Lei nº 11214 DE 02/10/2018

Norma Estadual - Paraíba - Publicado no DOE em 03 out 2018

Dispõe sobre penalidades administrativas a serem aplicadas pela prática de atos de discriminação por motivo religioso e dá outras providências.

O Governador do Estado da Paraíba:

Faço saber que o Poder Legislativo decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Será punido, nos termos desta Lei, todo ato discriminatório por motivo de religião, praticado no Estado da Paraíba, por qualquer pessoa, jurídica ou física, inclusive a que exerça função pública.

Art. 2º Consideram-se atos discriminatórios por motivo de religião, para os efeitos desta Lei:

I - praticar qualquer tipo de ação violenta, constrangedora, intimidatória ou vexatória;

II - proibir o ingresso ou a permanência em ambiente ou estabelecimento aberto ao público;

III - criar embaraços à utilização das dependências comuns e áreas não privativas de edifícios;

IV - recusar, retardar, impedir ou onerar a utilização de serviços, meios de transporte ou de comunicação, consumo de bens, hospedagem em hotéis, motéis, pensões e estabelecimentos congêneres ou o acesso a espetáculos artísticos ou culturais;

V - recusar, retardar, impedir ou onerar a locação, compra, aquisição, arrendamento ou empréstimo de bens móveis ou imóveis;

VI - praticar o empregador, ou seu preposto, atos de coação direta ou indireta sobre o empregado;

VII - negar emprego, demitir, impedir ou dificultar a ascensão em empresa pública ou privada, assim como impedir ou obstar o acesso a cargo ou função pública ou certame licitatório;

VIII - praticar, induzir ou incitar, pelos meios de comunicação, o preconceito ou a prática de qualquer conduta discriminatória;

IX - criar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propagandas que incitem ou induzam à discriminação;

X - recusar, retardar, impedir ou onerar a prestação de serviço de saúde, público ou privado.

Art. 3º (VETADO).

Art. 4º (VETADO).

Art. 5º (VETADO).

Art. 6º As sanções aplicáveis aos que praticarem atos de discriminação nos termos desta Lei serão as seguintes:

I - advertência;

II - multa de até 100 (cem) UFR-PB;

III - multa de até 200 (duzentas) UFR-PB, em caso de reincidência;

IV - suspensão da licença estadual para funcionamento por 30 (trinta) dias;

V - cassação da licença estadual para funcionamento.

§ 1º Quando a infração for cometida por agente público, servidor público ou militar, no exercício de suas funções, sem prejuízo das sanções previstas nos incisos I a III deste artigo, serão aplicadas as penalidades disciplinares cominadas na legislação pertinente.

§ 2º O valor da multa será fixado tendo-se em conta as condições pessoais econômicas do infrator e não poderá ser inferior a 30 (trinta) UFR-PB (Unidades Fiscais de Referência do Estado da Paraíba).

§ 3º A multa poderá ser elevada até o triplo quando se verificar que, em virtude da situação econômica do infrator, sua fixação em quantia inferior seria ineficaz.

§ 4º Quando for imposta a pena prevista no inciso V deste artigo, deverá ser comunicada a autoridade responsável pela outorga da licença, que providenciará a sua execução, comunicando-se, igualmente, a autoridade federal ou municipal para eventuais providências no âmbito de sua competência.

Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 8º Revogam-se as disposições em contrário.

PALÁCIO DO GOVERNO DO ESTADO DA PARAÍBA, em João Pessoa, 02 de outubro de 2018; 130º da Proclamação da República.

RICARDO VIEIRA COUTINHO

Governador

VETO PARCIAL

Senhor Presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba, Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1º do art. 65 da Constituição Estadual, por considerar inconstitucional e contrário ao interesse público, decidi vetar totalmente o Projeto de Lei nº 1.730/2018, de autoria da Deputada Daniella Ribeiro, que "Dispõe sobre penalidade administrativas a serem aplicadas pela prática de atos de discriminação por motivo religioso e dá outras providências."

RAZÕES DO VETO

O projeto de lei disciplina a punição administrativa pela prática de atos de discriminação por motivo religioso praticado por pessoa jurídica ou física, inclusive a que exerça função pública.

É bom destacar que o ordenamento jurídico pátrio já dispõe de arcabouço legislativo suficiente para penalizar qualquer ato resultante de discriminação ou preconceito de religião, raça, cor, sexo, etnia, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza.

A Constituição Federal (CF), por exemplo, garante a toda pessoa a liberdade de conservar sua religião ou suas crenças, ou de mudar de religião ou de crenças, bem como a liberdade de professar e divulgar sua religião ou suas crenças, individual ou coletivamente, tanto em público como em privado:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

.....

VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

.....

.....

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

A quem ouse adotar práticas e condutas discriminatórias ou preconceituosas ao exercício de religião de alguma pessoa, o Código Penal (CP) é implacável:

Injúria

Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

.....

§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência:

Pena - reclusão de um a três anos e multa.

.....

.....

Redução a condição análoga à de escravo

Art. 149. Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.

.....

.....

§ 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:

I - contra criança ou adolescente;

II - por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.

.....

.....

Ultraje a culto e impedimento ou perturbação de ato a ele relativo

Art. 208. Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

Parágrafo único. Se há emprego de violência, a pena é aumentada de um terço, sem prejuízo da correspondente à violência.

GRIFAMOS

A lei federal nº 7.716, de 05 de janeiro de 1989, pune os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

.....

Art. 3º Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional.

.....

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Pena: reclusão de um a três anos e multa.

Após essa análise, ainda que reconheça os bons propósitos que motivaram a iniciativa, vejo-me compelido a vetar parcialmente o projeto pela inconstitucionalidade por vício formal.

Ao criar atribuições para a Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana, o projeto de lei incorre em vício de iniciativa, uma vez que a matéria é de competência exclusiva do Governador do Estado. Nesse sentido o art. 63, § 1º, inciso II, alínea "e", da Constituição do Estado.

Vejamos:

"Art. 63. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

(.....)

II - disponham sobre:

(.....)

e) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública." (grifo nosso)

Ofende, portanto, o princípio da separação dos poderes lei de iniciativa parlamentar que disponha sobre atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.

STF-0088631) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. VÍCIO DE INICIATIVA. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR QUE DISPÕE SOBRE ATRIBUIÇÕES E ESTABELECE OBRIGAÇÃO A ÓRGÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO. 1. Acórdão recorrido que se encontra em sintonia com a jurisprudência desta Corte no sentido de que padece de inconstitucionalidade formal a lei de iniciativa parlamentar que disponha sobre atribuições ou estabeleça obrigações a órgãos públicos, matéria da competência privativa do Chefe do Poder Executivo. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (Ag. Reg. no Recurso Extraordinário nº 653041/MG, 1ª Turma do STF, Rel. Edson Fachin. j. 28.06.2016, unânime, DJe 09.08.2016).

GRIFO NOSSO

É salutar destacar que a eventual sanção de Projeto de Lei no qual se tenha constatado vício de iniciativa não seria apta a convalidar a inconstitucionalidade, conforme se infere do posicionamento firmado no Supremo Tribunal Federal:

"A sanção do projeto de lei não convalida o vício de inconstitucionalidade resultante da usurpação do poder de iniciativa. A ulterior aquiescência do chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, não tem o condão de sanar o vício radical da inconstitucionalidade. Insubsistência da Súmula 5/STF. Doutrina. Precedentes." (ADI 2.867, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 03.12.2003, Plenário, DJ de 09.02.2007.) No mesmo sentido: ADI 2.305, Rel. Min. Cezar Peluso, julga mento em 30.06.2011, Plenário, DJE de 05.08.2011; AI 348.800, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 05.10.2009, DJE de 20.10.2009; ADI 2.113, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 04.03.2009, Plenário, DJE de 21.08.2009; ADI 1.963-MC, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 18.03.1999, Plenário, DJ de 07.05.1999; ADI 1.070, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 29.03.2001, Plenário, DJ de 25.05.2001.

São essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar os arts. 3º, 4º e 5º do Projeto de Lei nº 1.730/2018, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros da Assembleia Legislativa.

João Pessoa, 02 de outubro de 2018.

RICARDO VIEIRA COUTINHO

Governador