Resolução CEDICA/RS nº 227 DE 09/06/2020

Norma Estadual - Rio Grande do Sul - Publicado no DOE em 16 jun 2020

Dispõe sobre recomendação de manutenção da suspensão das aulas presenciais em todas as etapas da Educação Básica, enquanto durar a declaração de calamidade pública no RS pela pandemia de COVID-19.

O Conselho Estadual Dos Direitos da Criança e do Adolescente do Estado do Rio Grande do Sul - CEDICA/RS, no uso de suas atribuições estabelecidas no art. 2º da Lei nº 9.831, 19 de fevereiro de 1993, atualizada pela Lei 12.484, de 12 de maio de 2006, em cumprimento ao artigo 2º do seu Regimento Interno e às deliberações da Plenária Extraordinária nº 474/2020, realizada de forma virtual, e por maioria dos seus membros,

Considerando que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação, conforme determina o artigo 196 da Constituição Federal Brasileira de 1988;

Considerando o princípio da prioridade absoluta dos direitos da criança e do adolescente, previsto no artigo 227 da Constituição Federal Brasileira de 1988 e no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990;

Considerando que a criança e o(a) adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência, conforme artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) - Lei Federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990;

Considerando que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício, de acordo com artigo 2º da Lei Federal nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências;

Considerando a garantia ao desenvolvimento integral das crianças e adolescentes no período de distanciamento social, sendo apontado pelos órgãos de saúde através do incentivo à realização de atividades adequadas ao momento, leituras e interações socioculturais a distância;

Considerando a declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional ratificada pela Portaria nº 188, de 03 de fevereiro de 2020, do Ministério da Saúde no Brasil;

Considerando o Plano de Contingência Nacional para Infecção Humana pelo COVID-19, elaborado pelo Ministério da Saúde em fevereiro de 2020;

Considerando a declaração da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre a situação da COVID-19 como pandemia mundial, em 11 de março de 2020;

Considerando o disposto nos Decretos Estaduais nº 55.115 e nº 55.118, ambos de março de 2020, que tratam de medidas temporárias de prevenção ao contágio pelo COVID-19 no âmbito do Estado do RS;

Considerando o disposto no Decreto Estadual nº 55.240, de 10 de maio de 2010, e suas subsequentes atualizações, que institui o Sistema de Distanciamento Controlado para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo novo coronavírus (COVID-19) no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, reitera a declaração de estado de calamidade pública em todo o território estadual e dá outras providências

Considerando o Decreto Estadual nº 55.285, de 31 de maio de 2020, que alterou os Decretos nº 55.240, de 10 de maio de 2020, nº 55.220, de 30 de abril de 2020, nº 55.154 de 01 de abril de 2020 e nº 55.128 de 19 de março de 2020, reiterando a declaração de estado de calamidade pública em todo território do Estado do Rio Grande do Sul, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pela COVID-19 e dá outras providências;

Considerando que o adequado enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus é de fundamental importância para a garantia da ordem interna e da segurança nos estabelecimentos de ensino, de modo a preservar a integridade das crianças, adolescentes e profissionais da área da educação que atuam nessas instituições;

Considerando a Resolução nº 217/2020 do CEDICA/RS, que endossa as recomendações do CONANDA para a proteção integral a crianças e adolescentes durante a pandemia do COVID-19;

Considerando que, segundo especialistas da área da saúde, a pandemia devido ao novo coronavírus tende a se estender no tempo, e o melhor remédio ainda é o isolamento social, até que a vacina ou medicamentos eficazes sejam uma alternativa;

Considerando que, no Estado do Rio Grande do Sul, o sistema de saúde tende a se sobrecarregar nos meses de inverno, em decorrência de doenças sazonais, e que, provavelmente, essa sobrecarga, neste momento, acarretaria perdas de muitas vidas;

Considerando que crianças e adolescentes são vetores de transmissão do novo coronavírus e que muitos deles convivem com familiares pertencentes a grupos de risco;

Considerando que especialmente crianças em idade pré-escolar dificilmente conseguirão manter o distanciamento social, o uso de máscaras e hábitos de higiene pessoal adequados, em decorrência de sua situação peculiar de desenvolvimento;

Considerando que o retorno às aulas presencias, neste momento, representa uma movimentação dos alunos, responsáveis e profissionais da área da educação, os quais terão, muitas vezes, que pegar transporte público e ficarão expostos a mais riscos;

Considerando que, para um retorno seguro às aulas presenciais, neste momento, seriam necessários protocolos específicos quanto à higiene, como a aquisição de equipamentos de proteção, em especial, EPIs, e material de limpeza para as escolas públicas, bem como a redução do número de alunos em cada sala de aula e o aumento do número de profissionais que realizam a limpeza das escolas e des locaria os recursos que o Estado coloca à disposição do sistema de saúde e da assistência social, setores mais requisitados e essenciais neste período;

Considerando que há alunos pertencentes aos grupos de risco, os quais deverão ser levados em consideração na tomada de eventual decisão quanto ao retorno das aulas, pois não poderão comparecer presencialmente, devendo o ente público, no caso das escolas públicas, dar suporte a esses estudantes por intermédio de aulas virtuais, inclusive com o fornecimento de equipamentos de informática, caso necessitem, de modo que não haja infração ao princípio da isonomia;

Considerando que, embora crianças e adolescentes não sejam considerados integrantes de grupos de risco, há pesquisas recentes demonstrando que podem desenvolver a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Infantil (MIS-C), a qual aparece semanas após a infecção pelo coronavírus, sendo que os sintomas começam com manchas na pele e evoluem para problemas cardíacos, renais e neurológicos, podendo levar à morte, conforme a Sociedade Brasileira de Pediatria (https://www.sbp.com.br/fileadmin/user_upload/22532d-NA_Sindr_Inflamat_Multissistemica_associada_COVID19.pdf).

Considerando as orientações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, do Comitê Científico do Governo do Estado do Rio Grande do Sul de Apoio ao Enfrentamento à pandemia COV ID-19, e da Sociedade Brasileira de Pediatria, quanto ao uso de máscaras faciais de uso não profissional, as quais não recomendam a utilização de máscaras por crianças menores de dois anos de idade;

Considerando o alerta da Mesa Diretora do Conselho Estadual de Saúde do Rio Grande do Sul sobre o "distanciamento controlado", o qual exige a anulação de todos os instrumentos legais que dão suporte ao modelo de distanciamento controlado, visto que são ausentes de embasamentos técnicos e científicos, além de eivados de ilegalidades;

Considerando que não há consenso quanto a efetividade da medida de "distanciamento controlado", e que este tema apresenta divergência entre a esfera governamental e o controle social;

Considerando que a interação social entre crianças, adolescentes e adultos é inerente aos processos de socialização desenvolvidos particularmente nos estabelecimentos de ensino e que o distanciamento social, especialmente em crianças com tenra idade, dificilmente será cumprido;

Considerando o Parecer do CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO homologado parcialmente pelo Ministério da Educação conforme DOU de 01.06.2020, bem como a Nota Técnica nº 32/2020/ASSESSORIA-GAB/GM/GM do Ministério da Educação, os quais, dentre outras sugestões, estimulam a adoção de atividades pedagógicas não presenciais a serem desenvolvidas com os estudantes enquanto persistirem restrições sanitárias para presença completa destes nos ambientes escolares e, ainda, para crianças em idade pré-escolar, sugere que as instituições de educação infantil possam elaborar orientações/sugestões aos pais e responsáveis legais sobre atividades sistemáticas que possam ser realizadas com seus filhos em seus lares, durante o período de isolamento social, e, por fim, recomenda um esforço dos gestores educacionais no sentido de que sejam criadas ou reforçadas plataformas públicas de ensino on-line, na medida do possível, que sirvam de referência não apenas para o desenvolvimento dos objetivos de aprendizagem em períodos de normalidade quanto em momentos de emergência como este;

Considerando a necessidade de o assunto ser amplamente discutido com a comunidade escolar, tendo em vista tratar-se de tema que atinge direta ou indiretamente inúmeras crianças, adolescentes, familiares e profissionais da área da educação

Considerando que não há estudo técnico acerca do tema 'aulas presenciais na educação infantil', conforme nota técnica da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul - FAMURS, divulgada no último dia 28 de maio de 2020, por intermédio de sua Coordenação de área Técnica da Educação ( http://www.famurs.com.br/noticias/famurs-divulga-nota-sobre-retorno-as-atividades-escolares-presenciais/)

Considerando a inexistência de vacina ou de medicamentos eficazes ou que tenham sido objeto de estudo científico e que tenham conferido resultados satisfatórios para tratar os pacientes acometidos pela COVID-19, até o momento;

Considerando que o direito à vida e à saúde se sobrepõe ao direito à educação e à liberdade de ir e vir em decorrência da interpretação do princípio da proporcionalidade, que decorre da necessidade de preservação dos direitos fundamentais, e deve apontar se a eventual medida restritiva de um direito fundamental é, ao mesmo tempo, adequada (ou seja, apta para produzir os fins desejados), necessária (ou seja, exigível, no sentido de que não haveria outro meio igualmente adequado que sacrificasse menos um dos direitos fundamentais em conflito) e ainda proporcional em sentido estrito (ou seja, havendo desvantagens para o interesse de pessoas, que, pelo menos, as vantagens que traz para os interesses de outras as superem, o que significa o sopesamento de tais valores no caso concreto);

Considerando o Decreto Estadual nº 55.292, de 04 de junho de 2020, que estabelece as normas aplicáveis às instituições e estabelecimentos de ensino situados no território do Estado do Rio Grande do Sul, conforme as medidas de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo novo Coronavírus (COVID-19) de que trata o Decreto nº 55.240 , de 10 de maio de 2020, que institui o Sistema de Sistema de Distanciamento Controlado e dá outras providências.

Resolve:

Art. 1º RECOMENDAR ao ente público estadual e aos entes públicos municipais, bem como a todas as instituições de ensino particulares, que mantenham a suspensão das aulas presenciais na Educação Básica, enquanto persistir a situação de calamidade pública no RS decorrente da pandemia causada pelo novo coronavírus, visando à efetiva segurança dos alunos, familiares e profissionais da área da educação, especialmente das crianças em idade de frequentar a educação infantil, devido às dificuldades inerentes a sua condição especial de desenvolvimento.

§ 1º As escolas públicas ou particulares, enquanto durar o estado de calamidade pública decorrente da pandemia causada pelo novo coronavírus, deverão organizar as aulas de forma remota e fornecer, às crianças e adolescentes que não disponham de equipamentos de informática ou acesso à internet, material pedagógico visando atender ao que determina o princípio da isonomia.

§ 2º Eventual retorno às atividades presenciais deverá levar em consideração, além dos protocolos e diretrizes dos órgãos públicos quanto à higienização dos ambientes, acerca do distanciamento social e da bandeira de classificação definida em cada unidade, a existência de um sistema de saúde que proporcione o atendimento adequado, ou seja, com um percentual de taxa de ocupação dos leitos inferior a 60%, bem como ofertar a possibilidade de o ensino continuar a ocorrer de forma remota para as crianças e adolescentes que assim o desejarem.

Art. 2º RECOMENDAR às empresas, empregadores, órgãos públicos e demais instituições que flexibilizem os horários de trabalho presencial ou estabeleçam trabalho remoto aos seus empregados ou subordinados que possuam filhos(as) com idade de 0 a 17 anos, ou que sejam os seus responsáveis legais, enquanto durar o estado de calamidade pública no RS decorrente da pandemia causada pelo novo coronavírus, visando a evitar que as crianças e adolescentes, especialmente aquelas com deficiência, permaneçam em casa sem a proteção de um responsável legal.

Art. 3º RECOMENDAR ao Estado e aos municípios do RS a realização de estudo técnico quanto ao retorno das aulas presenciais, especialmente ao que se refere à Educação Infantil, bem como propiciar espaço de escuta da comunidade escolar sobre a metodologia empregada às aulas remotas e o retorno às aulas presenciais.

Art. 4º Esta resolução entra em vigor no ato de sua publicação.

Sessão Plenária Extraordinária nº 474/2020 do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente - CEDICA/RS, do dia 09 de junho de 2020.

Porto Alegre, 09 de junho de 2020.

Lúcia Flesch

Presidente do CEDICA/RS