Resolução CONAMA nº 417 de 23/11/2009

Norma Federal

Dispõe sobre parâmetros básicos para definição de vegetação primária e dos estágios sucessionais secundários da vegetação de Restinga na Mata Atlântica e dá outras providências.

O Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA, no uso das competências que lhe são conferidas pela Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981 , e tendo em vista o disposto na Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965 , na Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006 , em especial nos seus arts. 2º e 4º, e no seu Regimento Interno, e

Considerando as Resoluções Conama nº 10, de 1º de outubro de 1993 e nº 388, de 23 de fevereiro de 2007, que dispõem sobre os parâmetros básicos para definição de estágios sucessionais de vegetação;

Considerando a necessidade de se definir vegetação primária e parâmetros básicos para análise dos estágios sucessionais secundários nas distintas fitofisionomias de Restinga, na Mata Atlântica, visando estabelecer critérios a fim de orientar o licenciamento e outros procedimentos administrativos relativos à autorização de atividades nessas áreas;

Considerando a importância biológica, incluindo endemismos, espécies raras e ameaçadas de extinção existentes na vegetação de Restinga;

Considerando a singularidade da fisionomia e das belezas cênicas da Restinga;

Considerando a distribuição geográfica restrita da vegetação de Restinga; e

Considerando o elevado grau de ameaça a que está submetida a vegetação de Restinga em função das ações antrópicas,

Resolve:

Art. 1º Esta Resolução estabelece parâmetros básicos para análise e definição de vegetação primária e dos distintos estágios sucessionais secundários da vegetação de Restinga na Mata Atlântica,

Art. 2º Para o disposto nesta Resolução entende-se por:

I - Vegetação Primária: vegetação de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies;

II - Vegetação Secundária ou em Regeneração: vegetação resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas ou causas naturais, podendo ocorrer espécies remanescentes da vegetação primária;

III - Vegetação de Restinga: o conjunto de comunidades vegetais, distribuídas em mosaico, associado aos depósitos arenosos costeiros quaternários e aos ambientes rochosos litorâneos - também consideradas comunidades edáficas - por dependerem mais da natureza do solo do que do clima, encontradas nos ambientes de praias, cordões arenosos, dunas, depressões e transições para ambientes adjacentes, podendo apresentar, de acordo com a fitofisionomia predominante, estrato herbáceo, arbustivo e arbóreo, este último mais interiorizado;

IV - Vegetação Herbácea e Subarbustiva de Restinga: vegetação composta por espécies predominantemente herbáceas ou subarbustivas, atingindo até cerca de 1 (um) metro de altura, ocorrendo em praias, dunas frontais e internas (móveis, semifixas e fixas), lagunas e suas margens, planícies e terraços arenosos, banhados e depressões, caracterizada como vegetação dinâmica, mantendo-se sempre como vegetação pioneira de sucessão primária (clímax edáfico), inexistindo estágios sucessionais secundários;

V - Vegetação Arbustiva de Restinga: vegetação constituída predominantemente por plantas arbustivas apresentando até 5 (cinco) metros de altura, com possibilidade de ocorrência de estratificação, epífitas, trepadeiras e acúmulo de serapilheira, sendo encontrada em áreas bem drenadas ou paludosas, principalmente em dunas semifixas e fixas, depressões, cordões arenosos, planícies e terraços arenosos;

VI - Vegetação Arbórea de Restinga: Vegetação densa com fisionomia arbórea, estratos arbustivos e herbáceos geralmente desenvolvidos e acúmulo de serapilheira, comportando também epífitos e trepadeiras;

VII - Transição entre Vegetação de Restinga e outras Tipologias Vegetacionais: vegetação que ocorre ainda sobre os depósitos arenosos costeiros recentes, geralmente em substratos mais secos, sendo possível ocorrer sedimentos com granulometria variada, podendo estar em contato e apresentar grande similaridade com a tipologia vegetal adjacente, porém com padrão de regeneração diferente.

Art. 3º A vegetação primária e secundária nos distintos estágios de regeneração das fitofisionomias de Restinga a que se refere o art. 4º da Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006 , são assim definidos:

I - Vegetação Herbácea e Subarbustiva de Restinga:

a) Vegetação clímax.

1. Plantas herbáceas providas de estolões ou de rizomas, em alguns casos formando touceiras, com distribuição esparsa ou recobrindo totalmente a areia, podendo ocorrer à presença de arbustos e formação de moitas;

2. Estrato herbáceo predominante;

3. No estrato herbáceo não se consideram parâmetros como altura e diâmetro;

4. Epífitas inexistentes ou raras, em geral representadas por liquens e pteridófitas;

5. Espécies que em outras formações ocorrem como trepadeiras, nesta formação podem aparecer recobrindo o solo;

6. Serapilheira não considerada;

7. Sub-bosque ausente; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

II - Vegetação arbustiva de Restinga:

a) Estágio Primário;

1. Fisionomia arbustiva com predominância de arbustos de ramos retorcidos, podendo formar moitas intercaladas com espaços desnudos ou aglomerados contínuos;

2. Estrato arbustivo predominante;

3. Altura das plantas: cerca de até 3 (três) metros, podendo ocorrer indivíduos emergentes com até 5 (cinco) metros, diâmetro da base do caule das espécies lenhosas em torno de 3 (três) centímetros;

4. Poucas epífitas, representadas por liquens e pteridófitas;

5. Ocorrência de espécies de trepadeiras;

6. Presença de serapilheira com espessura moderada;

7. Sub-bosque ausente;

8. Estrato herbáceo presente e nas áreas abertas e secas geralmente limitado a associações de liquens terrestres e briófitas; e

9. Espécies vegetais indicadoras.

b) Estágio inicial de regeneração;

1. Fisionomia predominantemente herbácea podendo haver testemunhos de espécies lenhosas da vegetação primária;

2. Estrato herbáceo predominante;

3. Ausência de epífitas e trepadeiras,

4. Ausência de serapilheira;

5. Ausência de sub-bosque;

6. Diversidade menor em relação à vegetação original, podendo ocorrer espécies ruderais; e

7. As espécies vegetais indicadoras.

c) Estágio médio de regeneração; e

1. Fisionomia arbustiva predominante;

2. Possível distinção dos estratos herbáceo e arbustivo;

3. Vegetação arbustiva, com até 3 (três) metros de altura e diâmetro caulinar com até 2 (dois) centímetros;

4. Possível ocorrência de epífitas e trepadeiras de pequeno porte;

5. Pouca serapilheira;

6. Sub-bosque ausente; e

7. Espécies vegetais indicadoras.

d) Estágio avançado de regeneração.

1. Fisionomia predominantemente arbustiva;

2. Estratificação evidente;

3. Altura das plantas acima de 3 metros e diâmetro caulinar com até 3 (três) centímetros;

4. Presença de epífitas e trepadeiras;

5. Pouca serapilheira, podendo haver acúmulo sob as moitas;

6. Sub-bosque irrelevante para a caracterização desse estágio; e

7. Espécies vegetais indicadoras.

III - Vegetação arbórea de Restinga:

a) Estágio Primário;

1. Fisionomia arbórea predominante;

2. Estratificação evidente, estratos arbustivos e herbáceos igualmente bem desenvolvidos e diversificados;

3. Árvores em geral com altura superior a 6 (seis) metros e com caules ramificados desde a base, e com Diâmetro a Altura do Peito - DAP (1,30 metros), acima de 5 centímetros;

4. Maior quantidade e diversidade de epífitas e trepadeiras em relação às demais fitofisionomias de Restinga;

5. Presença de serapilheira; e

6. Espécies vegetais indicadoras.

b) Estágio inicial de regeneração;

1. Fisionomia herbáceo-arbustiva, podendo ocorrer tanto indivíduos arbóreos isolados quanto espécies ruderais;

2. Predominância dos estratos herbáceo e arbustivo;

3. Altura dos indivíduos arbóreos até 3 (três) metros e DAP médio de até 3 (três) centímetros;

4. Ausência de epífitas, ou ocorrência com baixa riqueza de espécies e pequena quantidade de indivíduos;

5. Ausência de trepadeiras ou, se presentes, com reduzida diversidade de espécies;

6. Serapilheira ausente ou em camada fina;

7. Sub-bosque ausente; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

c) Estágio médio de regeneração; e

1. Fisionomia arbustivo-arbórea;

2. Predominância dos estratos arbustivo e arbóreo;

3. Arbustos com até 4 (quatro) metros e árvores com até 6 (seis) metros de altura, com DAP médio de até 10 (dez) centímetros;

4. Epifitismo presente com maior diversidade de espécies em relação ao estágio inicial;

5. Trepadeiras presentes e com maior riqueza de espécies que o observado no estágio inicial;

6. Presença de serapilheira em camada fina;

7. Sub-bosque em formação e pouco desenvolvido; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

d) Estágio avançado de regeneração.

1. Fisionomia arbórea;

2. Predominância do estrato arbóreo;

3. Árvores geralmente com altura entre 6 (seis) e 10 (dez) metros, DAP médio raramente ultrapassando 10 (dez) centímetros, podendo ocorrer árvores emergentes atingindo até 20 (vinte) metros;

4. Presença expressiva de epífitas;

5. Ocorrência de trepadeiras com riqueza de espécies acentuada em relação aos estágios sucessionais anteriores;

6. Serapilheira mais desenvolvida, podendo ocorrer acúmulo em alguns locais, com grande quantidade de folhas em adiantado estado de decomposição;

7. Presença de estratificação com sub-bosque desenvolvido, com aspecto semelhante aos da formação primária; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

IV - Transição Floresta de Restinga-Floresta Ombrófila Densa:

a) Estágio Primário;

1. Fisionomia arbórea predominante com dossel fechado;

2. Estratificação evidente com os estratos arbustivos e herbáceos igualmente bem desenvolvidos e diversificados;

3. Árvores com altura variando entre 12 (doze) e 18 (dezoito) metros, com árvores emergentes podendo ultrapassar 20 (vinte) metros, e com DAP médio variando de 5 (cino) a 30 (trinta) centímetros, alguns podendo ultrapassar 40 (quarenta) centímetros;

4. Presença de epífitas com grande riqueza de espécies;

5. Presença de trepadeiras com grande riqueza de espécies;

6. Presença de serapilheira e espessa camada de húmus; e

7. Espécies vegetais indicadoras.

b) Estágio inicial de regeneração;

1. Fisionomia herbáceo-arbustiva, podendo ocorrer tanto indivíduos arbóreos isolados quanto espécies ruderais;

2. Predominância dos estratos herbáceo e arbustivo;

3. Arbustos e arvoretas com até 5 (cinco) metros de altura, com DAP médio geralmente inferior a 8 centímetros;

4. Ausência de epífitas, ou ocorrência com baixa riqueza de espécies e pequena quantidade de indivíduos;

5. Ausência de trepadeiras;

6. Serapilheira ausente ou em camada fina;

7. Sub-bosque ausente; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

c) Estágio médio de regeneração; e

1. Fisionomia arbustivo-arbórea;

2. Predominância dos estratos arbustivo e arbóreo;

3. Árvores com até 10 (dez) metros de altura, com DAP médio de até 15 (quinze) centímetros;

4. Epifitismo presente com maior diversidade de espécies em relação ao estágio inicial;

5. Presença de trepadeiras, predominantemente herbáceas;

6. Presença de serapilheira em camada fina;

7. Estratificação presente com sub-bosque em desenvolvimento; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

d) Estágio avançado de regeneração.

1. Fisionomia arbórea;

2. Predominância do estrato arbóreo;

3. Árvores com até 13 (treze) metros de altura, com as emergentes ultrapassando 15 (quinze) metros, com DAP médio variando de 5 (cinco) a 20 (vinte) centímetros, com algumas plantas podendo ultrapassar 30 centímetros de diâmetro;

4. Presença expressiva de epífitas;

5. Ocorrência de trepadeiras com riqueza de espécies acentuada em relação aos estágios sucessionais anteriores;

6. Presença de serapilheira em camada espessa;

7. Presença de estratificação com sub-bosque desenvolvido, com aspecto semelhante ao da formação primária; e

8. Espécies vegetais indicadoras.

§ 1º As listas das espécies indicadoras mencionadas neste artigo serão estabelecidas em Resoluções do Conama para cada Estado da Federação, considerando-se as características específicas da sua vegetação de Restinga, mantendo-se, até as suas edições, a vigência das Resoluções nº 7, de 23 de julho de 1996 e nº 261, de 30 de junho de 1999.

§ 2º A dinâmica sucessional da vegetação na transição entre Restinga e outras tipologias vegetacionais serão estabelecidas em resoluções do Conama para cada Estado da Federação.

Art. 4º A ausência de uma ou mais espécies indicadoras, ou a ocorrência de espécies não citadas nas resoluções específicas referidas no art. 3º, não descaracteriza o respectivo estágio sucessional da vegetação.

Parágrafo único. Serão consideradas a abundância e a predominância das espécies presentes nos estágios sucessionais para a sua caracterização.

Art. 5º Considerando o seu caráter pioneiro, a ocorrência de espécies invasoras, ruderais ou cultivadas em remanescentes de vegetação nativa não descaracteriza o caráter primário da vegetação de Restinga.

Art. 6º Não se caracteriza como remanescente de vegetação de Restinga a existência de espécies ruderais nativas ou exóticas, em áreas já ocupadas com agricultura, cidades, pastagens e florestas plantadas ou outras áreas desprovidas de vegetação nativa, ressalvado o disposto no art. 5º da Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006 .

Art. 7º As resoluções específicas para cada Estado deverão destacar, na citação das espécies indicadoras, aquelas identificadas como endêmicas, raras ou ameaçadas de extinção, constantes das listas oficiais da União Federal e dos respectivos Estados.

Art. 8º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

CARLOS MINC

Presidente do Conselho