Recomendação MPDFT nº 3 de 21/09/2009

Norma Federal - Publicado no DO em 28 set 2009

Dispõe sobre a atuação dos representantes legais das entidades jurídicas no exercício da função arbitral no Distrito Federal.

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios-MPDFT, por sua Procuradora Distrital dos Direitos do Cidadão e por seu Promotor de Justiça dos direitos do Consumidor, no exercício das funções institucionais de que tratam os arts. 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal, e especialmente o art. 6º, inciso XX, da Lei Complementar nº 75/1993, que dispõe competir ao Ministério Público da União expedir recomendações, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover:

Considerando que ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, por meio da Procuradoria Distrital dos Direitos do Cidadão-PDDC, incumbe a defesa dos direitos coletivos protegidos constitucionalmente de acordo com as atribuições previstas na Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, e que à Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor compete a defesa dos direitos coletivos do consumidor, nos termos do art. 129, inciso III, da Constituição Federal e arts. 81 e 82 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor);

Considerando que a Constituição da República expressa que são símbolos da República Federativa do Brasil a bandeira, o hino, as armas e o selo nacionais (CF, art. 13, § 1º);

Considerando que a Lei nº 5.700, de 01 de setembro de 1971, em seu art. 1º, parágrafo único, inciso I, estabeleceu que as armas nacionais são consideradas Símbolos Nacionais;

Considerando que o diploma normativo que instituiu as Armas Nacionais, segundo art. 1º da Lei nº 5.389, de 22 de fevereiro de 1968, foi o Decreto nº 4, de 19 de novembro de 1889, com a alteração feita pela Lei nº 5.443, de 28 de maio de 1968, e que a forma de apresentação foi regulada pelo Decreto-Lei nº 4.545, de 04 de setembro de 1942;

Considerando que esse conjunto normativo conferiu o uso das armas nacionais somente aos órgãos integrantes da República Federativa do Brasil, como símbolo e identificação do caráter público e nacional de seus serviços;

Considerando que a atividade de mediação e arbitragem, a teor da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, é exercida em caráter privado, cabendo às partes escolherem o árbitro em que confiem, que pode ser qualquer pessoa capaz, física ou jurídica (art. 13);

Considerando que a informação adequada é direito básico do cidadão e do consumidor e que a utilização indevida das Armas e Símbolos Nacionais, bem como das expressões juiz, juiz arbitral, processo, intimação e citação podem induzir o cidadão em erro;

Considerando que o uso das Armas Nacionais por entidades jurídicas constituídas para o exercício da função arbitral, seja no mandado de notificação, seja em qualquer outro documento de sua alçada (inclusive carteiras de identificação dos árbitros e demais membros) ou mesmo na comunicação visual do prédio, passa a falsa impressão ao público leigo de que essa entidade integra a estrutura do Estado, com natureza de direito público;

Considerando o entendimento do Conselho Nacional de Justiça nos autos do Pedido de Providência nº 553 de que as instituições constituídas para o exercício da função arbitral não estão autorizadas à utilização das Armas e demais signos da República Federativa do Brasil.

Considerando que ninguém é obrigado a ser submetido a qualquer solução alternativa de conflitos, isto porque a solução arbitral somente pode ser adotada em razão da vontade comum das partes, na forma do art. 3º da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996;

Considerando que as cláusulas compromissórias não podem ser incluídas em contratos adesivos de consumo, sob pena de afronta à função social do negócio jurídico, com a caracterização da abusividade do dispositivo contratual, na forma dos arts. 46 e 51, incisos IV e VII do Código de Defesa do Consumidor,

Resolve:

I - RECOMENDAR

Aos Senhores Representantes legais das entidades jurídicas constituídas para o exercício da função arbitral no Distrito Federal para que dêem cumprimento à legislação citada, tomando as seguintes providências:

1. Que não mais utilizem em seus documentos, papéis de trabalho ou no seu estabelecimento:

a) Armas e Símbolos Nacionais ou quaisquer outros símbolos que lhes sejam similares e que possam confundir o cidadão;

b) As denominações: juiz, juiz arbitral, processo, citação, intimação.

2. Que não mais convoquem, de qualquer forma, qualquer parte, com o objetivo de se firmar cláusula compromissória ou compromisso arbitral, pois a arbitragem somente se processará quando as partes interessadas comparecerem em conjunto e de forma voluntária nas entidades jurídicas constituídas para o exercício da função arbitral.

3. Que não mais indiquem, sugiram ou de qualquer forma estimulem a inserção de cláusulas compromissórias em contratos adesivos de consumo.

4. Que não mais contratem serviços de arbitragem com qualquer das partes, em momento anterior à sua instituição.

II - ADVERTIR

1. Que nos termos do art. 17 da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996 os árbitros, quando do exercício de suas funções ou em razão delas, ficam equiparados aos funcionários públicos, para efeitos da legislação penal, e portanto podem responder pela prática dos crimes previstos nos arts. 312 a 327 do Código Penal;

2. Que é vedado aos árbitros utilizarem-se de qualquer tipo de coação ou ameaça, moral ou física, para que a parte convocada realize acordo ou pague dívida, pois tal fato encontra-se tipificado no art. 344 do Código Penal (Coação no Curso do Processo);

3. Que o fato de induzir o cidadão a crer que está sendo citado ou convocado pelo Poder Judiciário e não por uma entidade jurídica de direito privado, pode se enquadrar no tipo descrito no art. 328 do Código Penal (Usurpação de Função Pública);

4. Que o fato de utilizar-se de identidade funcional que leve o cidadão a crer tratar-se de Juiz de Direito, integrante do Poder Judiciário, pode em tese configurar a prática do crime previsto no art. 307 do Código Penal (Falsa Identidade);

5. Que o uso dos Símbolos Nacionais (que têm como característica fundamental identificar os órgãos públicos) por entidades privadas caracteriza o crime previsto no art. 296 do Código Penal (Falsificação de Selo ou Sinal Público).

Para fins de verificação do cumprimento espontâneo da presente recomendação, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios poderá realizar inspeção na entidade, com base no art. 8º, V e VI da Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, respeitada a garantia constitucional do art. 5º, XI.

Requisita-se, por oportuno, no prazo de até 15 dias, que informem à Procuradoria Distrital dos Direitos do Cidadão quais medidas estão sendo adotadas visando o efetivo cumprimento da presente Recomendação Ministerial, se o caso.

Para adoção das providências ora recomendadas, nos termos do mesmo dispositivo legal complementar, assinala-se o prazo de até 15 dias úteis, a contar do primeiro dia útil após o recebimento desta Recomendação.

GUILHERME FERNANDES NETO

Promotor de Justiça

MARIA ANAÍDES DO VALE SIQUEIRA SOUB

Procuradora Distrital dos Direitos do Cidadão