Resolução CONAMA nº 375 de 29/08/2006

Norma Federal - Publicado no DO em 30 ago 2006

Define critérios e procedimentos, para o uso agrícola de lodos de esgoto gerados em estações de tratamento de esgoto sanitário e seus produtos derivados, e dá outras providências.

O CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE-CONAMA, no uso das competências que lhe são conferidas pelos arts. 6º, inciso II e 8º, inciso VII, da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, regulamentada pelo Decreto nº 99.274, de 6 de junho de 1990 e suas alterações, tendo em vista o disposto em seu Regimento Interno, e

Considerando que a produção de lodos de esgoto é uma característica intrínseca dos processos de tratamento de esgotos e tende a um crescimento no mínimo proporcional ao crescimento da população humana e a solução para sua disposição é medida que se impõe com urgência;

Considerando que os lodos de esgoto correspondem a uma fonte potencial de riscos à saúde pública e ao ambiente e potencializam a proliferação de vetores de moléstias e organismos nocivos;

Considerando que devido a fatores naturais e acidentais os lodos de esgotos são resíduos que podem conter metais pesados, compostos orgânicos persistentes e patógenos em concentrações nocivas à saúde e ao meio ambiente;

Considerando a necessidade de dispor os lodos de esgoto provenientes das estações de tratamento de esgoto sanitário de forma adequada à proteção do meio ambiente e da saúde da população;

Considerando que o lodo de esgoto sanitário constitui fonte de matéria orgânica e de nutrientes para as plantas e que sua aplicação no solo pode trazer benefícios à agricultura;

Considerando que o lodo de esgoto é um resíduo que pode conter elementos químicos e patógenos danosos à saúde e ao meio ambiente;

Considerando que o uso agrícola do lodo de esgoto é uma alternativa que apresenta vantagens ambientais quando comparado a outras práticas de destinação final; e

Considerando que a aplicação do lodo de esgoto na agricultura se enquadra nos princípios de reutilização de resíduos de forma ambientalmente adequada, resolve:

Seção I
Das Disposições Preliminares

Art. 1º Esta Resolução estabelece critérios e procedimentos para o uso, em áreas agrícolas, de lodo de esgoto gerado em estação de tratamento de esgoto sanitário e seus produtos derivados, visando benefícios à agricultura e evitando riscos à saúde pública e ao ambiente.

Parágrafo único. Para a produção, compra, venda, cessão, empréstimo ou permuta do lodo de esgoto e seus produtos derivados, além do previsto nesta Resolução, deverá ser observado o disposto no Decreto nº 4.954, de 14 de janeiro de 2004, que regulamenta a Lei nº 6.894, de 16 de dezembro de 1980, que dispõe sobre a inspeção e fiscalização da produção e do comércio de fertilizantes, corretivos, inoculantes ou biofertilizantes destinados à agricultura.

Art. 2º Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:

I - agentes patogênicos: bactérias, protozoários, fungos, vírus, helmintos, capazes de provocar doenças ao hospedeiro;

II - aplicação no solo: ação de aplicar o lodo de esgoto sanitário ou produto derivado uniformemente:

a) sobre a superfície do terreno (seguida ou não de incorporação);

b) em sulcos;

c) em covas;

d) por injeção subsuperficial;

III - áreas agrícolas: áreas destinadas à produção agrícola e silvicultura;

IV - áreas de aplicação do lodo de esgoto: áreas agrícolas em que o lodo de esgoto ou produto derivado é aplicado;

V - atratividade de vetores: característica do lodo de esgoto ou produto derivado, não tratado ou tratado inadequadamente, de atrair roedores, insetos ou outros vetores de agentes patogênicos;

VI - carga acumulada teórica de uma substância inorgânica:

a) somatório das cargas aplicadas;

b) somatório (taxa de aplicação X concentração da substância inorgânica no lodo de esgoto ou produto derivado aplicado);

VII - concentração de microrganismos: número de microrganismos presentes no lodo de esgoto ou produto derivado por unidade de massa dos sólidos totais (base seca);

VIII - esgoto sanitário: despejo líquido constituído de esgotos predominantemente domésticos, água de infiltração e contribuição pluvial parasitária;

IX - estabilização: processo que leva os lodos de esgoto destinados para o uso agrícola a não apresentarem potencial de geração de odores e de atratividade de vetores, mesmo quando reumidificados;

X - Estação de Tratamento de Esgotos-ETE: estrutura de propriedade pública ou privada utilizada para o tratamento de esgoto sanitário;

XI - fração de mineralização do nitrogênio do lodo de esgoto ou produto derivado: fração do nitrogênio total nos lodos de esgoto ou produto derivado, que, por meio do processo de mineralização, será transformada em nitrogênio inorgânico disponível para as plantas;

XII - lodo de esgoto: resíduo gerado nos processos de tratamento de esgoto sanitário;

XIII - lodo de esgoto ou produto derivado estabilizado: lodo de esgoto ou produto derivado que não apresenta potencial de geração de odores e atração de vetores de acordo com os níveis estabelecidos nesta norma;

XIV - lodo de esgoto ou produto derivado higienizado: lodo de esgoto ou produto derivado submetido a processo de tratamento de redução de patógenos de acordo com os níveis estabelecidos nesta norma;

XV - lote de lodo de esgoto ou produto derivado: quantidade de lodo de esgoto ou produto derivado destinado para uso agrícola, gerada por uma Estação de Tratamento de Esgoto-ETE ou Unidade de Gerenciamento de Lodo-UGL no período compreendido entre duas amostragens subseqüentes, caracterizada físico-quimica e microbiologicamente;

XVI - manipulador: pessoa física ou jurídica que se dedique à atividade de aplicação, manipulação ou armazenagem de lodo de esgoto ou produto derivado;

XVII - parcela: área homogênea, definida para fins de monitoramento, com base nos critérios definidos no Anexo IV desta Resolução;

XVIII - produto derivado:produto destinado a uso agrícola que contenha lodo de esgoto em sua composição;

XIX - projeto agronômico: projeto elaborado por profissional habilitado visando a aplicação de lodo de esgoto ou produto derivado em determinada área agrícola, observando os critérios e procedimentos estabelecidos nesta Resolução;

XX - taxa de aplicação: quantidade de lodo de esgoto ou produto derivado aplicada em toneladas (base seca) por hectare, calculada com base nos critérios definidos nesta Resolução;

XXI - transportador de lodo de esgoto: pessoa física ou jurídica que se dedique à movimentação de lodo de esgoto ou produto derivado, da ETE à UGL e desta às áreas de aplicação agrícola, mediante veículo apropriado ou tubulação; e

XXII - Unidade de Gerenciamento de Lodo-UGL: unidade responsável pelo recebimento, processamento, caracterização, transporte, destinação do lodo de esgoto produzido por uma ou mais estações de tratamento de esgoto sanitário e monitoramento dos efeitos ambientais, agronômicos e sanitários de sua aplicação em área agrícola.

Art. 3º Os lodos gerados em sistemas de tratamento de esgoto, para terem aplicação agrícola, deverão ser submetidos a processo de redução de patógenos e da atratividade de vetores, de acordo com o Anexo I desta Resolução.

§ 1º Esta Resolução não se aplica a lodo de estação de tratamento de efluentes de processos industriais.

§ 2º Esta Resolução veta a utilização agrícola de:

I - lodo de estação de tratamento de efluentes de instalações hospitalares;

II - lodo de estação de tratamento de efluentes de portos e aeroportos;

III - resíduos de gradeamento;

IV - resíduos de desarenador;

V - material lipídico sobrenadante de decantadores primários, das caixas de gordura e dos reatores anaeróbicos;

VI - lodos provenientes de sistema de tratamento individual, coletados por veículos, antes de seu tratamento por uma estação de tratamento de esgoto;

VII - lodo de esgoto não estabilizado; e

VIII - lodos classificados como perigosos de acordo com as normas brasileiras vigentes.

Art. 4º Os lotes de lodo de esgoto e de produtos derivados, para o uso agrícola, devem respeitar os limites estabelecidos no art. 11, Tabelas 2 e 3, desta Resolução.

Parágrafo único. Não poderão ser misturados lodos de esgoto que não atendam as características definidas no art. 11, Tabelas 2 e 3, desta Resolução.

Art. 5º Para o uso de lodo de esgoto como componente de produtos derivados destinados para uso agrícola, o lote deverá atender aos limites para as substâncias potencialmente tóxicas, definidos no art. 11, Tabela 2, desta Resolução.

Art. 6º É proibida a importação de lodo de esgoto ou produto derivado.

Art. 7º A caracterização do lodo de esgoto ou produto derivado a ser aplicado deve incluir os seguintes aspectos:

I - potencial agronômico;

II - substancias inorgânicas e orgânicas potencialmente tóxicas;

III - indicadores bacteriológicos e agentes patogênicos; e

IV - estabilidade.

§ 1º Para a caracterização do potencial agronômico do lodo de esgoto ou produto derivado deverão ser determinados, de acordo com os Anexos II, III e IV desta Resolução, os seguintes parâmetros:

I - carbono orgânico;

II - fósforo total;

III - nitrogênio Kjeldahl;

IV - nitrogênio amoniacal;

V - nitrogênio nitrato/nitrito;

VI - pH em água (1:10);

VII - potássio total;

VIII - sódio total;

IX - enxofre total;

X - cálcio total;

XI - magnésio total;

XII - umidade; e

XIII - sólidos voláteis e totais.

§ 2º Para a caracterização química do lodo de esgoto ou produto derivado quanto à presença de substâncias inorgânicas, deverão ser determinadas, de acordo com os Anexos II e IV desta Resolução, as seguintes substâncias:

I - Arsênio;

II - Bário;

III - Cádmio;

IV - Chumbo;

V - Cobre;

VI - Cromo;

VII - Mercúrio;

VIII - Molibdênio;

IX - Níquel;

X - Selênio; e

XI - Zinco.

§ 3º Para a caracterização química do lodo de esgoto ou produto derivado quanto à presença de substâncias orgânicas, deverão ser determinadas, de acordo com os Anexos II e IV desta Resolução, as substâncias indicadas na Tabela 1 do Anexo V desta Resolução, inclusive quantitativamente.

§ 4º Em função das características específicas da bacia de esgotamento sanitário e dos efluentes recebidos, as UGLs poderão requerer, junto ao órgão ambiental competente, dispensa ou alteração da lista de substâncias orgânicas a serem analisadas nos lotes de lodo de esgoto ou produto derivado.

§ 5º Para a caracterização do lodo de esgoto ou produto derivado quanto à presença de agentes patogênicos e indicadores bacteriológicos, deverão ser determinadas, de acordo com os Anexos II e IV desta Resolução, e as concentrações de:

I - coliformes termotolerantes;

II - ovos viáveis de helmintos;

III - Salmonella; e

IV - vírus entéricos.

§ 6º Para fins de utilização agrícola, o lodo de esgoto ou produto derivado será considerado estável se a relação entre sólidos voláteis e sólidos totais for inferior a 0,70.

Art. 8º O órgão ambiental competente poderá solicitar, mediante motivação, outros ensaios e análises não listados nesta Resolução.

Parágrafo único. Em função das características específicas da bacia de esgotamento sanitário e dos efluentes recebidos, as UGLs poderão requerer, junto ao órgão ambiental competente, dispensa ou alteração da lista de substâncias a serem analisadas nos lotes de lodo de esgoto ou produto derivado.

Art. 9º A aplicação de lodo de esgoto e produtos derivados no solo agrícola somente poderá ocorrer mediante a existência de uma UGL devidamente licenciada pelo órgão ambiental competente.

§ 1º O licenciamento ambiental da UGL deve obedecer aos mesmos procedimentos adotados para as atividades potencialmente poluidoras e/ou modificadoras do meio ambiente, exigidos pelos órgãos ambientais competentes.

§ 2º O licenciamento ambiental da UGL contemplará obrigatoriamente as áreas de aplicação.

§ 3º O processo de licenciamento deve prever mecanismos de prestação de informações à população da localidade em que será utilizado o lodo de esgoto ou produto derivado sobre:

I - os benefícios;

II - riscos;

III - tipo e classe de lodo de esgoto ou produto derivado empregado;

IV - critérios de aplicação;

V - procedimentos para evitar a contaminação do meio ambiente e do homem por organismos patogênicos; e

IV - o controle de proliferação de animais vetores.

Seção II
Da Freqüência de Monitoramento do Lodo de Esgoto ou Produto Derivado

Art. 10. O monitoramento das características do lodo de esgoto ou produto derivado deverá ser implementado de acordo com os critérios de freqüência definidos na Tabela 1.

Tabela 1. Freqüência de monitoramento

Quantidade de lodo de esgoto ou produto derivado destinado para aplicação na agricultura em toneladas/ano (base seca) Freqüência de monitoramento 
até 60 anual, preferencialmente anterior ao período de maior demanda pelo lodo de esgoto ou produto derivado 
de 60 a 240 semestral, preferencialmente anterior aos períodos de maior demanda pelo lodo de esgoto ou produto derivado 
de 240 a 1.500 trimestral 
de 1.500 a 15.000 bimestral 
acima de 15.000 mensal 

§ 1º A caracterização do lodo de esgoto ou produto derivado, representada por amostragem, é válida exclusivamente para o lote gerado no período compreendido entre esta amostragem e a subseqüente.

§ 2º Caso os valores para substâncias potencialmente tóxicas alcancem 80% dos limites estabelecidos por esta Resolução, a freqüência de monitoramento deverá ser aumentada, segundo parâmetros definidos pelo órgão ambiental competente, e a UGL deverá implementar as medidas adequadas para reduzir estes valores.

§ 3º A critério do órgão ambiental licenciador, em conjunto com os órgãos de saúde e de agricultura competentes, as freqüências de amostragem podem ser aumentadas, devidamente justificadas.

§ 4º As análises químicas e biológicas previstas nesta Resolução devem ser realizadas em laboratórios que adotem os procedimentos de controle de qualidade analítica necessários ao atendimento das condições exigíveis.

§ 5º Os lotes de lodo de esgoto ou produto derivado, para uso agrícola que não se enquadrarem nos limites e critérios definidos nesta resolução deverão receber outra forma de destinação final, devidamente detalhada no processo de licenciamento ambiental e aprovada pelo órgão ambiental licenciador.

Seção III
Requisitos Mínimos de Qualidade do Lodo de Esgoto ou Produto Derivado Destinado a Agricultura

Art. 11. Os lotes de lodo de esgoto e de produtos derivados, para o uso agrícola, devem respeitar os limites máximos de concentração das Tabelas 2 e 3, a seguir especificadas:

Tabela 2. Lodos de esgoto ou produto derivado - substâncias inorgânicas

Substâncias Inorgânicas Concentração Máxima permitida no lodo de esgoto ou produto derivado (mg/kg, base seca) 
Arsênio 41 
Bario 1300 
Cádmio 39 
Chumbo 300 
Cobre 1500 
Cromio 1000 
Mercúrio 17 
Molibdênio 50 
Níquel 420 
Selênio 100 
Zinco 2800 

Tabela 3. Classes de lodo de esgoto ou produto derivado - agentes patogênicos

Tipo de lodo de esgoto ou produto derivado Concentração de patógenos 
Coliformes Termotolerantes