Resposta à Consulta nº 283 DE 21/10/2022

Norma Estadual - Mato Grosso - Publicado no DOE em 24 out 2022

ITCD – OBRIGAÇÃO PRINCIPAL – DOAÇÃO – QUOTAS DE EMPRESA – RESERVA DE USUFRUTO – BASE DE CÁLCULO. A base de cálculo do ITCD é o valor venal do bem ou direito transmitido na data da realização do ato ou da celebração do contrato de doação, sendo que, no caso de quotas ou outros títulos de participação em sociedades comerciais, considera-se valor venal o seu valor patrimonial atualizado na data da ocorrência do fato gerador.

Texto

..., pessoa física, com endereço na Rua ..., n° ..., em .../MT e com inscrição no CFP sob o n° ..., formula consulta sobre apuração da base de cálculo do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, de quaisquer Bens e Direitos (ITCD) na hipótese em que especifica.

Para tanto, informa o consulente que é sócio proprietário de uma empresa LTDA (sociedade de responsabilidade limitada), com capital social investido de R$ 8.701.000,00, equivalente a 8.701.000 quotas, sendo detentor de 8.000.500 destas quotas.

Acrescenta que pretende realizar a doação, com reserva de usufruto, de 8.000.000 quotas.

Em seguida, transcreve o balanço patrimonial da empresa, como segue:

ATIVO PASSIVO
Ativo Circulante Passivo Circulante
Caixa e Equivalentes R$ 56.100,00 Fornecedores

Obrigações Trabalhistas

R$ 5.000,00

R$ 1.400,00

Ativo Não Circulante Passivo Não Circulante
Investimentos R$ 1.300,00 Empréstimo
Imobilizado R$ 8.700.000,00 Patrimônio Líquido
Capital Social R$ 8.701.000,00
Lucros R$ 50.000,00
Total do Ativo R$ 8.757.400,00 Total do Passivo R$ 8.757.400,00

Ao final, apresenta os seguintes questionamentos:

1) Com base no balanço apresentado, qual seria a base de cálculo do imposto incidente sobre as 8.000.000 quotas doadas?

2) Como podem ver, o imobilizado da empresa tem um valor expressivo, é feita alguma avaliação dos bens que compõem o imobilizado, a título de atualizar o valor patrimonial da empresa?

3) Neste caso, se tratando de doação, caso eu desista de seguir com a doação, mas a guia do ITCD já estaria gerada, mas não paga, posso desistir do processo? Ou como a guia já está gerada sou obrigado a seguir com a Doação?

Por último, faz observação de que as informações e demonstração são fictícias.

Declara ainda o consulente que não se encontra sob procedimento fiscal iniciado ou já instaurado para apurar fatos relacionados com a matéria objeto da presente consulta, que a dúvida suscitada não foi objeto de consulta anterior já respondida, bem como que a matéria consultada não foi objeto de decisão proferida em processo administrativo já findo, em que tenha sido parte.

É a consulta.

De início, convém informar que o Imposto sobre a Transmissão "Causa Mortis" e Doação de quaisquer Bens ou Direitos neste Estado (ITCD) foi instituído pela Lei nº 7.850, de 18.12.2002, e alterações, regulamentada pelo Decreto nº 2.125, de 12.11.2003.

Para efeito de tributação do ITCD, considera-se doação qualquer ato ou fato não oneroso que importe ou se resolva em transmissão de quaisquer bens ou direitos.

A legislação civil brasileira definiu a doação (art. 538) como uma modalidade de contrato "em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra" e estabeleceu o usufruto como um direito real sobre a coisa (bem). Eis à transcrição de preceitos do referido Código Civil Brasileiro, Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002, inerentes à matéria:

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.

(...)

Art. 1.394. O usufrutuário tem direito à posse, uso, administração e percepção dos frutos.

No ato hipotético sob análise, o proprietário, no exercício de sua livre vontade, dispôs de um elemento constitutivo da propriedade mediante doação e reservou para si o uso e o gozo da coisa (bem), ou seja, transmitiu o domínio e manteve para si a fruição do bem.

Entende-se que sobre o ato jurídico que consistiu na transmissão não onerosa da nua-propriedade (a própria doação do bem) com reserva de usufruto recairá a exigência do ITCD, conforme normatizado nos dispositivos do Decreto regulamentador do imposto em tela, nos seguintes termos:

Decreto n° 2.125/2003:

Art. 4º Ocorre o fato gerador do imposto no momento da:

I – abertura da sucessão, inclusive a decorrente de morte presumida;

II – realização do ato ou celebração do contrato de transmissão do bem ou direito nos demais casos.

(...)

Art. 11 A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional, a ser descrito nas guias de informação anexas a este regulamento.

§ 1º Considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou da celebração do contrato de doação, ou instituição de direito real.

§ 2º Nos casos a seguir, a base de cálculo do imposto é:

I – na transmissão não onerosa da nua-propriedade e na instituição e na extinção de usufruto, uso e habitação por ato não oneroso: 70% (setenta por cento) do valor do bem;

(...)

Art. 16 No caso de ações não negociadas em bolsas, quotas ou outros títulos de participação em sociedades comerciais ou civis de objetivos econômicos, considera-se valor venal o seu valor patrimonial na data da ocorrência do fato gerador.

Parágrafo único Na hipótese de o valor patrimonial não corresponder ao de mercado, a autoridade fiscal poderá realizar ajustes com base em normas e práticas contábeis aplicáveis à apuração de haveres e à avaliação patrimonial. (Acrescentado pelo Dec. 1.395/18, efeitos a partir de 16.03.18)

Art. 28 O imposto será recolhido:

(...)

II – na doação:

a) antes da realização do ato ou celebração do contrato correspondente, observado o disposto no § 2º;

b) nos momentos indicados no § 3º, se houver reserva do usufruto, do uso ou da habitação sobre o bem, em favor do doador;

III – nos casos não especificados, decorrentes de atos judiciais, dentro de 30 (trinta) dias, contados da sua ciência pelo contribuinte.

(...)

§ 3º Na hipótese prevista na alínea b do inciso II do caput deste artigo, o imposto será recolhido:

I – antes da lavratura da escritura, sobre o valor da nua-propriedade;

II – por ocasião da consolidação da propriedade plena, na pessoa do nu-proprietário, sobre o valor do usufruto, uso ou habitação;

III – facultativamente, antes da lavratura da escritura, sobre o valor integral da propriedade.

(...).

Segundo o que estatuiu o art. 28 já reproduzido, há um tratamento específico para o caso da doação com reserva de usufruto em favor do doador.

Cabe destacar que, nessa situação, haverá o recolhimento de dois impostos: um, sobre a nua-propriedade e o outro, sobre o usufruto.

Não obstante, pode o contribuinte optar pelo momento do recolhimento do imposto correspondente ao usufruto.

O imposto sobre a nua-propriedade deverá sempre ser recolhido antes da lavratura da escritura em duas situações, quais sejam:

ü a prevista no inc. I do § 3º do art. 28;

ü a prevista no inc. III do § 3º do art. 28.

Se o contribuinte optar em efetuar o recolhimento do ITCD apenas sobre o valor da nua-propriedade nos termos do inc. I do § 3º do art. 28, a base de cálculo será de 70% (setenta por cento) do valor venal, de acordo com o art. 11, § 2º, inciso I.

Por outro lado, se optar em efetuar o recolhimento do ITCD “facultativamente, antes da lavratura da escritura, sobre o valor integral da propriedade”, conforme prevê o transcrito inc. III do § 3º do art. 28, nesse caso, engloba o pagamento do ITCD tanto na doação da nua propriedade quanto no usufruto, e a base de cálculo corresponderá a 100% (cem por cento) do valor venal do bem ou direito transmitido. De forma que, em sendo essa a opção, não haverá que se falar em recolher o imposto quando da extinção do usufruto.

No que tange à alíquota aplicável ao cálculo do imposto, o artigo 25 do comentado Decreto regulamentar n° 2.125/2003 assim dispõe:

Art. 25 As alíquotas do imposto são as fixadas de acordo com as diferentes faixas de escalonamento da base de cálculo atribuída por fato gerador dos bens transmitidos por doação ou causa mortis, constantes das tabelas abaixo: (Nova redação dada à integra do art. 25 pelo Dec. 905/17, efeitos a partir de 1º.04.17)

(...)

II - nas doações:

FAIXA ESCALONAMENTO DA BASE DE CÁLCULO REFERENTE A CADA FATO GERADOR ALÍQUOTA
a) Até 500 (quinhentas) UPF/MT Isento
b) Acima de 500 (quinhentas) e até 1.000 (mil) UPF/MT 2% (dois por cento)
c) Acima de 1.000 (mil) e até 4.000 (quatro mil) UPF/MT 4% (quatro por cento)
d) Acima de 4.000 (quatro mil) e até 10.000 (dez mil) UPF/MT 6% (seis por cento)
e) Acima de 10.000 (dez mil) UPF/MT 8% (oito por cento)

§ 1º Nas hipóteses previstas neste artigo, a alíquota fixada em cada faixa será aplicada exclusivamente sobre o montante que exceder o limite fixado para aquela imediatamente inferior.

§ 2º O valor total do imposto devido será calculado somando-se os valores apurados em relação a cada faixa de tributação.

§ 3º Em relação ao inciso II do caput deste artigo, o imposto será recalculado a cada doação efetuada, no mesmo ano civil, pelo mesmo doador ao mesmo donatário, adicionando-se à base de cálculo os valores dos bens ou direitos anteriormente transmitidos e deduzindo-se os valores dos impostos já recolhidos.

§ 4º Fica dispensado o pagamento do imposto quando o valor a pagar for inferior a 1 (uma) UPF/MT.

Importante destacar que, de acordo com a Portaria n° 179/2022-SEFAZ, o valor da UPF/MT, vigente para o mês de outubro de 2022, corresponde a R$ 220,23 (duzentos e vinte reais e vinte e três centavos).

Por fim, com base em todo o exposto, passa-se a responder às questões apresentadas pelo consulente, como segue:

Questão 1 - Com base no balanço apresentado, qual seria a base de cálculo do imposto incidente sobre as 8.000.000 quotas doadas?

Conforme determina o “caput” do artigo 11, e § 1°, do Decreto n° 2.125/2003, transcrito anteriormente, regra geral, a base de cálculo do ITCD na doação é o valor venal do bem ou direito transmitido na data da celebração do contrato de doação.

Já, no caso de doação de quotas ou outros títulos de participação em sociedades comerciais, de acordo com o artigo 16 do referido Diploma regulamentar, para efeito de definição da base de cálculo, considera-se valor venal o seu valor patrimonial na data da ocorrência do fato gerador. De forma que se o valor patrimonial não corresponder ao valor de mercado, a autoridade fiscal (unidade da SEFAZ responsável pelo produto) poderá realizar os ajustes. Vide transcrição:

Art. 16 No caso de ações não negociadas em bolsas, quotas ou outros títulos de participação em sociedades comerciais ou civis de objetivos econômicos, considera-se valor venal o seu valor patrimonial na data da ocorrência do fato gerador.

Parágrafo único Na hipótese de o valor patrimonial não corresponder ao de mercado, a autoridade fiscal poderá realizar ajustes com base em normas e práticas contábeis aplicáveis à apuração de haveres e à avaliação patrimonial. (Acrescentado pelo Dec. 1.395/18, efeitos a partir de 16.03.18)

Assim sendo, na hipótese de o consulente optar em efetuar o recolhimento do ITCD apenas sobre a doação da nua-propriedade nos termos do inc. I do § 3º do art. 28 do Decreto n° 2.125/003, isto é, sem considerar o usufruto, a base de cálculo

Por outro lado, se optar em efetuar o recolhimento do ITCD sobre o valor integral da propriedade, como prevê o inciso III do § 3° do artigo 28 do Decreto n° 2.125/2003, ou seja, sobre a doação da nua propriedade e do usufruto, a base de cálculo corresponderá a 100% (cem por cento) do valor venal do bem ou direito transmitido. Nessa hipótese, diferentemente da anterior, não haverá que se falar em recolher o imposto quando da extinção do usufruto.

Questão 2 - Como podem ver, o imobilizado da empresa tem um valor expressivo, é feita alguma avaliação dos bens que compõem o imobilizado, a título de atualizar o valor patrimonial da empresa?

Em princípio sim, pois, conforme legislação transcrita, no caso de doação, a base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido na data da realização do ato ou da celebração do contrato de doação.

Sendo que, de acordo com o transcrito artigo 16 do Decreto n° 2.125/2003, no caso de quotas ou outros títulos de participação em sociedades comerciais, considera-se valor venal o seu valor patrimonial na data da ocorrência do fato gerador.

Assim, para se chegar ao valor patrimonial das quotas na data da ocorrência do fato gerador, ou seja, na data da celebração do contrato de doação, há necessidade de atualização do balanço patrimonial da empresa.

Com isso, deve-se atualizar todo o ativo e passivo, de forma que o valor do patrimônio líquido reflita o seu valor atualizado na data da ocorrência do fato gerador.

Vale lembrar que o valor patrimonial de cada cota é obtido pela divisão do valor do patrimônio líquido da sociedade pelo número total de cotas da sociedade.

Questão 3 - Neste caso, se tratando de doação, caso eu desista de seguir com a doação, mas a guia do ITCD já estaria gerada, mas não paga, posso desistir do processo? Ou como a guia já está gerada sou obrigado a seguir com a Doação?

Pois bem, se a doação não foi efetivada em decorrência de desistência, não ocorre o fato gerador, por consequência, não há que se falar em recolhimento do ITCD.

Contudo, considerando a hipótese de que a guia ITCD já teria sido gerada, a consulta será desmembrada para que a unidade responsável pelo produto possa se manifestar a respeito.

De acordo com o artigo 45 do Decreto n° 2.125/2003, “O procedimento administrativo de consulta sobre interpretação e aplicação da legislação tributária relativa ao ITCD observará, no que couber, as normas pertinentes ao Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS.”

Esclarece-se que esta unidade consultiva (CDCR/SUCOR) tem competência para responder apenas consulta sobre obrigação tributária principal, assim, a presente será desmembrada para que a “questão 3” seja também analisada e respondida pela unidade competente, conforme disposições do artigo 995 do RICMS:

Art. 995 A unidade fazendária competente para apreciação da consulta é a coordenadoria:

I - de Divulgação e Consultoria de Normas da Receita Publicada Superintendência de Consultoria Tributária e Outras Receitas - CDCR/SUCOR, quando se tratar de consultas sobre obrigação tributária principal, ressalvado o disposto nos incisos II a IV deste artigo;

II – pertinente, quando se tratar de consulta sobre obrigação tributária acessória;

III – (revogado) (Revogado pelo Decreto 342/2019)

III-A - do IPVA, ITCD e Outras Receitas da Superintendência de Consultoria Tributária e Outras Receitas - CIIOR/SUCOR, quando se tratar de crédito de qualquer natureza vinculado à propriedade de veículos automotores;

IV – a qual esteja atribuída, no Regimento Interno, a execução do produto ou serviço a que se refere o questionamento ou cuja legislação eleja como responsável pela aplicação do dispositivo consultado, na hipótese de se tratar de consulta sobre obrigação tributária formulada por pessoa, servidor, titular ou substituto vinculado, direta ou indiretamente, a superintendência ou coordenadoria da própria Secretaria Adjunta da Receita Pública, observado ainda o disposto no § 4° deste artigo.

(...)

§ 3° Será desmembrada para resposta pela unidade fazendária competente, a consulta que, simultaneamente, versar sobre objeto a ser analisado por mais de uma coordenadoria com atribuições específicas para a matéria.

(...).

Dessa forma, desmembra-se a presente consulta para que a CIIOR/SUCOR responda a questão n° 3 formulada pelo consulente, ou, caso entenda não ser competente para elaborar tal resposta, encaminhe para a unidade fazendária que julgue competente.

Cabe ressaltar que o entendimento exarado na presente Informação vigorará até que norma superveniente disponha de modo diverso, nos termos do parágrafo único do artigo 1.005 do RICMS.

Cumpre ainda registrar que não produzirá os efeitos legais previstos no artigo 1.002 e no parágrafo único do artigo 1.005 do Regulamento do ICMS, aprovado pelo Decreto nº 2.212/2014, a consulta respondida sobre matéria que esteja enquadrada em qualquer das situações previstas nos incisos do caput do artigo 1.008 do mesmo Regulamento.

Alerta-se que, em sendo o procedimento adotado pelo consulente diverso do aqui indicado, deverá, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, contados da ciência da presente, regularizar suas operações, inclusive com recolhimento de eventuais diferenças de imposto, ainda sob os benefícios da espontaneidade, com acréscimo de correção monetária, juros e multa de mora, calculados desde o vencimento da obrigação até a data do efetivo pagamento.

Após o transcurso do prazo assinalado, ficará o estabelecimento consulente sujeito ao lançamento de ofício, para exigência de eventuais diferenças, nos termos do artigo 1.004 do RICMS/2014.

Registra-se que esta resposta não se enquadra nas hipóteses das alíneas do inciso I do § 2° do artigo 995 do RICMS, conforme redação dada pelo Decreto n° 1.076, de 24 de agosto de 2021, não se submetendo, portanto, à análise da Câmara Técnica Permanente.

É a informação, ora submetida à superior consideração, com a ressalva de que os destaques apostos nos dispositivos da legislação transcrita não existem nos originais.

Coordenadoria de Divulgação e Consultoria de Normas da Receita Pública da Superintendência de Consultoria Tributária e Outras Receitas, em Cuiabá – MT, 24 de outubro de 2022.

Antonio Alves da Silva

FTE

DE ACORDO:

Elaine de Oliveira Fonseca

Coordenadora – CDCR/SUCOR

APROVADA.

José Elson Matias dos Santos

Superintendente de Consultoria Tributária e Outras Receitas