Parecer AGU nº 12 de 11/05/2004

Norma Federal - Publicado no DO em 13 mai 2004

Dispõe sobre as limitações impostas pela Lei nº 9.504 de 1997.

(*) A respeito deste Parecer o Excelentíssimo Senhor Presidente da República exarou o seguinte despacho: "Aprovo. Em, 11.05.2004".

PARECER Nº AGU/MC 02/04

PROCESSO Nº 80000.000835/2004-31

PROCEDÊNCIA: Casa Civil da Presidência da República

ASSUNTO: Limitações impostas pela Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997.

EMENTA: Possibilidade de obras ou serviços que, conquanto regulares, ainda não estejam em andamento na data limite para as transferências voluntárias de que trata o art. 73, inciso VI, letra "a", da Lei nº 9.504, de 1997.

Senhor Advogado-Geral da União

1. Por solicitação do Senhor Ministro de Estado Chefe da Casa Civil, vem ao exame desta Advocacia-Geral da União indagação do Senhor Ministro das Cidades sobre os limites da aplicação do art. 73, inciso VI, letra "a", da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997, segundo o qual:

"Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

2. A questão está em saber, para fins administrativos, qual a interpretação eleitoral apropriada destes dispositivos.

3. A Nota nº 2004/AGU/CGU/SFT-0026/2004, elaborada pelo Advogado da União Dr. Sérgio Eduardo de Freitas Tapety a partir do estudo das ponderações apresentadas pelo Ministério das Cidades e em face dos precedentes desta Consultoria-Geral - aliás, pareceres aprovados pelo Senhor Advogado Geral da União e pelo Senhor Presidente da República (Parecer GQ-116, de 1996 e GQ-158, de 1998) - e com eles coincidente, salvo melhor juízo, não exclui entendimento diverso.

4. Com efeito.

5. A lei eleitoral e particularmente a Lei nº 9.504, de 1997, têm por objeto a disciplina da disputa eleitoral, de modo a garantir a lisura da escolha e a igualdade de oportunidade dos candidatos aos cargos executivos ou de representação popular, cuja seleção se dá por via de eleição pública. Nesse sentido, a lei eleitoral é expedida com o propósito de disciplinar o pleito, e seus conceitos e categorias jurídicas devem ser compreendidos nos limites dos objetos jurídicos respectivos, de maneira que parece adequado invocar a lei eleitoral para disciplinar situações que são eleitorais. Ou, em outros termos, a lei eleitoral endereça-se à disciplina de situações eleitorais que, por isso, precisam ser compreendidas como fatos eleitorais, muito mais do que fatos administrativos.

6. Assim como a lei penal e a tributária, também a lei eleitoral tem objeto próprio, disciplina específica e, sobretudo, jurisprudência peculiar porque versa situações e realidades especiais que exigem inteligência e tutela próprias. Por esta razão, as categorias de direito civil ou tributário ou as regras de controle orçamentário ou de execução não são preponderantes na exegese eleitoral, devendo prevalecer a inteligência e a organicidade das determinações eleitorais na sua estrita finalidade.

7. Deste modo, quando o intérprete administrativo examina um dispositivo de lei eleitoral naturalmente terá de referir-se à axiologia eleitoral como critério de valoração das restrições e vedações eleitorais para que não resultem do excessivo rigor ou tolerância efeitos inversos ao pretendido pela regra aplicada. Se a lei eleitoral é o principal instrumento de preservação da igualdade eleitoral, seus preceptivos - e, conseqüentemente, também o aplicador ou intérprete - devem se orientar nesta perspectiva, sob risco de desviar-se o significado dela que é, precípuamente, resguardar a soberania popular (art. 14 da Constituição Federal).

8. De outra parte, é perfeitamente correto afirmar que a proteção da soberania popular não pode se transformar em empecilho ou elemento de desarticulação ou de frustração dos atos da Administração, mesmo durante o chamado período eleitoral. Se é certo que os atos da Administração têm por si presunção de legitimidade e legalidade e estão submetidos a diversos mecanismos de controle administrativo e judicial, não pode ser exato fundar a interpretação restritiva apenas na potencialidade da ilicitude eleitoral. Ao contrário, os limites da lei eleitoral são os limites da regularidade administrativa das ações de governo, as quais quando praticadas com desvio de finalidade ou abuso de poder poderão ser corrigidas ainda na ausência de tutela eleitoral, e, se configurarem ilícito eleitoral, merecer também a sanção correspondente. Como todo sistema, o sistema eleitoral tem uma racionalidade específica que cumpre observar.

9. Fixado este tópico, que é marco essencial para o desenvolvimento da adequada solução, é possível avançar.

10. Os Pareceres mencionados e o Aviso Circular nº 6, de 22 de julho de 1998, expedido por ordem do então Senhor Presidente da República, bem assim a Nota agora referida, tomaram por princípio assente a certeza de que as transferências voluntárias permitidas em ano eleitoral seriam apenas as que estivessem acobertadas por convênio ou contrato regularmente firmados antes da data limite (90 dias antes do pleito) e para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, considerados estes como obras ou serviços fisicamente verificados.

11. Sem questionar os demais termos da controvérsia, conceitos e vedações, já adequadamente abordados pelo trabalho acima indicado e ao que não há objeções consistentes, salvo melhor juízo, a expressão grifada tem de merecer análise de acordo com os propósitos eleitorais estritos de garantia da igualdade eleitoral e da preservação da soberania popular.

12. Tudo o mais que exceder tais balizas pode provocar prejuízos à Administração que tanto a Constituição como a tutela eleitoral sequer cogitaram, não podendo o intérprete porventura influenciado por uma ou outra ocorrência ilícita estabelecer como método a desconfiança ou preconceito em face dos participantes da competição eleitoral.

13. Nessa linha de compreensão, portanto, é preciso compatibilizar as limitações eleitorais com a continuidade do serviço público e a atividade administrativa, uma vez que a pactuação não está proibida mesmo depois da data limite, embora, a partir desta, as transferências voluntárias sejam vedadas. Daí resulta que, se as transferências estão proibidas noventa dias antes da eleição, parece intuitivo que a pactuação somente será possível até o mesmo limite para efeito de transferências voluntárias. E assim é, porque os convênios e contratos só podem ser, repita-se, para esse efeito, firmados até esse dia, já que, depois dele, não poderia haver "obra em andamento".

14. Em outros termos, mesmo sendo permitidos o contrato e o convênio após a data limite porque a lei eleitoral não o proíbe, não poderia haver obra ou serviço em andamento para cuja compreensão abrangente seria então sempre necessária a existência prévia da assinatura dos atos formais, na data em questão.

15. Sendo verdadeiro que é necessária a existência formal do convênio ou contrato até noventa dias antes da eleição, é sistematicamente certo que todos os requisitos legais e formais anteriores à obra ou serviço estarão atendidos, de modo que a execução da obra ou serviço é no mínimo uma conseqüência administrativamente necessária, lógica e tão legítima como os atos que os determinaram.

16. Em rigor, aliás, a obra ou serviço regularmente contratado deverá ser obrigatoriamente executado não havendo nenhum impedimento para tanto, a dizer que se não executados conforme contratados ou conveniados, ao contrário, existirá irregularidade. Portanto, se existir acerto administrativo até o dia limite há presunção lógica de obra ou serviço em andamento. Conclusão diversa acaba pressupondo fato ou circunstância que a lei não contempla como regra e implica suposição negativa a demandar justa prova, até porque a lei não dá, no dispositivo referido, nenhuma indicação disso.

17. Com esse espírito, a interpretação que verte da regra em estudo só pode ser a que tolera a idéia de que obra ou serviço em andamento não é só a que está fisicamente em andamento, mas também a que vai estar, no tempo próprio e na forma compatível, em execução conforme as praxes e costumes da época e da natureza respectiva.

18. A ilação, de resto, é inteiramente obediente ao regime eleitoral porque a justificação da obra ou do serviço foi concebida antes do período de vedação e não pode por tal motivo ser considerada conduta vedada. Por isto, a interpretação que considerasse a obra ou serviço não fisicamente em andamento, depois do dia limite, como obra ou serviço eleitoralmente ilícito teria que pressupor necessariamente que o acordo ou avença administrativamente firmados antes desse dia seriam igualmente ilícitos.

19. As transferências voluntárias, feito o acerto formal, podem ser efetuadas desde que exista obra ou serviço em andamento - estes, os quais, pressupõem logicamente previsão legal, prévia licitação, previsão e provisão orçamentária e financeira, e oportunidade e conveniência - e cronograma prefixado, bastando saber o que constitui esta expressão legal na perspectiva da tutela eleitoral.

20. É de se ter presente ainda que o texto legal refere como causa de afastamento da vedação a execução da obra em andamento com cronograma prefixado e essa cláusula legal autoriza uma inteligência abrangente. Ao estabelecer que exista na data limite a execução da obra em andamento a lei em verdade dispôs que é a execução que estaria em andamento, que é o sentido lógico da expressão, e essa idéia permite o entendimento de que a obra física em si pudesse ainda não ter sido iniciada, até porque - e o artigo em questão exige - terá de haver cronograma da obra, isto é, da execução dela, o qual, então, faz a ligação dos trabalhos preparatórios ou auxiliares com a obra em si. Por outra, a obra em andamento diz logicamente com a execução que a contém num processo único de acordo com o cronograma, e é isto que a lei exige na data limite.

21. A solução que se oferece, portanto, não pode ser outra que considerar obra ou serviço em andamento como aquela que, regularmente pactuada antes da data limite, está em andamento ou deveria ou poderá estar em andamento de acordo com o cronograma prefixado segundo as praxes usuais da construção ou prestação respectiva, sendo excessiva a exigência da necessária verificação física dos trabalhos.

22. Aliás, se o objetivo da tutela eleitoral no caso é preservar o eleitorado e os demais candidatos da conduta inescrupulosa de alguém com fim eleitoral, a proposição dos pareceres e da nota acima referida seria insuficiente. Bastaria que uma obra fisicamente iniciada antes do período vedado ficasse deliberadamente paralisada depois disso e ser incrementada festivamente às vésperas da eleição para surtir o mesmo efeito proibido que uma outra que se iniciasse ilícita e propositadamente na mesma época e com a mesma finalidade. Não haveria por certo diferença do ponto de vista da proteção da soberania popular e da igualdade entre os participantes uma vez que, nessa hipótese, ambos os apoiados pelo empreendedor da obra ou serviço seriam obviamente favorecidos.

23. Parece, pois, que, fora os casos manifestamente aberrantes em que a intenção é claramente desviada, não se pode reconhecer a priori eleitoralmente ilícita uma obra ou serviço regularmente firmados só por que ainda não executados fisicamente na data limite da vedação.

Nessa linha, hão de ser verificados caso a caso os episódios em que se apontar essa situação, sem pressuposições ou preconceitos que desservem a finalidade dos atos da Administração e principalmente o interesse e o bem públicos, categorias vetoriais essenciais na interpretação de qualquer dispositivo endereçado às relações entre as entidades públicas, e estas e os cidadãos ou qualquer outra instituição.

24. Com relação aos questionamentos formulados na Exposição de Motivos do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, adoto o entendimento da Nota nº 2004/AGU/CGU/SFT-0026/2004, constante dos itens 27 a 36 e 39 a 47, que expôs, in verbis:

"27. Com relação às perguntas formuladas, que foram anteriormente transcritas, faz-se mister respondê-las nos itens a seguir expostos:

a) entes federados destinatários da regra no art. 73, da Lei nº 9.504/97, no atual período eleitoral: os Estados e suas entidades da administração direta e indireta também se submetem à regra?

28. Inicialmente cabe ressaltar que a Lei nº 9.504, de 1997, veio a regulamentar, através de normas gerais, as eleições em todos os níveis no País. Especificamente ao pleito que irá se realizar em 3 de outubro de 2004, que será somente municipal, é necessário que se observe atentamente os comandos legais contidos no art. 73, da citada Lei, que dispõem sobre condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais.

29. Essas regras, que estão previstas no art. 73, da Lei Eleitoral, têm aplicação na eleição municipal de 3 de outubro de 2004, e sua observância impõe-se a todos os entes federados, salvo a exceção prevista no § 3º do referido artigo.

30. Dispõe o citado parágrafo que as vedações do inciso VI do caput, alíneas b e c, aplicam-se apenas aos agentes públicos das esferas administrativas cujos cargos estejam em disputa na eleição.

31. Somente essa ressalva irá se aplicar à esfera municipal, e não abrangerá a federal e a estadual. Para melhor compreensão, cabe transcrever as normas mencionadas no § 3º do art. 73, da Lei nº 9.504, de 1997, senão vejamos, in verbis:

"Art. 73. ..................................................................

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

b) com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado, autorizar publicidade institucional dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral;

c) fazer pronunciamento em cadeia de rádio e televisão, fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo;

................................................................................"(N)

32. Dessa forma, todas as condutas proibidas aos agentes públicos de todos os entes federados, previstas no citado art. 73, inclusive aquela estabelecida na alínea a, do inciso VI, que se refere ao caso ora em análise, salvo as exceções anteriormente citadas, deverão ser obedecidas mesmo diante de pleito exclusivamente municipal, como será o de 3 de outubro de 2004.

33. Assim, a União está proibida de efetuar transferências voluntárias não somente aos Municípios, mas também aos Estados, incluindo os órgãos da Administração direta e as entidades da Administração indireta.

b) possibilidade de celebração de contratos que impliquem transferência voluntária de recursos orçamentários no período eleitoral, com cláusula de repasses durante o prazo proibitivo;

34. A celebração de contratos, convênios ou outros atos assemelhados, que têm por objeto a transferência voluntária de recursos, segundo o entendimento do Parecer GQ-158, de 1998 e da jurisprudência do TSE, poderá ser realizada no período de três meses que antecedem a eleição, pois é considerada como ajuste prévio.

35. De acordo com o referido Parecer, os agentes públicos podem praticar atos iniciais, ou seja, preparatórios dos convênios, senão vejamos, in verbis:

"28. Verificado que o elenco de condutas vedadas pelo art. 73 da Lei nº 9.504/97 é taxativo, concluiu-se que apenas aquelas condutas ali mencionadas são proibidas, não cabendo ao intérprete acrescentar outras baseado em possíveis semelhanças. Por outro lado, viu-se, também, que não cabe ao intérprete, por meio de investigação teleológica, acrescentar outras condutas que seriam vedadas.

Mas também não lhe cabe, baseado no critério teleológico, tentar superar qualquer daquelas condutas vedadas, sob o argumento de que, naquele caso, a conduta não tenderia a afetar aquela igualdade desejada pela lei.

29. Em razão do que se acabou de afirmar, considero absolutamente legítimo que, durante os três meses que antecedem as eleições, os agentes públicos pratiquem todos os atos preparatórios necessários ao início de uma obra ou serviço, incluindo a assinatura do convênio, acordo ou instrumento congênere, pois nenhum desses atos se encontra proibido pelo art. 73. Não se pode admitir, como já se viu, que se interprete a lei nela inserindo proibições que não existem, levando ao absurdo de obrigar a Administração a cruzar os braços, aguardando o término do período para, somente aí, começar a praticar os atos preparatórios.

30. Como afirmei, esses atos preparatórios, inclusive a assinatura do instrumento próprio, podem ser legitimamente praticados. Para deixar evidente que não se está descumprindo qualquer proibição legal, o convênio, acordo ou instrumento congênere deverá conter cláusula que explicite que os recursos somente serão liberados, ou seja, a transferência dos recursos somente ocorrerá, após o término do prazo previsto no inciso VI, alínea a, do art. 73 da Lei nº 9.504/97. E isso porque a única proibição que aí existe é quanto à transferência de recursos."(N)

36. Também, verifica-se que esse entendimento é adotado pelo TSE em seus julgados, conforme pode se concluir pelo ACORDÃO Nº 19.469, DE 01.02.2002, a seguir transcrito, in verbis:

"O dispositivo legal citado tem o seguinte teor:

"art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(omissis)

VI - nos três meses que antecedem o pleito:

a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;"

Como se vê, a lei proibiu expressamente a transferência voluntária de recursos, nos três meses anteriores ao pleito, ato de que não cogita o caso em exame. As instâncias ordinárias não analisaram, em nenhum momento, a transferência de recursos do Estado para o município, até porque isso não constituiu objeto da representação. O órgão do Ministério Público buscou responsabilizar os recorridos apenas pelo atraso na publicação do convênio. Entretanto, a prática de atos preliminares ou preparatórios, como a assinatura ou a própria publicação do convênio, não foi vedado pela norma em questão.

Esta Corte Superior teve oportunidade de examinar hipótese semelhante, no Acórdão nº 54, da lavra do nobre Ministro Fernando Neves, do qual extraio este tópico expressivo:

'Como já tive oportunidade de afirmar, a possibilidade do titular dos cargos de Presidente da República, Governador e Prefeito ser candidato à reeleição, inclusive sem a necessidade de se afastar de tais cargos não pode paralisar a administração. Daí porque considero inviável coibir, em tese, procedimentos que não tenham sido expressamente vedados por norma legal.

No caso em exame, embora aprovado pelo Presidente da República, o parecer em questão não gera conseqüências automáticas e imediatas. Cuida o citado parecer, conforme se vê do texto anexo à representação, da fixação do entendimento de que a vedação do art. 73, VI, a, da Lei 9.504, de 1997, se resume às transferências de recursos, não abrangendo atos preparatórios e a assinatura dos contratos ou convênios.

Certa ou errada, trata-se de uma interpretação, que não permite a aplicação de qualquer punição, que só poderia ser aplicada aos responsáveis por um caso concreto que, após o devido processo legal, viesse a ser considerado como violador na norma legal.'

E mais adiante:

"Tenho para mim que não é possível pressupor o ilícito, o errado, o desvirtuamento do regular exercício da função pública. Por isso, admiti que a proibição prevista no art. 73, inciso IV, letra a, da Lei nº 9.504, de 1997, não impede a prática dos atos iniciais de convênios,"(Sessão de 06.08.1998) No caso em exame, o autor da representação não se insurgiu nem mesmo contra a celebração do convênio, já que essa se fizera em data anterior ao período de três meses que antecedeu o pleito municipal. Toda a irresignação se volta contra a publicação do convênio, ato cuja prática, a exemplo de sua celebração, não foi vedado pela norma legal, pois a proibição nela contida se cingiu à transferência ou liberação de recursos. O alargamento da hipótese descrita na norma legal, para abranger a celebração do convênio, implicaria interpretação extensiva de seu texto, que não se harmoniza com a orientação desta Corte (Vide Acórdão nº 16.040, Ministro Costa Porto, DJ de 04.02.2000)."(N)

39. No entanto, não há impedimento previsto na Lei Eleitoral com relação às práticas de atos preparatórios necessários para a celebração de contratos, convênios ou outros atos assemelhados no período de três meses que antecedem as eleições, com cláusulas que determinem a transferência voluntária de recursos após este período pré-eleitoral, conforme o entendimento exposto no referido Parecer e na jurisprudência do TSE.

c) é facultado ao Município que não conseguir dar início às obras no período pré-eleitoral, lançar edital, homologar resultado de licitação, firmar contrato e dar início à execução física, ficando apenas vedado o repasse de recursos?

Parecer GQ - 158 e Aviso Circular 06, de 22 de julho de 1998, do Ministro-Chefe da Casa Civil da Presidência da República;

40. Ao se analisar essa questão, verifica-se que o interesse é exclusivo do Município na prática dos citados atos administrativos, não estando aquele ente estatal vinculado aos comandos estatuídos no Parecer GQ - 158, de 1998 e no Aviso Circular nº 06, de 1998, pois estes atos produzem efeitos apenas no âmbito da Administração Pública Federal direta e indireta.

d) prazo limite para realização de operações de crédito pelos entes federados, incluídas aquelas para execução de programas com recursos do FGTS, nos termos dos arts. 66 e 67 do Decreto nº 99.684, de 8 de novembro de 1990, em face do art. 15, da Resolução nº 43, de 2001, do Senado Federal.

41. Com relação ao prazo limite para a contratação de operações de crédito pelos entes federados, tendo em vista a proibição contida no art. 15, da Resolução nº 43, de 2001, do Senado Federal, faz-se mister, primeiramente, buscar a definição legal do que seja operação de crédito.

42. Operação de crédito, segundo o art. 29, inciso III, da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, é o compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito, emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros.

43. Com base nesse conceito, ainda é necessário verificar em que classificação de receita está contida a operação de crédito. De acordo com a Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, em seu art. 11, § 4º, operação de crédito está inserida na classificação de receitas de capital.

44. Ora, sendo considerada como receitas de capital, a operação de crédito está compreendida na definição de transferência voluntária prevista no art. 25, caput, da Lei de Responsabilidade Fiscal.

45. Conforme o citado dispositivo legal, entende-se por transferência voluntária a entrega de recursos correntes ou de capital. Logo, diante disso, todos os entes federados estão sujeitos à aplicação do art. 73, inciso VI, alínea a, da Lei nº 9.504, de 1997, no que se refere às operações de crédito, inclusive aquelas para a execução de programas com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS.

46. No que tange ao disposto no art. 15, da Resolução nº 43, de 2001, do Senado Federal, que veda a contratação de operação de crédito nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do Chefe do Poder Executivo do Estado, do Distrito Federal ou do Município, observa-se que a sua incidência recai exclusivamente sobre os Municípios, pois as eleições deste ano somente ocorrerão nas esferas municipais. Cabe destacar que esse lapso temporal tem início com o período pré-eleitoral estabelecido na Lei nº 9.504, de 1997.

47. Dessa forma, o prazo limite para a realização de operações de crédito pelos entes federados, incluídas aquelas para execução de programas com recursos do FGTS, será o período anterior a 4 de julho de 2004, conforme o estatuído no art. 73, inciso VI, alínea a, da Lei nº 9.504, de 1997. Para os Municípios o prazo limite será de 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do Chefe do Poder Executivo Municipal, ou seja, 4 de julho a 31 de dezembro de 2004, pois somente a este ente estatal se aplicará o disposto no art. 15, da Resolução nº 43, de 2001, do Senado Federal."

25. Por isto, a interpretação que parece mais correta é a que tolera a possibilidade de obras ou serviços que, conquanto regulares e obedientes ao cronograma estabelecido, ainda não estejam em andamento fisicamente verificável na data limite para as transferências voluntárias de que trata o art. 73, VI, letra "a", da Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997.

26. As demais indagações desdobradas ficam - incorporadas as justificações da Nota mencionada que se compatibilizam com a solução ora proposta - respondidas desde que obedecido o critério agora exposto.

27. Com estas considerações, que submeto à apreciação de Vossa Excelência com a sugestão de convertê-las em orientação normativa, dissinto em parte das conclusões em sentido contrário, modificando, em parte, os Pareceres GQ-113, de 1996, e GQ-158, de 1998.

Sub censura.

Brasília, em 3 de maio de 2004.

Adoto, para os fins do art. 41 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993, o Anexo PARECER Nº AGU/MC-02/04, de 26 de abril de 2004, da lavra do Consultor-Geral da União, Dr. MANOEL LAURO VOLKMER DE CASTILHO, e submeto-o ao EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA REPÚBLICA, para os efeitos do art. 40 da referida Lei Complementar.

Brasília, 11 de maio de 2004.

ALVARO AUGUSTO RIBEIRO COSTA

Advogado-Geral da União