Parecer AGU nº 14 de 09/07/2004

Norma Federal - Publicado no DO em 16 jul 2004

Dispõe sobre a possibilidade de transferência de recursos para a execução de obra ou serviço que não esteja em andamento conforme a Lei nº 9504/97, art. 73, VI, "a", nos três meses que antecedem o pleito.

PROCESSO Nº 80000.000835/2004-31 (**)

ASSUNTO :Consulta nº 1062

Decisão do Tribunal Superior Eleitoral.

(*) Adoto o anexo Despacho nº 447/2004, de 8 de julho de 2004, da lavra do Consultor-Geral da União Dr. MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

Brasília, 12 de julho de 2004.

ALVARO AUGUSTO RIBEIRO COSTA

Advogado-Geral da União

(*) A respeito deste Parecer o Excelentíssimo Senhor Presidente da República exarou o seguinte despacho: "Aprovo. Em, 12 de julho de 2004".

Despacho do Advogado-Geral da União

Aprovo a Nota Nº AGU/MC-14/2004, de 9 de julho de 2004, relativa ao Processo nº 80000.000835/2004-31

Brasília, 12 de julho de 2004.

ALVARO AUGUSTO RIBEIRO COSTA

Advogado-Geral da União

Despacho do Consultor-Geral da União nº 447/2004

Processo n º 80000.000835/2004-31

Consulta nº 1062

Interessado: Luiz Carlos Jorge Hauly

Assunto: Parecer AGU nº AC-12.

Senhor Advogado-Geral da União,

1. À vista da decisão do Sr. Ministro Presidente do Tribunal Superior Eleitoral na Consulta nº 1062 - Brasília - DF, Relator o Sr. Ministro Carlos Velloso, parece ajustado submeter ao Sr. Presidente da República, em face do despacho de S. Exa. aprovando o Parecer AC-12 de 13 de maio de 2004 desta Advocacia-Geral da União, a sugestão de orientar a Administração ante as conclusões daquele ato, assim exaradas:

"42. De tudo, ad referendum do Tribunal respondo negativamente à consulta para assentar que, por força do disposto no art. 73, VI, a, da Lei nº 9504/97, é vedado à União e aos Estados, até as eleições municipais, a transferência voluntária de recursos aos Municípios - ainda que constitua objeto de convênio ou de qualquer outra obrigação preexistente ao período - quando não se destinem à execução já fisicamente iniciada de obras ou serviços, ressalvadas unicamente as hipóteses em que se faça necessária para atender a situação de emergência ou de calamidade pública. Brasília, 7 de julho de 2004".

2. É que, embora se cuide de decisão singular ainda sujeita ao referendo do Tribunal, convém levá-la na devida consideração, em prol da segurança jurídica e para preservar a regularidade da ação governamental em face do art. 73, inciso VI, letra 'a', da Lei nº 9.504/97.

À consideração.

Brasília, 9 de julho de 2004.

MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO

Consultor-Geral da União

(**) republicado o Despacho nº 447/2004 acrescido da NOTA Nº AGU/MC 14/14

NOTA Nº AGU/MC 14/04

PROCESSO Nº80000.000835/2004-31

PROCEDÊNCIA:Casa Civil da Presidência da República

ASSUNTO: Consulta nº 1062 TSE

REFERENCIA: Parecer AGU AC-12

Senhor Advogado-Geral da União

Tendo presente os termos do Parecer AC-12, de 13 de maio de 2004, expedido por Vossa Excelência com o aprovo presidencial, e a publicação da decisão proferida pelo Senhor Ministro Presidente do Tribunal Superior Eleitoral na Consulta nº 1062 - Brasília/DF, em 7 de julho de 2004, penso conveniente esclarecer os pontos a seguir desenvolvidos.

1. A Consulta submetida ao e. Tribunal Superior Eleitoral, por parlamentar, apresentava a seguinte formulação: "Hipoteticamente será possível que, nos três meses que antecedem o pleito, se realize transferência de recursos para a execução de obra ou serviço que não esteja em andamento conforme a Lei nº 9504/97, art. 73, VI, "a", tendo em vista a edição do referido parecer aprovado pelo Senhor Presidente da República ?" e, mais adiante,

"Ocorre que, nos termos do art. 40, § 1º da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, o referido parecer vincula a Administração Pública e encontra-se em dissonância com o entendimento dessa Egrégia Corte, sobretudo a jurisprudência firmada por meio da Resolução nº 20.410, de 3 de dezembro de 1998. (.....) Diante do exposto, face ao prejuízo irremediável para o pleito eleitoral, venho requerer a Vossa Excelência a adoção de medida acautelatória, conforme preconiza o art. 17 do Regimento Interno desta Corte, pois se trata de questão que merece solução urgente, de modo a suspender a eficácia do referido Parecer da AGU, ater o deslinde da questão de modo definitivo pelo Plenário dessa Corte."

Alguns dias depois, voltou o consulente pleiteando:

"Diante do exposto, face ao prejuízo irremediável para o pleito eleitoral, venho requerer a Vossa Excelência a adoção de medida acautelatória, conforme preconiza o art. 17 do Regimento Interno desta Corte, pois se trata de questão que merece solução urgente, de modo a suspender a eficácia do referido Parecer da AGU, até o deslinde da questão de modo definitivo pelo Plenário dessa Corte". (grifo do original)

2. Tanto o pedido principal na Consulta nº 1062 como o requerimento de providência liminar de sustação dos efeitos do Parecer nº AGU AC-12 foram objeto de deliberação pelo Senhor Presidente do TSE, mas, quanto ao segundo, Sua Excelência indeferiu-o de pronto por "inviável juridicamente", proclamando que não cabe ao Tribunal o "controle abstrato de atos normativos contrários à lei", mesmo a eleitoral, antes que ocorra aplicação concreta de suas determinações, sendo certo que o aprovo presidencial confere ao Parecer nº AGU AC-12 força de ato normativo geral, e é o Presidente da República "o único árbitro de manter-se ou não, suspender ou revogar, como norma vinculante de Administração Federal, o ato normativo substantivado no parecer da AdvocaCIA-Geral da União que aprovou".

3. Neste quadro, a Consulta transcrita foi apreciada como interpretação da lei, e não do Parecer nº AGU AC-12 que é apenas motivo ou razão dela não seu objeto. Assim, é possível afirmar que o Parecer nº AGU AC-12 não foi suspenso nem apreciado como objeto de ação judicial, até porque a consulta eleitoral é procedimento administrativo e não vincula sequer o Tribunal que a profere, como é de sua própria jurisprudência na interpretação do art. 23, XII, do Código Eleitoral. Aliás, o disposto no art. 17 do RI da Corte, que a decisão do Senhor Ministro Presidente do e. TSE implicitamente referiu, se aplica para dirimir questão que mereça solução urgente e aqui, no âmbito de consulta, não há questão nem controvérsia.

4. O interesse jurídico da União, desse modo, fica circunscrito a uma opinião do Tribunal e seus fundamentos, posto que nada foi determinado pela Corte, como se percebe de seu dispositivo:

"42. De tudo, ad referendum do tribunal, respondo negativamente à consulta para assentar quer, por força do disposto no art. 73, VI, a, da Lei nº 9504/97, é vedado à União e aos Estados, até as eleições municipais, a transferência voluntária de recursos aos Municípios - ainda que constitua objeto de convênio ou de qualquer outra obrigação preexistente ao período - quando não se destinem à execução já fisicamente iniciada de obras ou serviços, ressalvados unicamente as hipóteses em que se faça necessária para atender a situação de emergência ou de calamidade pública". (grifo do original)

Por este ângulo, o e. TSE, nada obstante tenha afirmado que é vedado à União proceder a transferências voluntárias nas condições referidas, não determinou que a União se abstivesse de fazê-lo nem por qualquer modo invalidou o Parecer nº AGU AC-12.

5. Daí, portanto a conveniência de apreciar os termos da decisão para encaminhar a orientação interna da Administração.

6. A primeira consideração que se impõe é que a conclusão do Parecer nº AGU AC-12 sustentou que a expressão legal "recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado" (art. 73, VI, a Lei nº 9504/97) significava que a obra ou serviço em andamento podia abranger obra ou serviço fisicamente ainda não iniciado, pois a verificação da obrigação formal preexistente e a comprovação da execução do cronograma prefixado levavam à certeza do cumprimento regular do contrato o que permitia disciplinar também hipóteses logicamente não alcançadas pelos Pareceres nºs GQ 113 e GQ 158, segundo os quais as transferências voluntárias dependiam sempre da verificação do início físico da obra ou do serviço em sentido estrito, não valendo para esse efeito nem mesmo as obras ou atos preparatórios.

7. O Parecer nº AGU AC-12, nessa linha, propõe uma sistematização mais racional e assim mais ajustada da limitação legal sem diminuir em nada a proteção da igualdade nas eleições. Não é difícil compreender que há obras ou serviços cuja verificação física é extremamente improvável ou até inviável; e, por isso mesmo insuficiente para orientar tanto o administrador como o próprio julgador.

8. Se é certo que o contrato regular e o cronograma prefixado antes da data limite de transferências voluntárias são pressupostos comuns tanto da interpretação defendida pelo e. TSE como pelo Parecer nº Agu AC-12, o que é fato, o desenvolvimento do parecer abrange situações que a r. decisão do TSE não pode alcançar, pois:

a) sempre que a visualização física dos serviços não pudesse ser verificada, segundo o e. TSE não haveria "obra em andamento", e, então, serviços de saúde, de segurança ou de educação de interesse público, especialmente serviços de divulgação de campanhas de saúde pública (tipo Zé gotinha, AIDS) e outras de interesse público no município (pela mídia: televisão, radio, jornais e revistas, etc...), e outros como aquisição de recursos ou implementos locais, tais a aquisição de caminhão de lixo, a implantação de programa de regularização fundiária, de transporte de alunos na zona rural, de pacientes ou passageiros, contratação de cursos, seminários, treinamento e planos diretores, enfim serviços que viessem a ficar disponibilizados à população nesse período, com impossível visualização física, não seriam considerados serviços em andamento;

b) e, de outro modo, o movimento de terras, a construção de tapumes, ou de andaimes, ou de alojamentos de empregados, ou a contratação deles, ou a contratação de empreiteiros, a escavação de terrenos, a secagem de pântanos, a derrubada de vegetação, o controle de águas, bem assim os projetos ou estudos respectivos, como não estão diretamente relacionadas com o resultado físico da obra ou serviço ou não se incorporam ao resultado final como elemento de sua identidade, a rigor, pela orientação do TSE, não consistiriam em obra em andamento. Aliás, é a provável razão pela qual o texto da lei não contém as expressões "fisicamente iniciada" ou "fisicamente verificável".

9. Com efeito, o Senhor Ministro Presidente do e. TSE assim descreveu a compreensão lógica da interpretação que adotou: "33. Por conseguinte, não se pode abstrair, na inteligência da vedação legal a interpretar, de um dado da experiência comum: os momentos culminantes de impacto eleitoral da realização de uma obra pública é, antes de sua inauguração - também objeto de preocupação da lei (art. 77) - o do começo da percepção física da obra. 34. Para o eleitor comum, não são os trâmites burocráticos que necessariamente a precedem, mas o início da construção que faz visível a concretização do empreendimento governamental e aguça a expectativa dos benefícios que a sua conclusão possa trazer ao público: e é a partir daí que se tem uma, como é da linguagem cotidiana uma obra em andamento".

10. Não se afirma, por suposto, em nenhum momento que é possível a transferência voluntária sem obra em andamento, como sugeriu a consulta ao não diferençar a sua da verdadeira hipótese examinada pelo Parecer nº AGU AC-12. Ao contrário, essa proibição foi reafirmada em várias passagens do parecer de maneira a deixar muito claro que somente mediante contrato devidamente licitado e regularmente assinado com cronograma aprovado e fixado seria possível reconhecer uma obra ou serviço em andamento. E essa percepção não é melhor ou tecnicamente mais sofisticada que a decisão do e. TSE, apenas tem alcance mais completo, pois levou em conta hipóteses e situações que a decisão judicial não enxergou.

11. Aliás, quanto à questão específica, como reconhece seu Presidente, o e. TSE, "ao contrário de que supõe o consulente, o Tribunal não firmou jurisprudência a respeito" e o precedente isolado (a Resolução nº 20.410/1998) nem é pertinente porque não enfrentou o assunto como aqui posto. Por esta razão, também não é verdadeiro que o Parecer atentasse contra o entendimento da Corte que sequer o tinha. Muito pelo contrário, a própria decisão do Tribunal tanto compreendeu a insuficiência da orientação dos pareceres anteriores que, mesmo abonando-lhes a tese principal, deles também afastou-se, como no parecer ora discutido, ao compreender que a mera visualização física da obra ou serviço não bastaria para o atendimento do preceito. A argumentação do despacho judicial claramente admite que é "esse valor simbólico do começo efetivo da construção da obra que dá a medida do seu impacto eleitoral", a repetir que a obra física não passa de mero símbolo ou representação imperfeita do que lhe dá a verdadeira causa, e que, mesmo em favor da soberania popular, não é desarrazoada a preocupação com a desarticulação ou frustração dos atos da Administração na seqüela dessa inteligência. Nesse sentido, a decisão do e. TSE sinaliza positivamente e coincide com o avanço proposto no Parecer nº AGU AC-12 sobre a avaliação do Parecer nº GQ-113.

12. Convém assinalar, por derradeiro, que o Parecer nº AGU AC-12 respondeu a uma solicitação do Ministério das Cidades, por intermédio da Casa Civil da Presidência da República, visto que a inteligência das manifestações anteriores da Advocacia-Geral da União não logravam acomodar as situações de atividade inteiramente legítima da Administração e as peculiaridades da disputa eleitoral, mostrando-se necessário uma nova proposição que não arranhasse a igualdade eleitoral e ao mesmo tempo mantivesse fluida a ação governamental.

13. Com essa intenção, o Parecer nº AGU AC-12, no criticado esforço de identificar o referencial teórico da vedação, ainda assim não autoriza transferência de recursos para obras ou serviços que não tenham sido iniciadas em sentido técnico, isto é, que não tenham origem em convênio e contrato regularmente avençados de acordo com a legislação própria e cronograma prefixado e em execução, reconhecendo legítima apenas a situação em que estas condições prévias e concomitantes se tenham realizado e estejam sendo rigorosamente observadas antes da data limite.

14. Todavia, ante as considerações referidas pelo Senhor Presidente do e. TSE, a prudência recomenda que, até a decisão definitiva dessa e. Corte Eleitoral, a Administração observe a orientação indicada no despacho ora publicado no Diário da Justiça de 12 de julho de 2004, Seção I, página 1, vale dizer, abstenha-se de efetuar transferências voluntárias no período eleitoral "quando não se destinem à execução já fisicamente iniciada de obras ou serviços, ressalvadas unicamente as hipóteses em que se faça necessária para atender a situação de emergência ou de calamidade pública".

15. É que, embora se cuide de decisão singular ainda sujeita ao referendo do plenário do Tribunal Superior Eleitoral, convém levá-la em consideração, em prol da segurança jurídica e para preservar a regularidade da ação governamental em face do art. 73, inciso VI, letra 'a', da Lei nº 9504/97.

À consideração.

Brasília, 9 de julho de 2004.

MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO

Consultor-Geral da União