Resposta à Consulta nº 23642 DE 21/06/2021

Norma Estadual - São Paulo - Publicado no DOE em 21 jun 2021

ICMS – Obrigações acessórias - Conserto de bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário – Industrialização por conta de terceiro, em mercadoria destinada à posterior comercialização pelo autor da encomenda – Incidência. I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, se sujeita à incidência somente do imposto estadual. II. Na saída do produto acabado, o industrializador deverá emitir Nota Fiscal que terá como destinatário o estabelecimento autor da encomenda, utilizando o código 5.124 nas linhas correspondentes às mercadorias de sua propriedade empregadas no processo industrial e aos serviços prestados; o código 5.902 para o retorno dos insumos recebidos pelo industrializador e incorporados ao produto; o código 5.903 para retorno dos insumos recebidos e não utilizados, se for o caso; e 5.949 para perdas não inerentes ao processo industrial, se houver.

ICMS – Obrigações acessórias - Conserto de bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário – Industrialização por conta de terceiro, em mercadoria destinada à posterior comercialização pelo autor da encomenda – Incidência.

I. A atividade de industrialização, em quaisquer das suas modalidades (artigo 4º, inciso I, do RICMS/2000), se executada sobre mercadorias de terceiro, destinadas a posterior comercialização ou industrialização pelo autor da encomenda, se sujeita à incidência somente do imposto estadual.

II. Na saída do produto acabado, o industrializador deverá emitir Nota Fiscal que terá como destinatário o estabelecimento autor da encomenda, utilizando o código 5.124 nas linhas correspondentes às mercadorias de sua propriedade empregadas no processo industrial e aos serviços prestados; o código 5.902 para o retorno dos insumos recebidos pelo industrializador e incorporados ao produto; o código 5.903 para retorno dos insumos recebidos e não utilizados, se for o caso; e 5.949 para perdas não inerentes ao processo industrial, se houver.

Relato

1. A Consulente, optante pelo Regime do Simples Nacional, que tem como atividade principal a “Reparação e manutenção de outros objetos e equipamentos pessoais e domésticos não especificados anteriormente” (CNAE 95.29-1/99) e como atividade secundária o “Comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios” (CNAE 47.81-4/00), apresenta consulta sobre como proceder em relação ao conserto de bolsas e acessórios que efetuará para contribuinte do ICMS, o qual, posteriormente, comercializará tais mercadorias.

2. Transcreve os artigos 1º e 3º da Portaria CAT-92/2001 e informa que a Consulente é uma prestadora de serviços, que conserta objetos como bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário para empresas importadoras dessas mercadorias, acrescentando, ainda, que na operação ora analisada, sua cliente (empresa importadora) envia os objetos para conserto utilizando na Nota Fiscal o CFOP 5.915 (“Remessa de mercadoria ou bem para conserto ou reparo”) e juntamente envia à Consulente as partes e peças que substituirão as quebradas ou danificadas, utilizando o CFOP 5.949 (“Outra saída de mercadoria ou prestação de serviço não especificado”).

3. Diante dessa situação, apresenta os questionamentos abaixo:

3.1. É possível caracterizar essa operação como serviço de assistência técnica, visto que atende uma marca específica de forma contínua, embora não de forma exclusiva?

3.2. Não sendo possível enquadrá-la na assistência técnica, como proceder na entrada e saída da parte ou peça do estoque que substituirá as quebradas e danificadas?

3.3. Na entrada dessas partes e peças deve ser utilizado o CFOP 1.949 (“Outra entrada de mercadoria ou prestação de serviço não especificada”) e, na saída dessas, na respectiva Nota Fiscal, o CFOP 5.949?

3.4. Essa operação é fato gerador do ICMS?

3.5. Na entrada da mercadoria objeto de conserto deve ser utilizado o CFOP 1.915 (“Entrada de mercadoria ou bem recebido para conserto ou reparo”), e na saída o CFOP 5.916 (“Retorno de mercadoria ou bem recebido para conserto ou reparo”)?

Interpretação

4. Preliminarmente, considerando que a Consulente não forneceu determinadas informações em seu relato, registre-se que a presente resposta adotará o pressuposto de que as operações tratadas na consulta são internas. Caso essa premissa não se confirme, pode a Consulente formular nova consulta tributária, trazendo mais informações acerca do caso concreto objeto de análise.

4.1. Além disso, com relação ao questionamento sobre a possibilidade dessa operação ser caracterizada como serviço de assistência técnica, visto que a Consulente atende uma marca específica de forma contínua, embora não de forma exclusiva, cabe apontar que, de forma geral, assistência técnica é o estabelecimento comercial autorizado pelo fabricante a fazer a manutenção do produto vendido dentro do prazo de garantia ou após o término dele, observando que seus profissionais devem estar capacitados e qualificados para o serviço, bem como as peças devem ser originais do fabricante.

4.2. Assim, não compete a esta Secretaria da Fazenda definir se o serviço prestado pela Consulente pode ser considerado como de assistência técnica. Todavia, para fins do cumprimento das obrigações principal e acessória, conforme informações trazidas, na hipótese de contribuinte do imposto remeter mercadoria avariada para conserto, sendo os insumos fornecidos, direta e preponderantemente, pelo autor da encomenda, e o produto consertado destinar-se a posterior comercialização, estará caracterizada industrialização por conta de terceiro. Esse entendimento encontra-se positivado na própria Portaria CAT-92/2001, mencionada pela Consulente, em seu artigo 3º.

5. Feitas essas considerações preliminares, depreende-se que as partes e peças remetidas à Consulente pertencem ao estoque do cliente e, após a intervenção realizada pela Consulente, serão utilizadas como parte integrante do produto importado pelo remetente que o destinará à futura comercialização. Sendo assim, cabe inicialmente tecer algumas considerações teóricas sobre o tema.

6. Com efeito, é notório que a Constituição Federal, em linhas gerais, repartiu entre os entes federativos a competência da tributação sobre o consumo em função da etapa do ciclo econômico em que a atividade se encontra: industrial (União); comercial (Estados e Distrito Federal); e prestação de serviços (Municípios e Distrito Federal).

7. Nesse contexto, especificamente no que tange ao ICMS, ele incide sobre as “operações relativas à circulação de mercadorias”, que fundamentalmente são aquelas operações que impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final. Tais operações implicam a “obrigação de dar” (a mercadoria), mas, no entanto, em algum momento da cadeia produtiva, pode surgir, concomitantemente ou não, uma “obrigação de fazer”, sem que isso altere a natureza da operação.

8. Diante disso, a mesma atividade realizada - com ou sem emprego de materiais - pode constituir uma operação de industrialização voltada à mercancia (ICMS) ou uma prestação de serviço (ISSQN). Com efeito, o fato de determinada atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/03 como prestação de serviço sujeita ao ISSQN, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (artigo 2º, III, “a”, do RICMS/2000).

9. Negar essa constatação e querer tributar por ISSQN o fornecimento de uma atividade, ainda que imaterial, envolta no ciclo produtivo, é ofender a não cumulatividade. Isso porque o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando-o, sem a possibilidade de compensação, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.

9.1. Além disso, não é razoável, ante as complexidades técnicas encontradas no ciclo produtivo, querer-se entender que a simples preponderância da atividade imaterial/intelectual, ou mesmo a produção personalíssima sob encomenda, seja um critério finito e único para a conceituação e definição de serviço para fins de incidência do ISSQN.

10. Sendo assim, a destinação da mercadoria sobre a qual é executada a atividade é elemento determinante para identificar a etapa do ciclo econômico em que essa atividade se localiza e, desse modo, é também um dos elementos fundamentais para se estabelecer a incidência do imposto competente.

11. Essa mesma linha de entendimento é atualmente seguida pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões sobre o tema de industrialização por encomenda, como pode ser observado das seguintes decisões: (i) AI nº 803.296/SP-AgR, transitado em julgado em 09/04/2019; e (ii) RE nº 606.960/ES-AgR, transitado em julgado em 16/12/2014 – cujas ementas são bastante elucidativas, motivo pelo qual transcreve-se os seguintes excertos:

“1. Em precedente da Corte consubstanciado na ADI nº 4.389/DF-MC, restou definida a incidência de ICMS “sobre operações de industrialização por encomenda de embalagens, destinadas à integração ou utilização direta em processo subsequente de industrialização ou de circulação de mercadoria.

2. A verificação da incidência nas hipóteses de industrialização por encomenda deve obedecer dois critérios básicos: (i) verificar se a venda opera-se a quem promoverá nova circulação do bem e (ii) caso o adquirente seja consumidor final, avaliar a preponderância entre o dar e o fazer mediante a averiguação de elementos de industrialização.

(...)

4. À luz dos critérios propostos, só haverá incidência do ISS nas situações em que a resposta ao primeiro item for negativa e se no segundo item o fazer preponderar sobre o dar.” (AI nº 803.296/SP-AgR).

“3. Na industrialização por encomenda, se o bem retorna à circulação, tal processo industrial representa apenas uma fase do ciclo produtivo da encomendante, não estando essa atividade, portanto, sujeita ao ISSQN, como é o caso dos presentes autos.” (RE nº 606.960/ES-AgR).

12. Nesse sentido, como visto acima, na industrialização por conta de terceiro, sequer é necessário analisar a preponderância entre o dar e o fazer, já que a industrialização por conta de terceiro é uma etapa do processo produtivo em que terceiro executa atividade em mercadoria alheia que posteriormente será comercializada ou se submeterá a outro processo de industrialização. Nesse caso, a industrialização por conta de terceiro se configura como etapa do processo de circulação de mercadoria e deve ser tributada pelo ICMS.

13. Nesse contexto, e a contrário senso, para se constituir fato gerador do ISSQN, o serviço prestado deve estar elencado na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar nº 116/2003 e ser executado sobre bem pertencente a usuário ou consumidor final. Portanto, é pressuposto, para a incidência do ISSQN, tratar-se de bem de terceiro, ou seja, bem de propriedade de usuário ou consumidor final e não objeto de mercancia (mercadoria).

14. Observa-se, então, que na hipótese trazida, como as partes e peças remetidas serão integradas no conserto das bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário que serão posteriormente comercializados pelo remetente, verifica-se que a atividade da Consulente se encontra envolta no ciclo de produção e comercialização, tratando-se, portanto, de operação de industrialização voltada à mercancia, sujeita, assim, à competência tributária estadual, ou seja, é fato gerador do ICMS.

15. Nessa perspectiva, como visto, a realização do conserto das bolsas está no ciclo da operação relativa à circulação da mercadoria. Notadamente, o objetivo principal do cliente da Consulente é a efetivação da venda de seus produtos para terceiros. Por opção, o cliente remetente se utiliza de estabelecimento de terceiro (Consulente) para cumprir esta etapa e, assim, prosseguir no ciclo de comercialização de seus produtos. Nesse contexto, na medida em que serviços de conserto importam em modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto (beneficiamento), aprimora-o para o consumo.

16. Portanto, o processo de conserto pode ser equiparado a um beneficiamento, o qual, na definição dada pelo Regulamento do ICMS - RICMS/2000, em seu artigo 4º, inciso I, alínea “b”, é uma espécie de industrialização, consistindo em uma operação que importe em modificação, aperfeiçoamento ou, de qualquer forma, alteração do funcionamento, da utilização, do acabamento ou da aparência do produto.

17. Diante disso, haja vista a referida operação de conserto nas bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário ser um processo de industrialização (do qual resultará o aperfeiçoamento dos produtos) e ter sido encomendado por terceiro, possibilitando assim a circulação da mercadoria na cadeia mercantil, na situação descrita pela Consulente, devem ser aplicados os procedimentos de industrialização por conta de terceiros previstos nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.

18. Explica-se, melhor. Da operação em tela, verifica-se que ocorre uma industrialização por conta de terceiros na qual, por opção do cliente remetente, uma etapa do processo produtivo é realizada por meio de serviço de um terceiro (Consulente). Esse serviço é executado sobre mercadoria do encomendante, que, em etapa posterior, a comercializará.

19. Ressalta-se ainda que, como dito no subitem 4.2, o entendimento teórico acima detalhadamente exposto encontra-se sucintamente normatizado no artigo 3º da Portaria-CAT 92/2001, mencionada pela Consulente, nos seguintes termos:

“Art. 3º Na hipótese do conserto ser encomendado por contribuinte do imposto e o produto consertado destinar-se a posterior comercialização, caracterizando industrialização sob encomenda, o lançamento do imposto incidente na saída do encomendante fica suspenso, conforme disciplina prevista no artigo 402 do Regulamento do ICMS.”

20. Dessa feita, na situação ora analisada, atendendo a disciplina elencada nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, devem ser adotados os seguintes procedimentos:

20.1. Na saída da mercadoria (bolsas, carteiras, cintos etc) com destino ao estabelecimento da Consulente para que sejam efetuados os consertos (espécie de beneficiamento) ficará suspenso o lançamento do ICMS incidente (“caput” do artigo 402 do RICMS/2000), devendo o cliente remetente (encomendante) emitir respectiva Nota Fiscal, sob o CFOP 5.901 (“Remessa para industrialização por encomenda”), informando a quantidade e a descrição dos produtos remetidos ao estabelecimento da Consulente, quem realizará o conserto;

20.2. No subsequente retorno ao estabelecimento do cliente encomendante, após a realização dos consertos no estabelecimento da Consulente, também ficará suspenso o lançamento do ICMS relativamente aos produtos que foram remetidos para tal, lembrando que como condição da suspensão, o retorno ao estabelecimento do cliente encomendante deverá ocorrer dentro de 180 dias contados da data da saída da mercadoria de seu estabelecimento com destino àquele que procederá ao serviço de conserto, conforme preceituam os artigos 409 e 410 do RICMS/2000;

20.2.1. No retorno das mercadorias (bolsas, carteiras, cintos e acessórios de vestuário) e insumos (partes e peças) recebidos para industrialização pela Consulente, deverá ser emitida Nota Fiscal consignando o CFOP 5.902 (“Retorno de mercadoria utilizada na industrialização por encomenda”), pelo estabelecimento industrializador (Consulente);

20.2.2. Caso haja acréscimo de material, pelo industrializador, inclusive energia elétrica e combustíveis empregados no processo produtivo, tal material deve ser tributado no retorno ao estabelecimento do cliente encomendante, devendo ser acrescentado, na Nota Fiscal emitida pela Consulente, sob o CFOP 5.124 (“Industrialização efetuada para outra empresa”);

20.2.3. Sob este mesmo CFOP 5.124 (“Industrialização efetuada para outra empresa”) devem ser classificados os serviços prestados. Tratando-se de operações internas, em que tanto o estabelecimento autor da encomenda como o estabelecimento industrializador se localizam neste Estado de São Paulo, o imposto referente à parcela cobrada pelos serviços (mão de obra) prestados pela Consulente fica diferido para o momento da efetiva saída dos produtos por ocasião da venda pelo cliente encomendante, conforme determina o artigo 1º, da Portaria CAT-22/2007;

20.2.4. Para o retorno dos insumos recebidos em seu estabelecimento diretamente do autor da encomenda, porém não aplicados no processo de industrialização o código 5.903 (“Retorno de mercadoria recebida para industrialização e não aplicada no referido processo”).

20.2.5. Para discriminar eventuais perdas não inerentes ao processo produtivo o código 5.949 (“Outra saída de mercadoria não especificada”).

20.2.6. Ademais, tendo em vista que a Consulente é optante pelo regime do Simples Nacional, deve ser observado ainda o entendimento contido na Decisão Normativa CAT 13/2009, na qual foi assegurada a aplicabilidade da suspensão prevista no artigo 402 do RICMS/2000 e do diferimento previsto na Portaria CAT-22/2007 para as empresas optantes do Simples Nacional que industrializam mercadorias sob encomenda de contribuinte paulista, nos termos ali expostos.

21. Ante o exposto, caso a Consulente esteja procedendo de forma diversa à descrita nesta resposta, deverá procurar o Posto Fiscal de sua vinculação para regularizar a situação, ao abrigo do disposto no artigo 529 do RICMS/2000.

21.1. Em função da atual situação epidemiológica enfrentada no país, sugere-se a leitura da Portaria CAT-34/2020, que dispõe sobre o atendimento não presencial, por meios remotos de prestação de serviços, e da Resolução SFP-26/2020, que dispõe sobre o atendimento ao contribuinte no âmbito das unidades da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo para o enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do novo coronavírus (Covid-19).

22. Com isso, dá-se por respondidos os questionamentos apresentados pela Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.