8º Os lotes de LETAs e de produtos derivados, para o uso agrícola, devem respeitar os limites máximos de concentração da Tabela 1.

Tabela 1. Limites máximos de concentrações totais de contaminantes admitidos em LETAs para uso agrícola 1.

Contaminante Valor máximo admitido (mg kg -1)
Arsênio 20
Cádmio 3
Chumbo 150
Cromo 2 500
Mercúrio 1
Níquel 70
Selênio 80

1. Valores correspondentes aos limites máximos de contaminantes admitidos em fertilizantes orgânicos e condicionadores de solo (Instrução Normativa MAPA Nº 07/2016 ).

2. Valor correspondente ao limite máximo de contaminantes admitidos em fertilizantes, corretivos, inoculantes e biofertilizantes (Instrução Normativa MAPA Nº 27/2006 ).

Seção III - Da Frequência de Monitoramento do Lodo de Estação de Tratamento de Água ou Produto Derivado

Art. 9º O monitoramento das características do LETA deve ser anual.

Parágrafo único. Para a geração de amostras representativas, devem ser coletadas subamostras de LETAs no início de cada estação climática do ano, formando uma amostra composta, que seja representativa do ano todo, a qual deve ser analisada por laboratórios com Acreditação ou Reconhecimento, por organismo competente, sendo os resultados armazenados em acervo digital, disponível para consulta pelo órgão ambiental, quando solicitado.

Seção IV - Da Aplicação Art 10. Deve ser adotado, para a taxa de aplicação máxima (base seca), o valor obtido de acordo com os seguintes critérios:

I - valor recomendado por órgãos oficiais de pesquisa, obtido a partir de resultados experimentais de eficiência agronômica e segurança ambiental;

II - valor obtido por meio de ensaio de elevação de pH (constante no Anexo I desta resolução) promovido pela adição de LETA ou produto derivado no solo do local que receberá a aplicação do LETA. A taxa de aplicação deve garantir que o pH final da mistura solo - LETA ou produto derivado atinja o valor de 6,0 e não ultrapasse o limite de 6,5;

III - a taxa máxima anual de LETA não pode ultrapassar a dose de 60 ton ha -1 (base seca) quando a aplicação for em solos agrícolas;

IV - a observância dos limites da carga máxima acumulada de substâncias inorgânicas apresentados na Tabela 2.

Parágrafo único. O lote de L ETA que apresentar teores de substâncias inorgânicas em níveis superiores aos limites máximos contidos no Art. 8º, Tabela 1, somente pode ser aplicado em solos se a taxa máxima anual e a carga máxima acumulada de substâncias inorgânicas não exceder os limites apresentados na Tabela 2.

Tabela 2. Taxa máxima anual e carga máxima acumulada de substâncias inorgânicas em solos quando do uso de LETA ou produto derivado 1.

Substâncias inorgânicas Taxa máxima anual (kg ha -1 ano -1) Carga máxima acumulada (kg ha -1)
Arsênio 2 20
Cádmio 1,9 19
Cromo 150 1500
Chumbo 15 150
Mercúrio 0,85 8,5
Níquel 21 210
Selênio 5 50

1. Valores de taxa máxima anual e carga máxima acumulada de substâncias inorgânicas pela aplicação em solos agrícolas baseados na Resolução CONAMA Nº 498/2020 .

Art. 11. A aplicação e incorporação dos LETAs corrigidos em solos deve ser realizada preferencialmente em conjunto com a calagem do solo, pelo menos três meses antes do primeiro cultivo, com incorporação em área total na camada arável do solo (0,0-0,20 m).

Art. 12. Alternativamente, a aplicação de LETAs não corrigidos em solos pode ser realizada, desde que sua incorporação seja realizada pelo menos seis meses antes do primeiro cultivo, com incorporação em área total na camada arável do solo (0,0-0,20 m), realizando-se a análise do solo e subsequente calagem, com previsão para elevação do pH do solo da camada arável para 6,5./p>

Seção V - Do Monitoramento das Áreas de Aplicação do Lodo de Estação de Tratamento de Água ou Produto Derivado

Art. 13. O solo deve ser analisado antes da primeira aplicação do LETA ou produto derivado, observando o constante no Art. 6º.

§ 1º A utilização da área proposta para aplicação de LETA s ou produto s derivado s depende da avaliação da qualidade do solo, realizada mediante a comparação dos resultados analíticos com valores orientadores de qualidade de solo, a critério do órgão ambiental competente.

§ 2º A análise dos parâmetros de fertilidade do solo deve ser realizada antes de cada aplicação de LETA corrigido. Para fins de monitoramento e acompanhamento da fertilidade do solo, deve ser mantido sob guarda o histórico das análises (laudos), para fins de eventual consulta do órgão ambiental competente.

§ 3º O monitoramento de substâncias inorgânicas no solo deve ser realizado nos seguintes casos:

I - um ano após cada aplicação, sempre que estas substâncias inorgânicas forem consideradas poluentes limitantes da taxa de aplicação;

II - quando a carga adicionada para qualquer uma das substâncias inorgânicas monitoradas alcançar 80% da carga máxima acumulada estabelecida na Tabela 2, do Art. 10 desta Resolução; e

III - um ano após a 5ª aplicação, nas camadas de 0-20 e 20-40 cm do solo.

§ 4º Em casos excepcionais, a critério do órgão ambiental competente, podem ser requeridos monitoramentos adicionais, incluindo-se o monitoramento das águas subterrâneas ou de cursos d'água superficiais.

Art. 14. A aplicação de LETA s ou produtos derivado s na agricultura deve ser interrompida nos locais em que for verificada contaminação do solo ou comprometimento da qualidade da água de mananciais da mesma microbacia devido à aplicação de LETA.

Porto Alegre, 19 de maio de 2022.

Marjorie Kauffmann Presidente do CONSEMA

Secretária de Estado do Meio Ambiente e Infraestrutura

ANEXO I ENSAIO DA ELEVAÇÃO DE PH PROVOCADA POR LODOS DE ESTAÇÃO DE TRATAMENTO DE ÁGUA CORRIGIDOS OU PRODUTO DERIVADO CORRIGIDO

A curva de elevação de pH será obtida por ensaio de incubação utilizando mistura solo-LETA ou produto derivado conforme descrito a seguir:

a) Pesar 500 g do solo representativo do local (camada 0-20 cm) onde se pretende fazer a aplicação do lodo de ETA ou produto derivado e adicionar o correspondente às seguintes doses de lodo de ETA ou produto derivado, em toneladas/ha (base seca): 0, 10, 20, 40, 80.

b) Homogeneizar a mistura e colocar em recipientes de material inerte (potes, copos ou sacos plásticos).

c) Adicionar água no início da incubação de modo a atingir e manter a umidade a 70% da capacidade máxima de retenção de água do solo, ao longo de todo o experimento.

d) Os recipientes devem ser mantidos cobertos de maneira a evitar ressecamento. O ensaio deve ser feito com no mínimo três repetições.

e) amostrar o solo dos tratamentos com a mistura solo/LETA ou produto derivado nos tempos de 30 e 60 dias e determinar o pH em água (relação sólido: água igual a 1:5).

f) A curva de elevação de pH será obtida através de gráfico da variação do pH final da mistura solo-LETA ou produto derivado em função da dose de LETA, para cada um dos tempos.

g) A taxa de aplicação máxima anual será aquela que resultar em pH da mistura solo-LETA entre 6,0 e 6,5, observados os demais requisitos contidos nesta norma.