Consulta COPAT nº 44 DE 04/05/2018

Norma Estadual - Santa Catarina - Publicado no DOE em 08 mai 2018

ICMS. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. INAPLICABILIDADE. 1) A IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS (ARTIGOS RELIGIOSOS) PARA POSTERIOR REVENDA AOS FIÉIS, MESMO QUE SEM FINALIDADE LUCRATIVA, TRATAM-SE DE OPERAÇÕES SUBMETIDAS À INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. 2) OPERAÇÕES COM ESTAS MESMAS MERCADORIAS REALIZADAS ENTRE ENTIDADES RELIGIOSAS DA MESMA CONFISSÃO E DE MESMA TITULARIDADE SUBMETEM-SE À LEGISLAÇÃO PERTINENTE APLICÁVEL ÀS TRANSFERÊNCIAS REALIZADAS ENTRE CONTRIBUINTES NORMAIS DO IMPOSTO. 3) NA TRANSFERÊNCIA DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO ENTRE ENTIDADES RELIGIOSAS DA MESMA CONFISSÃO E DE MESMA TITULARIDADE NÃO INCIDE O IMPOSTO POR NÃO CARACTERIZAR OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIA.

DA CONSULTA

A consulente é uma associação civil regularmente constituída, sediada na cidade de São Paulo, com abrangência em todo o território nacional, abrigando em seu quadro todas as igrejas de determinada e conhecida confissão religiosa. Não há qualquer inscrição no CCICMS/SC concedida à consulente ou aos seus associados.

A consulta questiona sobre a possibilidade de ser aplicada a imunidade tributária nos termos do art. 150, VI, "b", da Constituição Federal e do art. 128, VI, b, da Constituição Estadual de Santa Catarinense às operações de importação e posterior revenda de artigos e materiais religiosos exclusivamente aos fiéis da igreja, realizadas diretamente pela consulente, sem intermédio de terceiros e sem a finalidade lucrativa, de forma a afastar a exigência do ICMS incidente nestas operações.

Acrescenta que realiza as seguintes operações: (i) Transferência de mercadorias para uso religioso a partir da matriz e filial localizadas em São Paulo para os templos (filiais) localizados em outros Estados, com a posterior revenda direta aos fiéis (pessoas físicas não contribuintes);(ii) Venda direta a partir da matriz e filial localizadas em São Paulo para os fiéis (pessoas físicas não contribuintes) localizados neste Estado; (iii) Transferência de bens para ativo imobilizado utilizado na construção de templos nos Estados.

Destaca ainda que essas operações não tem o objetivo de auferir lucro. Portanto, a importação e a revenda de artigos e materiais religiosos (livros, brochuras, revistas e periódicos, gravuras, impressos em geral, macacões batismais, mantos, robes, véus e xales de fibra sintética, barretes e outros artefatos semelhantes, quadros e pinturas), apesar de serem operações mercantis, convergem para o desempenho de um único propósito, o de cumprir com suas finalidades essenciais, sem jamais focar em qualquer rentabilidade.

Além disso, a Consulente informa que já possui resposta a ela favorável em São Paulo (Consulta nº 11581/2016 - doc. 03), e que também possui decisão favorável em mandado de segurança impetrado em São Paulo para a liberação de mercadorias importadas sem a necessidade de pagamento do ICMS-importação (mandado de segurança nº 1026476-76.2015.8.26.0602 - doc. 04.

Diante dos fatos narrados, e com base na Constituição Federal , a consulente formula, literalmente, os seguintes questionamento:

1) As operações de revendas de artigos e materiais religiosos, exclusivamente aos fiéis da igreja, realizadas através de lojas/templos situadas neste Estado (sem a finalidade de obter lucro) estão contempladas pela imunidade tributária com relação ao ICMS, nos termos dos art. 150, VI, "b", da Constituição Federal e art. 128 , VI, "b", da Constituição Estadual de Santa Catarina?

2) As operações de revenda interestadual diretamente da matriz/filiais localizadas em São Paulo para fiéis (não contribuintes) também contam com a imunidade para fins do diferencial de alíquota (Emenda Constitucional nº 87/2015 ), com fundamento no mesmo dispositivo?

3) As operações de transferência interestadual da matriz/filiais localizadas em São Paulo para templos/capelas localizados neste Estado são alcançadas pela mencionada imunidade tributária no que diz respeito ao ICMS eventualmente devido por substituição tributária?

4) As operações referentes ao recebimento interestadual em transferência de materiais para o ativo imobilizado dos templos/capelas possuem a referida imunidade tributária no que se refere ao diferencial de alíquota?

As condições de admissibilidade foram verificadas pela Gerência Regional.

É o parecer, passo à análise.

LEGISLAÇÃO

CF, art. 150, V "b", § 4º, art. 155, II, § 2º, XII;

LC nº 87/96 , art. 2º , § 1º, I.

FUNDAMENTAÇÃO

Preliminarmente, vale registrar que os precedentes citados pela consulente a título de argumento de autoridade visando sustentar o seu entendimento, não estão em plena consonância com a tese exposta na peça vestibular. Senão veja-se:

A resposta dada pelo Fisco Paulista à consulta nº 11581/2016 traz a seguinte ementa (grifos deste parecerista):

ICMS - Templos de qualquer culto - Imunidade tributária - Venda de produtos religiosos (bíblias, hinários, véus e outros). I. A imunidade instituída para os templos pela Constituição Federal de 1988 (artigo 150 , inciso VI, "b") não alcança o ICMS que, por regra, incide sobre as operações de aquisição ou de venda de mercadorias realizadas pelos templos. II. Bíblias, hinários e produtos impressos que possam ser classificados como livros ou periódicos são, por si próprios, imunes à incidência do ICMS.

Da fundamentação da citada resposta extrai-se o seguinte "Interpretação

5. Primeiramente, em relação à questão constante no item 4 "a", entendemos que a dúvida já foi esclarecida em resposta à Consulta nº 4317/2014 (*), 22/01/2014, anteriormente formulada pela própria Consulente.

Destaque deste parecer: (*) ICMS - Entidade religiosa - Importação. I. A imunidade constitucional dos templos de qualquer culto não alcança o ICMS na operação de importação de bens e mercadorias do exterior.

6. No tocante à imunidade tributária do ICMS nas "operações de revendas de artigos e materiais religiosos importados, exclusivamente aos fiéis da igreja, realizadas diretamente pela Consulente, sem intermédio de terceiros", vale lembrar que este órgão consultivo, a respeito da imunidade conferida aos templos de qualquer culto, entende que o referido dispositivo constitucional (artigo 150, VI, "b", e § 4º, da CF/1988) proíbe, tão somente, a incidência de impostos sobre o patrimônio, a renda e os serviços dessas entidades. A imunidade constitucional referida impede que os impostos recaiam diretamente sobre o patrimônio, a renda e os serviços dos templos.

7. Convém destacar, no caso em concreto, o balizamento que a doutrina faz entre impostos diretos e indiretos. Na acepção de Ricardo Lobo Torres (in "Tratado de direito constitucional financeiro e tributário", volume III: os direitos humanos e a tributação: imunidade e isonomia - Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 244):

"[.....] os templos não pagam os impostos diretos, mas estão sujeitos à incidência dos indiretos, quer como compradores, quer como vendedores de mercadorias. [.....]".

8. Com efeito, o ICMS, imposto classificado como "indireto", afora as prestações de serviços de transporte intermunicipal e interestadual e de comunicação, tem como objeto as operações relativas à circulação de mercadorias, não se enquadrando, assim, no conceito de impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços. Dessa maneira, o ICMS, em regra, não é alcançado pela imunidade prevista no artigo 150, VI, "b", da Constituição Federal/1988. "

De se destacar que a solução salomônica - excerto abaixo transcrito somente para ilustrar - adotada na resposta do Fisco Paulista não encontra respaldo jurídico, portanto é imprestável para sustentar a tese esposada pela consulente.

Entretanto, diante da situação fática apresentada, cabe assinalar que este órgão consultivo já entendeu, em outra oportunidade, que há situações em que o repasse de alguns produtos aos fiéis, para uso durante o culto, pode não configurar hipótese de incidência de ICMS.

10. (.....)

11. Assim considerado, no que se refere a véus, vestimentas e outros produtos para uso durante o culto, é condição essencial para a não incidência do ICMS, na situação sob análise, que esses produtos de caráter religioso, embora sejam vendidos aos fiéis pela Consulente, não sejam alcançados pelo intuito de lucro que confere às operações mercantis seu lineamento peculiar; isto é, que o templo não possua a prerrogativa de auferir renda com a venda (repasse) aos seus fiéis ou igrejas de mesma doutrina.

12. Dessa forma, para que a operação de repasse (ou venda), aos fiéis e às igrejas de mesma doutrina, de produtos religiosos, não se sujeite ao ICMS, mantendo-se albergada pela imunidade que se irradia do próprio templo, é necessário que: (i) seja efetuada diretamente pelo templo (igreja);

(ii) seja realizada graciosamente ou, na hipótese de venda, que o valor cobrado seja igual ou inferior ao "preço de custo" ou ao "custo de reposição" (preço de aquisição atualizado) do produto; e

(iii) os produtos em questão sejam essenciais à prática do próprio culto e devam ser utilizados dentro das edificações do templo (estabelecimento físico).

Já no tocante ao MS nº 1026476-76.2015.8.26.0602, onde houve a liberação de mercadorias importadas sem a necessidade de pagamento do ICMS-importação, apura-se que a situação fática envolvida na lide se refere à importação de bem para integrar o ativo imobilizado do importador. É o se depreende da simples leitura da ementa:

MANDADO DE SEGURANÇA ICMS IMUNIDADE TRIBUTÁRIA ENTIDADE RELIGIOSA IMPORTAÇÃO DE INSTRUMENTOS MUSICAIS. Impetração objetivando a liberação de instrumentos musicais importados para utilização na consagração das missas, sem o prévio pagamento do ICMS Entidade religiosa, sem fins lucrativos Imunidade tributária Possibilidade O direito à imunidade tributária de templos de qualquer culto compreendem o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas, alcança o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre as operações de importação de mercadorias Aplicação do artigo 150, VI, "b" e § 4º da Constituição Federal , que abrange os tributos que incidem sobre bens a serem utilizados na prestação de suas finalidades essenciais Equipamento importado que se relaciona às suas finalidades essenciais e que não são destinados ao comércio Precedentes deste Tribunal e do STF Existência de direito líquido e certo. Sentença concessiva mantida. Reexame necessário e recurso fazendário não providos. Recurso da impetrante provido para adequação da fundamentação.

Observa-se que o caso trata-se de importação de bens (instrumentos musicais) destinados a integrar o ativo imobilizado dos associados da consulente, portanto, não se tratam de mercadorias propriamente dita, mas sim de bens móveis.

Sabe-se que a Suprema Corte tem decidido que a tributação somente será afastada se a entidade religiosa a ser imunizada é sujeito passivo "de direito" do ICMS. Nesse sentido, vem reconhecendo a imunidade do ICMS nos casos de importação de bens incorporados ao patrimônio. (Rec. MS nº 22.582 - CE (2006/0187914-3).

Infere-se, por conseguinte, que as operações de importação de mercadorias por entidade religiosa quando destinadas a revenda (a qualquer título) deverão submeter-se a incidência do ICMS.

Agora, no campo doutrinário, registra-se o escólio de Roque A. Carrazza (Curso de Direito Constitucional Tributário, 1997, p. 409/10) que esclarece ser fácil perceber que a alínea "b" do inciso IV, do art. 150 da CF visa assegurar a livre manifestação da religiosidade das pessoas, isto é, a fé que elas têm em certos valores transcendentais. As entidades tributantes não podem, nem mesmo por meio de impostos, embaraçar o exercício de cultos religiosos. A Constituição garante, pois, a liberdade de crença e a igualdade entre as crenças.

No entanto, adverte o professor que o § 4º do mesmo dispositivo constitucional restringe a imunidade às finalidades essenciais das entidades (igrejas) mencionadas. Tudo o que não estiver vinculado ao culto não está abrangido pela isenção. Prossegue o mesmo autor citado:

(.....) a imunidade não se estende às rendas provenientes de alugueres de imóveis, da venda de objetos sacros, da exploração comercial de estacionamentos, da venda de licores etc., ainda que os rendimentos assim obtidos revertam em benefício do culto. Por que? Simplesmente porque estas não são funções essenciais de nenhum culto. Com efeito, nenhum culto existe para, v.g., fabricar e vender bebidas alcoólicas. As atividades espirituais não se coadunam com tais práticas, que, posto lícitas, têm objetivos nitidamente temporais.

Portanto, com respaldo nos fundamentos jurídicos apurados nos apontamentos acima, pode-se afirmar que a imunidade tributária concedida aos templos de qualquer culto (artigo 150, VI, "b" da CF/1988) NÃO alberga eventuais operações de circulação de mercadorias realizadas pelas entidades religiosas, exceto as operações com livros, jornais e periódicos, as quais serão IMUNES por que regidos em dispositivo constitucional próprio (artigo 150, VI, "d" da CF/1988).

Assim, a luz do entendimento jurisprudencial do STF, temse que não é possível aplicar a imunidade tributária sobre as operações de importação de mercadorias destinadas a revenda de artigos e materiais religiosos, mesmo que sem finalidade lucrativa.

RESPOSTA

Posto isto, proponho que os questionamentos sejam respondidos na ordem em que foram formulados pela consulente:

1) As operações de revendas de artigos e materiais religiosos, exclusivamente aos fiéis da igreja, realizadas através de lojas/templos situadas neste Estado (sem a finalidade de obter lucro) estão contempladas pela imunidade tributária com relação ao ICMS, nos termos dos art. 150, VI, "b", da Constituição Federal e art. 128 , VI, "b", da Constituição Estadual de Santa Catarina?

RESPOSTA: Este tipo de operação mercantil não é albergada pela imunidade tributária concedida aos templos de qualquer culto pela CF, art. 150, VI, "b", submetendo-se, portanto, à incidência do ICMS. 2) As operações de revenda interestadual diretamente da matriz localizada em São Paulo para fiéis (não contribuintes) também contam com a imunidade para fins do diferencial de alíquota (Emenda Constitucional nº 87/2015 ), com fundamento no mesmo dispositivo?

RESPOSTA: Considerando haver a incidência do ICMS neste tipo de operação conforme demonstrado neste parecer, NÃO HÁ que se cogitar sobre a aplicação da imunidade tributária concedida aos templos de qualquer culto pela CF, art. 150, VI, "b", ao valor referente ao diferencial de alíquota, posto que esta exação deriva do fato gerador original imposto.

3). As operações de transferência interestadual da matriz/filiais localizadas em São Paulo para templos/capelas localizados neste Estado são alcançadas pela mencionada imunidade tributária no que diz respeito ao ICMS eventualmente devido por substituição tributária?

RESPOSTA: Considerando haver a incidência do ICMS neste tipo de operação conforme demonstrado neste parecer, não há que se cogitar na aplicação da imunidade concedida aos templos de qualquer culto pela CF, art. 150, VI, "b", apenas pelo fato destas operações estarem submetidas ao regime da substituição tributária.

4). As operações referentes ao recebimento interestadual em transferência de materiais para o ativo imobilizado dos templos/capelas possuem a referida imunidade tributária no que se refere ao diferencial de alíquota?

RESPOSTA: Não cabe evocar a imunidade tributária para esta hipótese, posto que se tratando de bens devidamente integralizados ao ativo imobilizado a transferência entre estabelecimentos ou entidades religiosas da mesma titularidade, ou seja, a mesma pessoa jurídica não se caracterizará numa operação de circulação com mercadorias, logo, não haverá a incidência do imposto (Ex. CONSULTA 18/2014: ICMS. REMESSA DE BENS DO ATIVO IMOBILIZADO PARA CANTEIRO DE OBRAS MANTIDO PELO PRESTADOR DE SERVIÇO EM OUTRA UNIDADE DA FEDERAÇÃO NÃO CONSTITUI FATO GERADOR DO IMPOSTO, LOGO, NADA É DEVIDO A TÍTULO DE DIFERENCIAL DE ALÍQUOTAS.)

É o parecer que submeto a apreciação desta Colenda Comissão.

LINTNEY NAZARENO DA VEIGA

AFRE IV - Matrícula: 1914022

De acordo. Responda-se à consulta nos termos do parecer acima, aprovado pela COPAT na Sessão do dia 19.04.2018.

A resposta à presente consulta poderá, nos termos do § 4º do art. 152-E do Regulamento de Normas Gerais de Direito Tributário (RNGDT), aprovado pelo Decreto 22.586 , de 27 de julho de 1984, ser modificada a qualquer tempo, por deliberação desta Comissão, mediante comunicação formal à consulente, em decorrência de legislação superveniente ou pela publicação de Resolução Normativa que adote diverso entendimento.

Responsáveis

ROGERIO DE MELLO MACEDO DA SILVA

Presidente COPAT

CAMILA CEREZER SEGATTO

Secretário(a) Executivo(a)