Resposta à Consulta nº 717 DE 28/02/2001

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 28 fev 2001

Pauta Fiscal - Características - Aplicação, em vista do Comunicado CAT n.º 74/94.

CONSULTA Nº 717, DE 28 DE FEVEREIRO DE  2001

Pauta Fiscal - Características - Aplicação, em vista do Comunicado CAT n.º 74/94.

1. Informa o Consulente que é produtor rural, pecuarista, em dois estabelecimentos, localizados nos Estados de Goiás, onde é criador, e de São Paulo, onde recria e engorda o gado, e que, em vista desta atividade, habitualmente transfere bezerros machos, com até 12 meses, daquele Estado para este, contratando serviços de transporte.

2. Relativamente ao crédito do imposto pelas entradas dos semoventes no seu estabelecimento paulista, demonstra-se inconformado com os efeitos da disciplina decorrente das Portarias CAT n.ºs 14/82, 38/86 e do Comunicado CAT n.º 74/94, por considerar que “esse procedimento, decididamente irregular, consiste basicamente em ignorar a base de cálculo da operação e o ICMS anteriores, destacados em documentação regular, oriunda da outra UF, no caso do Estado de Goiás, para limitá-los a valores ou parâmetros locais, constantes de uma ‘pauta fiscal’, fixados genericamente, sem, portanto, correspondência ou fundamento em fatos reais ou bases efetivas como os de uma operação, implicando em glosa sumária e indevida de crédito do imposto assegurado constitucionalmente”.

3. Após referir-se à doutrina e à jurisprudência para argüir a ilegalidade do Comunicado CAT n.º 74/94 diante da Lei Complementar n.º 87/96, pergunta:

. “Pode o Chefe do Posto Fiscal, sem oferecer oportunidade de avaliação contraditória, administrativa ou judicial (art. 18 da LC 87/96) glosar créditos de ICMS – Gado e, também, negar-se a registrar ou reconhecer o crédito de ICMS oriundo de serviços de transporte de bovinos objetivando futura compensação?”

. “O Comunicado CAT 74/94, mesmo se tivesse amparado legalmente e, também, revestisse a condição de Norma Complementar de Legislação Tributária (CTN, art. 100), não estaria derrogado por força da legislação hierarquicamente superior, mais especificamente pela Lei Complementar n.º 87/96, editada para atender exigência da própria Constituição Federal – art. 155, § 2º, inciso XIII?”

. “Há outras normas e determinações legais aplicáveis à espécie que o Consulente ignore e que amparam a restrição de crédito manifestada?”

4. Inicialmente, cabe esclarecer, pelas razões postas nos itens seguintes, que a “fixação” da base de cálculo por pauta fiscal num caso concreto é provisória. Os valores nela consignados são apenas presumidos, podendo tal presunção ser revertida por prova apresentada pelo contribuinte ou por verificação fiscal. Portanto, não ocorre glosa de crédito de ICMS, mas uma avaliação fiscal transitória, que permanece enquanto não se produzir prova incontestável e idônea em contrário, embora possa tornar-se definitiva após o decurso do prazo prescricional para a reclamação. Nada impede o contribuinte de exercer a ampla defesa e o contraditório, através de petição dirigida à autoridade administrativa que praticou o ato, recurso à autoridade superior e, obviamente, também por ação judicial.

5. O Estado tem faculdades juridicamente sustentáveis para agir em prol da defesa de sua receita, porque corresponde ao interesse coletivo de sua população. Pode fazê-lo através das normas mencionadas na Consulta, as quais, se tivessem sido declaradas ilegais pela Justiça, certamente não estariam sendo aplicadas.

6. Pelo Comunicado CAT n.º 74, de 05/08/94, ficaram os contribuintes orientados de que, em razão de alguns Estados, notadamente no que concerne a grãos em geral e gado bovino, estarem elevando artificialmente os valores mínimos de operações interestaduais em sua pauta fiscal, fixando-os em níveis notadamente superiores aos preços reais, de mercado, a fim de não causar prejuízo ao Estado de São Paulo, o que poderia ocorrer na medida em que o excesso de crédito neutraliza os débitos pelas operações locais, cabe ao fisco paulista, em reação, diante de tais evidências, nestes casos em que o imposto tenha sido pago por pauta fiscal no Estado de origem, proceder à glosa do crédito excedente ao correspondente ao preço corrente de mercado e/ou pauta paulista.

7. Deve-se interpretar o Comunicado CAT n.º 74/94 sabendo-se que a “pauta fiscal” paulista não estipula definitivamente, num caso concreto, a base de cálculo do imposto. A base de cálculo do ICMS é o valor da operação de saída da mercadoria ou o preço da prestação de transporte, conforme determina a Lei Complementar n.º 87/96. Mas não pode se tomar por “base de cálculo” um valor irrealístico e improvável, atribuído a uma operação ou prestação. Apenas ao valor real da operação e o preço real da prestação atribui-se a condição de servir de base para calcular um imposto.

8. A pauta fiscal paulista, ao ser aplicada em razão do Comunicado CAT n.º 74/94 busca o efeito preventivo de coibir o superfaturamento em operações e prestações interestaduais que têm por destino o Estado de São Paulo. Tem o seguinte fundamento.

9. O fato de a legislação tributária goiana, ou de outro Estado, fixar pauta para valorar determinadas operações e prestações não obriga o Estado de São Paulo a aceitar o aproveitamento, por contribuinte estabelecido em seu território, de valor de crédito irreal, maior do que o legalmente permitido. Nesse passo, convém lembrar que o Código Tributário Nacional, ao tratar da competência tributária, deixa estabelecido no "caput" do art. 6º que “a competência tributária compreende a competência tributária plena”, com as limitações da lei. Dessa forma, a política tributária, a legislação e sua aplicação compete a cada Estado, que as estabelece segundo seus próprios critérios, obedecidas as limitações constitucionais e os preceitos de lei complementar.

10. Na falta do valor real, a Lei Complementar n.º 87/96 estipula, em seus arts. 15 e 16, a base de cálculo do imposto que deve ser atribuída à operação e à prestação. Atribui-se à base de cálculo o preço corrente da mercadoria, ou de seu similar, no mercado atacadista do local da operação ou, na sua falta, no mercado atacadista regional, caso o remetente seja produtor. Nas prestações sem preço determinado, a base de cálculo do imposto é o valor corrente do serviço, no local da prestação.

11. Dispõe também a Lei Complementar, em seu art. 18, que é dever da autoridade fiscal, diante de declarações sobre o valor ou o preço de mercadorias, bens ou serviços que não mereçam fé, arbitrá-los, admitindo a contestação pela avaliação contraditória.

12. E a lei paulista n.º 6.374/89, no art. 30, caput, combinado com seu § 4º, condiciona a aceitação, pelo fisco paulista, de valores mínimos em operações ou prestações interestaduais, à celebração de acordo entre este Estado e os demais Estados envolvidos, para estabelecimento dos critérios de fixação dos valores. Na sua falta, o valor de operações ou prestações interestaduais, se fixado unilateralmente por outro Estado, deve ser recusado pela autoridade administrativa, podendo a base de cálculo da operação ou prestação atender à pauta expedida pela Secretaria da Fazenda. No § 3º do mesmo dispositivo legal está expressa a garantia da avaliação contraditória.

13. Dada a impossibilidade prática de se apurar a cada momento a aceitabilidade dos valores de operações e prestações, e mesmo de formar valores referenciais a partir de todos dos mercados atacadistas de todas as mercadorias, as pautas paulistas são restritas a algumas mercadorias mais comuns e, na medida do possível, são formadas a partir da pesquisa e coleta de preços mais favoráveis ao contribuinte. No caso trazido pelo Consulente, os valores possivelmente refletem os maiores preços encontrados nos mercados atacadistas de gado, consideradas as variações regionais. Este fato confere legitimidade à pauta fiscal paulista.

14. A Receita Estadual goiana, pela Instrução Normativa n.º 107/00 – SRE, de 20 de julho de 2000, adotou unilateralmente, para operações internas e interestaduais, “como pauta de valores para efeito de base de cálculo do ICMS, o preço corrente da mercadoria e do serviço constantes dos Anexos I e II, respectivamente, desta instrução” (art. 1º da IN 107/00). Seu Anexo I traz, no item 15924, que o valor atribuído ao bezerro de até 12 meses (no campo “Gado Bovino de Criar) é de R$ 280,00, o mesmo consignado nas Notas Fiscais Avulsas de n.ºs 96741 e 96742. Seu Anexo II indica, no item 22763, que o valor atribuído ao transporte de gado vivo, por quilômetro, é de R$ 0,75, para distâncias acima de 251 Km, o mesmo consignado nas Notas Fiscais supra.

15. Tais Notas Fiscais foram emitidas em 28/04/00, na vigência de Instrução Normativa anterior, que possivelmente tenham tido os mesmos valores, relativamente aos bens em questão.

16. Assim, cabe ao Consulente, na defesa de seus interesses, contestar não apenas os valores estabelecidos nas pautas paulistas, mas também os das pautas goianas às quais as normas paulistas apenas oferecem reação automática. Pode, também, contestar, perante a administração ou a justiça goiana, a validade do arbitramento unilateral de valores de operações e prestações que, se aceitas incontestes, teriam o efeito de obrigar a Fazenda paulista a suportar créditos de ICMS decorrentes de valores irreais de operações e prestações, ofendendo-lhe a autonomia estadual.

17. Para finalizar, conclui-se, em razão do exposto, que: (1) o Estado de São Paulo não pode aceitar crédito de ICMS acima do legalmente apropriável; (2) em operação onde há indício de irrealidade, pelo emprego de valores acima dos de mercado, é lícito, num caso concreto, estabelecer valor provisório de base de cálculo que, sujeito ao contraditório, sucumbe diante de prova do valor real da operação ou prestação, ou do valor de mercado; (3) o Comunicado CAT 74/94 está em vigor, e (4) cabe ao Consulente não apenas o direito de produzir, junto ao fisco paulista, as provas para exercer o contraditório, mas também o de exigir, segundo o seu arbítrio, perante o Estado de Goiás, a possível diferença do imposto pago a maior.

Fernando Batlouni Mendroni
Consultor Tributário

De acordo

Cirineu do Nascimento Rodrigues
Diretor da Consultoria Tributária .