Resposta à Consulta nº 38 DE 08/06/2016

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 08 jun 2016

Consignação Industrial

Texto

..., empresa estabelecida na ..., em ...-MT, inscrita no CNPJ sob o nº ... e no Cadastro de Contribuintes do Estado sob o nº ..., formula consulta sobre a possibilidade de remeter insumos agropecuários a produtores rurais mato-grossenses com faturamento posterior, isto é no momento da utilização no plantio.

A consulente informa que atua no ramo industrial, com importação, fabricação e comercialização de adubos e fertilizantes e suas matérias primas.

Assevera que seu processo fabril caracteriza-se pela mistura e ensaque dos mencionados componentes para entrega direta aos seus clientes, sendo este processo realizado de acordo com as características técnicas exclusivas de cada produtor rural, ou seja, conforme as necessidades do solo, cultura, região, o que resulta em grande variação de fórmulas, volumes e até de embalagem.

Explica que, conforme acima discorrido, não há possibilidade de manutenção de estoques do produto final para entrega, pois é inviável a manutenção de estoques sem que antes haja encomenda com as informações técnicas das necessidades específicas de seus clientes, quais sejam: os produtores rurais estabelecidos no Estado de Mato Grosso.

Anota que as operações internas com estes insumos agropecuários são isentas de ICMS, desde que atendidas às condições previstas no artigo 115 do Anexo IV do RICMS/MT.

Registra que a característica do mercado de adubos e fertilizantes representa um grande desafio logístico e industrial, pois além de manter grandes estoques de diversas variedades de componentes para mistura, precisa também primar pela qualidade do produto acabado, evitando sua contaminação na mudança de fórmulas através de análises laboratoriais e processos sistêmicos de limpeza do maquinário industrial.

Destaca que além dos quesitos operacionais mencionados, os fabricantes de adubos e fertilizantes ficam sujeitos, ainda, a variáveis climáticas, de crédito, econômicas, de sazonalidades, entre outras, o que resulta em períodos de ociosos ou períodos de demandas superiores a capacidade de produção, o que gera desabastecimento ou morosidade e descompasso com as necessidades de entrega para o grande mercado agrícola mato-grossense.

Explica que, diante disso, vislumbrou a oportunidade, expressa pelos próprios produtores rurais, de se receber nas propriedades rurais, grandes quantidades de fertilizantes antecipadamente ao momento do plantio, o que traria benefícios aos envolvidos, pois os fabricantes poderiam minimizar os efeitos da sazonalidade, com a otimização da distribuição nas fábricas ao longo do ano; e os produtores com capacidade de armazenagem, poderiam estocar o produto e utilizá-lo no momento propício sem sujeitar-se as intempéries acima descritas.

Alega, entretanto, que como o fertilizante é uma “commodity agrícola” seu preço está sujeito a variação cambial, de maneira que o preço final de venda não pode ser definido no ato do envio antecipado dos adubos e fertilizantes ao produtor rural, ou seja, não há como concretizar no ato do envio físico a operação de compra e venda.

Entende que, o instituto da “consignação industrial”, fundamentado no Protocolo ICMS 52/00, do qual este Estado passou a ser signatário após a publicação do Protocolo ICMS 61/15, pode atender perfeitamente as necessidades de fornecimento de adubos e fertilizantes nas condições acima, vez que o faturamento ocorre apenas quando da utilização da mercadoria pelo destinatário, e eventual diferença de preço (variação cambial) está prevista no referido Protocolo, através do Reajuste de Preço.

Aduz que a produção rural reflete o conceito de transformação trazido pelo próprio Regulamento do Imposto sobre Produtos Industrializados – RIPI, aprovado pelo Decreto nº 7.212/2010, que em seu artigo 4º trata do conceito de industrialização. Transcreve o referido artigo, e acrescenta que o referido diploma legal foi integralmente recepcionado pelo RICMS/MT, conforme estabelecido no seu artigo 4º, inciso II, alínea “c”.

Defende que a analogia é objetiva quanto à transformação intrínseca a produção rural, vez que através das técnicas de plantio e a utilização de insumos obtém-se nova espécie de produto, qualificando o produtor como um estabelecimento industrial, podendo, assim, adotar a figura da “Consignação Industrial”, vez que a produção rural também pode ser considerada, por analogia, como produção industrial.

Por fim, apresenta os seguintes questionamentos:

1) Está correto o entendimento da consulente quanto a interpretação de que a produção rural pode ser também considerada como processo industrial nos termos definidos no Protocolo ICMS 52/00 que instituiu a “consignação industrial”?

2) Na hipótese do entendimento do que se pretende praticar divergir deste erudito órgão, qual seria o mecanismo para remeter insumos agropecuários a produtores rurais mato-grossenses com faturamento no momento da utilização?

É a consulta.

Inicialmente cumpre registrar que em consulta ao Sistema de Informações Cadastrais desta SEFAZ/MT, constata-se que a Consulente está cadastrada na CNAE principal 2013-4/02 – Fabricação de adubos e fertilizantes, exceto organo minerais, bem como que se encontra enquadrada no regime de Apuração Normal do ICMS.

Ainda na preliminar, cabe trazer à colação dispositivo do Protocolo ICMS 52/00 citado pela consulente, que dispõe sobre as operações relacionadas com as remessas de mercadorias em consignação industrial para estabelecimentos industriais:

Cláusula primeira Acordam os Estados da Bahia, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo em permitir que fornecedores estabelecidos nos seus territórios promovam a saída de mercadorias a título de "consignação industrial" com destino a estabelecimentos industriais localizados no território de qualquer dos Estados signatários, nos termos deste protocolo.

§ 1° Para efeito deste protocolo, entende-se por consignação industrial a operação na qual ocorre remessa, com preço fixado, de mercadoria com a finalidade de integração ou consumo em processo industrial, em que o faturamento dar-se-á quando da utilização dessa mercadoria pelo destinatário.

§ 2° O disposto neste protocolo não se aplica às mercadorias sujeitas ao regime de substituição tributária.

Cláusula segunda Na saída de mercadoria a título de consignação industrial, observadas as legislações estaduais e federal, relativamente ao ICMS e IPI, respectivamente:

I - o consignante emitirá Nota Fiscal contendo, além dos demais requisitos, o seguinte:

a) natureza da operação: "Remessa em Consignação Industrial";

b) destaque do ICMS e do IPI, quando devidos;

c) a informação, no campo "Informações Complementares", de que será emitida uma Nota Fiscal para efeito de faturamento, englobando todas as remessas de mercadorias em consignação e utilizadas durante o período de apuração.

II - o consignatário lançará a Nota Fiscal no Livro Registro de Entradas, creditando-se do valor do imposto, quando permitido.

Cláusula terceira Havendo reajuste de preço contratado após a remessa em consignação de que trata este protocolo

I - o consignante emitirá Nota Fiscal complementar, contendo, além dos demais requisitos, o seguinte:

a) natureza da operação: Reajuste de preço em consignação industrial;

b) base de cálculo: o valor do reajuste;

c) destaque do ICMS e do IPI, quando devidos;

d) a indicação da Nota Fiscal prevista na cláusula anterior com a expressão "Reajuste de Preço de Mercadoria em Consignação - NF nº ..., de .../.../...";

II - o consignatário lançará Nota Fiscal no Livro Registro de Entradas, creditando-se do valor do imposto, quando permitido, indicando os seus dados na coluna "Observações" da linha onde foi lançada a Nota Fiscal prevista na cláusula anterior.

Cláusula quarta No último dia de cada mês:

I - o consignatário deverá:

a) emitir Nota Fiscal globalizada com os mesmos valores atribuídos por ocasião do recebimento das mercadorias efetivamente utilizadas ou consumidas no seu processo produtivo sem destaque do valor do ICMS, contendo, além dos demais requisitos, como natureza da operação, a expressão "Devolução Simbólica – Mercadorias em Consignação Industrial";

b) registrar a Nota Fiscal de que trata o inciso seguinte, no Livro Registro de Entradas apenas nas colunas "Documento Fiscal" e "Observações", apondo nesta a expressão "Compra em Consignação - NF nº ... de .../.../...";

II - o consignante emitirá Nota Fiscal, sem destaque do ICMS, contendo, além dos demais requisitos, o seguinte:

a) natureza da operação: Venda;

b) valor da operação: o valor correspondente ao preço da mercadoria efetivamente vendida, neste incluído, quando for o caso, o valor relativo ao reajuste do preço;

c) no campo "Informações Complementares", a expressão "Simples Faturamento de Mercadoria em Consignação Industrial - NF nº ..., de .../.../... (e, se for o caso) reajuste de preço - NF nº ..., de .../.../...".

§ 1º O consignante lançará a Nota Fiscal a que se refere o inciso II, no Livro Registro de Saídas, apenas nas colunas "Documento Fiscal", "Observações", apondo nesta a expressão, "Venda em consignação - NF nº ..., de .../.../...". (Renumerado de p. único para § 1º pelo Prot. ICMS 14/01)

§ 2º As Notas Fiscais previstas nesta cláusula poderão ser emitidas em momento anterior ao previsto no "caput", inclusive diariamente. (Acrescentado pelo Prot. ICMS 14/01)

Cláusula quinta Na devolução de mercadoria remetida em consignação industrial:

I - o consignatário emitirá Nota Fiscal, contendo, além dos demais requisitos, o seguinte:

a) natureza da operação: "Devolução de Mercadoria em Consignação Industrial";

b) valor : o valor da mercadoria efetivamente devolvida, sobre o qual foi pago o imposto;

c) destaque do ICMS e indicação do IPI os mesmos valores debitados, por ocasião da remessa em consignação;

d) no campo "Informações Complementares", a expressão "Devolução (parcial ou total, conforme o caso) de Mercadoria em Consignação - NF nº ..., de .../.../...";

II - o consignante lançará a Nota Fiscal, no livro Registro de Entradas, creditando-se do valor do imposto.

Cláusula sexta O consignante deverá entregar à repartição fiscal a que estiver vinculado, em meio magnético, até o dia 10 do mês subseqüente ao da realização das operações, demonstrativo de todas as remessas efetuadas em consignação e das correspondentes devoluções, com a identificação das mercadorias.

Cláusula sétima Poderá este protocolo, a qualquer tempo, ser denunciado unilateralmente por qualquer unidade federada signatária, desde que efetuada com antecedência mínima de 30 (trinta) dias.

Pela leitura que se faz do citado Protocolo verifica-se que o instituto da consignação industrial somente poderá ser utilizado, no âmbito do ICMS, nas saídas de mercadorias com destino a estabelecimentos industriais e aplica-se às operações realizadas com os Estados signatários do Protocolo ICMS nº 52/2000.

Dessa forma, não há possibilidade de se utilizar a consignação industrial nas operações cujos destinatários não estejam legalmente constituídos como industrial, isto é, o consignante não poderá remeter a mercadoria para pessoa jurídica que não seja industrial, na forma indicada no aludido Protocolo, visto que somente este está habilitado à prática de operações tipificadas como industrialização.

No tocante às dúvidas suscitadas pela consulente de que a produção rural pode ser considerada, por analogia, produção industrial, necessário se faz trazer à colação os dispositivos ora indicados, iniciando-se pelo artigo 4º, inciso II, alínea “d” do Regulamento do ICMS do Estado de Mato Grosso, aprovado pelo Decreto nº 2.212, de 20 de março de 2014, conforme se transcreve a seguir:

Art. 4° Para os efeitos da aplicação da legislação do imposto:

(...)

II – considera-se, ainda:

(...)

c) industrialização, qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para consumo, tal como:

1) a que, executada sobre matéria-prima ou produto intermediário, resulte na obtenção de espécie nova (transformação);

2) a que importe em modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto (beneficiamento);

3) a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma (montagem);

4) a que importe em alteração da apresentação do produto pela colocação de embalagem, ainda que em substituição à original, salvo quando a embalagem aplicada destinar-se apenas ao transporte da mercadoria acondicionamento ou reacondicionamento);

5) a que, executada sobre o produto usado ou partes remanescentes de produto deteriorado ou inutilizado, o renove ou restaure para utilização (renovação ou recondicionamento);

d) em estado natural, o produto tal como se encontra na natureza, que não tenha sido submetido a nenhum processo de industrialização referido na alínea c deste inciso, não perdendo essa condição o que apenas tiver sido submetido a resfriamento, congelamento, secagem natural, acondicionamento rudimentar ou que, para ser comercializado, dependa necessariamente de beneficiamento ou acondicionamento;

(...)

§ 2° Relativamente ao disposto na alínea c do inciso II do caput deste artigo, não perde a natureza de primário o produto que apenas tiver sido submetido a processo de beneficiamento, acondicionamento ou reacondicionamento.

(...). Destacou-se.

A referida definição tem respaldo no Decreto Federal nº 7.212, de 15/06/2010, que regulamenta a cobrança, fiscalização, arrecadação e administração do imposto sobre produtos industrializados – IPI, definição trazida do art. 3º da Lei nº 4.502/1964:

Decreto nº 7.212, de 15/06/2010 – Regulamento do IPI:

Art. 4° Caracteriza industrialização qualquer operação que modifique a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto, ou o aperfeiçoe para consumo, tal como:

I - a que, exercida sobre matérias-primas ou produtos intermediários, importe na obtenção de espécie nova (transformação);

II - a que importe em modificar, aperfeiçoar ou, de qualquer forma, alterar o funcionamento, a utilização, o acabamento ou a aparência do produto (beneficiamento);

III - a que consista na reunião de produtos, peças ou partes e de que resulte um novo produto ou unidade autônoma, ainda que sob a mesma classificação fiscal (montagem);

IV - a que importe em alterar a apresentação do produto, pela colocação da embalagem, ainda que em substituição da original, salvo quando a embalagem colocada se destine apenas ao transporte da mercadoria (acondicionamento ou reacondicionamento); ou

V - a que, exercida sobre produto usado ou parte remanescente de produto deteriorado ou inutilizado, renove ou restaure o produto para utilização (renovação ou recondicionamento).

(...).

De conformidade com o dispositivo acima transcrito, caracteriza-se industrialização o processo que importe em modificar a natureza, o funcionamento, o acabamento, a apresentação ou a finalidade do produto ou o aperfeiçoe para o consumo.

Um produto mantém seu estado natural quando se apresenta tal como se encontra na natureza. Por sua vez, produto primário é aquele resultante da agricultura, pecuária, entre outras, que não tenha sido submetido a nenhum processo de industrialização, não perdendo essa condição o que tiver sido submetido apenas a resfriamento, congelamento, secagem natural, acondicionamento rudimentar ou que, para ser comercializado, dependa necessariamente de beneficiamento ou acondicionamento, conforme previsto na alínea “d” do inciso II do artigo 4º do RICMS/MT

Assim, no caso em comento, os produtos resultantes da atividade rural (produção rural), além de serem considerados produtos in natura, são também caracterizados produtos primários, vez que não são submetidos a nenhum processo de industrialização que esteja compreendido no campo da incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI,

Prosseguindo a análise e corroborando esse entendimento, em relação às atividades rurais, a Secretaria da Receita Federal do Brasil editou a Instrução Normativa SRF n° 83, de 11 de outubro de 2001, que “dispõe sobre a tributação dos resultados da atividade rural das pessoas físicas”, e, no mesmo sentido, também editou a Instrução Normativa SRF n° 257, de 11 de dezembro de 2002, que “dispõe sobre a tributação dos resultados da atividade rural na apuração do imposto de renda das pessoas jurídicas”.

O artigo 2° da aludida IN SRF n° 83/2001 arrola as atividades compreendidas entre as chamadas atividades rurais. É elucidativo o rol contemplado no indicado artigo:

Art. 2º Considera-se atividade rural:

I – a agricultura;

II – a pecuária;

III – a extração e a exploração vegetal e animal;

IV – a exploração de atividades zootécnicas, tais como apicultura, avicultura, cunicultura, suinocultura, sericicultura, piscicultura e outras culturas de pequenos animais;

V – a atividade de captura de pescado in natura, desde que a exploração se faça com apetrechos semelhantes aos da pesca artesanal (arrastões de praia, rede de cerca, etc.), inclusive a exploração em regime de parceria;

Assim, diante de todo exposto, infere-se que não caracteriza processo de industrialização a atividade desenvolvida pelo produtor rural, ainda que na produção rural sejam utilizados insumos, equipamentos coletores de avançada tecnologia, até mesmo integrado com a secagem e limpeza, exclusivamente com o produto resultante da colheita, e, portanto, não se cogita a adoção da figura Consignação Industrial às operações em comento.

Após as considerações supra, passa-se às respostas dos questionamentos efetuados pela Consulente na ordem em que foram propostos:

Está correto o entendimento da consulente quanto a interpretação de que a produção rural pode ser também considerada como processo industrial nos termos definidos no Protocolo ICMS 52/00 que instituiu a “consignação industrial”?

Quesito 1 – A resposta é negativa. Conforme já visto anteriormente, a produção rural em comento não caracteriza atividade industrial. Dessa forma, não há possibilidade de aplicação do estabelecido no Protocolo ICMS 52/00, vez que este somente se aplica nas operações relacionadas com mercadorias remetidas em consignação industrial destinadas a estabelecimentos industriais

Na hipótese do entendimento do que se pretende praticar divergir deste erudito órgão, qual seria o mecanismo para remeter insumos agropecuários a produtores rurais mato-grossenses com faturamento no momento da utilização?

Quesito 2 – Em resposta ao presente quesito, informa-se que não há previsão na legislação tributária mato-grossense para que a consulente efetue a remessa de insumos agropecuários a produtores rurais mato-grossenses com faturamento posterior, isto é, no momento da utilização pelo produtor.

É a informação, ora submetida à superior consideração.

Gerência de Interpretação da Legislação Tributária da Superintendência de Normas da Receita Pública, em Cuiabá – MT, 08 de junho de 2016.

Francislaine Cristini Vida Marquezin Garcia Rúbio

FTE

APROVADA:

Adriana Roberta Ricas Leite

Gerente de Interpretação da Legislação Tributária

Dulcinéia Souza Magalhães

Superintendente de Normas da Receita Pública