Declaração de Ineficácia de Consulta COTRI nº 22 DE 15/12/2023

Norma Estadual - Distrito Federal - Publicado no DOE em 15 dez 2023

ITBI. 1. Imunidade. Não incidência de ITBI na transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem na transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, nos termos do inciso I do § 2º do Art. 156 da cf/88. 2. Lei Distrital nº 3.830/2006 e Decr. Distrital nº 27.576/2006. Presunção de constitucionalidade. 3. Tjdft. Arguição de inconstitucionalidade de normas distritais. Decisão não definitiva do tribunal para declarar a inconstitucionalidade parcial do § 1º, do Art. 3º, da Lei Distrital nº 3.830/2006 e do Decreto distrital nº 27.576/2006, na parte em que mencionam os incisos I e III, do caput. Decisão sem trânsito em julgado, sujeita à interposição de recurso. 4. Incidência de ITBI sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital nela subscrito, e na transmissão de bens ou direitos em decorrência de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, quando a pessoa jurícica adquirente tiver como atividade preponderante a compra e venda de bens imóveis e seus direitos reais, a locação de bens imóveis ou o arrendamento mercantil, nos termos do § 1º do art 3º da Lei Distrital nº 3.830/2006 e do § 1º do Art. 2º do Decr. Distrital nº 27.576/2006. (Processo SEI nº 04034-00011818/2023-16).

I – RELATÓRIO

1. Pessoa jurídica de direito privado, localizada no Distrito Federal, apresentou Consulta abrangendo o Imposto sobre Transmissão “Inter Vivos” de Bens Imóveis e de Direitos a eles Relativos - ITBI, disciplinado no território distrital por meio da Lei nº 3.830, de 14 de março de 2006 — regulamentada pelo Decreto distrital nº 27.576, de 28 de dezembro de 2006.

2. O processo de Consulta tem lastro nos artigos 55 a 63 da Lei distrital nº 4.567, de 9 de maio de 2011, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, contencioso e voluntário, no âmbito do Distrito Federal, e nos artigos 73 a 82 do Decreto distrital nº 33.269, de 18 de outubro de 2011, que a regulamenta.

3. A Consulente declarou ter como atividade econômica principal o aluguel de imóveis e como atividade econômica secundária a compra e venda de imóveis próprios (ID 120102746).

4. Em seguida, aduziu que a SEFAZ/DF, no tocante à incidência de ITBI na integralização de imóveis ao capital social da empresa, entendia ser devido o referenciado imposto relativo àqueles imóveis que viessem a ser integralizados ao capital social da empresa que tivesse como atividade econômica preponderante a atuação imobiliária, a exemplo da administração de imóvel, a sua venda e o seu aluguel etc.

5. Alegou que o ITBI é tributo municipal que incide quando há transação onerosa, a qualquer título, de um imóvel. Também anotou que o ITBI é disciplinado no Distrito Federal por meio da Lei distrital nº 3.830/2006 e pelo Decreto distrital nº 27.576/2006.

Demais isso, assentou que do ITBI é aplicado de forma proporcional ao valor de aquisição do bem e que a falta de seu pagamento enseja a impossibilidade de transferência do imóvel.

6. Arrazoou que o Supremo Tribunal Federal - STF, em julgamento do “Recurso Especial” 796.376/SC, sob regime de repercussão geral (Tema 796), discutiu o alcance da imunidade tributária do ITBI, prevista no art. 156, II, § 2º, I, da Constituição Federal, sendo que o relator do aludido processo deliberou que as ressalvas previstas na segunda parte do supracitado inciso são aplicáveis única e restritivamente à hipótese de incorporação de bens decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, não abrangendo a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, como previsto na sua legislação.

7. Ato subsequente, sustentou que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – TJDFT, por ocasião do julgamento do processo nº 0705115-03.2021.8.07.0018, firmou a orientação para a inconstitucionalidade parcial do § 1º do art. 3º da Lei nº 3.830/2006 e do art. 2º do Decreto distrital nº 27.576/2006, culminando na imunidade tributária do ITBI em operações de transferência de bens imóveis para fins de integralização de capital subscrito pelos sócios, mesmo que sua atividade preponderante seja imobiliária.

8. Por fim, a Consulente fez o seguinte questionamento, ipsis litteris:

- Atualmente, após os julgamentos mencionados acima, a SEFAZ/DF alterou o entendimento para fazer valer a não incidência do ITBI na integralização de imóveis ao capital social de empresa que tenha como atividade preponderante a administração de imóveis próprios?

9. Após o regular saneamento processual, nos termos do art. 75 do Decreto distrital nº 32.269/2011, realizado pela Coordenação de Atendimento ao Contribuinte - COATE e pelo Centro de Gestão de Malha e Programação Fiscal - CEMPRO, os autos foram conclusos para despacho dessa Gerência de Esclarecimento de Normas - GEESC, no que tange ao exame do mérito da Consulta (ID 122840707).

II - ANÁLISE

10. Inicialmente, registra-se que a análise da matéria consultada está plenamente vinculada aos estritos preceitos da legislação tributária do Distrito Federal e que as considerações e respostas apresentadas se adequam às circunstâncias da Consulta em exame, não se aplicando a outras situações que alterem as variáveis ou os elementos ora examinados.

11. É facultado ao sujeito passivo — contribuinte ou responsável —, formular Consulta em caso de dúvida sobre a interpretação e aplicação da legislação tributária do Distrito Federal, referente à determinada situação de fato, relacionada a tributo do qual seja inscrito no CF/DF ou pelo qual seja responsável, conforme dicção do art. 73 do Decreto distrital nº 33.269/2011. A Consulta deve ter descrição clara e objetiva da dúvida e elementos imprescindíveis à sua solução, sob pena de ser inadmitida, nos termos do art. 76 do supracitado decreto distrital.

12. A dúvida, no âmbito de um processo de consulta formal, consiste na ausência de convicção entre duas ou mais interpretações e/ou aplicações da legislação tributária do Distrito Federal, no tocante a uma determinada situação de fato, sendo de todo oportuno lembrar que tal dúvida não pode ser genérica e também não pode ser confundida, em nenhum momento, com questionamento de natureza meramente procedimental, que pode ser respondido por meio de atendimento virtual presente na página eletrônica da Subsecretaria da Receita (https://www.receita.fazenda.df.gov.br).

13. Será considerada ineficaz a Consulta sobre fato definido ou declarado em disposição literal da legislação ou disciplinado em ato normativo, inclusive em Solução de Consulta, ou orientação, publicados antes de sua apresentação, nos termos dos incisos I e II do art. 58 da Lei distrital nº 4.567/2011.

14. Pois bem, a Consulente mencionou que o Supremo Tribunal Federal – STF julgou o “Recurso Especial” 796.376/SC, sob regime de repercussão geral (Tema 796), tratando acerca do alcance da imunidade tributária do ITBI, prevista no art. 156, II, § 2º, I, da Constituição Federal. Por entender que a Consulente queria, na verdade, referir-se a Recurso Extraordinário quando anotou Recurso Especial, e também em virtude das competências do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça – STJ, designadas na Constituição Federal, faremos menção, doravante, apenas do Recurso Extraordinário 796.376/SC.

15. Antes de observarmos o que foi decidido pelo STF na apreciação do Tema 796 da repercussão geral, vale historiar as decisões judiciais anteriores referentes a um pedido de um contribuinte para que o Município de São João Batista/SC reconhecesse a imunidade, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, na realização de capital
no total de R$ 802.724,00, mesmo que o capital social da sua empresa fosse de apenas de R$ 24.000,00. Para tanto, segue excerto do voto do Ministro Alexandre de Morais por ocasião do julgamento do RE 796.376/SC. Confira.

Na origem, Lusframa Participações Societárias Ltda. impetrou mandado de segurança, com pedido liminar, contra ato do Secretário da Fazenda Municipal de São João Batista/SC, que reconheceu apenas parcialmente a imunidade do ITBI sobre os bens imóveis incorporados ao patrimônio da impetrante a título de realização de capital, exigindo o tributo sobre a diferença entre o valor do capital social e o dos bens transferidos.

Informou que (a) foi constituída em maio de 2010, com objeto social determinado para participação societária e acionária em outras empresas, e representação comercial por conta própria ou de terceiros; (b) o capital social da empresa é R$ 24.000,00, e foi integralizado mediante bens imóveis (17 imóveis) cujo valor total (R$ 802.724,00) é superior ao do capital social; e (c) a autoridade coatora se nega a emitir guia de Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) com imunidade integral na transferência dos bens, conforme previsão do art. 156 da Constituição Federal de 1988 e art. 36 do Código Tributário Nacional, sob o argumento de que a imunidade atinge somente o montante do capital social da empresa a ser integralizado. Ao final, pleiteou a declaração de imunidade tributária em relação ao ITBI sobre o valor total do imóveis transferidos. A
sentença concedeu a segurança, para reconhecer a imunidade tributária sobre todos os imóveis transmitidos e determinar que a autoridade coatora se abstivesse de exigir o ITBI sobre a transmissão daqueles bens incorporados ao patrimônio da impetrante a título de realização de capital. Em seguida, o Tribunal de origem, em sede de apelação e de reexame necessário, reformou a sentença, para denegar a segurança, ao entendimento de que a imunidade do ITBI incide apenas sobre o valor do imóvel suficiente para a integralização do capital social da empresa. Decidiu que deve ser tributada a diferença, no montante de R$ 778.724,00, apurada entre os valores do capital social subscrito e dos bens dados em pagamento para a integralização da quotas sociais. O acórdão recebeu a seguinte ementa:

TRIBUTÁRIO — ITBI — INCORPORAÇÃO DE IMÓVEIS PARA INTEGRALIZAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL DE PESSOA JURÍDICA — IMUNIDADE TRIBUTARIA (ART.156, § 2°, INCISO II, DA CF/1988) — VALOR DOS IMÓVEIS SUPERIOR AO DO CAPITAL SOCIAL INTEGRALIZADO E DAS COTAS DOS SÓCIOS RESPECTIVOS — IMUNIDADE QUE ALCANÇA APENAS O LIMITE DO CAPITAL E DAS COTAS (INTEGRALIZADAS COM IMÓVEIS — EXCEDENTE SUJEITO À TRIBUTAÇÃO — SENTENÇA REFORMADA. A imunidade tributária prevista na primeira parte do inciso II do § 2° do art. 156, da Constituição Federal de 1988 impede a incidência do imposto de transmissão de bens imóveis "inter vivos" somente sobre o valor do imóvel necessário à integralização da cota do capital social. Vale dizer, sobre o valor do imóvel incorporado que excede o limite do capital social a ser integralizado ou da própria cota do sócio respectivo, haverá incidência do tributo.

Opostos Embargos de Declaração pela impetrante, foram rejeitados. Irresignada, a empresa interpôs Recurso Extraordinário, com fundamento no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, em que aponta violação ao art. 156, § 2º, I, da Constituição
Federal, além dos princípios constitucionais da legalidade (37, II), da reserva legal (art. 5º, II), da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI), da livre iniciativa e da autonomia da vontade (arts. 1º, IV, e 170). Para tanto, sustenta que:

a) o fisco municipal e o acórdão recorrido afrontaram o princípio da legalidade ao impor limitação à imunidade do ITBI em relação aos imóveis destinados à integralização do capital social da empresa, haja vista tal restrição não estar prevista na Constituição, nem no Código Tributário Nacional;

b) “ocorrendo a incorporação dos imóveis para fins de integralização do capital social, deve a empresa ora recorrente estar imune ao pagamento do tributo de transmissão sobre bens imóveis, não podendo ser criado ou estabelecido nenhum outro critério além daqueles previstos na Constituição Federal, a aplicação de tal critério de exceção traduz verdadeira insegurança jurídica ao empresariado;

c) “negar a concessão de benefício constitucional para empresa recorrente seria negar consequentemente o preceito que visa motivar os particulares à exploração de atividades empresariais”, o que contraria o objetivo da norma inscrita no art. 170 da CF;

d) a vedação ao poder de tributar constante no art. 156, § 2º, I, constitui imunidade tributária e, como tal, não admite limitação; e

e) as ilações do Tribunal de origem a respeito das razões pelas quais se pretende destinar imóveis em valor superior ao da integralização do capital viola à livre iniciativa, pois não há nenhuma norma legal que proíba tal conduta, uma vez que o valor dos imóveis excedente ao capital social figurará na contabilidade empresarial com reserva capital, conforme o acordo de vontade dos sócios consubstanciado no contrato social da empresa.

16. A jurisprudência do STF registra que o Tema do RE 796.376/SC é o “Alcance da imunidade tributária do ITBI, prevista no art. 156, § 2º, I, da Constituição, sobre imóveis incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica, quando o valor total desses bens excederem o limite do capital social a ser integralizado”. Segue abaixo o texto constitucional preceituado no art. 156, § 2º, I, da CF/88. Veja.CF/88

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana;

II - transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

(...)

§ 2º O imposto previsto no inciso II:

I - não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil;

17. A decisão do STF, por ocasião do julgamento do RE 796.376/SC, restou assim ementada:

RE 796.376

Órgão julgador: Tribunal Pleno

Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO

Redator(a) do acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES

Julgamento: 05/08/2020

Publicação: 25/08/2020